Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação experimental dos métodos de prevenção de fissuras na interface alvenaria de vedação e pilar de concreto

Resumos

As fissuras na interface alvenaria/estrutura são ocorrências patológicas comuns nas edificações e muitos são os métodos propostos pela indústria da construção que prometem evitar este problema. De caráter recorrente encontram-se as fissuras na ligação pilar de concreto e parede de alvenaria. Neste trabalho, são avaliados, em laboratório, os métodos mais usuais de prevenção deste tipo de fissura. Modelos pilar/alvenaria foram construídos utilizando-se diferentes tipologias de ligação entre o pilar de concreto e a parede de alvenaria, desde o usual "ferro cabelo" até telas de aço. A eficiência de cada um destes métodos de ligação foi avaliada por intermédio de ensaio dos modelos à tração direta, com o monitoramento da evolução da abertura da fissura na ligação pilar/parede em função do incremento de carga aplicada ao modelo. Os resultados desta pesquisa indicaram o modelo composto por "tela metálica eletrossoldada, e sem cantoneira de aço", como a melhor técnica de controle da fissuração na ligação pilar de concreto e parede de alvenaria, dentre todos os modelos avaliados.

alvenaria; fissuras; tela eletrosoldada


Cracks that form at the interfaces between masonry structures are common uncontrolled occurrences in buildings. Numerous methods have been proposed by the construction industry to address this problem. Cracks continuously form in the joints between concrete columns and masonry infill walls. In this study, the most common methods for preventing these types of cracks were evaluated in laboratory experiments. Column masonry models were constructed using different types of joints between concrete columns and masonry infill walls, such as steel bars and steel mesh. The efficiency of each type of joint method was evaluated by performing direct tensile tests (pullout tests) on the models and monitoring the evolution of the crack opening in the joint between the column and wall, as a function of load applied to the model. The results from this study indicate that the model composed of "electrowelded wire mesh without steel angles" is the best model for controlling cracking in the joints between concrete columns and masonry infill walls.

masonry; cracks; electrowelded metallic screen


Avaliação experimental dos métodos de prevenção de fissuras na interface alvenaria de vedação e pilar de concreto

A. P. TramontinI; A. L. Moreno JuniorII; C. R OliveiraIII

IUNICAMP, Department of Structures, School of Civil Engineering, Architecture and Urban Planning, andre_penteado@yahoo.com.br, address: UNICAMP, Departamento de Estruturas, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo; Rua Saturnino de Brito nº. 135, Laboratório de Estruturas. CEP: 13083-852, CP 6021, Cidade Universitária Zeferino Vaz s/nº -Distrito de Barão Geraldo, Campinas-SP-Brazil

IIUNICAMP, Department of Structures, School of Civil Engineering, Architecture and Urban Planning, almoreno@fec.unicamp.br, address: UNICAMP, Departamento de Estruturas, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo; Rua Saturnino de Brito nº. 135, Laboratório de Estruturas. CEP: 13083-852, CP 6021, Cidade Universitária Zeferino Vaz s/nº -Distrito de Barão Geraldo, Campinas-SP-Brazil

IIIUNICAMP, Department of Structures, School of Civil Engineering, Architecture and Urban Planning, claytonreisoliveira@hotmail.com, address: UNICAMP, Departamento de Estruturas, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo; Rua Saturnino de Brito nº. 135, Laboratório de Estruturas. CEP: 13083-852, CP 6021, Cidade Universitária Zeferino Vaz s/nº -Distrito de Barão Geraldo, Campinas-SP-Brazil

RESUMO

As fissuras na interface alvenaria/estrutura são ocorrências patológicas comuns nas edificações e muitos são os métodos propostos pela indústria da construção que prometem evitar este problema. De caráter recorrente encontram-se as fissuras na ligação pilar de concreto e parede de alvenaria. Neste trabalho, são avaliados, em laboratório, os métodos mais usuais de prevenção deste tipo de fissura. Modelos pilar/alvenaria foram construídos utilizando-se diferentes tipologias de ligação entre o pilar de concreto e a parede de alvenaria, desde o usual "ferro cabelo" até telas de aço. A eficiência de cada um destes métodos de ligação foi avaliada por intermédio de ensaio dos modelos à tração direta, com o monitoramento da evolução da abertura da fissura na ligação pilar/parede em função do incremento de carga aplicada ao modelo. Os resultados desta pesquisa indicaram o modelo composto por "tela metálica eletrossoldada, e sem cantoneira de aço", como a melhor técnica de controle da fissuração na ligação pilar de concreto e parede de alvenaria, dentre todos os modelos avaliados.

Palavras-chave: alvenaria, fissuras, tela eletrosoldada.

1. Introdução

O ritmo acelarado da indústria da construção, numa corrida contra o crescente déficit habitacional no País, tem gerado resultados muitas vezes insatisfatórios quanto ao desempenho das edificações. Este mau desempenho é traduzido em problemas patológicos, que prejudicam a utilização segura e confortável destas edificações.

Dentre as patologias recorrentes na construção civil, encontram-se as fissuras. Segundo [1], fatores como a falta de qualificação profissional, a utilização de materiais fora das especificações, o emprego inadequado ou equivocado de técnicas de construção, a falta de fiscalização na execução da obra e falhas de projeto podem ser colocados como causas principais desta recorrência.

No caso das edificações com estrutura em concreto armado e fechamento em alvenaria, vale acrescentar aos fatores causadores do mau desempenho, a tendência crescente à construção de estruturas cada vez mais esbeltas. Quando mais esbeltas as estruturas, maiores serão suas deformações.

Ao deformar-se, a estrutura de concreto faz com que a parede de alvenaria de vedação seja solicitada ao oferecer resistência aos deslocamentos impostos pela estrutura. Quanto maior os deslocamentos impostos, mais solicitadas estarão as paredes de vedação. O atual incremento do problema patológico da fissuração, nas edificações com estruturas em concreto armado e fechamento em alvenaria, pode indicar que as atuais técnicas de prevenção do problema carecem de adaptação aos novos critérios de desempenho e de comportamento (principalmente em relação à esbeltez) das edificações.

Entretanto, tantas são as variáveis envolvidas, e tamanha é a dependência destas variáveis umas com as outras, que o estudo de métodos construtivos para evitar fissuras, ou torná-las imperceptíveis, revela-se um problema bem mais complexo do que possa aparentar, em uma primeira análise. A distribuição das solicitações na parede de alvenaria e as propriedades físicas e mecânicas dos componentes da parede (elemento de alvenaria e argamassa de assentamento) podem ser colocados como variáveis importantes deste problema.

Este número elevado de variáveis envolvidas no problema, aliado à interdependência entre as mesmas e aos resultados, ainda inconclusivos, da influência isolada, de cada uma delas no comportamento da parede quanto à fissuração, fazem do estudo em questão um clássico problema de cunho experimental, onde novas técnicas de prevenção de fissuras são avaliadas em ambientes de laboratório.

Na citada avaliação em laboratório, por limitações técnicas e de custos, muitas vezes não é possível a reprodução do comportamento real da parede de alvenaria em situação de serviço. Nestes casos, avaliações da eficiência destas técnicas de prevenção de fissuras em modelos de menor escala podem ser uma alternativa. Desta maneira, neste trabalho, como forma de contribuição ao meio técnico, na forma de resultados experimentais, são avaliados, em modelo reduzido, vários dispositivos usuais de prevenção à fissuração que ocorre na junta de ligação entre a parede de alvenaria e a estrutura de concreto (pilar). A citada proposta de avaliação, a princípio, pode ser empregada para o descarte inicial de uma técnica, em detrimento a uma outra, em eventual seleção preliminar ao teste, de custo bem mais elevado, da parede em tamanho real, em laboratório.

2. A fissuração em paredes de alvenaria de vedação

A parede de alvenaria de vedação é constituída por elementos de alvenaria (blocos ou tijolos maciços) unidos por juntas de argamassa de assentantamento. Estes mateirais, com propriedades físicas e mecânicas individuais, devem trabalhar em conjunto de forma que a parede cumpra sua função de vedação.

Em termos de desempenho, espera-se que uma parede de vedação seja concebida, executada e utilizada, segundo critérios específicos de segurança, de durabilidade, de resistência ao fogo, de conforto térmico e acústico e de estanqueidade. Acrescente-se, logicamente, aos citados fatores, critérios que dizem respeito à estética e a economia.

Quando alguns desses requisitos não são considerados ou, até mesmo, considerados segundo critérios ainda sem a devida comprovação técnico/científica, fatalmente ocorrerão problemas patológicos nas alvenarias de vedação. Um dos problemas é a fissuração.

Avaliando as causas primárias responsáveis pelas fissuras, [2] cita: deficiência dos materiais constituintes; erros de projetos; defeitos de execução; acidentes e utilização e/ou manutenção inadequada.

O mesmo autor [2] classifica ainda, como causas imediatas das fissuras em alvenarias de vedação: movimento das fundações; deformações estruturais excessivas; variações de temperatura; variações de umidade; defeitos de execução e, por fim, causas genéricas como aquelas fissuras advindas de reações químicas dos materiais constituintes da parede, vibrações da própria parede, etc. Esta segunda classificação mostra-se mais útil quanto ao diagnóstico e reparação do problema.

Na mesma linha de identificação das causas da fissuração, [3] afirma que as fissuras são provocadas por tensões oriundas da atuação de sobrecargas ou de movimentações de materiais, dos componentes ou da obra como um todo.

Segundo [4], das causas atribuídas à fissuração em paredes de vedação de edifícios altos, destaca-se a incompatibilidade das deformações da estrutura em comparação com a capacidade de acomodar deformações e a resistência das vedações verticais. As alvenarias de vedação estão em contato ou apoiadas sobre os componentes da estrutura (lajes, vigas e pilares), logo devem ter comportamentos resistentes inter-relacionados.

Atualmente, existe uma tendência ao incremento ainda mais acentuado desta fissuração na parede de alvenaria de vedação, gerada pela incompatibilidade de deformação entre alvenaria/estrutura. Como já alertado por [5], e também por [6], projetam-se estruturas cada vez mais esbeltas, com incremento dos vãos das vigas e diminuição da seção dos pilares. Estas estruturas, mais deformáveis, acabam por impor estas deformações às alvenarias que as circunvizinham, gerando tensões para as quais as alvenarias não foram projetadas e, desta forma, aumentando a probabilidade de ocorrência de fissuração na parede ou na região de ligação desta com a estrutura (junta).

A fissuração na região de ligação entre parede/estrutura ocorre geralmente, quando a parede de alvenaria resiste às citadas tensões (advindas das deformações impostas pela estrutura deformável), mas a ligação entre a alvenaria e a estrutura não resiste. Neste caso, podem surgir fissuras ao longo das juntas (interface alvenaria/estrutura).

Existem, atualmente, muitas técnicas de tratamento da citada junta de ligação parede/estrutura para prevenir fissuras ou limitar sua abertura a valores aceitáveis quanto ao desempenho da parede de alvenaria de vedação. Nesta linha, encontram-se as sugestões de [7], [8] e [9], de se adotar reforços metálicos como suporte das tensões atuantes nas regiões mais solicitadas, ou juntas de controle, permitindo que estas tensões sejam dissipadas.

No caso de emprego de reforços metálicos, como forma de prevenção das fissuras na ligação parede/pilar, tem sido comum, na indústria da construção civil nacional, o emprego dos chamados "ferros cabelo" (barras de aço para concreto armado de espessura entre 4 a 6 mm) ou o emprego de telas metálicas eletro-soldadas de arame de pequenos diâmetros, fixadas com pinos, arruelas ou cantoneiras no pilar de concreto (Figuras [1] a [3]).


Estes métodos, em muitos casos patológicos, não tem se mostrado eficientes. Avaliar, em laboratório, a eficiência destes métodos de prevenção das fissuras entre parede de alvenaria e pilar de concreto foi o objetivo deste trabalho.

3. Materiais e programa experimental

As técnicas avaliadas de prevenção da fissura, que pode ocorrer na junta de ligação da parede de alvenaria e pilar de concreto, foram as constituídas por dispositivos de ligação formados por barras de aço ("ferro cabelo") ou por tela metálica eletro-soldada galvanizada. Observa-se que as técnicas aqui avaliadas são de uso corrente, atualmente, na indústria da construção civil nacional. Na fixação das barras de aço nos pilares foi empregada metodologia usual deste procedimento, com a barra sendo inserida em furação prévia nos pilares e ancorada com adesivo epóxi. No caso das telas, dois procedimentos foram avaliados: a fixação com pinos e arruelas e a fixação por intermédio de cantoneiras metálicas.

A fixação dos dispositivos de ligação (ferro cabelo e tela), nas paredes de alvenaria, se deu por ancoragem destes dispositivos nas juntas de assentamento. Ensaios prévios de arrancamento do dispositivo das juntas, com comprimentos de ancoragem de 30 cm ou de 40 cm, indicaram a ancoragem de 40 cm como a mais eficiente. A metodologia destes ensaios de arrancamento está descrita a seguir. Outro parâmetro de interesse, analisado neste trabalho, foi a eficiência do incremento de rugosidade superficial da face do pilar em contato com a parede de alvenaria. A face do pilar em questão foi tratada com argamassa de cimento e areia, aditivada com adesivo acrílico.

Logicamente, alguns parâmetros foram mantidos constantes na avaliação comparativa proposta, quais sejam: o tipo de alvenaria de vedação (bloco cerâmico de 14 cm de largura, 19 cm de altura e 39 cm de comprimento), a argamassa de assentamento (argamassa industrializada), o concreto de execução dos pilares e a tensão prévia de compressão aplicada à alvenaria.

O dispositivo de ligação constituído por barras de aço, conhecido como "ferro cabelo", foi avaliado nos diâmetros de 5.0 mm e 6.3 mm. No caso da tela de aço, foi empregada tela com malha quadrada de 15 cm e diâmetro dos fios de 1.65 mm.

Em resumo, considerando as variáveis descritas, foram avaliados, em laboratório, os seguintes modelos:

barra de aço com 5.0 mm e superfície do pilar com tratamento prévio;

barra de aço com 5.0 mm e superfície do pilar sem tratamento prévio; n barra de aço com 6.3 mm e superfície do pilar com tratamento prévio;

barra de aço com 6.3 mm e superfície do pilar sem tratamento prévio;

tela de aço fixada no pilar por pinos e arruelas, superfície do pilar com tratamento;

tela de aço fixada no pilar por pinos e arruelas, superfície do pilar sem tratamento;

tela de aço fixada no pilar por cantoneiras metálicas e superfície do pilar com tratamento, e;

tela de aço fixada no pilar por cantoneiras e superfície do pilar sem tratamento.

Para cada um destes oito modelos foram executadas quatro amostras, que foram ensaiadas à tração direta ("Pullout Test"). A metodologia destes ensaios está descrita a seguir.

Apresentados a seguir, também estão os resultados de caracterização dos materiais utilizados nesta pesquisa. Bloco cerâmico, concreto, argamassa de assentamento, barras e tela de aço foram caracterizados em relação às propriedades físicas e mecânicas de interesse no trabalho.

3.1 Metologia empregada nos ensaios de arrancamento do dispositivo de ligação (tela ou barra de aço) da argamassa de assentamento

Esses ensaios foram executados com o objetivo de se avaliar qual dos comprimentos usualmente empregados na indústria da construção, 30 cm ou 40 cm, seria o mais adequado para a ancoragem do dispositivo de ligação (barra de aço ou tela) na junta de assentamento das paredes de alvenaria.

Para esta avaliação foram executados prismas de alvenaria constituídos por dois blocos cerâmicos de vedação, assentados com argamassa industrializada ensacada. Na junta de assentamento desses prismas foram inseridas as barras (de 5.0 ou 6.3 mm) ou a tela de aço, nos comprimentos de 30 cm ou de 40 cm.

O ensaio consistia do arrancamento do dispositivo de ligação da junta de argamassa. Um equipamento especial foi construído para este ensaio. Nele, os prismas foram dispostos entre chapas metálicas, conectadas por tirantes rosqueados e instrumentados que, por sistema de aperto com porcas, aplicavam esforço controlado de compressão nas faces dos blocos. Este arranjo de ensaio foi necessário para simular uma situação em serviço das paredes de alvenaria, onde os dispositivos de ligação tem uma compressão prévia, proveniente do peso próprio da parede de alvenaria.

O esforço de compressão aplicado nos prismas foi estimado em 15 kN, equivalente ao que ocorreria em ligação localizada a meia altura de parede de alvenaria com pé-direito de 3,0 m. O controle deste carregamento prévio da ligação ocorreu via instrumentação das barras dos tirantes, nos quais foram colados extensômetros elétricos.

A Figura [4], ilustra o arranjo de ensaio de arrancamento proposto. Nesta figura nota-se a fixação das chapas de aço em grandes blocos de concreto. O deslocamento horizontal do sistema é liberado no instante da aplicação do esforço de compressão aos blocos. A medida que as porcas vão sendo apertadas, um dos conjuntos de placas se movimenta e aplica o esforço de compressão aos prismas.


Também foram instalados defletômetros em pontos localizados na superfície do bloco e no dispositivo de ligação (barra ou tela) de forma a se obter o deslocamento do dispositivo de ancoragem nesta região (Figura [5]). Vale observar que este deslocamento, em situação real, pode ser traduzido em abertura da fissura, que a técnica em questão deseja evitar.


Com o prisma devidamente posicionado no equipamento, e devidamente pré-comprimido, procedeu-se o ensaio de arrancamento do dispositivo de ligação, que foi tracionado até a ruptura por perda de ancoragem (arrancamento). A Figura [6] ilustra a execução deste ensaio para o caso da tela eletro-soldada.


3.2 Metodologia dos ensaios à tração direta dos modelos de prevenção de fissuras na interface pilar de concreto e parede de alvenaria

Todas as trinta e duas amostras, quatro para cada um dos oito modelos propostos, foram executadas em laboratório.

Um pilar de concreto, com seção transversal quadrada de lado igual a 20 cm e comprimento de 50 cm, foi executado. Neste pilar, os dispositivos de ligação (barra ou tela) foram instalados. No caso da barra de aço (ferro cabelo), a mesma foi inserida em furação prévia no pilar e ancorada com adesivo. No caso da tela, a mesma foi ligada ao pilar por intermédio de pinos e arruelas ou por intermédio de cantoneiras metálicas.

Na face lateral dos pilares, cujo dispositivo de ligação estava instalado (barra ou tela), foram posicionados os prismas, constituídos por dois blocos cerâmicos. Os prismas foram posicionados de forma que os dispositivos de ligação (barra ou tela) ficassem inseridos na junta de assentamento entre os blocos, com comprimentos de ancoragem de 40 cm; comprimento que se mostrou mais eficiente nos ensaio prévios de arrancamento, anteriormente descritos.

Em alguns modelos, a face do pilar, em contado com os blocos cerâmicos, foi tratada com argamassa aditivada com adesivo acrílico. Os modelos foram posicionados no mesmo equipamento utilizado para o ensaio de arrancamento dos dispositivos de ligação e, em arranjo semelhante, os prismas foram pré-comprimidos, de maneira a simular-se situação em serviço já justificada.

Posicionados no equipamento, os modelos foram ensaiados à tração direta da ligação, conforme ilustrado na Figura [7]. Com o prisma (parede) fixado ao equipamento, e por intermédio de cabos conectados ao pilar, tracionou-se o sistema até o instante em que o observador, distante 50 cm do modelo e a olho nú, observasse uma primeira fissura.


Neste ensaio também foi avaliada a evolução da abertura da fissura na junta pilar/parede, em função do carregamento aplicado ao modelo. A Figura [8] ilustra o posicionamento de defletômetros na região, bem como o artifício empregado para tornar mais evidente, ao observador, as fissuras: pintura dos blocos cerâmicos com tinta latex branca.


4. Resultados e discussões

4.1 Ensaios de caracterização dos materiais

Os materiais, bloco cerâmico, argamassa de assentamento, barras de aço de 5.0 mm e 6.3 mm de diâmetro, tela eletro-soldada e concreto foram caracterizados em relação às propriedades físicas e mecânicas de interesse e de acordo com normatização nacional vigente.

O bloco cerâmico apresentou resistência à compressão de 2,11 MPa e absorção de água de 9,32%.

A resistência à compressão da argamassa de assentamento, avaliada aos 28 dias de idade e em corpos de prova cilíndricos de 5,0 cm de diâmetro e 10 cm de altura, foi de 2,05 MPa. Esta mesma argamassa apresentou resistência de aderência à tração, avaliada em seis amostras, variando de 0,413 MPa a 0,672 MPa.

A resistência de aderência na flexão foi avaliada em prismas de 5 blocos, segundo procedimento da ASTM E518:2002 (Figura [9]). O valor obtido para esta resistência de aderência foi de 0,403 MPa.


A barra de aço de 5.0 mm de diâmetro apresentou resistência ao escoamento de 837,5 MPa, deformação de início de escoamento de 0,64% e módulo de deformação de 190,1 GPa.

A barra de aço de 6.3 mm de diâmetro apresentou resistência ao escoamento de 623,5 MPa, deformação de início de escoamento de 0,54% e módulo de deformação de 181,4 GPa.

A tela eletro-soldada, de diâmetro 1,63 mm, apresentou resistência ao escoamento de 171,5 MPa.

O concreto para fabricação dos pequenos pilares foi executado com Cimento Portland CPIII-32, no traço, em volume, 1:2:3 (cimento, agregado miúdo, agregado graúdo) e com relação a/c de 0,45. A resistência à compressão desta mistura, avaliada aos 28 dias de idade, em corpos de prova cilíndricos de 10 cm de diâmetro e 20 cm de altura foi de 32 MPa.

4.2 Ancoragem do dispositivo de ligação (barra ou tela de aço)

A Figura [10] apresenta resultados do deslizamento para as barras de aço CA-50, diâmetros de 5.0 mm e 6.3 mm, e para a tela metálica eletro-soldada galvanizada, malha quadrada de 15 mm e diâmetro do fio de 1.65 mm. Os comprimentos de ancoragem avaliados foram os usuais, de 30 cm e de 40 cm.


Analisando a Figura [10], nota-se um comportamento semelhante para os três dispositivos avaliados. Tanto as barras de aço quanto a tela apresentaram valores de deslizamento muito superiores para o comprimento de ancoragem de 30 cm, quando comparados ao comprimento de 40 cm. No caso da barra de aço de 5.0 mm de diâmetro, para um carregamento de arrancamento igual a 450 daN, como exemplo, o valor de deslizamento foi 3 vezes superior ao obtido para o comprimento de ancoragem de 40 cm.

Desta forma, em primeira análise, no confronto direto entre os comprimentos de ancoragem avaliados, o comprimento de 40 cm leva vantagem; justificando seu emprego na execução dos oito modelos propostos de prevenção de fissura na interface pilar/parede deste trabalho.

Entretanto, é valido observar que, embora os comprimentos de ancoragem avaliados (30 cm ou 40 cm) sejam de emprego corrente na indústria da construção nacional, em metodologias de prevenção de fissuras na interface pilar/parede, em todos as amostras avaliadas a ruptura se deu por arrancamento do dispositivo de ligação (barra ou tela), antes que ocorresse o escoamento do aço. Esta situação pode não ser uma situação adequada de projeto para o sistema de prevenção da fissura na ligação pilar/parede, pois, logicamente, acrescenta aos valores de abertura desta fissura os valores correspondentes ao deslizamento do dispositivo de ligação na junta de argamassa; valores estes que não são desprezíveis, como pode ser observado nos resultados apresentados na Figura [10].

4.3 Fissuração na junta de ligação pilar de concreto/parede de alvenaria

A Figura [11] ilustra a evolução dos valores de abertura da fissura na ligação pilar/parede, em função do carregamento de tração aplicado aos modelos avaliados, até o surgimento da primeira fissura visível a olho nú (abertura em torno de 0.1 mm).


Analisando os resultados apresentados na Figura [11], nota-se que os modelos executados com as barras de aço de diâmetros 5.0 mm e 6.3 mm, com tratamento superficial da face comum pilar/ parede, tiveram comportamento praticamente idêntico durante os ensaios. Este fato pode sugerir que a utilização do diâmetro de 6.3 mm, em detrimento ao de 5.0 mm, pode não resultar na pretendida menor abertura da fissura em análise.

No que diz respeito à opção por tela ou barra de aço, como dispositivo de ligação, os resultados apresentados na Figura [11] sugerem uma ligeira vantagem para o emprego da tela. No geral, a evolução da abertura da fissura na junta pilar/parede foi bem mais controlada com o emprego das telas, com destaque para os modelos com tratamento da superfície do pilar com argamassa.

Da mesma forma, analisando a Figura [11], no que diz respeito à eficiência do tratamento da face do pilar com argamassa, percebe-se significativa melhora de comportamento, em relação à evolução da abertura da fissura, para os modelos com este tratamento, quando comparados aos mesmos modelos sem o citado tratamento da face do pilar com argamassa. A referida avaliação do comportamento dos modelos, para qualquer dos dispositivos de ligação em avaliação (barra ou tela), sugere uma eficiência em torno de 40%. O provável incremento da aderência entre pilar e parede parece ter alterado o comportamento conjunto da ligação. Nas Figuras [12] e [13 ] estão ilustradas formas de ruptura típicas de modelos, respectivamente, sem o tratamento com argamassa aditivada e de modelos com o citado tratamento.


Em relação ao emprego de cantoneira metálica para a ligação da tela ao pilar de concreto, em detrimento à conexão com pinos e arruelas, pode-se afirmar, pelos resultados deste trabalho, que seu emprego não é justificável. No caso dos modelos com tratamento da face do pilar com argamassa e adesivo acrílico, os resultados de evolução de abertura de fissuras são muito próximos para os dois tipos de conexão avaliados e, no caso dos modelos sem o citado tratamento da superfície do pilar, os resultados demonstram melhor eficiência para o caso de conexão com pinos e arruelas.

Em relação ao relatado no parágrafo anterior, esperava-se que a utilização da cantoneira, para a conexão da tela ao pilar de concreto, aumentasse a resistência à abertura da fissura na interface pilar/ parede. A diminuição do comprimento ancorado do pino no pilar, em função da espessura da cantoneira, e a utilização de pinos lisos pode ser uma resposta a este comportamento inesperado.

Vale observar, que existe à disposição dos construtores nacionais, uma alternativa ao pino liso, empregado neste trabalho na fixação da cantoneira de aço ao pilar. Este outro pino, de custo bem mais elevado que o liso possui roscas e pode ser mais adequado à fixação da cantoneira no pilar.

5. Conclusões

Os resultados obtidos nesta avaliação, em laboratório, de métodos usuais de prevenção da fissura na interface pilar/parede, sugerem algumas conclusões prévias, listadas a seguir.

1 - O comprimento de 40 cm, quando comparado ao de 30 cm, de ancoragem do dispositivo de ligação (barra ou tela) parede/ pilar é mais eficiente na prevenção de eventual fissura na interface pilar/parede.

2 - O tratamento de argamassa, com adição de adesivo acrílico, na face do pilar em contato com a parede pode melhorar, consideravelmente, a eficiência dos métodos de prevenção da fissura pilar/parede avaliados.

3 - As barras de aço tipo "ferro cabelo" apresentam desempenho limitado, quando comparadas às telas metálicas eletro-soldadas galvanizadas, com tratamento da face de contato pilar/ parede com chapisco de argamassa e adesivo acrílico.

4 - O desempenho do dispositivo de ligação conhecido como "ferro cabelo" foi semelhante para ambos os diâmetros de barra de ligação avaliados, de 5.0 mm ou de 6.3 mm.

5 - A cantoneira metálica, em substituição aos pinos e arruelas, na fixação da tela ao pilar, não teve desempenho esperado, no que diz respeito a um maior controle da abertura da fissura na ligação pilar/parede.

6 - Dentre as técnicas de prevenção de fissura na ligação pilar/ parede avaliadas neste trabalho, a que apresentou melhor eficiência no controle da abertura da fissura foi o conjunto constituído por: tela metálica eletro-soldada galvanizada, com malha quadrada de 15 mm e diâmetro do fio de 1.65 mm, fixada por pinos e arruelas (sem cantoneira de aço) e com tratamento da face do pilar com chapisco de argamassa aditivada.

6. Referências bibliográficas

Received: 03 Aug 2012

Accepted: 21 May 2013

Available Online: 11 Oct 2013

  • [01] THOMAZ, E. Patologia. Manual técnico de alvenaria. Associação Brasileira de Construção Industrializada - ABCI. São Paulo, 1990, p. 97-117.
  • [02] SABBATINI, F.H. O processo construtivo de edifícios de alvenaria estrutural sílico-calcárea. São Paulo, 1984, Masters Dissertation - Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, p. 298.
  • [03] THOMAZ, E. Trincas em edifícios: causas, prevenção e recuperação. 6th edition. São Paulo: Editora Pini, EPUSP e Instituto de Pesquisas Tecnológicas, 2001. 193p.
  • [04] FRANCO, L.S.; BARROS, M.M.S.B.; SABBATINI, F.H. Desenvolvimento de um método construtivo de alvenaria de vedação de blocos de concreto celular autoclavados. EPUSP/SICAL. EPUSP, São Paulo. 1994, p. 132.
  • [05] JUNGINER, M.; SABATINI, F.H. Correção de fissuras na interface alvenaria/estrutura - um estudo de caso. São Paulo, 2004.
  • [06] MEDEIROS, H. Alerta! Deformações excessivas: edifícios expõem patologias de todo tipo na alvenaria. Por que as estruturas estão deformando como nunca? Thécne, São Paulo, 2005, v. 97, n. 13, p. 48.
  • [07] MEDEIROS, J.S.; FRANCO L.S.. O uso de telas metálicas eletrosoldadas como armadura e ancoragem de paredes de vedação [The use of electrowelded wire mesh as reinforcement and anchoring for infill walls]. EPUSP / MORLAN Agreement. São Paulo, 1999, p. 46.
  • [08] SOUZA, R. et al. Qualidade na aquisição de materiais e execução de obra [Quality in materials acquisition and work execution]. São Paulo: Editora Pini, 1996, p. 275.
  • [09] PFEFFERMAN, O.; HASELTINE, B.A. El desarrollo de armaduras para tendeles a lo longo de dos décadas [The development of bed joint reinforcement over two decades]. Eduardo Torrojas Institute. Construction Reports, v. 44, n. 421, September/October, 1992, p. 27-34.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      03 Ago 2012
    • Aceito
      21 Maio 2013
    IBRACON - Instituto Brasileiro do Concreto Instituto Brasileiro do Concreto (IBRACON), Av. Queiroz Filho, nº 1700 sala 407/408 Torre D, Villa Lobos Office Park, CEP 05319-000, São Paulo, SP - Brasil, Tel. (55 11) 3735-0202, Fax: (55 11) 3733-2190 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: arlene@ibracon.org.br