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Acidente com material biológico e vacinação contra hepatite B entre graduandos da área da saúde

Resumos

O manuseio de instrumentos perfurocortantes por estudantes da área da saúde é freqüente na atividade acadêmica, o que os expõe ao risco de adquirir infecção. Este estudo teve como objetivo analisar os acidentes com material biológico, ocorridos com alunos de graduação da área da saúde. Dos 170 acidentes registrados, 83 (48,8%) ocorreram com alunos do curso de odontologia, 69 (40,6%) de medicina, 11 (6,5%) de enfermagem e em 6 (3,5%) não havia a informação na ficha de atendimento. A maioria (106-62,4%) ocorreu com alunos de escolas privadas e 55(32,3%) de escolas públicas. Os acidentes percutâneos ocorreram em 133 (78,2%) exposições e em apenas 38 (21,3%) acidentes a procura pelo atendimento especializado foi imediata. Em 127 (74,7%) acidentes o esquema vacinal contra hepatite B estava completo. Assim, torna-se imprescindível que as escolas ofereçam cursos e/ou disciplinas específicas sobre medidas de biossegurança, incluindo aspectos relacionados à vacinação e em especial à vacina contra hepatite B.

risco ocupacional; estudantes de ciências da saúde; biossegurança; hepatite B


Undergraduate students from the health area often handle piercing-cutting instruments in their academic activities, which exposes them to the risk of contracting infections. This study aimed to analyze accidents with biological material among these students. Out of 170 accidents registered, 83 (48.8%) occurred with Dentistry students, 69 (40.6%) with Medical students, 11 (6.5%) with Nursing students and in 06 (3.5%) of the cases there was no such information in the files. Most accidents, 106 (62.4%), occurred with students from private schools and 55 (32.3%) with those from public schools. Percutaneous accidents occurred in 133 (78.2%) exposures and there was immediate search for specialized health care in only 38 (21.3%) accidents. In 127 (74.7%) accidents, the immunization schedule against hepatitis B was complete. Therefore, schools need to offer courses and specific class subjects regarding biosafety measures, including aspects related to immunization, especially the vaccine against hepatitis B.

occupational risks; students, health occupations; exposure to biological agents; hepatitis B


La manipulación de instrumentos punzo cortantes por estudiantes del área de la salud es frecuente en la actividad académica, lo que los expone al riesgo de adquirir infecciones. Este estudio tuvo como objetivo analizar los accidentes con material biológico ocurridos en alumnos del área de la salud. De los 170 accidentes registrados, 83 (48,8%) ocurrieron con alumnos del curso de Odontología, 69 (40,6%) de Medicina, 11 (6,5%) de Enfermería y en 06 (3,5%) no había información en la ficha de atención. La mayoría, 106 (62,4%), ocurrió con alumnos de escuelas privadas y 55 (32,3%) de públicas. Los accidentes percutáneos ocurrieron en 133 (78,2%) exposiciones y en 38 (21,3%) accidentes la búsqueda por atención especializada fue inmediata. En 127 (74,7%) accidentes el esquema de vacunas contra hepatitis B estaba completo. Así es imprescindible que las escuelas ofrezcan cursos y/o disciplinas específicas sobre medidas de bioseguridad incluyendo aspectos relacionados a campañas de vacunación y en especial la vacuna contra hepatitis B.

riesgos laborales; estudiantes de área de la salud; exposición a agentes biológicos; hepatitis B


ARTIGO ORIGINAL

Acidente com material biológico e vacinação contra hepatite B entre graduandos da área da saúde

Elucir GirI; Jeniffer Caffer NettoII; Silmara Elaine MalagutiIII; Silvia Rita Marin da Silva CaniniIV; Miyeko HayashidaV; Alcyone Artioli MachadoVI

IEnfermeira, Professor Titular da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS, Brasil, e-mail: egir@eerp.usp.br

IIEnfermeira

IIIEnfermeira, Mestre em Enfermagem

IVProfessor Doutor da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS, Brasil, e-mail: canini@eerp

VEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS, Brasil

VIMédica, Docente da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, Brasil

RESUMO

O manuseio de instrumentos perfurocortantes por estudantes da área da saúde é freqüente na atividade acadêmica, o que os expõe ao risco de adquirir infecção. Este estudo teve como objetivo analisar os acidentes com material biológico, ocorridos com alunos de graduação da área da saúde. Dos 170 acidentes registrados, 83 (48,8%) ocorreram com alunos do curso de odontologia, 69 (40,6%) de medicina, 11 (6,5%) de enfermagem e em 6 (3,5%) não havia a informação na ficha de atendimento. A maioria (106-62,4%) ocorreu com alunos de escolas privadas e 55(32,3%) de escolas públicas. Os acidentes percutâneos ocorreram em 133 (78,2%) exposições e em apenas 38 (21,3%) acidentes a procura pelo atendimento especializado foi imediata. Em 127 (74,7%) acidentes o esquema vacinal contra hepatite B estava completo. Assim, torna-se imprescindível que as escolas ofereçam cursos e/ou disciplinas específicas sobre medidas de biossegurança, incluindo aspectos relacionados à vacinação e em especial à vacina contra hepatite B.

Descritores: risco ocupacional; estudantes de ciências da saúde; biossegurança; hepatite B

INTRODUÇÃO

Após o reconhecimento do primeiro caso de aquisição do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) em decorrência do exercício profissional(1) e, conseqüente desenvolvimento de aids, por uma enfermeira, após perfuração acidental com uma agulha que continha sangue de um paciente infectado pelo HIV, essa temática tornou-se um grande desafio aos profissionais que atuam no Controle de Infecção Hospitalar e na Área de Saúde Ocupacional.

Como mostra a literatura(2-3), a aquisição ocupacional dos vírus da hepatite B (HBV), da hepatite C (HCV) e HIV por trabalhadores da área da saúde, é um fato concreto.

O panorama mundial(2) dos casos ocupacionais de infecção pelo HIV entre trabalhadores da área da saúde, segundo dados disponíveis até setembro de 1997, era de 264 casos. Nos Estados Unidos(3) estudo recente, evidenciou que já existem 57 casos documentados de aquisição ocupacional do HIV, sendo que 24 (42%) casos ocorreram com enfermeiros.

Destaca-se que, no Brasil, o primeiro caso de aids adquirido de maneira ocupacional só foi reconhecido pelo Ministério do Trabalho em 1999, acometendo uma auxiliar de enfermagem que colaborava no procedimento de punção venosa(4) .

Atualmente existem três casos sendo investigados, como de possível transmissão ocupacional(5). Porém, isto não significa que existe um baixo número de soroconversões, no Brasil, mas aponta para a falta de um sistema efetivo de vigilância e de notificação deste tipo de acidente, bem como de acompanhamento sistemático do profissional acidentado.

Os riscos de exposição ao HIV, HBV e HCV(6) são proporcionais ao manuseio de materiais perfurocortantes e fluidos orgânicos, sendo que o risco médio de infecção pelo HCV após acidente ocupacional percutâneo é de 1,8%, podendo variar de 1 a 10%. No caso do HBV, quando o paciente fonte é HbeAg positivo o risco está estimado entre 6 e 30%, podendo atingir até 40%, quando nenhuma medida profilática é adotada e do HIV, quando o paciente-fonte é positivo de 0,3 a 0,5% e 0,09% após exposição de membrana mucosa. A transmissão para o HIV, relacionada à exposição de pele já foi documentada, porém seu risco ainda não foi quantificado.

Em relação às medidas preventivas de acidentes elas se dividem em medidas pré-exposição e pós-exposição, sendo que as precauções-padrão são consideradas como uma das principais medidas preventivas para se evitar os acidentes.

Em 1996 as chamadas precauções universais foram reformuladas e passaram a ser denominadas de precauções-padrão(7) . Embora estas últimas mantenham a essência de considerar o risco como universal, recomenda-se estender a adoção das barreiras de proteção a todos os fluidos orgânicos, exceto o suor. Admite-se ainda, a técnica de reencapar as agulhas com apenas uma das mãos como medida segura.

Sobre a prevenção da hepatite, como medida preventiva pré-exposição, a vacinação é efetiva; porém há problemas de adesão dos trabalhadores da área da saúde. Quanto à medida preventiva pós-exposição ao HBV, é indicada a gamaglobulina hiperimune específica para o HBV (HBIG), o que confere 75% de efetividade na prevenção dessa infecção(8).

As medidas específicas para a prevenção do HIV incluem a recomendação de quimioprofilaxia com anti-retrovirais pós exposição ocupacional. Após 1990, outros três manuais foram publicados pelos Centers for Disease Control and Prevention(9), sendo que a última publicação ocorreu em 2001.

Quanto ao HCV as ações preventivas se restringem ao uso das precauções-padrão, pois até o momento não existe nenhuma outra medida eficaz para reduzir o risco de sua transmissão.

Os estudantes da graduação da área da saúde, desenvolvem parte de suas atividades acadêmicas em situações semelhantes à prática profissional o que também os coloca o em risco de exposição a material biológico. Dados do SINABIO(10) apontam que dos 14.096 acidentes com material biológico, registrados neste sistema no período de janeiro de 1999 a setembro de 2006, 1.067 (7,6%) ocorreram entre estudantes. Apesar de ter havido um crescimento de estudos sobre acidentes ocupacionais com material biológico entre profissionais na área da saúde, poucas são as publicações nacionais sobre este tipo de exposição com alunos de graduação.

Assim, buscou-se com o presente estudo identificar e analisar as exposições com material biológico potencialmente contaminado, ocorridas entre os alunos dos cursos de graduação da área da saúde do município de Ribeirão Preto-SP e que procuraram atendimento médico no ambulatório especializado de um hospital terciário e identificar a situação vacinal contra hepatite B.

METODOLOGIA

Trata-se de estudo descritivo, de caráter retrospectivo e abordagem quantitativa, acerca dos acidentes com material biológico ocorridos com alunos de graduação, que foram atendidos no ambulatório especializado para pessoas envolvidas nos acidentes com material biológico de um hospital de ensino do interior paulista, no período de janeiro de 2003 a maio de 2005.

Os alunos foram identificados a partir da pesquisa do registro do acidente realizado no serviço que presta atendimento aos casos. Após a identificação dos estudantes, os dados de interesse ao estudo foram obtidos por meio de consulta aos prontuários de cada caso, e transcritos para um formulário pré-elaborado.

Foram coletados dados referentes às condições do graduando (idade, sexo, curso/instituição de origem, gravidez), do acidente (data e horário do acidente, tempo de procura do atendimento, uso de equipamento de proteção individual, material e ato causador da exposição, tipo de exposição, região atingida) e da conduta frente à exposição (paciente-fonte, imunização contra hepatite B, quimioprofilaxia com anti-retrovirais).

Os dados foram processados em base de dados formatados em planilha do programa Excel 2003 e analisados no Epi Info 2005 versão 3.3.2 e os resultados apresentados em freqüência e porcentagem.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, da instituição onde o estudo foi realizado.

RESULTADOS

No período de janeiro de 2003 a maio de 2005 foram atendidos no ambulatório especializado 1.125 casos de exposições ocupacionais com material biológico, sendo que em 170 (15,1%) ocorreram com estudantes de graduação da área da saúde.

Em relação ao tipo de instituição de ensino, em 106 (62,4%) das exposições o aluno era proveniente de escola privada, em 55 (32,3%) de públicas e em 09 (5,3%) não foi possível identificar. Dos 83 (48,8%) acidentes ocorridos com graduandos de Odontologia, 76 (44,7%) eram das instituições privadas e cinco (2,9%) da instituição pública; dos 69 (40,6%) acidentes ocorridos com os da Medicina, 24 (14,1%) eram da instituição pública e 43 (25,3%) dos cursos privados. Para o curso de Enfermagem, do total de 11 (6,5%) acidentes, sete eram da instituição pública e três dos cursos privados. O único (0,6%) acidente ocorrido com graduando do curso de Farmácia era oriundo de instituição privada (Tabela 1).

Quanto ao gênero, as mulheres foram envolvidas em 100 (58,8%) exposições, enquanto que os homens em 70 (41,2%), e nenhuma das mulheres referiu gravidez por ocasião do atendimento. A idade dos acidentados variou entre 18 e 31 anos, sendo a maioria, 147 (86,5%), pertencente a faixa etária entre 18 e 25 anos.

Quanto ao horário de ocorrência do acidente, 79 (46,5%) deles aconteceram no período da tarde e foram predominantes nos meses de abril e maio.

Destaca-se que 133 (78,2%) exposições foram percutâneas, em 81 (47,5%) o objeto causador foi agulha oca ou de sutura e em 103 (60,6%) a região atingida foi dedos das mãos. Em 114 (67,1%) dos casos, não havia informação sobre o uso de equipamento de proteção individual, em apenas 40 (23,5%) havia registro do uso e seis (3,5%) relataram que não usavam nenhum tipo de equipamento de proteção individual no momento do acidente.

O paciente-fonte foi identificado em 144 acidentes (84,7%); em 16 (9,4%) não foi possível essa identificação; oito acidentes (4,7%) ocorreram com material sem fonte identificada e em dois não havia a informação.

Dos 170 acidentes identificados, em 127 (74,7%) casos o indivíduo referiu ter recebido as três doses da vacina, em 20 (11,8%) duas doses, em 08 (4,7%) uma dose, 03 (1,8%) quatro doses, 01 (0,6%) informou cinco doses, 01 (0,6%) não soube informar o número de doses. Em 04 (2,3%) casos não havia a informação e em 06 (3,5%) nenhuma dose foi recebida.

Em relação à conduta após a exposição, 125 estudantes (73,5%) procuraram atendimento algumas horas após a ocorrência do acidente, e apenas 31 (18,2%) o fizeram de imediato, ou seja, em período inferior a duas horas após o acidente conforme preconiza as recomendações para este tipo de exposição(9). Em 14 casos (8,2%) não havia informação do tempo de procura. Em 111 casos (65,3%), não foi realizada nenhuma conduta porque o paciente-fonte era negativo, 43 (25,3%) receberam recomendação para o uso de Zidovudina (AZT) e Lamivudina (3TC), 15 (8,8%) para AZT, 3TC e Nelfinavir e, somente em um caso (0,6%) foi indicado 3TC, Tenofovir, Efavirenz e Atazanavir, pois o paciente-fonte usava estes anti-retrovirais.

Quanto à hepatite B, em 130 (76,5%) casos, nenhuma conduta terapêutica foi necessária, em 11 (6,5%) foi recomendado completar a vacinação, 10 (5,9%) foram encaminhados para iniciar a vacinação, 10 (5,9%) aguardaram o exame para a conduta, oito (4,7%) necessitavam de reforço da vacina e um (0,6%) não tinha nenhuma informação sobre a conduta tomada.

DISCUSSÃO

A enfermagem vem sendo apontada como a categoria profissional mais acometida por acidentes envolvendo material biológico(11-12); entretanto, no presente estudo, a análise das exposições entre os alunos da área da saúde, registra maior ocorrência de acidentes, 83 (48,8%), entre os alunos do curso de odontologia.

A literatura aponta dados de elevada freqüência de exposição ocupacional a fluídos biológicos entre dentistas, sendo a via percutânea a mais comum(13).

Estudo recente ressalta a necessidade dos graduandos de odontologia aderirem às recomendações das precauções-padrão e de seguirem normas de prevenção e controle de infecção hospitalar em suas atividades clínicas(14); resultado semelhante foi encontrado na investigação(13) desenvolvida com dentistas.

Na investigação de acidentes com material biológico com alunos de graduação em enfermagem de uma universidade pública do interior paulista(14) foi evidenciado que estes alunos realizam o aprendizado técnico científico desenvolvendo suas habilidades junto aos pacientes, manuseando materiais perfurocortantes, bem como fluidos corporais, o que os deixa constantemente expostos aos mesmos riscos que os profissionais de enfermagem.

Quanto ao risco de aquisição do HBV, este pode ser minimizado por meio de medidas preventivas pré-exposição, com a imunização contra a hepatite B. A vacina tem eficácia de 90 a 95%, sendo considerada como uma das medidas preventivas mais importantes para a prevenção desse vírus, e está indicada antes da admissão do profissional de saúde ou dos estudantes de cursos da área da saúde.

Estudo(15) analisando a ocorrência de acidentes com material biológico, entre o pessoal dos serviços de apoio hospitalar, identificou que 35,4 % dos trabalhadores não haviam recebido nenhuma dose da vacina contra hepatite B. Portanto, pode-se considerar que a adesão à vacina é também um desafio para os profissionais que atuam nos Serviços de Controle de Infecção e nos Serviços de Medicina e Segurança do Trabalho.

Estes aspectos são preocupantes, visto que os dados sobre incidência e prevalência da hepatite B no Brasil(16) são altos e era de se esperar que todos os alunos apresentassem esquema vacinal completo. No mundo, as taxas de prevalência de portadores de HBV variam de 0,1% a taxas superiores a 30%, como nos países da Ásia. No Brasil, a prevalência é alta, e há estimativas de pelo menos 15% da população em geral já ter se exposto ao HBV. A região Norte brasileira concentra maior número de portadores. Estima-se em 450 milhões de portadores crônicos do HBV no mundo, dos quais dois milhões se concentram no Brasil(17).

Avaliando a associação entre vacinação e sorologia anti-HBs positiva, foi constatado um percentual de 86,4% de imunizados, sendo que a imunização entre trabalhadores da saúde foi menor com o aumento da idade e entre homens. A excelente eficácia da vacinação contra hepatite B é apontada em diversos estudos(17-18).

Quanto aos alunos, eles ingressam nos cursos escolhidos sem o conhecimento prévio sobre exposição a material biológico e imunização, cabendo às instituições fornecer informações detalhadas tão logo o estudante ingresse nos cursos de graduação.

Evitar a exposição ocupacional é o caminho mais seguro para prevenir a transmissão da infecção pelos HBV, HVC e HIV. A imunização contra a hepatite B e o atendimento adequado pós-exposição, são fundamentais em um programa de prevenção de acidentes ocupacionais. Entretanto, constatou-se que muitos estudantes não aderiram às recomendações relacionadas ao atendimento pós-exposição.

Sabe-se que em casos de acidentes envolvendo pacientes-fonte portadores do HIV a quimioprofilaxia com anti-retrovirais deve ser iniciada o mais rápido possível, idealmente nas primeiras duas horas após o acidente, diminuindo em eficácia quando iniciada de 24 a 48 horas depois da exposição(9). Os anti-retrovirais têm se mostrados efetivos na prevenção da infecção ocupacional, entretanto requerem completa adesão, porém em muitos casos os profissionais acabam deixando de tomar os medicamentos em decorrência dos efeitos colaterais.

No Brasil, estudo investigando 37 funcionários de um hospital universitário submetidos à quimioprofilaxia com quatro semanas de medicação antiretroviral, encontrou que 86,5% apresentaram eventos adversos clínicos ou laboratoriais, havendo necessidade de interromper as medicações em dois casos e substituição de esquema terapêutico em seis, a assistência via telefone móvel foi apontada como positiva para identificar precocemente os eventos adversos(19).

Apesar de as precauções-padrão serem reconhecidas como importante estratégia preventiva, estudo(20) aponta diferenças importantes entre alunos de enfermagem e de medicina que foram submetidos a programas educacionais específicos, apontando que os alunos que participaram de programa educativo apresentaram maiores índices de conhecimento e de comportamento; reforçando que o investimento nesta área deve ser encorajado.

Outra estratégia que tem se mostrado efetiva é o uso de dispositivos de segurança, que podem reduzir a ocorrência de lesões percutâneas entre profissionais da área da saúde.

A aquisição ocupacional do HIV, HBV, HVC por trabalhadores da saúde é uma realidade sendo que prevenção por meio da adoção de comportamentos seguros deve ser meta constante dos que militam na área da saúde, percebe-se que os alunos também têm sido expostos a riscos semelhantes aos de sua categoria profissional, merecendo estudos específicos para cada área de atuação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acredita-se que é imprescindível a implantação de programas sistematizados para se discutir sobre biossegurança em todos os setores de atuação dos acadêmicos da área de saúde, os quais deverão incluir estratégias efetivas de prevenção de acidentes e de minimização dos riscos ocupacionais, principalmente no caso das exposições a material biológico, além de estabelecer vigilância periódica e incentivar a notificação das ocorrências, pois estes mecanismos também são importantes ferramentas para direcionar a elaboração de medidas preventivas e consequentemente diminuírem os riscos de acidentes.

Os estudantes da área da saúde são inseridos nas atividades de sua futura categoria profissional, e desempenham suas atividades de ensino também se expondo aos riscos biológicos. As medidas de biossegurança e a adoção de comportamentos seguros devem ser adotadas desde a formação profissional, portanto os cursos de graduação devem promover a conscientização de uma prática segura no ambiente de trabalho, contribuindo assim para a formação de profissionais de saúde mais envolvidos com a prevenção de exposições a material biológico.

A temática biossegurança é de importância indiscutível na formação profissional de estudantes da área da saúde devendo, portanto ser abordada desde a graduação ou até mesmo nos cursos profissionalizantes, pois o ingresso de profissionais mais conscientes sobre prevenção de acidentes e comportamentos seguros poderá interferir diretamente no panorama atual de acidentes com profissionais e estarão protegendo não apenas sua saúde, como também dos clientes sob sua responsabilidade.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2008
  • Data do Fascículo
    Jun 2008

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2007
  • Aceito
    26 Mar 2008
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