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Análise experimental da contribuição do concreto na resistência ao cisalhamento em vigas sem armadura transversal

Resumo

Há muitas teorias e fórmulas empíricas que estimam a resistência ao cisalhamento de estruturas de concreto armado sem armadura transversal. A segurança de qualquer estrutura de concreto armado, em relação a um possível colapso, é que ela não dependa da resistência a tração do concreto, assim, o colapso é de forma dúctil, com aviso prévio. A fissuração, proveniente de esforços de tração, pode causar a ruptura do concreto e deve ser evitada para que não ocorra nenhum tipo de falha na estrutura. Nesta pesquisa foram realizados experimentos para analisar os mecanismos complementares ao de treliça de resistência ao cisalhamento em vigas de pórticos de concreto armado sem armadura transversal. O programa experimental consistiu no ensaio de oito pórticos e os modelos foram submetidos à flexão simples. Foram consideradas duas classes de resistências à compressão do concreto para a concretagem dos modelos, 20 Mpa e 40 Mpa. Para resistir os esforços de flexão, as vigas foram dimensionadas no domínio 3 do estado limite último. Foram usadas duas taxas de armadura, 1,32% e 1,55% com diâmetros de 12,5 mm e 16,0 mm de armaduras longitudinais de tração. A partir dos resultados obtidos foram analisados os critérios já propostos por normas para definir a parcela da contribuição relativa aos mecanismos resistentes de cisalhamento do concreto sem o uso de armadura transversal e a influência das resistências do concreto e taxas de armadura longitudinal nos resultados numéricos obtidos experimentalmente.

Palavras-chave:
Concreto Armado; Cisalhamento; Fissuração; Mecanismos Complementares

Abstract

There are many theories and empirical formulas for estimating the shear strength of reinforced concrete structures without transverse reinforcement. The security factor of any reinforced concrete structure, against a possible collapse, is that it does not depend on the tensile strength of the concrete and the formation of any collapse is ductile, thus giving advance warning. The cracking from tensile stress can cause breakage of the concrete and should be avoided at all cost, with the intent that any such breakage does not incur any type of failure within the structure. In the present research study, experiments were performed in order to analyze the complementary mechanisms of the shear strength of lattice beams of reinforced concrete frames without transverse reinforcement. The experimental program entails the testing of eight frames that were subjected to a simple bending process. Two concrete resistance classes for analyzing compressive strength were considered on the construction of frames, 20 MPa and 40 MPa. To resist the bending stresses, the beams of the frames are designed in domain 3 of the ultimate limit states. Different rates and diameters of longitudinal reinforcement were used, 1.32% and 1.55% with 12.5 mm diameter and 16.0 mm in longitudinal tensile reinforcement. From the obtained results, an analysis was made of the criteria already proposed for defining the norms pertinent to the portion of relevant contribution for the shear resistance mechanisms of concrete without the use of transverse reinforcement and the influence of the concrete resistance and longitudinal reinforcement rates established in the experimental numerical results.

Keywords:
reinforced concrete; shear; cracking; additional mechanisms


1. Introdução

A ruptura das vigas de concreto armado depende das características do material constituinte: concreto e aço, das dimensões do elemento, do tipo de carregamento e do dimensionamento e detalhamento das armaduras, sendo requisito desejável que ela seja do tipo dúctil. Fusco [1][1] FUSCO, Péricles Brasiliense. Estruturas de concreto: Solicitações Tangenciais. São Paulo: Editora Pini Ltda., 2008. 328 p. traz que enquanto as tensões principais de tração existentes na alma da peça não provocarem a ruptura do concreto por tração, o cisalhamento é resistido pelo próprio concreto.

Para calcular a resistência ao cisalhamento de uma viga, muitos códigos, normas e modelos simplesmente recomendam a superposição da resistência ao cisalhamento devido ao concreto mais a capacidade resistente devido à armadura de cisalhamento.

A ABNT NBR 6118:2014 [2][2] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014. Projeto de estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, 2014. diz que a resistência de uma viga ao cisalhamento, força cortante resistente, é considerada de forma usual a partir de duas parcelas: Vc é a parcela resistida pelo concreto e mecanismos complementares ao da treliça, contribuição do concreto e Vsw a parcela resistida pela armadura transversal. O dimensionamento [3][3] Ritter W. Die bauweise hennebique. Schweizerische Bauzeitung 1899;33:41-61. é apresentado pela analogia da treliça de Ritter e Morsch no início do século XX e associa a viga em concreto armado a uma estrutura treliçada equivalente. Portanto, para vigas com estribos, modelos baseados em escoras e tirantes ou campos de tensão podem ser aplicados para o dimensionamento [4][4] ASCE-ACI Committee 445 on Shear and Torsion. Recent approaches to shear design of structural concrete. ASCE, J Struct Eng 1998;124(12):1375-417..

A analogia de treliça é, por um lado fácil de entender e altamente didático, mas por outro lado uma representação muito simples do comportamento estrutural real, Figura 1. Fica assim claro que os modelos mais refinados são necessários para aperfeiçoar e tornar mais econômico o projeto estrutural de vigas de concreto armado, por Wilder et al. [5][5] K. De Wilder, P. Lava, D. Debruyne, Y. Wang, G. De Roeck, L. Vandewalle . Experimental investigation on the shear capacity of prestressed concrete beams using digital image correlation. .

Figura 1
Analogia de treliça proposta por Ritter e Morsch [5][5] K. De Wilder, P. Lava, D. Debruyne, Y. Wang, G. De Roeck, L. Vandewalle . Experimental investigation on the shear capacity of prestressed concrete beams using digital image correlation.

Com relação à resistência ao cisalhamento de vigas sem armadura transversal, não existe um consenso nos códigos e normas disponíveis sobre os parâmetros e fenômenos que regem o problema do cisalhamento, sendo muitas vezes estes baseados em fórmulas empíricas [6,7,8][6] ACI Committee 318. 318-11: Building code requirements for structural concrete and commentary. ACI; 2011. p. 503. [3] CEN European Committee for Standardization. .

Para vigas retangulares, com a formação da fissura inclinada, a força de cisalhamento transferida pelos vários mecanismos é proporcional em 20% a 40% pela zona de compressão do concreto não fissurado, 33% a 50% pelo engrenamento de agregados e 15% a 25% pelo efeito de pino, KIM and PARK [10][10] KIM, Jin-keun; PARK, Yon-dong. Prediction of Shear Strength of Reinforced Concrete Beams without Web Reinforcement. ACI Materials Journal, Estados Unidos, v. 93, n. 3, p.213-222, maio 1996.. Yang [11][11] Yang Y. Shear behaviour of reinforced concrete members without shear reinforcement, a new look at an old problem. PhD thesis, Delft University of Technology, Delft, Netherlands; 2014. p. 344. traz a importância do intertravamento dos agregados na resistência ao esforço de cisalhamento, que ajuda na transferência dos esforços após o início da fissuração.

Dependendo do tipo da abertura e do deslocamento relativo da fissura, desenvolve tensões normais tangenciais que são limitadas pela rugosidade da superfície em contato. Reforça-se que a rugosidade da superfície fissurada é influenciada pelo tamanho do agregado e também pela forma real da fissura, por Ruiz et al. [8][8] M. Fernández Ruiz, A. Muttoni, J. Sagaseta . Shear strength of concrete members without transverse reinforcement: A mechanical approach to consistently account for size and strain effects. Engineering Structures, Volume 99 (2015) 360-372..

Além do engrenamento dos agregados outros mecanismos de transferência da força de cisalhamento foram citado por Ruiz et al. [8] [8] M. Fernández Ruiz, A. Muttoni, J. Sagaseta . Shear strength of concrete members without transverse reinforcement: A mechanical approach to consistently account for size and strain effects. Engineering Structures, Volume 99 (2015) 360-372.como a resistência a tração do concreto, efeito do arco, e o efeito pino. Bentz [12][12] Bentz EC, Vecchio FJ, Collins MP. Simplified modified compression field theory for calculating shear strength of reinforced concrete elements. ACI Struct J 2006;103(4):614-24. explica a resistência ao cisalhamento considerando o engrenamento dos agregados de acordo com Walraven [9][9] WALRAVEN, Joost Cornelis. AGGREGATE INTERLOCK: A theoretical and experimental analysis. 1980. 202 f. Tese Doutorado - Curso de Engenharia Civil, Delft University Of Technology, Holanda do Sul, 1980..

2. Métodos de Cálculo da Resistência a Força Cortante (Vc)

2.1 ABNT NBR 6118:2014

No caso de elementos com armadura transversal:

(Equação 1)

Vc =Vc0 Para flexão simples e na flexo tração com a linha neutra cortando a seção;

(Equação 2)

(Equação 3)

Onde:

Vsd Força cortante solicitante de cálculo, na seção;

Vrd3 Força cortante resistente de cálculo, relacionada à ruptura por tração diagonal;

Vc Parcela da força cortante absorvida por mecanismos complementares ao de treliça;

Vc0 Valor de referência para Vc, quando θ = 45º;

fctd Resistência de cálculo do concreto à tração;

bw Largura da seção transversal;

d Altura útil;

Asw Armadura Transversal;

s Espaçamento entre elementos da armadura transversal Asw medido segundo o eixo longitudinal do elemento estrutural.

(Equação 4)

A resistência à tração indireta fct,sup deve ser obtida em ensaios realizados segundo a ABNT NBR 7222 [13][13] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7222: 1994. Argamassa e concreto - Determinação da resistência à tração por compressão diametral de corpos de prova cilíndricos. Rio de Janeiro, 1994..

A resistência a tração direta fct pode ser considerada igual a

2.2 ACI 318-14

A equação 22.5.5.1 da norma ACI 318-14 [14] em sua seção 22.5.5 determina de forma simplificada, a parcela Vc correspondente à resistência ao cisalhamento fornecida pelo concreto e dada por:

(Equação 5)

Onde:

fc' Resistência à compressão do concreto em MPa;

bw Largura da seção transversal em (mm);

d Altura útil em (mm);

λ Fator de redução das propriedades mecânicas do tipo de concreto: concreto de peso normal λ = 1 (Tabela 19.2.4.2 do ACI 314-14);

Vc Resistência nominal de cisalhamento do concreto em N.

Um cálculo de Vc mais detalhado é feito de acordo com as expressões da tabela 22.5.5.1 do ACI 318-14 utilizando o menor dos três valores:

(Equação 6)

(Equação 7)

(Equação 8)

Onde:

ρw Taxa de armadura longitudinal;

Vu Esforço cortante na seção;

Mu Momento fletor na seção.

Para a maioria dos modelos o segundo membro das expressões (6) e (7) assume o valor de como permitida pela Equação 5.

2.3 BS 8110-97

O dimensionamento do concreto e reforços, de acordo com o BS8110-97 [15][15] BRITISH STANDARD INSTITUTION, BS 8110 Structural Use of Concrete, Part. 1. Code of Practice for Design and Construction, BSI publications , London, 1997,160 p. pode ser assumido como elementos do sistema de bielas e tirantes. A ruptura por cisalhamento de vigas sem armadura transversal considera o ângulo das bielas de compressão θ=30º. A tensão de cisalhamento v, em uma seção transversal qualquer é dada pela equação:

(Equação 9)

Onde:

bw = largura da seção em mm;

d = altura efetiva em mm.

Em nenhum caso ν deve exceder a:

fcu = Resistência característica à compressão do concreto.

2.4 EN 1992-1-1: 2004 EUROCODE 2

O modelo de cálculo adotado pelo EUROCODE 2 [17][17] EUROPEAN STANDARD EN 1992-1-1: Eurocode 2: Design of Concrete Structures - Part 1: General rules and rules for buildings, London, 1992. baseia-se no modelo de treliça com a recomendação do ângulo das bielas de compressão θ no intervalo 45º≤ θ ≤ 68,20º.

Na seção 6.2.2, equação 6.4 do Eurocode permite calcular a resistência ao cisalhamento de vigas de concreto sem armadura transversal em regiões não fissurada por flexão e dada por:

(Equação 10)

Onde:

Vc em (N)

fctd = Resistência característica do concreto à tração MPa;

al ≤ 1,0 Para barras protendidas e al = 1,0 para outros tipos de pré esforços;

σcp = Tensão de compressão no concreto devido a carga axial:

em Mpa Ned > 0 na compressão;

Ac Área da seção transversal;

bw, d Largura e altura útil da seção transversal em (mm);

I Momento de inércia da seção transversal;

S Momento estático da área acima do eixo do centro de gravidade da seção.

2.5 CSA A23 3-04

O dimensionamento de peças de concreto armado baseia-se na teoria do campo da compressão modificada com o ângulo das bielas de compressão θ = 35º. A norma Canadense CSA A23. 3-04 [16] na seção 11.3.4 determina o valor da resistência do concreto ao cisalhamento de acordo com a equação:

(Equação 11)

Onde:

Fator de resistência do concreto;

β = Fator responsável pela resistência do concreto fissurado, β = 0,21

λ = 1,0 Densidade de concreto normal;

bw = Largura da viga em (mm);

dv = Altura útil de cisalhamento em (mm).

A resistência à compressão do concreto deve ser menor ou igual a 64 MPa ou

f'c em MPa , bw, dv em mm, Vc em (N)

O cálculo de β para seção transversal sem armadura de cisalhamento pelo método simplificado é dado por:

a) Se a seção não contém armadura transversal e o tamanho máximo nominal do agregado não é inferior a 20 mm β deve ser tomado como:

(Equação 12)

b) Se a seção não contém armadura transversal, o valor de β pode ser determinado para todos os tamanhos de agregados substituindo o parâmetro dv da equação pelo parâmetro Sze , que permite o tamanho do agregado e valor equivalente considerado a Sz e depende das características da armadura longitudinal, onde:

(Equação 13)

ag Diâmetro máximo nominal do agregado;

Sz Deve ser tomado como dv ou a distância máxima entre as linhas de distribuição da armadura longitudinal, o que for menor. Cada linha de camada da armadura longitudinal deve ter uma área pelo menos de conforme ilustra a Figura 2.

Figura 2
Detalhe da seção transversal para cálculo de S z , adaptado de [15][15] BRITISH STANDARD INSTITUTION, BS 8110 Structural Use of Concrete, Part. 1. Code of Practice for Design and Construction, BSI publications , London, 1997,160 p.

2.6 FIB MODEL CODE 2010

A resistência ao cisalhamento para peças de concreto sem armadura de cisalhamento, de acordo com o FIB Model Code 2010 [18][18] Fédération Internationale du Béton (fib), Model Code 2010 - final draft, vols. 1 and 2, fédération internationale du béton, Bulletins 65 and 66 , Lausanne, Switzerland; 2012. p. 350 and p. 370. pode ser calculada com a equação:

(Equação 14)

Onde:

z = Altura útil em (mm);

bw = Espessura da viga em (mm);

γc = Coeficiente de segurança do concreto, γc = 1,50,

VRd,c em N

fck em MPa e sendo:

(Equação 15)

3. Materiais e programa experimental

3.1 Características do pórtico e propriedades dos materiais

Foram ensaiadas quatro séries de pórticos de concreto armado com altura de 1,10 m e 2,25 m de comprimento com cargas equidistantes dos apoios e crescentes, por Samora [19]. Para cada série foram utilizados dois pórticos com as mesmas características geométricas e variáveis, assim foram ensaiados oito pórticos.

O esquema de carregamento dos pórticos e os diagramas de esforços correspondentes ao corpo livre são apresentados na Figura 3.

Figura 3:
Diagrama de carregamento e esforços

O planejamento experimental foi montado com os fatores de resistência característica à compressão do concreto e a taxa de armadura longitudinal da viga, Tabela 1. O interesse na variação ou níveis dos fatores de entrada é a resistência do concreto ao cisalhamento na ruptura. Os modelos ensaiados tiveram uma taxa geométrica de armadura longitudinal de tração de 1,32% para os pórticos do tipo A e de 1,55% para os pórticos tipo B.

Tabela 1
Identificação dos modelos

As vigas dos pórticos possuíam seção retangular de 15 cm de largura, 30 cm de altura por 2,25 m de comprimento. Os pilares dos pórticos possuíam seção transversal retangular de 15 cm de largura e 25 cm de comprimento e altura de 1,10 m do apoio à face superior da viga. As dimensões e detalhamento dos pórticos estão indicados nas Figuras 4 e Figura 5.

Figura 4:
Dimensões dos pórticos - Cotas em cm

Figura 5:
Detalhamento dos pórticos, tipos A e B - cotas em cm

O concreto utilizado na pesquisa foi do tipo usinado, fornecido por empresa especializada. Para os pares P1, P2 e P3, P4 foram utilizados concreto de classes C20 e C40 respectivamente e refere-se à idade aos 28 dias.

Os resultados dos ensaios de resistência à compressão do concreto em diversas idades e os valores do módulo de elasticidade e resistência a tração são apresentados na Tabela 2 e Tabela 3.

Tabela 2
Resultados dos ensaios de resistência à compressão do concreto dos pórticos

Tabela 3
Resultados dos ensaios de módulo de elasticidade e resistência à tração

Na Tabela 4 apresentam-se as datas de realizações dos ensaios e a idade de cada peça em relação a data de concretagem.

Tabela 4
Idade dos corpos de prova

A ABNT 6118:2014 permite verificar a resistência de cálculo do concreto aos t(dias) em relação a idade aos 28 dias dada pela expressão:

No caso são adotados o coeficiente de ponderação da resistência do concreto γc = 1. O valor de β 1 pode ser obtido pela expressão:

Com,

s = 0,38 para concreto de cimento CPIII e CPIV

s = 0,25 para concreto de cimento CPI e CPII

s = 0,20 para concreto de cimento CPV-ARI

t = idade efetiva do concreto, em dias.

Na Tabela 5 apresentam-se a resistência à compressão provável estimada para o concreto dos pórticos na data dos ensaios.

Tabela 5
Resistência à compressão provável estimada para o concreto

Pode-se afirmar que não houve influência em relação a idade do concreto dos pórticos na data dos ensaios a variação ocorrida da resistência à compressão em relação ao valor obtido através dos ensaios dos corpos de prova cilíndrico de 10 cm x 20 cm aos 56 dias de idade do concreto dos pórticos e adotado para os cálculos e considerações da pesquisa.

Na Tabela 6 apresentam-se os resultados médios obtidos para as propriedades mecânicas das barras de aço.

Tabela 6
Resultados dos ensaios de tração das barras de aço

3.2 Instrumentação

As deformações específicas nas armaduras e no concreto foram medidas por extensômetros elétricos marca Excel Sensores. Estes extensômetros elétricos foram colados nas armaduras longitudinais e no concreto por meio de adesivo à base de cianocrilato, isolados e impermeabilizados com fita isolante plástica conforme ilustrado na Figura 6. Os extensômetros colados nas armaduras longitudinais foram designados pela letra L, os imerso no concreto, letra I, e os colados na face comprimida do concreto, letra C.

Figura 6
Posição geral dos extensômetros no pórtico

3.3 Equipamentos utilizados nos ensaios

Para aplicação de cargas foi utilizado o pórtico metálico montado sobre a laje de reação do laboratório de Estruturas da UFU. O carregamento foi aplicado pelo atuador hidráulico alimentado por uma bomba manual e transferido a dois pontos simétricos da viga afastados de 70 cm em cada uma das extremidades, por meio de uma viga constituída por perfil metálico "I" 250 mm × 44,80 kg/m. Para a medição do carregamento, empregou-se uma célula de carga constituída por um cilindro de aço instrumentado com extensômetros elétricos de resistência calibrado até 500 kN, conforme ilustra a Figura 7.

Figura 7
Vista geral e detalhe do ponto de aplicação da carga

A carga foi aplicada com incrementos de 15kN. Em cada estágio de carregamento, foram efetuadas observações e registrado por vídeo o panorama de fissurações ocorridas no pórtico. À medida que se aumentava o carregamento foi possível observar a evolução das fissuras que eram marcadas com giz de cera na superfície do concreto, Figura 8.

Figura 8
Panorama de fissuração dos pórticos e cargas de ruptura

Com o uso de extensômetros elétricos ligados ao equipamento aquisitor de dados, foram medidas as deformações das armaduras e do concreto.

4. Resultados e discussões

Foram calculados os valores da parcela de força cortante resistida por mecanismos complementares definidos pelas normas ABNT NBR 6118:2014 [2][2] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014. Projeto de estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, 2014., ACI 318-14 [14][14] AMERICAN CONCRETE INSTITUTE. Building Code Requirements for Structural Concrete (ACI 318-14). Michigan, USA, 2014., BS 8110-97 [15][15] BRITISH STANDARD INSTITUTION, BS 8110 Structural Use of Concrete, Part. 1. Code of Practice for Design and Construction, BSI publications , London, 1997,160 p., EN 1992-1-1-2004 [17][17] EUROPEAN STANDARD EN 1992-1-1: Eurocode 2: Design of Concrete Structures - Part 1: General rules and rules for buildings, London, 1992. , CSA A23. 3-04 [16][16] CANADIAN STANDARDS ASSOCIATION. A23.3-04: Design of concrete structures. xviii ed. Ontário: Canadian Standards Association, 2004, 232 p. e FIB MODEL CODE 2004 [18][18] Fédération Internationale du Béton (fib), Model Code 2010 - final draft, vols. 1 and 2, fédération internationale du béton, Bulletins 65 and 66 , Lausanne, Switzerland; 2012. p. 350 and p. 370., Tabela 7.

Tabela 7
Valores das resistências de acordo com as normas

Com a armadura longitudinal proposta, o valor teórico do momento último para escoamento da armadura longitudinal foi calculado conforme as hipóteses da ABNT NBR 6118:2014 [2][2] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014. Projeto de estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, 2014. admitindo-se a distribuição retangular de tensões de compressão no concreto. A este momento fletor corresponde uma força cortante última obtida com o uso do programa Ftool [20][20] Ftool - Two-dimensional Frame Analysis Tool: versão 3.0. Luiz Fernando Martha, 2012. Disponível em http://www.tecgraf.puc-rio.br/ftool/.
http://www.tecgraf.puc-rio.br/ftool/...
. A Tabela 8 apresenta os resultados comparativos do valor teórico com o valor experimental.

Tabela 8
Comparação dos valores calculados e experimentais

A comparação , dos resultados experimentais em relação aos valores da força cortante última obtida dos valores calculados, nos mostra que os pórticos com maior taxa de armadura ρl = 1,55% (P2 e P4) apresentaram relação menor ao comparar com a relação dos pórticos com menor taxa de armadura ρl = 1,32% (P1 e P3).

Na Tabela 9 apresenta-se o resultado da variação da resistência ao cisalhamento dos mecanismos complementares mantidas constantes porcentagem de armadura longitudinal em função da resistência à compressão do concreto.

Tabela 9
Variação da resistência dos mecanismos complementares em função da resistência à compressão do concreto

Observa-se que para as vigas dos pórticos sem armadura transversal analisadas, com a mesma taxa de armadura longitudinal, houve um aumento na resistência ao cisalhamento dos mecanismos complementares ao de treliça, com o acréscimo da resistência à compressão do concreto.

Na Figura 9 e Figura 10, apresenta a comparação da carga resistente das vigas com a mesma resistência à compressão do concreto, variando a taxa de armadura. Constata-se que as vigas que possuem menor taxa de armadura para uma mesma resistência a compressão do concreto, suportaram maiores cargas.

Figura 9
Variação da taxa de armadura longitudinal/ resistência a compressão do concreto 21,6 MPa

Figura 10
Variação da taxa de armadura longitudinal/ resistência a compressão do concreto 40,5 MPa

Ao analisar as deformações das vigas na posição de maior valor para o momento fletor, extensômetro L0, Figura 11, observa-se que as armaduras não chegaram ao escoamento máximo admitido por norma 10 mm/m. O maior valor obtido foi de 0,0013 mm/m para a viga P1-A-a, confirmando a ruptura das vigas por cisalhamento e não a flexão simples.

Figura 11
Deformação na armadura longitudinal (L0) para os pilares da série P1-A e P2-B

A Tabela 8 mostra os resultados da comparação dos valores experimentais da parcela resistente do concreto ao cisalhamento sem armadura transversal (Vu,exp ) em relação aos valores de (Vc ) calculados pelas normas [2, 14, 15, 16, 17,18][2] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014. Projeto de estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, 2014..

Pode-se verificar que há uma grande variação dos valores calculados pelas normas comparados com os valores experimentais. A ABNT NBR 6118:2014 e o ACI 318-14 são as que mais se convergem os valores calculados com diferença aproximada de 10%, Tabela 10.

Tabela 10
Comparação entre valores experimentais e calculados das normas

5. Conclusões

Este trabalho objetivou-se apresentar as análises dos resultados experimentais sobre a parcela de força cortante Vc , em vigas dos pórticos engastados, com a variação da resistência característica do concreto e taxa de armadura longitudinal. Conclui-se que:

  1. 1) Com a menor taxa de armadura longitudinal, mantidas constantes as resistências características do concreto, houve um aumento da resistência dos mecanismos complementares ao de treliça frente ao cisalhamento. Com base nas tensões de tração e compressão aplicadas ao concreto por uma barra de aço sob ação de uma força a ser transferida pelo efeito de pino, a máxima força transferida pelo efeito de pino foi afetado negativamente com o aumento do diâmetro das barras;

  2. 2) Com o aumento da resistência característica do concreto à compressão, mantidas constantes as taxas de armadura longitudinal da viga, os resultados experimentais mostraram um aumento da resistência dos mecanismos complementares ao de treliça frente ao cisalhamento, evidenciando assim maior mobilização pelo engrenamento dos agregados.

  3. 3) Em relação aos valores obtidos experimentalmente comparados aos valores de cálculo das normas, os resultados que mais se aproximaram dos experimentais são do EUROCODE: 2004;

  4. 4) Os valores fixados da norma ABNT NBR 6118: 2014 são menores em aproximadamente 21,6% com relação aos valores obtidos experimentalmente das resistências do concreto ao cisalhamento. A fórmula de cálculo da parcela de força cortante resistida por mecanismos complementares ao modelo de treliça Vc = 0,6 ⋅ fctd bw d na flexão simples o fator multiplicador dos termos da equação poderia ser igual a 0,7296 a considerar os resultados dessa pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2017

Histórico

  • Recebido
    19 Nov 2015
  • Aceito
    16 Maio 2016
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