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Fatores biopsicossociais que interferem na reabilitação de vítimas de queimaduras: revisão integrativa da literatura

Resumos

Este estudo teve como objetivo identificar os fatores biopsicossociais que influenciam a reabilitação de vítimas de queimadura, por meio de revisão integrativa de literatura, no período de janeiro de 1987 a janeiro de 2007. A partir da busca dos artigos nas bases de dados SciELO, PubMed e LILACS, obtiveram-se 982 artigos, dos quais 45 foram selecionados. A maior parte dos estudos era do tipo descritivo e qualitativo. Os fatores mais frequentemente associados ao processo de reabilitação foram: estado de saúde mental prévio ao acidente, estratégias de enfrentamento e apoio da família, além da gravidade da queimadura e da superfície corporal queimada. A qualidade dos estudos, na maioria classificados com nível de evidência VI, chama a atenção para a escassa produção de evidências fortes nessa área do conhecimento, necessitando maiores investimentos, considerando-se as importantes implicações das sequelas da queimadura na reintegração social dessas pessoas.

Reabilitação; Queimaduras; Apoio Social


This study aimed to identify the biopsychosocial factors that influence the rehabilitation of burn victims, through an integrative literature review, from January 1987 to January 2007. Articles were searched in databases Scielo, Pubmed and Lilacs, resulting in 982 articles, of which 45 were selected, after the analysis and categorization processes. Most studies were descriptive and qualitative. The most frequently associated factors to the rehabilitation process were: mental health state before the accident, coping strategies and family support, besides the severity of the burn and the total body surface area burned. The quality of the selected studies, most classified as evidence level VI, shows the scarce production of strong evidences in this knowledge area, which needs more investment, considering the important implications of the sequelae of burns in the social reintegration of these people.

Rehabilitation; Burns; Social Support


Este estudio tuvo como objetivo identificar los factores biopsicosociales que influyen en la rehabilitación de víctimas de quemaduras, por medio de una revisión integradora de la literatura, en el período de enero de 1.987 a enero de 2.007. A partir de la búsqueda de los artículos en las bases de datos Scielo, Pubmed y Lilacs, se obtuvieron 982 artículos, de los cuales 45 fueron seleccionados. La mayor parte de los estudios era del tipo descriptivo y cualitativo. Los factores más frecuentemente asociados al proceso de rehabilitación fueron: estado de salud mental previo al accidente, estrategias de enfrentamiento y apoyo de la familia, además de la gravedad de la quemadura y de la superficie corporal quemada. La calidad de los estudios, en la mayoría clasificados con nivel de evidencia VI, llaman la atención para la escasa producción de evidencias fuertes en esta área del conocimiento, que necesita mayores inversiones, considerando las importantes implicaciones de las secuelas de la quemadura en la reintegración social de esas personas.

Rehabilitación; Quemaduras; Apoyo Social


ARTIGO DE REVISÃO

Fatores biopsicossociais que interferem na reabilitação de vítimas de queimaduras: revisão integrativa da literatura

Natália GonçalvesI; Maria Elena Echevarría-GuaniloII; Fernanda de Loureiro de CarvalhoIII; Adriana Inocenti MiassoIV; Lidia Aparecida RossiV

IAluna do curso de graduação em enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. Bolsista do Programa de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasil. E-mail: nataliasjbv@hotmail.com

IIEnfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Adjunto, Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Pelotas, RS, Brasil. E-mail: bbpino@hotmail.com

IIIPsicóloga, Doutoranda, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: fer.lc@bol.com.br

IVEnfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: amiasso@eerp.usp.br

VEnfermeira, Doutora em Enfermagem. Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: rizzardo@eerp.usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este estudo teve como objetivo identificar os fatores biopsicossociais que influenciam a reabilitação de vítimas de queimadura, por meio de revisão integrativa de literatura, no período de janeiro de 1987 a janeiro de 2007. A partir da busca dos artigos nas bases de dados SciELO, PubMed e LILACS, obtiveram-se 982 artigos, dos quais 45 foram selecionados. A maior parte dos estudos era do tipo descritivo e qualitativo. Os fatores mais frequentemente associados ao processo de reabilitação foram: estado de saúde mental prévio ao acidente, estratégias de enfrentamento e apoio da família, além da gravidade da queimadura e da superfície corporal queimada. A qualidade dos estudos, na maioria classificados com nível de evidência VI, chama a atenção para a escassa produção de evidências fortes nessa área do conhecimento, necessitando maiores investimentos, considerando-se as importantes implicações das sequelas da queimadura na reintegração social dessas pessoas.

Descritores: Reabilitação; Queimaduras; Apoio Social.

Introdução

Milhares de pessoas sofrem com as sequelas físicas, psicológicas e com as consequências sociais, causadas pela queimadura que podem permanecer por longo tempo ou serem definitivas(1).

Os fatores biológicos afetados pela queimadura precisam ser tratados e administrados de maneira que a vítima de queimadura possa se adaptar após a alta hospitalar. Entretanto, não se deve esquecer que se vive em ambiente dinâmico, sociável, onde se influencia e se é influenciado pelo comportamento das outras pessoas.

A reabilitação, definida como processo destinado a capacitar a pessoa a manter ou alcançar níveis satisfatórios de saúde intelectual, sensorial, física, psicológica e social, deve oferecer ferramentas para que ela possa estar apta novamente a ter independência e retomar seu papel na sociedade(2). O profissional de saúde tem papel fundamental para auxiliar a adaptação da vítima de queimadura(2), considerando o que ela apresenta de melhor como capacidade existente, e não enfocando apenas a incapacidade. A equipe interdisciplinar deve trabalhar com os princípios da filosofia da reabilitação que são a independência, a integração, o senso de justiça, igualdade e equidade e a inclusão das pessoas(2).

A literatura mostra que a área total de superfície corporal queimada (SCQ), idade, sexo, etnia, profundidade da queimadura, local da lesão e dor podem predispor a má reabilitação física, social e psicológica e a piora do estado geral de saúde(3-6). A queimadura, principalmente em partes do corpo que ficam expostas, provoca diminuição da autoestima e turbilhonamento de emoções. A pessoa que sofre queimadura se sente exposta tanto pela lesão da pele, que a expõe a patógenos, deformações, perda de líquidos e risco de morte, quanto pelo sentimento de impotência e culpa pelo acidente(7-8). Têm sido descritos como sentimentos associados ao trauma pela queimadura: angústia, estresse, medo, ansiedade que podem dificultar o enfrentamento da situação, ou seja, a reabilitação(9-12).

O sobrevivente de queimadura grave, após alta hospitalar, passa a vivenciar uma condição crônica, que requer cuidados contínuos, principalmente com a pele. Assim, o presente estudo teve como objetivo identificar, por meio de revisão integrativa de literatura, os fatores biopsicossociais que interferem na reabilitação das pessoas que sofreram queimadura.

Referencial teórico-metodológico

A revisão integrativa da literatura é método importante para a prática baseada em evidência, pois permite analisar vários estudos com diferentes metodologias (quantitativa e qualitativa) em um mesmo trabalho, assim como unir trabalhos experimentais e teóricos, construindo uma concepção nova sobre determinado tópico. É muito usada pelos profissionais de enfermagem, uma vez que está amplamente relacionada à prática baseada em evidência e, principalmente, com o aprimoramento do cuidado ao paciente(13). As evidências podem ser classificadas hierarquicamente, dependendo da abordagem metodológica empregada nos estudos(14). No presente estudo, foi utilizada a seguinte classificação de nível de evidência: I - evidências provenientes de revisão sistemática ou metanálise de todos os ensaios clínicos randomizados, controlados ou oriundas de diretrizes clínicas baseadas em revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados controlados; II - evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado; III - evidências obtidas de ensaios clínicos bem delineados sem randomização; IV - evidências provenientes de estudos de coorte e de caso controle bem delineados; V - evidências originárias de revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos; VI - evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo e VII - evidências oriundas de opinião de autoridades e/ou relatório de comitês de especialistas(15).

Para o desenvolvimento da presente revisão integrativa, foram percorridas as seguintes etapas: 1. estabelecimento da questão norteadora; 2. seleção dos artigos e critérios de inclusão; 3. extração dos artigos incluídos na revisão integrativa; 4. avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; 5. interpretações dos resultados e 6. apresentação da revisão integrativa(13).

Com o objetivo de responder a questão norteadora: "quais os fatores biopsicossociais que interferem no processo de reabilitação das pessoas que sofreram queimadura?", realizou-se busca no período de outubro de 2007 a janeiro de 2008, nas bases de dados PubMed, LILACS e SciELO. Definiram-se como descritores controlados: rehabilitation, burns, culture e social support, e como descritores não controlados: psicológico, reabilitação biopsicossocial e social. Os limites considerados nas buscas foram: humanos, adultos e o período de publicação de 1987 a 2007. Adotaram-se, ainda, como critérios de inclusão: estudos na íntegra relacionados a temas de reabilitação nos âmbitos biológico, psicológico e sociocultural e artigos nos idiomas inglês, português e espanhol.

Na base de dados PubMed, foram localizados 905 artigos e selecionados 79. Para a base de dados SciELO os descritores foram definidos como "palavras chave" e "resumo" e foram encontrados 54 artigos, selecionados 10. Na base de dados LILACS, localizaram-se 23 artigos, dos quais quatro foram incluídos. Após análise dos textos na íntegra, do total de artigos analisados, considerando-se os critérios de inclusão e as repetições, foram excluídos 48. Na amostra final, foram obtidos 45 artigos. A seleção dos artigos foi realizada por uma das pesquisadoras e confirmada por outras duas.

Para categorizar e facilitar a análise dos artigos, foi adaptado um instrumento da literatura(16-17), que foi avaliado em relação à adequação do conteúdo por dois pesquisadores, com experiência nesse tipo de revisão e na área temática em questão.

A análise dos delineamentos dos estudos incluídos nesta revisão integrativa foi baseada em conceitos apresentados na literatura(18-19) que os classifica como estudos com abordagem quantitativa (delineamento experimental, quase-experimental e não experimental), qualitativa (etnográfica, fenomenologia, teoria fundamentada, estudo de caso, biografia, análise narrativa, história, metassíntese) e revisões (integrativa, sistemática e de literatura)(18-19).

O processo de análise foi realizado buscando identificar os fatores biopsicossociais associados ao processo de reabilitação, o que resultou na identificação de três categorias, a saber, 1- fatores relacionados ao apoio social e emocional, 2- fatores psicológicos e 3- fatores associados ao trauma e à gravidade da queimadura.

Resultados

A amostra final compreendeu 45 artigos (quatro encontrados na base de dados LILACS, três na base SciELO e 39 na PubMed). Quarenta e um artigos foram classificados como nível de evidência VI (estudos não experimentais e qualitativos), três classificados como nível VII (opinião de especialista) e um nível V (revisão sistemática). Os artigos incluídos na presente revisão foram referenciados com os números: 3 e 4; 6 a 12 e 20 a 55.

A seguir são apresentadas as três categorias identificadas.

Fatores relacionados ao apoio social e emocional

Os fatores associados a esse grupo foram encontrados em 20 artigos, sendo que 18 foram classificados como nível de evidência VI.

Figura 1


Segundo dois estudos encontrados, delineamento correlacional (nível de evidência VI), o apoio emocional está associado à melhor reabilitação e qualidade de vida(37-38), mas, ao mesmo tempo, um estudo menciona que viver só estaria relacionado à melhor integração com atividades domésticas e sociais, uma vez que o indivíduo realizaria suas atividades de forma independente(39).

Fatores psicológicos

Esses fatores foram encontrados em 22 artigos e organizados em três subcategorias: fatores relacionados ao estado de saúde mental e características individuais prévias ao acidente, relacionados à experiência do tratamento e fatores relacionados aos mecanismos adaptativos pós-trauma. Os fatores relacionados ao estado de saúde mental e características individuais prévias ao acidente incluem aspectos referentes às experiências negativas prévias ao acidente, abuso de drogas, síndromes cerebrais orgânicas, desenvolvimento psicológico, estratégias de enfrentamento e autoestima (Figura 2).


Os resultados de alguns estudos descritivos correlacionais mostram associação estatisticamente significante entre pior estado de saúde mental prévio ao acidente e a adaptação psicossocial prejudicada, na fase de reabilitação(24,37,41). Os fatores relacionados à experiência do tratamento que incluem os procedimentos dolorosos, vivenciados durante a internação, o engajamento no autocuidado e as expectativas irreais na fase de reabilitação estão apresentados na Figura 3 e foram citados por quatro estudos.


Na Figura 4 são apresentados os fatores relacionados aos mecanismos adaptativos pós-trauma que incluem estresse pós-traumático, angústia, vulnerabilidade psicológica e sentimentos de ameaça, ansiedade, insatisfação com a imagem corporal e depressão. Esses fatores foram apontados como associados ao processo de reabilitação por 14 estudos.


Fatores associados ao trauma e à gravidade da queimadura

Em relação aos fatores associados ao trauma e à gravidade da queimadura, foram encontrados 31 artigos, apresentados na Figura 5.


Em relação aos fatores associados ao trauma e à gravidade da queimadura, a maior SCQ foi associada à pior adaptação após a alta hospitalar, por vários estudos(3-4,6).

Discussão

Sabe-se que o processo de reabilitação de pacientes queimados é complexo, necessita de equipe multidisciplinar, com foco no cuidado holístico e deve ter como objetivo promover a adaptação, incluindo a recuperação física, psicológica e social. Para tanto, é necessário o conhecimento dos diversos fatores (internos e externos) que podem influenciar a reabilitação desse indivíduo. A SCQ foi apontada como indicativo de pior ajustamento e qualidade de vida em alguns estudos descritivos desta revisão (nível VI)(50-53), pois, quanto maior a SCQ maiores serão as dificuldades com atividades da casa, do cuidar do corpo, da mobilidade, na integração social e, principalmente, do retorno ao trabalho. A gravidade da queimadura também foi apontada como dificultador da reabilitação e recuperação das funções, uma vez que pode levar a contraturas, entorpecimentos e pruridos da pele(27,40,42).

Nesta revisão, além da gravidade da queimadura e da SCQ, foram identificados como fatores frequentemente associados ao processo de reabilitação estado de saúde mental prévio ao acidente (pré-morbidades psiquiátricas, transtornos de humor, dependência química), estratégias de enfrentamento ineficazes e apoio da família (falta de apoio de familiares ou amigos). Cabe destacar que a maior extensão SCQ está associada a maior tempo de hospitalização e maior visibilidade das lesões. Revisão publicada recentemente, embora com critérios de inclusão distintos, encontrou resultado semelhante(56).

Um dos fatores que dificulta o processo de reabilitação está relacionado à capacidade de enfrentamento de estresse do paciente e às estratégias utilizadas por ele, que podem estar relacionadas a vários outros transtornos de ordem emocional, psicológica ou psiquiátrica (baixa autoestima, depressão, traço de ansiedade, transtorno de personalidade, dentre outros). Como encontrado em estudo recente(57), não incluído na presente revisão, o estado de saúde mental pré-queimadura pode interferir no processo de reabilitação, uma vez que pode levar a pior ajustamento psicossocial e também influenciar a melhora das funções físicas. Essa investigação, que incluiu 64 pacientes queimados, constatou que 24 apresentaram depressão e estresse pós-traumático, após 12 meses de seguimento, e, desses, 20 apresentavam história psiquiátrica pregressa. Verificou-se, ainda, que a maior parte dos indivíduos apresentou depressão grave antes da lesão e apenas dois participantes não tiveram qualquer episódio de desordem psiquiátrica pregressa(57). No presente estudo, trabalhos mostraram que a depressão esteve mais presente nos pacientes após a queimadura e que a maior SCQ e a visibilidade da queimadura nas mãos e face podem aumentar a chance de desenvolvimento da depressão, além de estar relacionada à limitação de atividades sociais e ocupacionais(34). Na literatura, outro estudo chama a atenção para o fato de que, mesmo aqueles pacientes que não possuíam diagnósticos psiquiátricos prévios, se apresentavam mais vulneráveis em relação ao estado de saúde mental antes da queimadura que a população em geral, o que pode ser fator que contribuiu para o acidente(58).

Como identificado nos resultados, as experiências negativas prévias e a personalidade do indivíduo são fatores predisponentes para o estado emocional a longo prazo. A identificação prévia desses problemas retarda possíveis complicações durante o estágio de internação e reabilitação, além de auxiliar o planejamento do cuidado(41,53). A personalidade também pode influenciar o aparecimento do estresse pós-traumático e está relacionada ao enfrentamento individual(5). Pode retardar o retorno ao trabalho(39) e esse retorno, dificultado ou ausente, pode levar a casos de estresse pós-traumático(6). O estresse pós-traumático pode ser definido como um transtorno de ansiedade, caracterizado pela ocorrência de evento traumático, o qual a pessoa experimentou ou testemunhou, manifestando intensos sentimentos de medo, impotência ou horror(59). A queimadura é evento traumatizante, pois como já foi relatado, expõe o indivíduo tanto a patógenos, pela perda da integridade da pele, quanto às percepções, sentimentos e reações psicológicas em relação ao fato de estar queimado, às quais nem sempre as vítimas estão prontas para enfrentar. O aparecimento de estresse pós-traumático no indivíduo que sofreu queimadura apresenta-se como a principal patologia psiquiátrica. Os profissionais de saúde devem estar atentos para a identificação de seus sinais e sintomas, sendo necessário que sejam competentes, sensíveis e especializados para lidar com tal situação.

Além de afetar a vida da vítima, a queimadura afeta toda a família que também deverá receber atenção e ser incluída no planejamento do cuidado, para melhor retorno às atividades de todos os membros e obtenção de melhores resultados, principalmente, quanto à qualidade de vida. O apoio social de familiares, amigos e pessoas significativas foi outro fator importante encontrado nesta revisão. Em estudo realizado com familiares de pessoas que sofreram queimaduras, observou-se que eles tentam ajudar o indivíduo que sofreu queimaduras, por meio de estímulos e apoio como ouvir, acalmar e conversar para que a pessoa não se sinta inferior, dando demonstração de sentimentos de amor e felicidade(7). A família também assume responsabilidades tanto para com os entes que estão saudáveis quanto na prestação do cuidado daquele que está com problemas de saúde, até sua completa recuperação. A doença e suas consequências são vividas em conjunto pelos membros, gerando condições de fragilidade e vulnerabilidade, tanto pela doença, em si, quanto pelas condições financeiras decorrentes dela(60). As fontes de apoio se mantêm pelo relacionamento interpessoal, pela cultura ou crença, sendo importante para o paciente, familiares e equipe relacionamento significativo(25) e estabelecimento de vínculo forte para a restauração do equilíbrio da dinâmica familiar(26).

Outra fonte importante de apoio, apontada nos estudos revisados, são os amigos, a comunidade e os profissionais da saúde. A rede social, amigos, pessoas da comunidade e até mesmo os profissionais da saúde são considerados pelos familiares de grande importância para o paciente em condição crônica, sendo as principais contribuições dessa fonte de apoio a proximidade, prestação de cuidado e auxílio financeiro(60).

Assim, é importante ressaltar que a equipe, apesar de ser identificada por número menor de estudos incluídos na presente revisão, foi, também, apontada como fonte de apoio social e emocional por alguns estudos classificados com evidência nível VI(23,29-30) e, também, considerada como importante ponto de apoio tanto na realização dos cuidados físicos quanto na criação de um local emocionalmente seguro nas instituições(21). As características dessa equipe, apontadas nos estudos, foram: que ela seja multifatorial e trabalhe de maneira interdisciplinar(35), que identifique a história pregressa de interação com pessoas significativas e os aspectos individuais do paciente, ajudando na reabilitação(9), que realize cuidados com carinho e atenção, favoreça o apoio psicológico e que tenha mais sensibilidade para identificar as reais necessidades dos pacientes(29). Ainda, relacionada à equipe e suas atividades, identificou-se neste estudo, como fator determinante para a reabilitação, a promoção da analgesia adequada(5,27-29).

A dor provocada pela queimadura foi apontada nesta revisão como fator que dificulta a reabilitação, em quatro estudos, classificados com nível de evidência VI, sendo três do tipo descritivo correlacional(24,27,33), um qualitativo(28) e um estudo nível VII (opinião de especialista)(45). Desencadeada tanto pela destruição celular do local quanto pela reação inflamatória, a qual estimula ainda mais as terminações nervosas. a dor no paciente queimado frequentemente está associada à ansiedade e à realização de procedimentos dolorosos. Apesar de, nas queimaduras de terceiro grau, haver perda das terminações nervosas e, com isso, ausência de dor, há sempre regiões adjuntas onde a queimadura pode ser de segundo grau(61) e, portanto, a manipulação dessas áreas deve ser também cuidadosa para causar a menor dor possível. A dor pode ser subestimada pelos profissionais de saúde, principalmente no que diz respeito às crianças, pois ainda não há consenso nem métodos efetivos de avaliação da dor(61). O tratamento da dor deve levar em consideração a individualidade do paciente.

Sendo assim, é importante que os profissionais de saúde realizem programas de reabilitação com enfoque na individualidade da vítima de queimadura, considerando tanto a recuperação física quanto a completa reabilitação psicossocial.

Conclusões

Os estudos analisados nesta revisão caracterizaram-se, na grande maioria, como estudos descritivos e, embora apresentem limitações, mostram que os principais fatores que influenciam o processo de reabilitação são estado de saúde mental prévio ao acidente (pré-morbidades psiquiátricas, transtornos de humor, dependência química), estratégias de enfrentamento ineficazes e apoio da família (falta de apoio de familiares ou amigos), além da gravidade da queimadura (extremos de idade, SCQ e queimaduras de espessura total). Pacientes que apresentam problemas relacionados a um ou mais desses fatores deveriam ter acompanhamento apropriado. O conhecimento sobre esses fatores pode subsidiar o planejamento de intervenções que facilitem o processo de reabilitação e, ainda, outros estudos que testem intervenções ou modelos de atenção na fase de reabilitação.

A qualidade dos estudos encontrados chama a atenção para a escassa produção de evidências fortes nessa área do conhecimento, que necessita de maiores investigações, considerando-se que a queimadura atinge principalmente pessoas do sexo masculino em idade produtiva e suas sequelas têm implicações importantes no retorno ao trabalho e na reintegração social dessas pessoas.

Recomenda-se a realização de estudos experimentais na área de reabilitação psicossocial, com o objetivo de testar intervenções em estudos multicêntricos, para permitir ampliação do tamanho da amostra e produzir evidências científicas confiáveis para a melhoria da qualidade da assistência às vítimas de queimadura.

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  • Corresponding Author:
    Lídia Aparecida Rossi
    Universidade de São Paulo. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
    Departamento de Enfermagem Geral e Especializada
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Aceito
      17 Mar 2010
    • Recebido
      05 Nov 2009
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