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Perfil dos alunos ingressos nos cursos de auxiliar e técnico de enfermagem do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE) no Rio de Janeiro - Brasil

Resumos

O objetivo deste trabalho é apresentar o perfil dos alunos ingressos nos Cursos de Qualificação Profissional para Auxiliar de Enfermagem e Complementação para Técnico de Enfermagem do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE). Esta é uma pesquisa quantitativa, desenvolvida no Estado do Rio de Janeiro, no período de agosto de 2004 a janeiro de 2005, com aplicação de 1400 questionários. Os dados foram tratados com estatística descritiva, sob a forma de freqüência simples e percentual. Depois de tabulados, eles foram divididos nas seguintes categorias: dados sociodemográficos, formação escolar, perfil familiar, hábitos, atuação profissional, faixa salarial, expectativas sobre o PROFAE e a Enfermagem, dificuldades para participar do Projeto, e processo ensino-aprendizagem. Os alunos/trabalhadores formados pelo PROFAE tendem a melhorar a qualidade da atenção hospitalar e ambulatorial, contribuindo para a dinamização do mercado de trabalho no setor de saúde.

credenciamento; enfermagem; ensino


This paper aims to present a profile of students registered in the Professional Training Courses for Nursing Auxiliaries and Complementation Courses for Nursing Technicians of the Nursing Worker Professionalization Project - PROFAE. This quantitative study was carried out in the State of Rio de Janeiro, Brazil, from August 2004 to January 2005, through the application of 1,400 questionnaires. Data analysis used descriptive statistics, with simple frequencies and percentages. After tabulation, data were divided in the following categories: sociodemographic data, educational background, family profile, habits, professional activity, salary range, expectations about PROFAE and nursing, difficulties to participate in the project and the teaching-learning process. Students/workers graduated from the PROFAE program tend to improve the quality of hospital and outpatient care, contributing to labor market dynamics in the health sector.

credentialing; nursing; teaching


Este trabajo busca presentar el perfil de los alumnos que ingresaron a los cursos de Calificación Profesional para Auxiliar de Enfermería y complementación para Técnico de Enfermería del Proyecto de Profesionalización de los trabajadores del Área de Enfermería. Esta es una investigación cuantitativa, desarrollada en el Estado de Rio de Janeiro, en el período de agosto del 2004 a enero del 2005, con aplicación de 1.400 cuestionarios. Los datos fueron tratados con estadística descriptiva, bajo la forma de frecuencia simple y porcentaje. Después de tabular los datos, fueron divididos en las siguientes categorías: datos sociodemográficos, formación escolar, perfil familiar, hábitos, actuación profesional, piso salarial, expectativas acerca de PROFAE y de la enfermería, dificultades para participar del Proyecto y proceso de enseñanza-aprendizaje. Los alumnos/trabajadores formados por el PROFAE tienden a mejorar la calidad de la atención hospitalaria y ambulatoria, contribuyendo con la dinámica del mercado de trabajo en el sector de la salud.

habilitación profesional; enfermería; enseñanza


ARTIGO ORIGINAL

Perfil dos alunos ingressos nos cursos de auxiliar e técnico de enfermagem do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE) no Rio de Janeiro - Brasil

Beatriz Guitton Renaud Baptista de OliveiraI; Isaura Setenta PortoII; Márcia de Assunção FerreiraIII; Joyce Beatriz de Abreu CastroIV

IDoutor em Enfermagem, Professor Titular da Escola de Enfermagem Aurora Afonso Costa da Universidade Federal Fluminense, e-mail: beatrizguitton@globo.com

IIDoutor em Enfermagem, Professor Adjunto, Pesquisadora do CNPq, e-mail: isauraporto@superig.com.br

IIIDoutor em Enfermagem, Professor Adjunto, e-mail: marciamata@bol.com.br

IVEnfermeira, Mestranda em Enfermagem, e-mail: joycebeatrizcastro@hotmail.com. Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro

RESUMO

O objetivo deste trabalho é apresentar o perfil dos alunos ingressos nos Cursos de Qualificação Profissional para Auxiliar de Enfermagem e Complementação para Técnico de Enfermagem do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE). Esta é uma pesquisa quantitativa, desenvolvida no Estado do Rio de Janeiro, no período de agosto de 2004 a janeiro de 2005, com aplicação de 1400 questionários. Os dados foram tratados com estatística descritiva, sob a forma de freqüência simples e percentual. Depois de tabulados, eles foram divididos nas seguintes categorias: dados sociodemográficos, formação escolar, perfil familiar, hábitos, atuação profissional, faixa salarial, expectativas sobre o PROFAE e a Enfermagem, dificuldades para participar do Projeto, e processo ensino-aprendizagem. Os alunos / trabalhadores formados pelo PROFAE tendem a melhorar a qualidade da atenção hospitalar e ambulatorial, contribuindo para a dinamização do mercado de trabalho no setor de saúde.

Descritores: credenciamento; enfermagem; ensino

INTRODUÇÃO

A formação de recursos humanos constitui a base para a viabilização das ações e dos serviços de Saúde, e o Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE) consiste numa estratégia de qualificação profissional e de reforço ao aparelho formador na área da saúde, que faz parte de uma política pública.

A implementação de experiências pedagógicas inovadoras, como o Projeto Larga Escala, criado no ano de 1981, com o objetivo de integrar o setor saúde com o da educação, trouxe a questão da formação profissional para o espaço de trabalho, mas não foi capaz de atender a toda demanda de trabalhadores(1). Em 2000, a UNESCO estabeleceu um projeto de cooperação técnica com o Ministério da Saúde para a execução do PROFAE. Essa cooperação teve como objetivo de desenvolvimento melhorar a qualidade do atendimento hospitalar e ambulatorial no Brasil, criando condições para a sustentabilidade dos mecanismos de formação de pessoal auxiliar de enfermagem(2).

Pesquisas apontam que, no Brasil, há um déficit crônico de profissionais técnicos qualificados, situação que coloca em risco a assistência à saúde da maior parte da população(1). Durante muitos anos se restringiu a oferta de empregos para técnico de enfermagem, trazendo por conseqüência a utilização de uma força de trabalho não qualificada e sem formação específica no mercado.

Com o surgimento do PROFAE, configurou-se a proposta de formação de trabalhadores da área de enfermagem que não tinham qualificação profissional e estavam atuando no mercado de trabalho, estimando-se para o início do projeto um contingente de 225 mil trabalhadores que deveriam ser formados durante quatro anos. Desses profissionais, cerca de 25 % deveriam também receber complementação do ensino fundamental.

Posteriormente, acrescentou-se a esse contingente, cerca de 100 mil trabalhadores que exerciam funções em instituições que executavam atividades de enfermagem de alta e média complexidade, com o segundo grau completo, para os quais deveria ser oferecida a complementação da qualificação em nível de técnico de enfermagem.

No estado do Rio de Janeiro, a finalização do PROFAE foi prevista para 2005 e, salvo todas as dificuldades encontradas, de natureza gerencial e pedagógica, uma das questões importantes levantadas é sobre o perfil dos alunos que ingressaram nos cursos, tendo em vista que, nos cadastramentos realizados pelo Banco do Brasil e, depois, pelas Secretarias de Saúde dos Municípios, muitas pessoas inscreveram-se sem ter o perfil de trabalhador da enfermagem exigido, como, por exemplo, motoristas de ambulância, balconistas, desempregados, entre outros(3).

Nos tempos atuais, a busca de maior qualificação e a requalificação constante dos profissionais deve ser uma prioridade em função dos danos sociais que a sua falta causa aos menos avisados, visto que o ambiente globalizado caracteriza-se por possuir um grau de modificação muito rápido, uma forte concorrência entre as empresas e a violenta competição no mercado de trabalho. Dessa forma, a globalização tem colocado desafios aos profissionais que precisam manter-se em condições de atuar em consonância com as atuais exigências do mercado, uma vez que esse novo padrão exige qualidade, flexibilidade e maior produtividade.

A Agência Regional do Estado do Rio de Janeiro desenvolveu um plano corporativo de supervisão, monitoramento e avaliação para os cursos do PROFAE. Dentro desse plano, um dos estudos que foram desenvolvidos versou sobre o perfil dos alunos dos Cursos de Qualificação Profissional de Auxiliar de Enfermagem (QP) e de Complementação da Qualificação Profissional de Auxiliar de Enfermagem para Técnico de Enfermagem (CQP), com a finalidade de conhecer algumas de suas características, seus interesses e suas expectativas em relação ao curso e à profissão. Tais informações foram valiosas no sentido de reorientar as práticas pedagógicas que visavam atender, com maior eficiência, às necessidades de alunos trabalhadores da área da enfermagem.

OBJETIVO

Apresentar o perfil dos alunos ingressos nos Cursos de Qualificação Profissional para Auxiliar de Enfermagem e Complementação para Técnico de Enfermagem do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (PROFAE).

METODOLOGIA

A metodologia utilizada baseou-se na abordagem quantitativa da pesquisa, sendo empregada no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, no período de agosto de 2004 a janeiro de 2005, com os alunos que estavam iniciando os cursos de QP e CQP pelo PROFAE.

Foram aplicados 1400 questionários com 34 questões fechadas, sendo que, em algumas questões, os alunos podiam assinalar mais de uma resposta. Os questionários foram respondidos por 109 alunos do curso de QP e 1291 alunos do curso de CQP, que foram convidados a participar da pesquisa, sendo esclarecidos quanto ao objetivo do estudo e garantia do anonimato.

As respostas foram transcritas para cartões que possibilitaram a leitura ótica. Os dados foram tratados com estatística descritiva, sob a forma de freqüência simples e percentual. Depois de tabulados, foram divididos nas seguintes categorias: dados sociodemográficos, formação escolar, perfil familiar, hábitos, atuação profissional, faixa salarial, expectativas sobre o PROFAE e a Enfermagem, dificuldades para participar do projeto, e processo ensino-aprendizagem. Os dados foram analisados e discutidos com literatura pertinente aos resultados encontrados.

Cabe ressaltar que esta pesquisa seguiu os trâmites recomendados pela Resolução nº 196 / 86 do Conselho Nacional de Saúde / MS, tendo sido aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem Anna Nery / Hospital Escola São Francisco de Assis, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e que os sujeitos da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

A caracterização sociodemográfica dos alunos mostrou que o grupo foi predominantente formado pelo sexo feminino (85,7%), que a faixa etária de 65,6% deles concentrava-se entre 31 a 50 anos, e que 51,5% estavam casados ou viviam com um companheiro, no período da coleta de dados.

Em relação à formação escolar, a maioria dos alunos (69,7%) concluiu o ensino fundamental em curso regular, embora 39,5% deles o tenha concluído em curso supletivo. Destaca-se, ainda, que 72,1% dos discentes terminaram o ensino fundamental há mais de 11 anos, sendo que 28,4% dos alunos de QP responderam que concluíram a 8ª série entre 2 a 5 anos atrás. Quanto ao ensino médio, 52,3% dos alunos do curso de auxiliar estavam cursando ou ainda não o tinham iniciado, enquanto 59,7% dos alunos do curso técnico concluíram esse ensino há mais de cinco anos.

Quase todos os alunos dos cursos de QP e CQP, ou seja, 90,5% do universo, responderam que não sabiam nenhum idioma estrangeiro. Quanto ao uso do computador, 40,5% dos entrevistados disseram que não sabiam utilizar esse equipamento, e 39% utilizavam o Word® (ou equivalente) com dificuldade.

Com relação ao grau de instrução dos pais dos alunos dos cursos de QP e CQP, como pode ser observado na Figura 1, apresentada a seguir, verifica-se que a maior freqüência incide sobre aqueles que sabiam ler e escrever, embora não tivessem completado a 4.ª série do ensino fundamental (43,4% das mães e 38,4% dos pais). Esse movimento é acompanhado pelos pais que completaram o ensino fundamental, com uma incidência também significativa (31% das mães e 30,8% dos pais). Embora os pais analfabetos (14,6% das mães e 9,4% dos pais) apresentassem uma incidência bem menor, ainda assim eles superaram os pais que completaram o ensino médio e superior (7,4% das mães e 9,7% dos pais). Dessa análise depreende-se, no geral, que, do ponto de vista de formação educacional, a maioria dos alunos é oriunda de famílias com baixo grau de instrução.


No que diz respeito ao universo familiar, a maioria dos alunos (84,4%) respondeu que residia com cerca de 2 a 5 pessoas. E a renda familiar de 39,5% dos alunos de QP e de 25,1% dos alunos de CQP era de até dois salários mínimos, como mostra a Tabela 1 apresentada a seguir.

Os hábitos de vida dos entrevistados mostraram que 64,6% deles preferiam ouvir música quando escutavam rádio; 82,9% preferiam assistir a noticiários pela televisão; e 51,1% liam semanalmente jornais ou revistas.

Os itens referentes à situação empregatícia mostraram que a maioria estava trabalhando em um emprego (61,5% de QP e 71,3% de CQP), embora 35,8% dos alunos do curso de auxiliar estivessem desempregados.

Quanto à carga horária de trabalho, 62,1% dos alunos informaram trabalhararem de 25 a 44 horas semanais. Sua remuneração era de um salário, para 49,3% dos entrevistados do Curso de QP, e entre um e dois salários, para 43,3% dos entrevistados do Curso de CQP.

Dos entrevistados que estão empregados, 91,5% trabalham na área da saúde, sendo que 36,5% dos alunos de QP são agentes comunitários; e 76,8% dos alunos de CQP são auxiliares de enfermagem, dos quais 40,7% disseram atuar há mais de 10 anos nessa área.

Quanto à natureza da instituição na qual trabalham, 52% dos alunos atuavam no serviço público municipal, sendo que 65,4% dos alunos do curso de auxiliar atuavam na rede básica, e 54,3% dos alunos do curso técnico atuavam na rede hospitalar. Dos respondentes que atuavam na rede básica, respectivamente 58,8% dos alunos de QP e 47,6% dos de CQP desenvolviam atividades em Centros de Saúde. E dos alunos que atuavam na rede hospitalar, respectivamente 91,7% de QP e 69,7% de CQP desenvolviam atividades em hospital geral.

As expectativas dos discentes sobre o PROFAE estão apresentadas na Tabela 2, a seguir. O projeto representa, principalmente, para 70,6% dos alunos de QP e 80,6% dos de CQP, a aprendizagem de novas técnicas e procedimentos indispensáveis à profissão. Para 61,5% dos alunos de QP e 77,4% dos alunos de CQP, o Projeto representa conhecimentos para compreenderem o significado do trabalho que realizam.

Ao serem interrogados sobre o que pretendem fazer após o término do curso, 63,4% dos alunos disseram que pretendiam continuar estudando. Entretanto, outras questões também foram assinaladas, tais como mudar de função no trabalho (17,4%) e mudar de profissão (9,1%).

O trabalho na área de enfermagem representa, para 75,1% dos alunos, um trabalho importante para o paciente. Para 64,3% deles representa um trabalho que ajuda na manutenção e na recuperação da saúde e, para 26,3%, esse trabalho representa uma oportunidade de ajudar ao próximo. Outras questões foram pouco assinaladas, tais como: exercício de uma profissão como outra qualquer (2,9%) e ajuda ao trabalho do médico (0,7%).

As maiores dificuldades encontradas pelos alunos para participar do PROFAE estão relacionadas na Tabela 3, apresentada a seguir, destacando-se o custo de deslocamento para ir à escola (51,9%). Também foram significativos o cansaço dos alunos decorrente do trabalho (36,1%) e a falta de liberação pelo empregador (23,6%) para freqüentarem os cursos.

Sobre o processo ensino-aprendizagem, 66,9% dos alunos disseram considerar mais fácil fazer trabalhos em grupo, porque há muitas opiniões para serem discutidas.

DISCUSSÃO

Nos dados sociodemográficos, observa-se que o predomínio do sexo feminino (85,7%) referenda uma das características sociohistóricas e sociais da profissão. A enfermagem brasileira, organizada e estruturada pelo paradigma "nightingaleano", desenvolveu-se como uma profissão feminina, assim reconhecida em qualquer espaço da sociedade.

Nas universidades, o ingresso dos alunos do sexo masculino deu-se a partir da década de 70, com o advento do vestibular. Até então, as próprias escolas selecionavam seus candidatos, geralmente aceitando apenas mulheres(4).Apesar de, já há alguns anos, a Enfermagem ser exercida pelos dois sexos, observa-se, nos dados, que as profissões de auxiliar e de técnico continuam substancialmente femininas.

A faixa etária dos alunos concentrou-se entre 31 a 50 anos, revelando um grupo mais maduro em busca da profissionalização, principalmente no caso dos alunos de QP, enquanto para os alunos de CQP significa a ampliação dos conhecimentos (Tabela 2). Esses resultados demonstram coerência, quando se oferta um curso de profissionalização, cuja maioria dos alunos já é trabalhador na área da saúde, formalmente inserido no mercado de trabalho.

Os dados do perfil sociodemográfico apontaram indicadores importantes que podem apoiar os professores no planejamento e condução do processo ensino-aprendizagem, para levar os alunos à superação de suas dificuldades e à vitória sobre os desafios inerentes a fazer um curso de profissionalização, como por exemplo, 69,7% dos alunos concluíram o ensino fundamental em curso regular, sendo que 72,1% deles há mais de 11 anos. Os alunos do curso técnico informaram que concluíram o ensino médio há mais de cinco anos. O tempo decorrido entre essa conclusão e o início dos Cursos do PROFAE, certamente demandou uma reciclagem de conhecimentos básicos necessários ao desenvolvimento de alguns conteúdos específicos de enfermagem.

Dessa forma, esses cursos puderam proporcionar tanto a qualificação profissional, como o aumento do nível de escolaridade, pois muitos alunos tiveram que concluir o ensino fundamental para realizar o curso de auxiliar de enfermagem, e outros concluíram o ensino médio para cursar a complementação para técnico.

No Brasil, as escolas profissionalizantes não conseguem formar trabalhadores que atendam às necessidades dos inúmeros segmentos do mercado de trabalho, na mesma velocidade com que a tecnologia avança, particularmente a da informação. Além do mais, as instituições não devem se restringir ao simples ato de treinar, uma vez que essa atitude cerceia a criatividade, reduz as possibilidades de autonomia e enseja a falta de flexibilidade do trabalhador.

Quando falamos do aumento do nível de escolaridade precisamos estar atentos à qualidade desse processo, ou seja, à garantia dos saberes indispensáveis para, pelo menos, assegurar a sobrevivência do profissional num mundo de crescente saber(5). Esse desafio também está inserido no contexto da educação profissional, que deixa de ser uma questão local e passa ter uma dimensão mais ampla, voltada para um mercado de trabalho exigente, que requer habilidades e conhecimentos profissionais mais diversificados(6).

O perfil sociofamiliar também é um fator contribuinte para se entender o contexto no qual estava inserido o aluno do PROFAE. Dados majoritários sobre as famílias das quais provêm os alunos, mostram que seus pais têm baixa escolaridade. Principalmente as mães, pois 43,4% delas sabem ler e escrever, mas não completaram a 4ª série, e 14,6% não sabem ler e nem escrever. Em relação aos pais, 38,4% deles sabem ler e escrever, mas não completaram a 4ª série e 9,4% não sabem ler nem escrever. Menos de 10% dos alunos têm um dos pais com ensino médio completo.

Houve um aumento da escolarização dos filhos em relação aos seus pais. Isso, significa a possibilidade de ascensão social, cultural e econômica na família(7). No entanto, essas pessoas, para alcançar um patamar mais alto na sua qualificação, precisaram vencer as dificuldades de uma formação fundamental precária, advindas de estudos em escolas públicas(8), da falta de convívio com pessoas num ambiente de estudo, além de considerar a dificuldade econômica que as afastam de algumas facilidades como a do acesso à informatização, a eventos científicos e culturais. O perfil desses alunos é de um grupo que procurou superar as desigualdades impostas por um sistema capitalista, em busca de profissionalização e da possibilidade de ocupação de um emprego.

Na renda familiar dos alunos, embora o maior percentual tenha sido até dois salários mínimos no grupo de CQP, a diferença das famílias cuja renda estava entre dois e três salários mínimos foi pequena. Os baixos salários indicaram as inúmeras dificuldades que esses alunos precisaram enfrentar para estudar. A questão salarial também pode ter sido um dos aspectos motivadores para que eles tivessem investido nos cursos, pois a qualificação, para a maioria deles, representou a oportunidade de aumentar seus ganhos financeiros e de melhorar sua empregabilidade.

A baixa renda mensal pode explicar os hábitos de vida da maioria dos brasileiros que optam pelo lazer caseiro. Em seu tempo livre, eles preferem ficar em casa, têm o costume de assistir à televisão em média 4h50min por dia, gostam de leitura e lêem revistas com regularidade(9).

Quanto à situação empregatícia dos alunos, a maioria estava trabalhando em um emprego (61,5% de QP e 71,3% de CQP). Um dado importante a ser destacado é que 35,8% dos alunos de QP estavam desempregados. Isso talvez explique a relevância desses cursos para suas vidas profissionais, pois eles representam uma abertura de oportunidades para sua inserção no mercado de trabalho. Mas se, por um lado, o desemprego pode ser considerado como um estímulo para sua profissionalização, por outro lado ele se torna uma barreira, tendo em vista a falta de recursos para custear as despesas de transporte, alimentação, entre outras.

Os entrevistados declararam trabalhar entre 25 e 44 horas semanais. No entanto, em relatório do PROFAE, os alunos que já exerciam a profissão de auxiliar de enfermagem declararam que os profissionais da Enfermagem costumam ter uma carga horária de trabalho exaustiva, com dois ou três empregos, para compensar os baixos salários(10). A baixa remuneração ocasiona o acúmulo de empregos, estresse, esgotamento físico e a baixa motivação, fazendo com que os profissionais deixem de se empenhar em participar dos processos de atualização profissional.

Dos alunos que trabalhavam, um número significativo deles atuava na rede municipal de saúde, revelando um perfil de trabalhador regional. Grande parte dos alunos de QP atuava na rede básica, uma conclusão justificada no fato de 36,5% deles serem agentes comunitários e 34,6% terem outras atividades. Nesse sentido, muitos alunos do curso de auxiliar de enfermagem trabalham em instituições de saúde, exercendo, no entanto, cargos como motorista de ambulância, recepcionista e balconista, ocupações que não são consideradas como parte das profissões da Saúde(3).

Os alunos do curso técnico, em sua maioria, eram auxiliares de enfermagem atuando na rede hospitalar, em busca de conhecimentos para melhorar a sua atuação e posição, além de passarem a ter maiores possibilidades no mercado de trabalho. Esse movimento dos alunos pode ser explicado pela tendência da extinção da categoria de auxiliar de enfermagem. Confirmando esses dados, uma pesquisa realizada no Estado de São Paulo destacou que existe certa paridade entre os cursos de auxiliar de enfermagem e de técnicos. No entanto, existe uma forte tendência de aumento no segundo tipo de curso, cujos alunos já buscam a especialização no seu itinerário profissional, principalmente para a área hospitalar(1).

As expectativas dos alunos em relação ao PROFAE foram muitas, destacando-se as seguintes como as mais incidentes, por visar a uma melhoria de seu desempenho profissional: a aquisição de maior conhecimento sobre as técnicas e procedimentos indispensáveis à profissão e a melhor compreensão sobre o significado do trabalho que realizavam para melhorar sua atuação e posição no emprego. Ambos os tipos de alunos pretendem continuar estudando para aprimorar seus conhecimentos. O que difere na posição entre eles, é que os de QP ansiavam em mudar de profissão, e os de CQP queriam mudar de função no trabalho.

No que diz respeito às dificuldades encontradas pelos alunos, a maioria das respostas destacou como fatores relevantes o custo de deslocamento para ir à escola, o cansaço por causa do trabalho e a falta de liberação pelo empregador. Nesse sentido, o recebimento do auxílio - aluno que o PROFAE ofereceu e a localização das turmas próxima às residências ou aos locais de trabalho dos alunos constituíram-se em estratégias importantes para diminuir o absenteísmo e propiciar sua permanência nos cursos. Frente a essas dificuldades, alguns deles relataram que, em sua freqüência aos cursos, deram maior prioridade aos estágios em detrimento das aulas teóricas(11).

Sobre o processo ensino-aprendizagem, os alunos referiram as estratégias de ensino que lhes trouxeram oportunidades para trabalhar em grupo com discussões em sala de aula. Das estratégias que estimularam a socialização do conhecimento, a troca de experiências foi bastante significativa nos depoimentos livres dados pelos alunos do PROFAE(8).

CONCLUSÕES

A análise dos registros dos alunos mostrou que eles realizaram os cursos com dificuldades e precisaram vencer muitas barreiras para alcançarem o objetivo da qualificação profissional. Surgiram muitos problemas de ordem financeira, de disponibilidade de tempo e de defasagem do conhecimento a serem superados por eles. A maioria referiu que estava complementando a sua qualificação porque ela inseria-se em uma política de ensino público; do contrário, eles não teriam condições de custear os cursos. Esses dados foram constatados por meio da composição do perfil dos alunos, pois a maioria deles pertence a uma classe social menos favorecida e com menores oportunidades socioculturais, a ponto de permitir sua competição em igualdade de condições no mercado de trabalho e nos concursos públicos.

O aumento no nível de escolaridade dos trabalhadores, a formação profissional com ênfase no conhecimento técnico - científico e as experiências de trabalho foram mediadas por uma dimensão pedagógica e, principalmente, por uma dimensão social e ético-política. Além disso, para que o trabalhador pudesse ser atendido em sua necessidade de qualificação, outras questões foram consideradas, tais como a sua escolaridade e sua certificação.

Considerando que a política de recursos humanos visa à preparação e utilização de pessoal, e regulação profissional, existe a necessidade de que se continue a política pública de formação profissional do trabalhador da Enfermagem e que se a amplie desta para os trabalhadores em geral da área da Saúde, como parte permanente das ações governamentais, contribuindo para a dinamização do mercado de trabalho no setor de saúde e para a melhoria da assistência à população brasileira.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em: 1º.11.2005

Aprovado em: 7.8.2006

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    Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. [Página na Internet] Brasília: UNESCO; c1999-2005 [updated 1996 janeiro; acesso em 2005 julho 15]. Disponível em: http://www.unesco.org.br/areas/educacao/Educacao/ensinomedioeducacaoprof/ educacaoprofissional/educacaoprofissional/mostra_documento
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Fev 2007

Histórico

  • Recebido
    01 Nov 2005
  • Aceito
    07 Ago 2006
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