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Percepções e experiências de participação cidadã de crianças e adolescentes no Rio de Janeiro

Perceptions and experiences of citizen participation of children and adolescents in Rio de Janeiro

Resumos

Este artigo discute os resultados de uma pesquisa desenvolvida com crianças e adolescentes sobre suas percepções e experiências de participação, cidadania, direitos e responsabilidades¹. O estudo foi conduzido em escolas públicas e privadas na cidade do Rio de Janeiro, e realizado com crianças e adolescentes em situação de rua e do Movimento Sem-Terra (MST). A pesquisa abordou questões relativas às dimensões sociais, econômicas e políticas, assim como, as percepções de gênero em relação aos direitos e à participação. O estudo demonstrou que as crianças e os adolescentes apresentam uma noção ampla sobre participação e os demais conceitos. E revelou também que estão conscientes de que os seus direitos são, com freqüência, ignorados e violados. Esta pesquisa é parte de um estudo internacional realizado paralelamente em seis países e que abarcou a mesma temática e metodologia de trabalho.

direitos da criança; cidadania; participação


This article discusses the results of a study of children's and adolescent's perceptions and experiences with participation, citizenship, rights and responsibilities. The study was conducted in public and private schools in the city of Rio de Janeiro and with children and adolescents living on the streets and from the Landless Farmers Movement (MST). The study addressed questions related to social, economic and political issues as well as perception of gender in relation to rights and participation. The study demonstrated that children and adolescents have a broad notion of their participation and of other concepts. It also reveals that they are aware that their rights are frequently ignored and violated. This study is part of an international study conducted in parallel in six countries with the same themes and methodology.

children's rights; citizenship; participation


PESQUISA APLICADA

Percepções e experiências de participação cidadã de crianças e adolescentes no Rio de Janeiro

Perceptions and experiences of citizen participation of children and adolescents in Rio de Janeiro

Irene RizziniI; Luciléia PereiraII; Nisha ThapliyalIII

IPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)

Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI)

IICentro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI)

IIIUniversidade de Maryland, EUA

Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância(CIESPI)

RESUMO

Este artigo discute os resultados de uma pesquisa desenvolvida com crianças e adolescentes sobre suas percepções e experiências de participação, cidadania, direitos e responsabilidades1 1 O Grupo Focal organizado pela Rede Internacional de Pesquisa Childwatch, foi coordenado pelos seguintes pesquisadores: Anne Smith, diretora do Children's Issues Centre, Universidade de Otago, Dunedin, Nova Zelândia e Natalie Kaufman, professora associada do Instituto sobre Family and Neighborhood Life, Universidade Clemson, Carolina do Norte, Estados Unidos. As demais instituições participantes da rede Childwatch durante o período 2004-2005 foram: Institute on Child and Youth Research da Universidade Cidade do Cabo, Cidade do Cabo, África do Sul; Child Research Unit, Center for Development in Primary Health Care, Universidade Al Quds University, Palestina; Norwegian Center for Child Research, Trondheim, Noruega e o Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI) em convênio com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil. Posteriormente ingressaram no projeto, pesquisadores australianos. A equipe de pesquisa no Brasil incluiu os seguintes nomes: Irene Rizzini, presidente da Childwatch e diretora do CIESPI; Luciléia Pereira e Marcelo Princeswal, pesquisadores do CIESPI; Carla Daniel Sartor, consultora,; Nathercia Lacerda, Isabela Massa, Alexandra Pena, Nisha Thapliyal e Tamo Chattopadhyay, colaboradores; Marina Rodriguez de Jesus, assistente de pesquisa e Christiano Botafogo, tradutor. As autoras agradecem a Mariana Menezes Neumann, pela tradução e seu apoio da construção do artigo e a Alessandra Caldeira, pela revisão do texto. . O estudo foi conduzido em escolas públicas e privadas na cidade do Rio de Janeiro, e realizado com crianças e adolescentes em situação de rua e do Movimento Sem-Terra (MST). A pesquisa abordou questões relativas às dimensões sociais, econômicas e políticas, assim como, as percepções de gênero em relação aos direitos e à participação. O estudo demonstrou que as crianças e os adolescentes apresentam uma noção ampla sobre participação e os demais conceitos. E revelou também que estão conscientes de que os seus direitos são, com freqüência, ignorados e violados. Esta pesquisa é parte de um estudo internacional realizado paralelamente em seis países e que abarcou a mesma temática e metodologia de trabalho.

Palavras-chave: direitos da criança, cidadania, participação.

ABSTRACT

This article discusses the results of a study of children's and adolescent's perceptions and experiences with participation, citizenship, rights and responsibilities. The study was conducted in public and private schools in the city of Rio de Janeiro and with children and adolescents living on the streets and from the Landless Farmers Movement (MST). The study addressed questions related to social, economic and political issues as well as perception of gender in relation to rights and participation. The study demonstrated that children and adolescents have a broad notion of their participation and of other concepts. It also reveals that they are aware that their rights are frequently ignored and violated. This study is part of an international study conducted in parallel in six countries with the same themes and methodology.

Key words: children's rights, citizenship, participation.

Introdução

A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças (UNCRC), realizada em 1989, articulou a proposta de participação infantil por meio dos seguintes direitos: direito à livre expressão e respeito às suas opiniões (artigos 12 e 13); direito à associação (artigo 15); direito à liberdade de pensamento e à escolha da religião (artigo 14). Ou seja, a definição dos artigos da convenção considerou quatro aspectos da vida das crianças: o direito à vida, ao desenvolvimento, à proteção e à participação2 2 O direito à sobrevivência inclui: o direito à vida e acesso aos direitos básicos (condições adequadas de vida; alimentação e saúde). Direito ao desenvolvimento: o direito da criança em atingir o seu potencial pleno (educação, lazer, brincadeira, atividades culturais, acesso à informação e liberdade de pensamento e religião). Direito à participação, ou seja, participação ativa na sociedade (liberdade de expressão de idéias e de associação); direito à proteção: direitos essenciais à segurança contra todos os tipos de abuso, violência, negligência e exploração (crianças refugiadas, envolvidas em conflitos armados, trabalho infantil, exploração sexual, tortura e uso de drogas. Disponível em: < http://www.hrea.org/learn/guides/children.html>. .

Estas idéias representaram uma mudança significativa da noção da criança como alvo de proteção para a criança como 'sujeito de direitos', capaz de expressar suas opiniões e de ter participação ativa na sociedade. Neste sentido, a Convenção representou um avanço quando legitima um " acordo global estipulando que a criança e o jovem são cidadãos cujos direitos exigem agendas políticas e sociais e comprometimento moral" (MATHEWS, 2005, p. 1).

Grande parte dos governos assumiu a responsabilidade de oferecer as condições necessárias para que a criança e o jovem possam exercitar o seu direito à participação. Diversos programas, desenvolvidos pelos estados e em especial pelo terceiro setor, possibilitam esta participação por meio de programas de combate à pobreza e à discriminação, procurando envolver a criança e o jovem nestes processos. Paralelamente, há uma tendência global de fortalecimento e consolidação da democracia e da educação de cunho participativo e cidadão.

Enquanto a proposta de participação infantil vem apresentando aceitação universal, estes programas e políticas não têm prestado atenção suficiente para o fato de que cada cultura constrói uma definição de infância contextualizada ao seu momento histórico, como vem apontando um grande número de estudiosos (ENNEW, 1986; REDDY, 1997; RIZZINI, 1997, 2000; SZANTON-BLANC, 1994; HUGGINS; MESQUITA, 2000; LEITEN, 2001; MIKULAK, 2002; PANTER-BRICK, 2003; WEIS; FINE, 2000).

Para que a participação possa se dar de forma efetiva, esta deve respeitar o ambiente cultural em que as propostas e agendas políticas estão sendo pensadas e implementadas e também como as crianças, em um contexto sociocultural específico, compreendem e exercitam o seu direito à participação.

Uma breve revisão da literatura3 3 Para a realização desta revisão da literatura, baseamos-nos em textos de Torres (2006), Butler (2006), Limber e Kaufman (2002), Taylor et al. (2001), Universidade de Illinois, do CIESPI e da Rede Internacional de Pesquisa Childwatch. Na literatura internacional, encontramos, com freqüência, o uso do termo 'civic participation' para se referir a uma educação voltada para a cidadania e a participação. Preferimos o uso do termo 'participação cidadã', como apontamos no texto.

Há um crescente interesse na pesquisa e no desenvolvimento de programas para a participação infantil e juvenil nas esferas pública e política (FLEKKOY; KAUFMAN, 1997). O relatório The State of the World's Children (UNICEF, 2003), elegeu o tema da participação juvenil, sublinhando os seus benefícios e apontou alguns exemplos de sucesso da participação de jovens em projetos de educação e desenvolvimento, como: a criação de parlamentos de jovens, a participação juvenil nas Nações Unidas e na mídia. A percepção sobre a participação apresentada neste relatório demonstra como esta se dá de forma gradual, tendendo a aumentar conforme a criança se torna mais velha. E mais, reconhece que historicamente a criança sempre participou da vida familiar, escolar e comunitária, tanto por meio do seu trabalho, quanto por outros meios. Um exemplo é sua participação em situações de guerra.

Definida como um fenômeno multifacetado, a participação pode incluir uma gama variada de atividades que diferem em sua forma e estilo, de acordo com a idade da criança, ou seja: busca por informações, expressar o desejo pelo conhecimento ainda quando jovem, construir sua visão de mundo, expressar idéias e ser informada e consultada nos processos decisórios, nas propostas e projetos e na tomada de decisões; respeito aos demais e ser tratada com dignidade... Colocar a participação em prática requer que os adultos levem em consideração as opiniões e visões de mundo da criança, em suas distintas formas de expressão e comunicação, já que estas terão um efeito direto em suas vidas (UNICEF, 2003, p. 4-5).

Na prática, as oportunidades e os mecanismos para a participação infantil e juvenil continuam limitadas. Por exemplo, aponta-se que as escolas têm destinado um tempo maior para discutir questões como democracia, ao invés de identificar formas de atuação e implementação dessas idéias. Os currículos internacionais de educação cívica (civic education) tendem a enfatizar valores e virtudes e/ou a moral e o caráter, evitando a discussão aprofundada sobre instituições e modelos de democracia (DAVIES, L. 2002, DAVIES, I.; GORARD; MCGUINN, 2005). E, ainda, demonstram a tendência de encorajar os jovens a se conformarem com as autoridades e estruturas políticas existentes (MCCOWAN, 2006). As formas existentes de participação democrática de crianças, em especial, os centros acadêmicos ou associações/conselhos estudantis, destinam-se a tratar de questões restritas ao ambiente escolar, destinando pouco poder de atuação e responsabilidade para as escolas (DAVIES 1998, 2002, DAVIES; KIRKPATRICK, 2000, MCLAREN, 1989).

O estudo conduzido pela Associação Internacional para Avaliação do Desempenho Educacional (International Association for the Evaluation of Educational Achievement) sugere que adolescentes de 14 anos de idade, na maioria dos países, apresentam noções introdutórias sobre instituições democráticas e valores, mas freqüentemente, estas noções são superficiais. As escolas podem representar um papel importante em ampliar o conhecimento sobre esta temática (TORNEY-PURTA et al., 2006). Outras pesquisas realizadas sobre a percepção dos jovens acerca dos seus direitos, indica que a participação cotidiana é importante (MORROW, 1999; MELTON; LIMBER,1993; TAYLOR, 2005). Estes apreciam ser tratados com dignidade, respeito e sentem que devem se pronunciar em questões que afetam as suas vidas. De acordo com Morrow (1999), um aspecto relevante é que os jovens demonstram ter maior interesse em colaborar nos processos decisórios do que deliberar sobre o que deve ou precisa ser feito. Taylor et al. (2001) identificaram em estudo comparativo realizado em escolas do ensino médio, com alunos, professores e funcionários, que os jovens ressaltaram ser mais importante dar ênfase aos direitos participativos. Já os professores, no mesmo estudo, identificaram que os direitos de participação e de proteção são igualmente relevantes para os jovens.

É comum argumentar-se que as noções que permeiam a definição de direito infantil tendem a ser uma reprodução do discurso dos adultos sobre o tema, e representam uma concepção eurocêntrica da infância e do direito, já que mudanças na jurisprudência ocidental, baseada no discurso sobre a infância, desempenharam um papel fundamental na elaboração da Convenção4 4 O discurso sobre direito infantil emergiu a partir de um contexto histórico e sociocultural que inclui a ruptura do modelo de família extensa e a crescente nuclearização da família, e posteriormente, a própria ruptura da estrutura familiar (Raman 2000). Goonesekere (1997, 92) salienta que: " O conceito acerca dos direitos à participação envolve um sistema de valores sobre a autonomia da criança que precisa ser trabalhada na percepção da própria convenção sobre a importante relação entre a criança, os pais e o Estado." A promoção dos direitos da criança durante a década de 90, é parte integrante de um discurso internacional mais amplo sobre democracia e construção da cidadania. A pressão exercida pelos países desenvolvidos visava acelerar o processo de implementação dos modelos democráticos nos países em desenvolvimento, por meio da erradicação da corrupção e consolidação do Estado de direito. Dentre outras motivações, pode-se destacar o crescente declínio de participação política e aumento de novas demandas socioeconômicas de países industrializados, que exigiam maiores níveis de consolidação das instituições democráticas (MCGINN, 1996). . A discussão sobre se a criança deve ou não trabalhar tem sido particularmente eficaz na desconstrução de uma visão descontextualizada de noções sobre participação infantil, particularmente em relação ao direito à educação (KABEER, NAMBISSAN et al 2003)5 5 A noção sobre trabalho infantil difere da prática de trabalho infantil. Crianças pobres sempre estiveram mais vulneráveis à exploração da sua mão-de-obra e as funções exercidas, nas esferas pública e privada, não conseguiram proteger a criança de diversas formas de exploração e abuso. De uma perspectiva crítica alternativa, as crianças provenientes de estratos marginalizados da sociedade, trabalham e vivem fora do ambiente doméstico familiar, em espaços públicos insalubres e inseguros, para auxiliar na renda familiar ao invés de irem para a escola. Esta condição se dá pela reprodução de demandas sócio-econômicas não respondidas como desemprego, inflação, fome, desigualdade de renda e endividamento, assim como, um sistema educacional inacessível (Huggins 2000). Crianças pobres precisam participar e competir com adultos na nova divisão do trabalho internacional, representando uma fonte ilimitada e desprotegida de mão-de-obra barata para os mercados capitalistas. . Militantes dedicados à defesa do direito da criança ao trabalho e à educação, argumentam que historicamente as crianças foram socializadas por meio de diversas funções que exigiam responsabilidades, e que em alguns casos, incluíam retorno financeiro. Diferentes formas de trabalho nas esferas pública e privada permitiram que as crianças participassem da vida familiar e comunitária (REDDY 1997; MICKELSON 2000).

Embora a conceituação legal sobre infância difira, a tendência é de que quanto mais as crianças sejam tratadas como cidadãs, mais elas possam participar ativamente da sociedade. Pesquisas demonstram que a compreensão das crianças sobre o seu status, os seus direitos e as suas responsabilidades podem vir a facilitar a sua inserção na sociedade, constituindo também um importante componente para o fortalecimento da democracia (FLEKKOY; KAUFMAN 1997; KAUFMAN; RIZZINI, 2002; LIMBER; KAUFMAN, 2002). Estimular o pensamento crítico das crianças, associando direitos e responsabilidades, pode encorajar o seu comprometimento e apoio aos valores democráticos, incluindo o respeito às leis (MELTON; LIMBER, 1993). Covell e Howe (2000) demonstram que crianças entre 11 e 12 anos de idade, cuja formação escolar tenha incluído a noção de direitos, apresentam maior tolerância em relação às diferenças étnicas, ao homossexualismo e em relação a pessoas com deficiência, sugerindo que crianças que estão familiarizadas com os seus direitos, conseqüentemente tendem a respeitar mais os direitos de terceiros.

Reflexões sobre crianças, adolescentes e participação cidadã

O conceito de participação cidadã neste texto resulta de reflexões e debates relacionados à temática da participação. Conceituamos a participação cidadã como

[...] um direito e um componente essencial no exercício da cidadania ativa. É o processo de conscientização que resulta em ações coletivas de promoção da cidadania. Refere-se a formas legítimas de participação da população na esfera pública e política (RIZZINI et al., 2005, p.8).

No desenvolvimento do processo de construção do conceito de participação cidadã, foi considerada a pluralidade de situações sociais à qual estão expostos os cidadãos. Nesse sentido, entendemos que a participação cidadã não esteja ligada somente ao engajamento aos partidos políticos, sindicatos e movimentos sociais. Ela passa pela consciência da realidade na qual o sujeito está inserido e pela sua manifestação como cidadão nesta realidade. Ter consciência é estar em conexão com os processos que determinam a realidade social, e, também, informado sobre os direitos e deveres inerentes à condição de cidadão.

Ao avaliar a participação cidadã como mecanismo de alcance à cidadania plena no Brasil, há que se considerar a situação de vulnerabilidade à qual está exposta a maioria da população brasileira, como resultado de um processo histórico-social. No Brasil, as decisões acerca do bem-estar social quase sempre estiveram nas mãos dos governos que, até recentemente na nossa história, não permitiam a plena participação democrática de seus cidadãos. Não queremos dizer com isso que não havia participação. Ela sempre existiu e foi expressa, talvez de forma mais visível, através dos grupos de elite (intelectuais e artistas), dos sindicatos e da imprensa.

Para além dos espaços ocupados por estes grupos, a população brasileira, mesmo reprimida e controlada sempre esteve presente no debate público. A repressão e o controle não impediram a população de pensar e se expressar nos espaços livres da censura, fosse na esfera pública ou privada. Além desses espaços selecionados, também tomou as ruas para reivindicar seus direitos. Constituem um exemplo desta forma de expressão os movimentos sociais.

Os movimentos sociais e outras formas de expressão da participação popular, que objetivavam mudanças no cenário político social do Brasil foram, fundamentais para as conquistas no campo dos direitos, e acontecem até hoje. Mas, se por um lado, eles representam a força da participação popular, por outro, podem representar um meio de cooptação da população para outros fins e interesses. Neste sentido, Souza (1991) afirma que nem todos os movimentos populares de engajamento participativo têm como fim o bem-estar coletivo. A autora alerta para as várias formas de cooptação que, disfarçadas de movimentos sociais, podem esconder interesses de uma determinada classe, mas que, pela população, são, muitas vezes, absorvidas como uma demanda social.

Para esta autora (1991, p. 102-103), os movimentos sociais devem estar ligados a uma problemática coletiva que tenha como objetivo o enfrentamento na busca de soluções que venham em " defesa da satisfação das necessidades básicas e da qualidade historicamente conquistadas" pela população. Por isso, estes importantes meios de participação popular não devem ser confundidos com " movimentações em busca de condições de consumo, cujos ânimos se esgotam à medida que o intento é conseguido."

Entendemos que as críticas aos movimentos sociais confirmam a idéia de que a participação cidadã é um processo. A cultura participativa, ainda muito incipiente no país, muitas vezes é utilizada como forma de manipulação para o controle. Os espaços abertos à população civil para a participação na gestão pública são, muitas vezes, direcionados a pessoas que defendem interesses próprios ou de um grupo. Lembramos que esta sempre foi a postura de governos autocráticos e repressivos onde se impunha a vontade de uma minoria em nome do coletivo.

Como resultado dos movimentos sociais no Brasil e como parte de um processo de lutas para conquista do direito de crianças e adolescentes à participação, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA-1990) representa um marco histórico. O Estatuto é tido como um importante documento por uma série de razões, em especial, por ter transformado um discurso político e popular em uma normativa, legitimando parâmetros de bem-estar da população infantil e juvenil, equivalentes à normativa internacional. Contribuiu também para mudar o discurso punitivo e 'assistencialista' ao incluir noções de direitos e respeito, instituindo a idéia de criança e adolescente como sujeitos de direito. O Estatuto determina também que todos os membros da sociedade – família, comunidade6 6 Artigo 227 da Constituição brasileira e artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente sobre direito à convivência familiar e comunitária. e autoridades públicas – têm o dever de respeitar o direito das crianças à convivência familiar e comunitária, entre outros. Isso possibilitou, acima de tudo, uma revisão dos mecanismos de proteção ao bem-estar infantil, implicando em uma maior participação das famílias e de suas comunidades de origem (RIZZINI et al., 2007).

O Estatuto, fortalecido por ações de organizações não-governamentais, em paridade com os governos, possibilitou a criação de estruturas em nível local para expandir a participação dos membros das comunidades e da sociedade civil, em geral, em iniciativas relativas à infância e adolescência. No entanto, embora alguns destes mecanismos tenham alcance limitado, são espaços que procuram implementar a 'democracia por baixo', possibilitando um sistema de monitoramento das decisões políticas. Neste sentido, pode-se observar a expansão de espaços políticos e sociais institucionalizados de participação, através dos quais se pode fazer valer direitos e trazer à tona casos de discriminação e abuso, por exemplo. Esta abertura permite que se faça pressão para que o Estado assuma a responsabilidade pela violação e negligência na implementação dos direitos das crianças.

Cabe acrescentar que a Convenção dos Direitos da Criança e o Estatuto tiveram um papel importante na articulação da linguagem sobre direitos e na criação dos mecanismos necessários para uma reforma institucional. Paralelo às abordagens integradas sobre a proteção das crianças, o Estatuto reconheceu a educação como um elemento vital para o desenvolvimento integral da criança, preparando-a para o exercício da cidadania. As escolas foram percebidas como espaços-chave para facilitar as oportunidades de participação e condições igualitárias de acesso àe permanência na escola, reconhecendo seus direitos de: ser respeitado pelos educadores; contestação aos métodos de avaliação; recorrer a instâncias superiores de decisão e resolução de conflitos, no âmbito escolar; organizar e participar em agremiações ou associações estudantis e ter acesso a uma escola pública próxima ao local de residência.

Nos aspectos materiais e simbólicos, as legislações conquistadas representam uma vitória dos movimentos pró-direitos infantis no Brasil, que perseveraram ao longo de eventos relevantes da história nacional, como o período de ditadura militar. Elas contribuíram para reforçar a necessidade de ajustar os programas voltados para a infância, e reificados pela sociedade, que validavam métodos de tratamento punitivos para crianças e jovens pobres (DEWEES; KLEES, 1995, KLEES et al., 2000). Historicamente grupos sociais mais vulneráveis, como a população pobre, os povos indígenas, os afro-brasileiros e as mulheres, têm sido alvo da violência, da exclusão e do 'assistencialismo'. A eles têm-se negado a oportunidade de participar no processo de formulação de políticas públicas, que irão afetar diretamente o seu bem-estar.

Diversos movimentos, formados por organizações de base e membros da sociedade civil, engajados politicamente, vêm demonstrando uma importante capacidade de atuação. No entanto, até o presente, as políticas públicas contribuíram pouco para fortalecer e apoiar famílias e comunidades pobres para que pudessem tomar para si o cuidado com as suas crianças (PILOTTI; RIZZINI, Irene, 1995, RIZZINI et al., 2002). Precisamos levar em consideração que no Brasil temos uma história de educação desigual, em especial, no que se refere à qualidade (UNICEF, 2004). Até a década de 1990 muitos brasileiros não tinham acesso à educação primária. Em 2000, somente 71% das crianças completaram a quinta série e é bastante reduzido o número de jovens provenientes de escolas públicas que têm acesso à universidade (SOCIAL WATCH, 2006).

Falar de educação é falar de direitos. A educação " é parte integrante de todo projeto global de mudança como motivação política necessária. O que inova, entretanto, é o conhecimento" (DEMO, 1995, p. 153). Conhecer, aprender, refletir e pesquisar são direitos implícitos em qualquer projeto educacional. Através do conhecimento é possível visualizar novas saídas e possibilidades, é possível desenvolver protagonismos e potencialidades. Infelizmente no Brasil, a educação de qualidade como direito para todos ainda é um caminho a ser trilhado.

O contexto

A pesquisa foi realizada na cidade do Rio de Janeiro, conhecida como uma das cidades mais desiguais do mundo, e procurou acessar como o conhecimento político e a participação de jovens são afetados em função do seu local de residência, classe socioeconômica, etnia, gênero e religião.

A cidade do Rio de Janeiro tem presenciado um florescimento do terceiro setor, com um número crescente de organizações e movimentos sociais voltados para o combate à desigualdade, pobreza, discriminação e violência urbana. Neste cenário de grande efervescência da ação pública pela cidadania e inclusão, enfatizar a percepção dos jovens sobre a sua participação é especialmente interessante, pois eles constituem um dos segmentos mais afetados pela desigualdade. Esta condição contribui diretamente para a limitação das possibilidades de mobilidade social. Uma das respostas a essa situação é o ingresso de alguns grupos em facções do tráfico de drogas, para quem o conceito de 'ação pública' está recebendo outra interpretação em um número significativo de comunidades pobres. Neste contexto de desigualdade social e aumento da violência, a maneira como os jovens de diferentes estratos econômicos percebem o conceito de cidadania e como as organizações e movimentos sociais estão trabalhando com esta temática, são questões atemporais.

Alguns dados são relevantes para se compreender a cidade do Rio de Janeiro como palco deste estudo. A riqueza e a pobreza convivem como vizinhos desconhecidos. Na zona sul do Rio de Janeiro, região mais nobre da cidade, as praias de Copacabana e Ipanema e os luxuosos prédios residenciais, dividem o panorama com as favelas.

No que se refere a índices de pobreza, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, 17,6% do total da população, em 2000, vivia abaixo da linha de pobreza, o que corresponde a 1,9 milhão de pessoas. Desse contingente 1,1 milhão corresponde à população que se encontra na faixa etária entre 0 e 24 anos de idade, ou seja, 58% do total de pobres na Região são crianças e jovens entre 0 e 24 anos de idade, correspondente a 24% da população total (URANI et al., 2006).

Em relação à educação da população carioca, a tendência predominante é que, as crianças que se encontram fora da escola, são pobres e/ou negras ou pertencentes a alguma minoria étnica. A destinação reduzida de verbas para os ensinos fundamental e médio criou uma situação de negligência extrema e, até mesmo, violência nas escolas do Rio de Janeiro e São Paulo (ABRAMOVAY, 2003, ABRAMOVAY et al., 1999; UNESCO 2003, WAISELFISZ, 2004). Uma ausência crônica de infra-estrutura, professores qualificados, recursos pedagógicos, somada ao reduzido treinamento de crianças e jovens para o mercado de trabalho, contribui ainda mais para a baixa qualidade da educação pública.

O acesso à educação, de crianças e adolescentes, na cidade do Rio de Janeiro, tem apresentado avanços a partir da década de 1990, mas ainda há muito por fazer. Uma das defasagens observadas está no acesso à creche e à pré-escola, que atende a faixa etária de zero a seis anos de idade. Deste segmento da população, seis de cada dez crianças encontrava-se fora da creche e da pré-escola. A dificuldade de acesso à escola de crianças em situação de vulnerabilidade e risco social é visivelmente maior do que a das crianças de famílias mais ricas da população carioca, ou seja, 60% das crianças têm acesso à escola, enquanto para as famílias de baixa-renda esta percentual é de apenas 32% (PNAD, 2006).

Um outro ponto a ser observado é a defasagem em relação à escolaridade no contingente da população infanto-juvenil entre 9 e 18 anos de idade. A despeito dos avanços, 58% dos que estão nessa faixa etária não se encontram no nível educacional ideal (URANI et al., 2006). Este atraso escolar, que atinge em sua maioria a população mais pobre, pode estar relacionado a fatores como condições educacionais e baixa qualidade de ensino bem como a fatores de ordem econômica, que levam crianças e jovens a abandonar a escola e arrumar um emprego para aumentar a renda familiar.

Um dos fenômenos de maior preocupação na cidade do Rio de Janeiro são os altos índices de mortalidade entre a população jovem. Dados da PNAD 2003 (2006) mostram um crescimento nos óbitos, principalmente por causas externas associadas à violência, desde 1980. Os dados mostram que há uma clara diferenciação de gênero em relação à mortalidade de jovens na cidade. Enquanto no grupo feminino a incidência de mortes por causas externas manteve-se, praticamente, inalterada ao longo do período de 1980-2003, com um mínimo de 18 e um máximo de 22 óbitos para cada 100 mil habitantes, no sexo masculino o comportamento das taxas foi ascendente partindo de 121, em 1980, e alcançando 184 óbitos para cada 100 mil jovens entre 20 a 24 anos.

A pesquisa

O presente estudo, realizado com crianças e adolescentes, teve como principal objetivo explorar as suas percepções sobre participação, com especial foco sobre aeus direitos. Esta temática é crucial por uma série de razões. Em primeiro lugar, a como as crianças percebem os seus direitos é importante para a construção de uma agenda voltada para a identificação dos principais problemas que as afetam. E o sucesso das estratégias para a promoção dos direitos das crianças vai depender das atitudes de crianças e adultos voltadas para a compreensão sobre direitos e cidadania.

Em segundo lugar, esta informação pode ser útil na configuração de estruturas e procedimentos necessários para assegurar que as crianças se familiarizem com os seus direitos. Caso as crianças não acreditem que os seus direitos serão respeitados, a tendência é de que não os coloquem em prática.

Em terceiro lugar, a compreensão frente às percepções de crianças e adolescentes é uma indicação de respeito às suas opiniões e posicionamentos. A oportunidade para realizar este tipo de pesquisa " celebra a diversidade cultural e possibilita a integração social e política" (MCGINN 1996, p. 342).

Por último, uma compreensão aprofundada sobre a percepção das crianças sobre os seus direitos (e mecanismos pelos quais esta percepção é formada) pode contribuir para a formação educacional das crianças e de seus valores democráticos.

Para a realização deste estudo entrevistamos crianças e adolescentes, alunos de colégios públicos e privados na cidade do Rio de Janeiro, para compreendermos como eles percebem os seus direitos e responsabilidades enquanto jovens cidadãos. É essencial compreendermos como as crianças percebem e analisam as realidades do seu ambiente educacional e familiar. Mais ainda, o nosso objetivo foi desenvolver um arcabouço teórico de cunho transnacional, de forma a contribuir para a expansão e aprofundamento das oportunidades para as crianças compreenderem e exercitarem os seus direitos.

Esta pesquisa é parte integrante de um estudo de caráter internacional coordenado por membros da Rede Internacional de Pesquisa Childwatch7 7 A Rede Internacional de Pesquisa Childwatch, é uma organização não-governamental e sem fins lucrativos formada por diversas instituições que compõem a sua rede global. As instituições participantes dedicam-se a pesquisa interdisciplinar na área da infância, com o propósito de promover os direitos das crianças, assim como, o seu bem-estar e desenvolvimento integral. A Childwatch foi fundada em 1993, com o objetivo de promover o intercâmbio entre pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, tendo como base a Convenção dos Direitos da Criança, formulada pelas Nações Unidas. A convenção constitui a agenda comum para a rede. A Childwatch é composta por cerca de 50 organizações, em 45 países, em todos os continentes. Para os membros da Childwatch, o conhecimento aprofundado sobre os temas relativos a infância é de fundamental importância para subsidiar o desenvolvimento de políticas e práticas voltadas para a formulação e implementação dos direitos da criança. , sediada em Oslo, Noruega. Como apontamos, este projeto de pesquisa foi desenhado com o objetivo de estudar as percepções de crianças e jovens sobre cidadania, direitos e responsabilidades, assim como o seu entendimento sobre as oportunidades de participação. A pesquisa foi realizada paralelamente no Brasil (Rio de Janeiro), África do Sul (Cidade do Cabo), Nova Zelândia (Dunedin), Palestina (Al Quds), Noruega (Trondheim) e nos Estados Unidos (Carolina do Norte). Os objetivos específicos foram: a) compreender a concepção de jovens sobre cidadania e formas de participação (caso houvesse algum tipo de engajamento); b) pesquisar a concepção de crianças e adolescentes sobre os seus direitos e responsabilidades; c) coletar informações que pudessem ser úteis para crianças e adolescentes na compreensão dos seus direitos e participação, nos diferentes países respectivamente e d) estimular crianças e adolescentes a aumentar o seu conhecimento sobre envolvimento e cidadania.

Para isso foi organizado pela Childwatch um grupo focal (GF), e ao longo do processo foram realizadas algumas adaptações, em função das especificidades de cada país, e das características de cada escola. Por exemplo, o tempo permitido para as crianças dedicarem ao projeto, fora da sala de aula. O objetivo do grupo focal foi estimular a criança a compartilhar seus conhecimentos e experiências de forma espontânea, a partir de trabalho dos facilitadores.

Os grupos focais eram formados por: crianças entre 8 e 9 anos de idade e por jovens entre 14 e 15 anos. O tamanho dos grupos variou, mas tiveram em média 10 participantes. A maior parte dos grupos era formada só por meninas ou só por meninos, mas alguns grupos eram mistos. Uma metade dos grupos focais era composto por crianças e jovens de baixa-renda e a outra metade era composta por jovens de classe média ou alta. Em sua maioria, os grupos tiveram a participação de dois pesquisadores, um responsável por organizar o grupo e o outro pela redação final das atividades de cada grupo. Os pesquisadores questionaram a percepção das crianças e dos jovens sobre cidadania, direitos e responsabilidades. Depois perguntaram como deveria ser um cidadão de um país imaginário.

A equipe de pesquisa do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI), em convênio com a PUC-Rio, foi responsável pelo desenvolvimento da pesquisa no Brasil. A equipe conduziu discussões com 13 grupos de crianças e jovens, incluindo dois grupos mistos para ampliar os resultados da análise comparativa. No total participaram aproximadamente 120 crianças e adolescentes. Foram selecionadas três escolas municipais, que apresentavam estudantes predominantemente residentes em comunidades de baixa renda, e duas escolas de classes média e alta. Dois grupos focais distintos foram realizados com crianças e adolescentes em situação de rua e oriundos do MST. A escolha metodológica em se trabalhar com estes dois grupos deu-se em função de que cada país escolheria grupos com elementos de diversidade.

O significado de participação, direitos e responsabilidades para crianças e adolescentes no Rio de Janeiro

Apresentaremos aqui uma síntese dos resultados do estudo. As crianças e os adolescentes identificaram com clareza o significado dos direitos em seu cotidiano, tanto na escola quanto em casa. No entanto, ponderaram que a aplicação das leis se dá com freqüência de forma contextualizada. Outro dado relevante é que as crianças e adolescentes de diferentes classes sociais apresentaram visões diferenciadas sobre direitos.

Uma criança de 8 anos de idade, aluna de escola privada, definiu direito como " o direito a ter uma vida boa." Crianças tão novas quanto ela puderam clarear o que significa " ter uma boa vida" e as formas como os seus direitos estão sendo ignorados ou violados. Eles apresentaram uma imagem vívida das ansiedades e inseguranças do seu cotidiano, e os seus sonhos por uma sociedade que ofereça boas escolas, alimentação e moradia adequadas, e também, justiça e dignidade para todos. Os direitos identificados pelos participantes refletiam os anseios em relação ao seu bem-estar físico e emocional, o desejo em participar, contribuir ativamente para viver em segurança e dignidade.

As crianças mais velhas demonstraram também a necessidade de reconhecimento e respeito e o desejo de fazerem escolhas sobre as suas próprias vidas – este desejo é muitas vezes ignorado pelos pais. Uma adolescente de 15 anos, também aluna de escola privada afirmou, ter direitos " Significa poder fazer algo, porque você tem direitos. Significa poder expressar-se." Tanto as crianças quanto os adolescentes demonstraram compreender que o respeito depende, em parte, de suas próprias ações. Para as crianças significava respeitar os mais velhos, fazer os deveres de casa, cuidar do quarto e contribuir financeiramente para a casa, entre outros. Perguntados sobre a atribuição dos adultos, apontaram, principalmente, a responsabilidade de trabalhar e prover a família para sua subsistência.

Outro tema de debate no grupo focal foram as atribuições e responsabilidades coletivas. A grande maioria apontou que ser um cidadão é trabalhar muito. Poucos fizeram qualquer referência sobre a responsabilidade social, exceto em alguns casos, como por exemplo, " um cidadão se preocupa com os direitos de todos os outros cidadãos" (menina de 15 anos, aluna de escola privada).

Um dos meninos apontou que um dos papéis do cidadão é a responsabilidade em relação ao meio-ambiente, como por exemplo, quanto à contaminação dos mares com lixo. Outro menino afirmou participar regularmente de atividades voluntárias de caridade, como campanhas de doação e auxílios na identificação de famílias substitutas para crianças: " minha mãe trabalha em um hospital público com crianças contaminadas pela AIDS e eu colaboro. Eu trabalho com as famílias destas crianças – sempre há algum tipo de celebração, Natal e Páscoa, e nós sempre ajudamos. Eu, de certa forma, patrocino um dos meninos, e, a cada mês, eu dou alguma coisa, como material escolar, lápis, mochila e brinquedos. Não é uma responsabilidade, eu não sou obrigado a ir ao hospital todo mês" (menina de 15 anos, aluna de escola privada).

Percepções de gênero sobre direitos e responsabilidades

A divisão de trabalho na esfera doméstica determinou em grande parte a forma pela qual meninos e meninas discutiram sobre as suas responsabilidades na esfera doméstica. De acordo com um adolescente de 15 anos, aluno de escola pública, " isso já vem de longe. As mulheres trabalham em casa, e os homens trabalham fora." Os adolescentes também internalizaram a visão sobre a prática da sexualidade dos adultos, ou seja, as meninas disseram que os meninos colocavam sobre elas a responsabilidade de se prevenirem contra a gravidez, e se recusavam a usar a camisinha apesar do risco de contaminação de doenças sexualmente transmissíveis. " Existem meninos que quando vão ter relações sexuais dizem: 'você não precisa disso, não é bom, machuca'. Eles afinal devem ter a responsabilidade de usá-las" (menina de 15 anos, aluna de escola pública). A grande maioria das jovens optou pelo uso de métodos contraceptivos, mostrando-se contra a opção do aborto, caso ficassem grávidas. No caso dos meninos, o tema sobre aborto gerou respostas diversas: " Eu acho que as mulheres devem abortar a criança quando não tiverem condições de criar o filho" (menino de 14 anos de idade, aluno de escola pública).

Sobre o tema específico da participação, os adolescentes identificaram não só a dimensão política, mas também, as esferas econômica e social.

Dimensões sociais e econômicas da participação

A ausência de condições sanitárias adequadas nas escolas, transporte público e moradia acessíveis, foram temas constantes nas falas das crianças de escolas públicas. As crianças ofereceram uma visão particularmente interessante sobre o novo sistema de cartão para o transporte público (RioCard), medida adotada para substituir a apresentação das carteiras escolares ao motorista.

No entanto, as crianças afirmaram depender da boa vontade dos motoristas para pegar o ônibus, que limitam o número de crianças. " Eu estou cansado do RioCard. Você só pode usá-lo de meia em meia hora e eu fico no ônibus em torno de 10 minutos. Algumas vezes tenho que esperar 20 minutos até poder pegar outro ônibus. E aí eles ainda dizem para você descer do ônibus" (menino de 14 anos, estudante de escola pública).

Com frequência crianças de baixa renda e alunos de escolas públicas sofrem os efeitos do preconceito em uma sociedade voltada para o consumo, onde o status está relacionado diretamente com a capacidade de adquirir bens. O local de residência e as marcas das roupas são em geral utilizados como símbolos de poder econômico e de classe social, distinguindo os ricos dos pobres. O mapa da cidade do Rio de Janeiro é percebido através da sua distribuição em 'zonas'. A zona sul é predominantemente o local de residência das classes média e alta, enquanto a zona norte reúne os estratos mais pobres da população. No entanto, na zona sul, podemos encontrar um grande número de favelas que circundam a região e ocupam as encostas. As crianças e jovens que freqüentam as escolas públicas residem nas favelas ou em áreas pobres, na baixada fluminense.

Em geral, o noticiário tende a associar as favelas ao crime e à presença de facções criminosas do tráfico de drogas. Mas essa generalização não faz justiça à realidade, como assinala por um dos adolescentes, " ninguém percebe que nas favelas moram pessoas que querem ajudar, realizando projetos sociais. Todo mundo só fala dos seus aspectos negativos como os assaltos, as mortes e seqüestros. É isso que gera essa imagem das favelas, onde os jovens são criados para serem criminosos. Nos jornais só aparecem estas matérias, não mostram os lugares que ajudam as crianças, como os centros sociais, por exemplo. Tudo o que você vê são roubos e mortes. Na primeira página dos jornais só aparecem os aspectos ruins da favela" (aluna de escola pública). Outro jovem acrescentou, " eles acham que você não tem direitos só porque vive na favela. É muita desigualdade" (aluno de escola pública).

A importância atribuída às marcas das roupas é uma fonte constante de embaraço e vergonha para as crianças de baixa renda. Os alunos de escolas públicas falaram em ter apenas uma calça, enquanto os outros (de escolas particulares) podem usar roupas e acessórios variados. As suas experiências pessoais refletiam, em grande parte, concepções reificadas socialmente sobre alunos de escolas públicas. A blusa dos uniformes no estado do Rio de Janeiro tem uma gola de cor laranja, com o símbolo do governo municipal. Mas a cor laranja também é a cor dos garis. Alguns adolescentes narraram que são chamados de 'homens do lixo' por estudantes de escolas particulares.

As reações preconceituosas em relação aos uniformes demonstram a alienação entre as classes sociais, na qual alunos de escolas públicas são taxados de pobres, e percebidos como se fossem criminosos. Segundo estes jovens, algumas pessoas ao se dirigirem a eles, ou passarem por eles nas ruas, seguram os seus pertences para evitar que sejam roubados. " Andar em um shopping vestido de uniforme é o mesmo que estar nu. As pessoas olham para você como se você tivesse acabado de sair da prisão" (aluno de escola pública).

Percebemos que as crianças e adolescentes que sofriam com este tipo de preconceito, em geral, reproduziam o mesmo comportamento, falando sobre o 'cabelo ruim' de um colega, ou de alguém que está em uma situação financeira difícil ou sobre crianças que vivem nas ruas. Como disseram duas crianças que estudam em colégio particular: " enquanto nós estudamos, eles estão pedindo esmolas nas ruas" , ou " nós temos família, e eles não" (8 e 7 anos, respectivamente).

A identificação desses problemas indicou que, de uma forma geral, os estudantes compreenderam quais são os seus deveres e os seus direitos enquanto como membros da sociedade. Muitos adolescentes afirmaram que as situações difíceis ocorrem, porque os próprios governos violam os seus direitos. A sensação comum entre os jovens é a de que o governo não está cumprindo com as suas obrigações. Poucos ressaltaram a responsabilidade do cidadão por meio do voto, e, conseqüentemente, da importância de selecionar um representante adequado. Estas percepções nos indicam uma visão não só cética em relação ao governo e seus representantes, mas também, uma mudança sintomática da relação entre o indivíduo e o Estado. E mais especificamente, entre a criança, o adolescente e o Estado.

A incapacidade do Estado em oferecer serviços básicos e a crescente desigualdade socioeconômica limitam a participação de crianças e adolescentes de estratos sociais menos favorecidos. As observações dos participantes demonstraram claramente como a infra-estrutura escolar e o conteúdo programático são insuficientes, e ainda, como estas lacunas fazem parte de um sistema maior de negligência e discriminação em relação às famílias e comunidades de baixa renda.

Participação política

Um espaço que, a princípio, consideramos privilegiado para identificar estudantes conscientes da importância da participação seria o Diretório de Estudantes. Mas, as experiências analisadas demonstraram que representam um papel em grande parte simbólico. Um adolescente de 14 anos afirmou, " O Diretório Estudantil? Este não é um espaço onde se discute tipos de participação, ou estratégias para mudarmos as coisas. É muita preguiça. Eu nunca vi grande parte dos membros do Diretório. Não é o tipo de participação em que se está preocupado com o outro ou de aprimorar as coisas."

Estas afirmações identificam uma ausência comum de espaços e mecanismos nas escolas nos quais os jovens podem participar ativamente da sociedade. Na ausência de alternativas viáveis, as crianças e jovens estão em uma posição de observadores passivos, impossibilitados de terem um impacto direto nos processos decisórios que irão afetar as suas vidas.

Diversos participantes disseram que apesar de saberem que os seus direitos estavam sendo violados, não conheciam meios para que fossem respeitados. Assim como, afirmaram que as configurações políticas atuais negavam constantemente oportunidades para se expressarem e lutarem pelos seus pontos de vista. Apresentaram uma visão crítica sobre o fato de que os adultos automaticamente são reconhecidos como sujeitos de direito e de autoridade " simplesmente pelo fato de serem mais velhos, terem estudado mais ou terem mais poder econômico" (adolescente de escola pública).

Algumas crianças de escolas particulares achavam que os que não trabalham não possuem uma casa própria ou renda, não poderiam ser considerados cidadãos. A idéia de ter uma casa, ou um lugar para morar, é um ponto de especial importância para as crianças do Movimento Sem-Terra, afirmando que são alvos constantes de piadas pelos colegas de turma e por outras crianças nas ruas. Essas crianças vêem-se como parte de uma comunidade que " está unida em prol de um objetivo único" (adolescentes do MST). No entanto, eles estão constantemente submetidos a brincadeiras ou provocações por não terem uma casa. As causas defendidas pelo MST, como o direito à terra, não é consensual na sociedade brasileira. A expressão destes valores nas crianças demonstra a natureza da sociedade consumista, que avalia o indivíduo pela sua aparência, pelo acesso a propriedade e status conferidos aos objetos de desejo. Assim, diferenças no valor econômico se misturam com as diferenças sociais, " nós temos boas maneiras e as crianças de rua, não. Os nossos pais nos ensinam o que aprenderam na igreja, no colégio e com os seus pais. Este conhecimento é passado através das gerações. Eles não fazem isso" (menino de 8 anos, aluno de colégio particular).

Conclusão

As crianças e os adolescentes participantes da pesquisa demonstraram conhecer seus direitos e puderam identificar muitos fatores que as levam a preferirem uns direitos em detrimento de outros. Crianças e adolescentes lidam com diferenças sociais de formas tão contraditórias e complicadas quanto os adultos (FINE et al., 2004). Esta pesquisa revelou diversas maneiras pelas quais eles internalizam e reproduzem a discriminação e o preconceito.

Os participantes mostraram também conhecer as contradições e os conflitos presentes nos discursos e práticas voltados para a infância e seus direitos. Mostra-se claro que as crianças e os adolescentes conhecem, em níveis diferenciados, os seus direitos e responsabilidades, embora tenhamos encontrado diferenças significativas entre os grupos, em especial entre àqueles de diferentes estratos socioeconômicos. No caso das crianças e dos adolescentes de escolas públicas, eles estão conscientes de que seus direitos são constantemente ignorados e violados. Eles não têm as mesmas oportunidades para aprender e crescer, frente às crianças e jovens das classes média e alta. Mais ainda, eles são constantemente rotulados e pré-julgados de diferentes formas, sentindo-se desrespeitados e excluídos. Estas respostas sublinham a importância do direito à educação como um 'multiplicador' de direitos e sublinham também a natureza complexa das mudanças culturais. A despeito dos avanços na legislação e na retórica, sobre a participação infantil e juvenil, evidenciou-se existir uma resistência à mudanças nas relações de poder estabelecidas entre adultos e crianças/adolescentes.

Estas dimensões chamam a atenção para aspectos do dia-a-dia da implementação e prática dos direitos. A desconexão entre como as crianças e adultos vêem os direitos das crianças, aponta para a necessidade de promover os direitos de forma menos individualizada e mais contextualizada. Alguns pesquisadores mostram-se críticos em relação à Convenção dos Direitos da Criança. Na tentativa de 'redefinir' a relação entre a família e a criança e da família em relação à esfera pública, a Convenção assinala para " um ponto fundamental, ou seja, no complexo nível das relações socioculturais entre a) o indivíduo e o grupo, b) a criança e a família, e em relação as estruturas mais amplas como o clã, a tribo, a casta ou o Estado" (RAMAN, 2000, p. 6).

Conforme sublinhado pela literatura internacional, na medida em que as crianças são tratadas como cidadãs, é mais provável que participem ativamente da sociedade. Oportunidades precoces de participação democrática alimentam um senso coletivo de responsabilidade, e de habilidades para resolver problemas de forma conjunta. Talvez o mais importante seja que as crianças desenvolvam um sentimento de autoconfiança como atores sociais, com o poder de impactar diretamente nas situações que afetam as suas vidas. Elas desenvolvem não só confiança, mas aprendem lições na prática sobre como podem melhorar a qualidade de vida. Mas o oposto também é verdadeiro, a tendência da participação cidadã é ameaçada pelas escolas nas quais as crianças sentem-se sem poder, alienadas, envergonhadas e com raiva (FINE et al., 2004).

O que se faz necessário são políticas que assistam às crianças estimulando a participação e o desenvolvimento do seu potencial um direito fundamental, garantido no Estatuto Brasileiro e na Convenção das Nações Unidas. Estas políticas precisam ser expandidas para que as crianças e os adolescentes aprendam sobre a prática da democracia e participem em múltiplas esferas de ação pública.

Mas para que isso venha a ocorrer, concordamos com o relatório do UNICEF (2003, p. 2) sobre participação infantil, quando afirma que:

Os adultos precisam desenvolver novas competências. Nós precisamos aprender como elucidar as questões de crianças e jovens de forma efetiva e reconhecer as suas múltiplas vozes, as diversas maneiras que as crianças e jovens se expressam e como interpretar as suas mensagens verbal e não-verbal. E ainda, precisamos assegurar de que há oportunidades, espaços seguros para que possam ser ouvidos e levados em consideração. E precisamos desenvolver as nossas habilidades para responder de forma apropriada para as mensagens e opiniões de crianças e jovens.

O modelo baseado em normas jurídicas para o desenvolvimento de políticas para crianças também apresenta problemas. E certamente não se afigura como a única forma de lidarmos com os problemas que nos confrontam. No entanto, para falarmos sobre criar uma cultura de direitos é necessário um exame crítico das relações de poder e privilégio no Brasil. No caso da população jovem, nós percebemos que as contradições nas políticas públicas refletem as contradições encontradas dentro da própria sociedade – sociedades estas que não estão totalmente confortáveis com a idéia de que as crianças sejam sujeitos de direito.

Este estudo exploratório deve ser visto como um aporte inicial para entender as percepções de crianças e adolescentes sobre participação, conceitos sobre direitos e cidadania, assim como, sobre as suas percepções sobre o lugar que ocupam na sociedade. Concluímos citando a professora Anne Smith (2005, p. 8), do Children´s Issue Centre, sediado na Nova Zelândia, e uma das coordenadoras deste projeto:

Este estudo se caracteriza como uma foto sobre a construção da cidadania pelas crianças, e que tende a ser emoldurada dentro de suas próprias vidas, e não em formas abstratas de compreensão sobre a cidadania e a sociedade. O desafio dos pesquisadores é desenvolver idéias acerca das noções enriquecedoras de crianças sobre cidadania, e sugerir aos professores, pais e crianças, estratégias úteis e produtivas de colocá-las em prática.

Notas

Recebido em 16.04.2007. Aprovado em 25.06.2007.

Irene Rizzini

Doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (IUPERJ)

Professora do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio

Presidente da Rede Internacional de Pesquisa Childwatch

Diretora do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI)

Nisha Thapliyal

Doutora pelo programa de Educação Internacional da Universidade de Maryland (EUA)

Professora da Colgate University, USA

Pesquisadora colaboradora do CIESPI

Luciléia Pereira

Mestre em Serviço Social pela PUC-Rio

Psicóloga Clínica

Endereço do CIESPI

www.ciespi.org.br

Caixa Postal: 38002

Rio de Janeiro - RJ

CEP: 22451-970

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  • 1
    O Grupo Focal organizado pela Rede Internacional de Pesquisa Childwatch, foi coordenado pelos seguintes pesquisadores: Anne Smith, diretora do Children's Issues Centre, Universidade de Otago, Dunedin, Nova Zelândia e Natalie Kaufman, professora associada do Instituto sobre Family and Neighborhood Life, Universidade Clemson, Carolina do Norte, Estados Unidos. As demais instituições participantes da rede Childwatch durante o período 2004-2005 foram: Institute on Child and Youth Research da Universidade Cidade do Cabo, Cidade do Cabo, África do Sul; Child Research Unit, Center for Development in Primary Health Care, Universidade Al Quds University, Palestina; Norwegian Center for Child Research, Trondheim, Noruega e o Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI) em convênio com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil. Posteriormente ingressaram no projeto, pesquisadores australianos. A equipe de pesquisa no Brasil incluiu os seguintes nomes: Irene Rizzini, presidente da Childwatch e diretora do CIESPI; Luciléia Pereira e Marcelo Princeswal, pesquisadores do CIESPI; Carla Daniel Sartor, consultora,; Nathercia Lacerda, Isabela Massa, Alexandra Pena, Nisha Thapliyal e Tamo Chattopadhyay, colaboradores; Marina Rodriguez de Jesus, assistente de pesquisa e Christiano Botafogo, tradutor. As autoras agradecem a Mariana Menezes Neumann, pela tradução e seu apoio da construção do artigo e a Alessandra Caldeira, pela revisão do texto.
  • 2
    O direito à sobrevivência inclui: o direito à vida e acesso aos direitos básicos (condições adequadas de vida; alimentação e saúde). Direito ao desenvolvimento: o direito da criança em atingir o seu potencial pleno (educação, lazer, brincadeira, atividades culturais, acesso à informação e liberdade de pensamento e religião). Direito à participação, ou seja, participação ativa na sociedade (liberdade de expressão de idéias e de associação); direito à proteção: direitos essenciais à segurança contra todos os tipos de abuso, violência, negligência e exploração (crianças refugiadas, envolvidas em conflitos armados, trabalho infantil, exploração sexual, tortura e uso de drogas. Disponível em: <
  • 3
    Para a realização desta revisão da literatura, baseamos-nos em textos de Torres (2006), Butler (2006), Limber e Kaufman (2002), Taylor et al. (2001), Universidade de Illinois, do CIESPI e da Rede Internacional de Pesquisa Childwatch. Na literatura internacional, encontramos, com freqüência, o uso do termo 'civic participation' para se referir a uma educação voltada para a cidadania e a participação. Preferimos o uso do termo 'participação cidadã', como apontamos no texto.
  • 4
    O discurso sobre direito infantil emergiu a partir de um contexto histórico e sociocultural que inclui a ruptura do modelo de família extensa e a crescente nuclearização da família, e posteriormente, a própria ruptura da estrutura familiar (Raman 2000). Goonesekere (1997, 92) salienta que: " O conceito acerca dos direitos à participação envolve um sistema de valores sobre a autonomia da criança que precisa ser trabalhada na percepção da própria convenção sobre a importante relação entre a criança, os pais e o Estado." A promoção dos direitos da criança durante a década de 90, é parte integrante de um discurso internacional mais amplo sobre democracia e construção da cidadania. A pressão exercida pelos países desenvolvidos visava acelerar o processo de implementação dos modelos democráticos nos países em desenvolvimento, por meio da erradicação da corrupção e consolidação do Estado de direito. Dentre outras motivações, pode-se destacar o crescente declínio de participação política e aumento de novas demandas socioeconômicas de países industrializados, que exigiam maiores níveis de consolidação das instituições democráticas (MCGINN, 1996).
  • 5
    A noção sobre trabalho infantil difere da prática de trabalho infantil. Crianças pobres sempre estiveram mais vulneráveis à exploração da sua mão-de-obra e as funções exercidas, nas esferas pública e privada, não conseguiram proteger a criança de diversas formas de exploração e abuso. De uma perspectiva crítica alternativa, as crianças provenientes de estratos marginalizados da sociedade, trabalham e vivem fora do ambiente doméstico familiar, em espaços públicos insalubres e inseguros, para auxiliar na renda familiar ao invés de irem para a escola. Esta condição se dá pela reprodução de demandas sócio-econômicas não respondidas como desemprego, inflação, fome, desigualdade de renda e endividamento, assim como, um sistema educacional inacessível (Huggins 2000). Crianças pobres precisam participar e competir com adultos na nova divisão do trabalho internacional, representando uma fonte ilimitada e desprotegida de mão-de-obra barata para os mercados capitalistas.
  • 6
    Artigo 227 da Constituição brasileira e artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente sobre direito à convivência familiar e comunitária.
  • 7
    A Rede Internacional de Pesquisa Childwatch, é uma organização não-governamental e sem fins lucrativos formada por diversas instituições que compõem a sua rede global. As instituições participantes dedicam-se a pesquisa interdisciplinar na área da infância, com o propósito de promover os direitos das crianças, assim como, o seu bem-estar e desenvolvimento integral. A Childwatch foi fundada em 1993, com o objetivo de promover o intercâmbio entre pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, tendo como base a Convenção dos Direitos da Criança, formulada pelas Nações Unidas. A convenção constitui a agenda comum para a rede. A Childwatch é composta por cerca de 50 organizações, em 45 países, em todos os continentes. Para os membros da Childwatch, o conhecimento aprofundado sobre os temas relativos a infância é de fundamental importância para subsidiar o desenvolvimento de políticas e práticas voltadas para a formulação e implementação dos direitos da criança.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Dez 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      25 Jun 2007
    • Recebido
      16 Abr 2007
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