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Medidas utilizadas na prevenção de infecções em transplante de células-tronco hematopoéticas: evidências para a prática

Resumos

Esta revisão integrativa teve como objetivo identificar e avaliar as evidências disponíveis em relação ao uso de filtros de ar de alta eficiência, isolamento protetor e máscaras para a prevenção de infecção em pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoéticas, durante a internação. Para a seleção dos artigos foram utilizadas as bases de dados LILACS, PubMed, CINAHL, EMBASE e a Biblioteca Cochrane. Das 1023 publicações identificadas, 15 foram incluídas na amostra. O uso dos filtros HEPA é recomendado para pacientes submetidos ao transplante alogênico, durante o período de neutropenia. O nível das evidências do isolamento protetor é fraco (VI) e os estudos avaliados não recomendam o seu uso. Não foram avaliados estudos com evidências fortes (I e II) que justifiquem o uso de máscaras, sendo indicado que sejam seguidas as recomendações dos Centers for Disease Control and Prevention quanto ao uso de respiradores especiais pelos pacientes imunocomprometidos. Os dados evidenciados podem auxiliar na tomada de decisão para a assistência de enfermagem.

Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas; Transplante de Medula Óssea; Infecção; Filtração do Ar; Isolamento de Pacientes; Máscaras


This integrative review aimed to identify and assess evidence available about the use of high-efficiency air filters, protective isolation and masks for infection prevention in patients submitted to hematopoietic stem cell transplantation during hospitalization. LILACS, PUBMED, CINAHL, EMBASE and the Cochrane Library were used to select the articles. Of the 1023 identified publications, 15 were sampled. The use of HEPA filters is recommended for patients submitted to allogeneic transplantation during the neutropenia period. The level of evidence of protective isolation is weak (VI) and the studies evaluated did not recommend its use. No studies with strong evidence (I and II) were evaluated that justify the use of masks, while Centers for Disease Control and Prevention recommendations should be followed regarding the use of special respirators by immunocompromised patients. The evidenced data can support decision making with a view to nursing care.

Hematopoietic Stem Cell Transplantation; Bone Marrow Transplantation; Infection; Air Filtration; Patient Isolation; Masks


ARTIGO DE REVISÃO

Medidas utilizadas na prevenção de infecções em transplante de células-tronco hematopoéticas: evidências para a prática1

Livia Maria GarbinI; Renata Cristina de Campos Pereira SilveiraII; Fernanda Titareli Merízio Martins BragaI; Emilia Campos de CarvalhoIII

IEnfermeira, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: Livia: liviagarbin@usp.br, Fernanda: titareli@eerp.usp.br

IIEnfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: recris@eerp.usp.br

IIIEnfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: ecdcava@usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Esta revisão integrativa teve como objetivo identificar e avaliar as evidências disponíveis em relação ao uso de filtros de ar de alta eficiência, isolamento protetor e máscaras para a prevenção de infecção em pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoéticas, durante a internação. Para a seleção dos artigos foram utilizadas as bases de dados LILACS, PubMed, CINAHL, EMBASE e a Biblioteca Cochrane. Das 1023 publicações identificadas, 15 foram incluídas na amostra. O uso dos filtros HEPA é recomendado para pacientes submetidos ao transplante alogênico, durante o período de neutropenia. O nível das evidências do isolamento protetor é fraco (VI) e os estudos avaliados não recomendam o seu uso. Não foram avaliados estudos com evidências fortes (I e II) que justifiquem o uso de máscaras, sendo indicado que sejam seguidas as recomendações dos Centers for Disease Control and Prevention quanto ao uso de respiradores especiais pelos pacientes imunocomprometidos. Os dados evidenciados podem auxiliar na tomada de decisão para a assistência de enfermagem.

Descritores: Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas; Transplante de Medula Óssea; Infecção; Filtração do Ar; Isolamento de Pacientes; Máscaras.

Introdução

O transplante de células-tronco hematopoéticas (TCTH), atualmente, se configura como alternativa de tratamento para diversos tipos de doenças(1), como doenças hematológicas malignas e não malignas, imunodeficiências, erros inatos de metabolismo e tumores sólidos(2). É considerado procedimento de risco devido às possíveis complicações, destacando-se as reações adversas e transfusionais que podem ocorrer no momento da infusão das células-tronco hematopoéticas (CTH)(3), complicações hepáticas, hemorrágicas, renais, pulmonares, neurológicas, cardíacas, infecciosas e gastrointestinais.

No que tange às infecções, sua ocorrência está relacionada principalmente à imunossupressão causada pelo regime de condicionamento, configurando importante causa de morbidade e mortalidade nesses pacientes(2) e podem ser causadas por qualquer categoria de agente etiológico, em qualquer tipo ou fase do transplante.

Uma das fases mais preocupantes é a neutropenia anterior à enxertia das CTH, durante a qual medidas relativas à prevenção de infecção são imprescindíveis para o sucesso do tratamento.

Enquanto algumas dessas medidas são embasadas em conhecimento científico e seguem as diretrizes dos Centers for Disease Control and Prevention (CDC), outras são baseadas em experiências e opiniões pessoais e têm sido alvo de divergências. Ainda, embora existam diretrizes dos CDC, em relação às medidas de prevenção, algumas são utilizadas de forma pouco consensual, destacando-se o uso de filtros de ar de alta eficiência (HEPA), máscaras e o isolamento protetor.

Os filtros HEPA têm como função a prevenção de infecções fúngicas, sendo um dos itens do ambiente protetor recomendado pelos CDC, para os pacientes submetidos ao TCTH alogênico(4-5). Embora seja indicado para os TCTHs alogênicos, observa-se que também é utilizado em TCTHs autólogos. Em contraposição, devido ao custo elevado e dificuldade de manutenção, alguns centros aboliram seu uso, inclusive para os TCTHs alogênicos.

Sobre o isolamento protetor, esse conceito foi introduzido pela primeira vez em 1970 e consistia em confinar os pacientes em quarto privativo e atendê-los usando avental, máscaras e luvas esterilizadas(6); sendo observado, desde aquela época, grande variação em relação aos itens empregados em sua composição.

Pela experiência ter mostrado que o mesmo não atendia os objetivos propostos, pois grande parte das infecções era originária da microbiota endógena, a recomendação de seu uso foi extinta pelos CDC, em 1983(7). Contudo, muitos centros deram continuidade ao seu emprego, o que gerou inúmeros questionamentos em relação à efetividade dessa medida.

A utilização de máscaras para a prevenção de transmissão de infecções é outro ponto controverso e que, em muitas situações, tem sido empregada de forma empírica.

Diante dessas divergências, verificou-se a necessidade de levantar informações para direcionar os profissionais em relação à utilização dessas medidas. Nesse contexto, o enfermeiro tem papel fundamental, uma vez que é parte integral na prestação de cuidados ao paciente e seus familiares em todas as fases do transplante(1).

Frente ao exposto, o referencial teórico selecionado foi a prática baseada em evidências (PBE), que consiste em abordagem de solução de problemas, na qual os resultados de pesquisa são utilizados para a tomada de decisão na prática e cujo desenvolvimento se dá por meio da produção de métodos de revisão de literatura que permitam buscar, avaliar e sintetizar as evidências disponíveis sobre o tema investigado(8). Assim, optou-se pelo desenvolvimento de revisão integrativa da literatura que, além de apresentar o estado atual da ciência, contribui para o desenvolvimento de teorias e tem aplicabilidade na prática(9).

O objetivo deste estudo consistiu em identificar e avaliar as evidências disponíveis na literatura, em relação ao uso de filtros de ar de alta eficiência, isolamento protetor e máscaras por pacientes, profissionais da saúde e/ou visitantes na prevenção de infecções em pacientes submetidos ao TCTH, durante a internação.

Métodos

A revisão integrativa é compreendida como a análise sistemática e síntese da investigação sobre um tema alvo, sendo que o seu escopo pode ser amplo ou restrito, e o tipo de análise é descritiva. O método tem o intuito de reduzir incertezas sobre práticas realizadas, e facilitar o processo de tomada de decisão, relacionado às ações e intervenções que podem resultar em cuidado mais efetivo e custo eficiente na saúde(10).

Para a elaboração desta revisão, foram percorridas seis etapas: identificação do tema ou questionamento da revisão integrativa, amostragem ou busca na literatura, categorização dos estudos, avaliação dos estudos, interpretação dos resultados e apresentação da revisão integrativa(9,11-13).

A questão norteadora foi elaborada, tendo como base a estratégia PICO, acrônimo no idioma inglês que, em português, corresponde a paciente, intervenção, comparação e resultados (desfecho). Consiste em proposta atual que auxilia na elaboração da pergunta clínica e na identificação dos descritores que serão utilizados para a localização dos estudos, permitindo maximizar a recuperação de evidências nas bases de dados e focar o escopo da pesquisa(14).

Assim, para a construção da questão norteadora atribuiu-se a P os pacientes submetidos ao TCTH, ao I o emprego de filtros HEPA, isolamento protetor e/ou máscaras, ao C a comparação dessas intervenções com outras possíveis, ou não, e ao O a ocorrência de infecção. Dessa forma, a mesma consistiu em: quais são as evidências disponíveis quanto ao uso de filtros de ar de alta eficiência, isolamento protetor e máscaras na prevenção de infecções em pacientes submetidos ao TCTH?

Para a seleção dos artigos foram consultadas as bases de dados LILACS, PubMed, CINAHL, MEDLINE, EMBASE e a Biblioteca Cochrane, sendo empregadas diferentes estratégias de busca com descritores controlados e não controlados. O descritor controlado consiste em um termo de um vocabulário estruturado e organizado, ou seja, um descritor de assunto utilizado para a indexação dos artigos nas bases de dados(15), e o não controlado significa que o termo não faz parte do "descritor de assunto" e representa as palavras textuais e seus sinônimos, identificados a partir da leitura de textos primários. Os descritores controlados selecionados foram: transplante de medula óssea, transplante de células-tronco hematopoéticas, infecção, controle de infecções, isolamento de pacientes, dispositivos de proteção respiratória, máscaras, ar, filtração e filtração do ar; e os não controlados: isolamento protetor, filtros HEPA, fluxo de ar laminar, máscara cirúrgica e máscara N95.

Os critérios de inclusão adotados foram: artigos que abordassem os cuidados relacionados ao isolamento protetor, utilização de filtros de ar de alta eficiência e/ou máscaras para a prevenção de infecções em pacientes submetidos ao TCTH, durante o período de internação, publicados em periódicos em inglês, espanhol ou português, nos últimos 20 anos. Os critérios para exclusão foram: estudos que incluíram diferentes populações de pacientes neutropênicos, nos quais os resultados são apresentados de forma generalizada, e publicações que não se enquadram na classificação do nível de evidências utilizada(16).

Essa classificação engloba sete níveis de evidência, sendo o nível I: evidências provenientes de revisões sistemáticas ou meta-análise de ensaios clínicos randomizados controlados (ECRC) relevantes, ou de diretrizes clínicas, baseadas em revisões sistemáticas de ECRC; nível II: evidência derivada de pelo menos um ECRC bem delineado; nível III: evidência obtida de ensaios clínicos bem delineados, sem randomização; nível IV: evidência proveniente de estudo caso controle ou coorte bem delineado; nível V: evidência proveniente de revisão sistemática de estudos qualitativos e descritivos; nível VI: evidência derivada de um único estudo descritivo ou qualitativo; nível VII: evidência oriunda da opinião de autoridades e/ou relatórios de comitês de especialistas. Considerando que essa classificação se baseia no tipo de delineamento do estudo e na sua capacidade de afirmar causa e efeito, os níveis I e II são consideradas evidências fortes, III e IV moderadas e de V a VII fracas(16).

Foram identificados 1.023 e pré-selecionados 49 estudos, por meio da leitura dos títulos e resumos. Após leitura na íntegra, 34 foram excluídos pelos seguintes motivos: publicações em alemão e japonês (n=2), resultados apresentados sem distinção para pacientes submetidos ao TCTH ou a outros tipos de tratamento quimioterápico (n=3), estudos relacionados ao controle e vigilância do ar, ambiente e/ou do sistema de ventilação (n=6), foco dos trabalhos voltado para outras intervenções ou resultados (n=9), publicações que não se enquadraram na classificação do nível de evidências utilizado (revisão narrativa da literatura, resumo, carta ao editor e guideline, n=13), e impossibilidade de aquisição do artigo na íntegra (n=1).

Assim, foram selecionados 15 estudos, sendo sete localizados na base de dados PubMed, dois na EMBASE, cinco concomitantemente no PubMed e EMBASE, e um foi encontrado nessas duas bases de dados e na Biblioteca Cochrane. Para a extração dos dados dos artigos foi utilizado instrumento já empregado por enfermeiros(17). As publicações selecionadas foram classificadas de acordo com o delineamento metodológico e nível de evidência(12), e a síntese dos dados foi apresentada de forma descritiva, segundo as categorias temáticas: utilização do filtro HEPA, emprego do isolamento protetor e uso de máscaras.

Resultados

As publicações foram incluídas nas categorias temáticas utilização do filtro HEPA (n=10), emprego do isolamento protetor (n=9) e uso de máscaras (n=2), sendo que um mesmo estudo pode ter sido incluído em mais de uma categoria.

Em relação à instituição sede, doze estudos (80%) foram conduzidos em hospitais, e os três restantes (20%) não tiveram instituição sede por se tratar de uma meta-análise, um survey e uma apresentação de opinião de especialistas. Quanto ao periódico, quatro estudos (26,6%) foram publicados no Bone Marrow Transplantation, cinco (33,3%) são provenientes de periódicos que publicam estudos relacionados ao TCTH, hematologia e/ou oncologia e três (20%) artigos foram publicados em revistas que abordam o tema infecção; sendo que grande parte deles é proveniente da Inglaterra (46,6%) e Estados Unidos da América (40%).

Em relação ao delineamento de pesquisa e nível de evidência(16), um estudo foi classificado com nível de evidência I (revisão sistemática e meta-análise), um com nível IV (estudo de coorte), um com nível de evidência V (revisão sistemática de estudos descritivos), onze estudos com nível de evidência VI (estudos descritivos) e um estudo com nível de evidência VII (opinião de especialistas).

Na Figura 1 está apresentada a síntese dos artigos incluídos nesta revisão integrativa(18-32). Destaca-se que foram incluídos cinco estudos desenvolvidos com diferentes populações de pacientes neutropênicos(19-21,24,26), uma vez que os resultados, em relação aos receptores de TCTH, foram apresentados de forma independente.


Análise dos dados extraídos dos artigos

Os filtros HEPA têm a capacidade de remover até 99,97% das partículas em suspensão com, no máximo, 0,3µm de diâmetro, sendo sua principal função a prevenção de infecções fúngicas veiculadas pelo ar, em especial aquelas causadas por espécies de Aspergillus que podem levar a 95% de mortalidade. Em diretrizes publicadas sobre a prevenção de infecções oportunistas, entre receptores de TCTH(4-5,33), é recomendado o emprego do ambiente protetor que tem a finalidade de minimizar a contagem de esporos fúngicos no ar e reduzir o risco de ocorrência de infecção fúngica invasiva, relacionada ao ambiente, entre receptores de TCTH alogênico, sendo um dos itens do ambiente protetor os filtros HEPA.

Conforme evidenciado em estudos analisados(18,20,22-23), os filtros são particularmente importantes em locais próximos a construções, por serem importante fator de risco para a ocorrência de infecções fúngicas veiculadas pelo ar. Assim, os resultados dos estudos analisados, mesmo apresentando nível de evidência fraco, corroboram as recomendações dos CDC em relação ao uso dos filtros nos transplantes alogênicos, especialmente na ocorrência de surtos de infecções fúngicas e em períodos nos quais estejam ocorrendo construção ou atividade geradora de poeira, na unidade de transplante ou nas proximidades(4-5). A recomendação do uso do filtro também é sustentada pelos dados apresentados em estudo com nível I de evidência(26). Em apenas um estudo(27), também descritivo, foi relatado que os filtros não seriam necessários, porém, os autores permaneceram cautelosos uma vez que a amostra era limitada e outras medidas, como o uso de antifúngicos, foram utilizadas prevendo que esse tipo de infecção poderia ocorrer.

Quanto aos transplantes autólogos, embora alguns estudos relatem que o uso do filtro seria prudente nessa população(20-21,23,25), outros trabalhos necessitam ser desenvolvidos, sendo essa indicação refutada pelo estudo com nível de evidência I, incluído na amostra(26).

De acordo com as diretrizes dos CDC(4), embora a necessidade do emprego de filtros HEPA para os receptores de transplantes autólogos ainda não tivesse sido estabelecida na época de publicação do guideline, já era relatado que seu uso deveria ser avaliado para esses pacientes se apresentassem neutropenia prolongada. Uma vez que as recomendações são em relação aos TCTHs alogênicos, é necessário avaliar as condições, características e realidade de cada unidade, para tomar decisões sobre o uso do filtro para os receptores autólogos.

Resultados positivos quanto ao uso dos filtros HEPA são evidenciados também por pesquisadores que, após iniciar a realização dos transplantes em uma unidade com filtro HEPA, observaram redução da incidência de aspergilose(34). Contudo, há pesquisadores cautelosos em afirmar a utilidade desse equipamento, uma vez que, apesar da diminuição das taxas de infecção fúngica, não foi constatada redução na mortalidade(35).

Observou-se, nos estudos, que outras medidas constituintes do ambiente protetor(5,33) também foram utilizadas, sendo a pressão de ar positiva entre o hall de entrada e os quartos, fluxo de ar direcionado, portas com fechamento automático, selagem dos quartos para prevenção de entrada de ar, vedação dos ductos de ventilação e construção de barreiras rígidas para impedir a entrada de poeira e esporos de Aspergillus, nas unidades de TCTH.

Sobre o isolamento protetor, a recomendação de seu uso foi abolida pelos CDC na década de 80 do século passado. No entanto, ainda hoje tem sido utilizado e pode incluir várias combinações de medidas, conforme evidenciado nos estudos analisados.

Embora pesquisadores relatem que o mesmo pode ser empregado com segurança, para a realização dos transplantes(27-28), é necessário salientar que essa consideração é feita para situações nas quais o filtro HEPA não esteja disponível e que essa recomendação se baseou em dados de estudos com nível de evidência fraco. Apesar de os resultados de estudo classificado com nível I terem indicado que o isolamento protetor foi efetivo(26), deve-se considerar que, nesse caso, o filtro HEPA foi considerado como item do isolamento protetor.

Sobre as medidas que compõem o isolamento protetor, em um estudo(26) é salientado que a utilização de medidas de barreira tem grande importância nos dias atuais, devido às altas taxas de patógenos resistentes nos hospitais. Contudo, considera-se que essa recomendação está em desacordo com as divulgadas pelos CDC. A higienização das mãos, uso das precauções padrão e das precauções baseadas na transmissão, quando necessário, são suficientes para a prevenção de infecções cruzadas, quando adequadamente empregadas(4).

Os resultados apresentados pela maioria dos estudos analisados estão em consonância com as indicações dos CDC, sendo que o principal motivo para abolir o uso dessa medida pauta-se no fato de que os agentes causadores das infecções que acometem esses pacientes, na fase de neutropenia, são, em grande parte, microrganismos originários da microbiota endógena e atingem a corrente sanguínea ou órgãos profundos devido à quebra das barreiras cutânea e mucosa. Nesses casos, é sugerida a utilização de dietas com baixa carga microbiana, descontaminação do trato gastrintestinal com antibióticos orais não absorvíveis e uso de profilaxia antimicrobiana.

Ainda, conforme salientado em dois estudos descritivos(29,31), é necessário considerar a possibilidade de realização de TCTH em esquema ambulatorial. Em trabalhos que avaliaram os efeitos e resultados dessa modalidade de transplante, verificou-se que o tempo de enxertia, ocorrência de febre, dias em uso de antibióticos, porcentagem de hemoculturas positivas e tipos de infecção são similares entre os grupos tratados no hospital ou em esquema ambulatorial, dados que sinalizam que esse tipo de programa é seguro, aumenta a qualidade de vida de pacientes e suas famílias, e maximiza o uso dos leitos e recursos hospitalares(36).

Outros pesquisadores também não conseguiram identificar diferenças significantes nas taxas de infecção, ou na mortalidade, entre pacientes mantidos no isolamento protetor e aqueles que não foram isolados(37). Dessa forma, recomenda-se que, quando possível, os receptores de TCTH sejam colocados em quartos individuais(33), sem necessidade de medidas de barreira.

Em relação à utilização de máscaras pelos pacientes, profissionais ou visitantes, foram identificados apenas dois surveys nos quais foi relatado o uso desses equipamentos nas unidades de transplante, enquanto medida de prevenção de infecções veiculadas pelo ar(25,32), não sendo possível com esses resultados sustentar a recomendação de seu uso.

De acordo com diretrizes atuais(5), os profissionais devem utilizar máscaras cirúrgicas enquanto equipamento de proteção individual, não havendo indicação de seu uso como medida de prevenção de transmissão de infecção. Para a redução na transmissão de patógenos, veiculados pelo ar, faz-se necessário o rastreamento de pessoas com sintomas de infecção de vias aéreas superiores, para evitar o contato com receptores de TCTH, a dispensa desses do atendimento ao paciente e a vacinação dos profissionais(4).

Embora as máscaras sejam empregadas como parte de programas de controle de infecções, causadas por vírus respiratórios que mostram resultados positivos(38), esses são decorrentes de um conjunto de medidas, não devendo ser atribuídos exclusivamente ao emprego das máscaras.

As diretrizes atuais(5) indicam que qualquer paciente utilize máscaras simples, quando apresentar tosse, para limitar o potencial de disseminação de secreções respiratórias infectadas. Os respiradores especiais (máscaras N95 ou FFP2), utilizados para a prevenção de inalação de pequenas partículas, são indicados para uso pelos pacientes submetidos ao TCTH, durante a fase de neutropenia, quando conseguirem tolerar esse equipamento, para evitar a exposição a fungos, durante o transporte perto de áreas de construção ou renovação. Não há recomendações em relação ao seu uso ao sair da unidade se não houver áreas de construção próximas(5,33,39).

Considerando as consequências que os processos infecciosos podem trazer para os receptores de TCTH, é necessário que os enfermeiros e a equipe de saúde que atuam nessa área estejam preparados para atender os pacientes em suas necessidades, e que sua prática esteja embasada em conhecimentos científicos para subsidiar a implementação de medidas comprovadamente eficazes. Nesse processo, é necessário considerar as mudanças ocorridas em relação ao TCTH, como o aparecimento de novos agentes antimicrobianos, a utilização de regimes de condicionamento de intensidade reduzida, o aumento da idade dos receptores de TCTH, e o uso mais frequente de doadores de células-tronco alternativos, características que podem influenciar nos tipos e incidência de quadros infecciosos.

Conclusão e considerações finais

Tendo em vista a prevenção de infecções em pacientes submetidos ao TCTH, este estudo forneceu subsídios para a tomada de decisão quanto ao emprego dos filtros de ar de alta eficiência, isolamento protetor e máscaras pelos pacientes, profissionais de saúde e visitantes, permitindo a melhoria da assistência de enfermagem prestada a essa clientela.

De acordo com um estudo com nível de evidência I, um com nível de evidência moderada e sete classificados como evidências fracas, os filtros HEPA devem ser utilizados para a realização de TCTH alogênicos, especialmente em situações de surto de infecção fúngica e durante o desenvolvimento de trabalhos de construção, ou atividades geradoras de poeira na unidade de internação ou próximo a ela. Em relação aos TCTHs autólogos, a utilização dos filtros não é sustentada pelos estudos analisados, sendo recomendado que outros trabalhos sejam conduzidos para verificar a necessidade de utilização do filtro para esses pacientes.

Sobre o emprego do isolamento protetor, apesar de a única publicação com nível de evidência I ter indicado melhores resultados, relacionados ao transplante, quando o mesmo é utilizado, neste estudo o filtro HEPA era parte do isolamento. Com base nos resultados e conclusões de outros seis estudos, classificados com nível de evidência fraco, não há indicação de se utilizar o isolamento protetor, uma vez que ele não teria utilidade na prevenção das principais infecções que acometem os pacientes nessa fase.

Em relação às máscaras, não foram encontrados estudos com evidências fortes que justifiquem seu uso para a prevenção de infecção entre receptores de TCTH, devendo ser utilizadas pelos profissionais de saúde como equipamento de proteção individual, de acordo com as diretrizes apresentadas pelos CDC. As recomendações dos CDC também devem ser seguidas em relação ao uso de respiradores especiais pelos receptores de TCTH alogênico, já apresentadas.

Os resultados deste estudo contribuem para o planejamento da assistência de enfermagem aos pacientes submetidos ao TCTH. No entanto, é evidente a necessidade de desenvolvimento de estudos randomizados controlados para elucidar questionamentos ainda existentes e auxiliar na tomada de decisão para aplicação dessas medidas na prática clínica, o que contribuirá para a melhoria da qualidade da assistência aos pacientes transplantados. Nesse processo, é importante não só o empenho dos enfermeiros, mas de toda a equipe e das instituições de saúde para o alcance de melhores resultados, maior satisfação dos clientes e familiares e, ainda, redução de custos tanto para a instituição quanto para os pacientes.

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  • Corresponding Author:
    Lívia Maria Garbin
    Universidade de São Paulo. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
    Departamento de Enfermagem Geral e Especializada
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    E-mail:
  • 1
    Paper extracted from "Medidas utilizadas na prevenção de infecções em transplante de células-tronco hematopoéticas: evidências para a prática", presented to Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brazil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Aceito
      03 Mar 2011
    • Recebido
      06 Jun 2010
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