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Do dispositivo psicopatológico: a loucura entre os muros do discurso

On the psychopathological device: the madness between the walls of discourse

De l’appareil psychopathologique: la folie entre les murs du discour

Del dispositivo psicopatológico: la locura entre los muros del discurso

Vom psychopathologischen Gerät: der Wahnsinn zwischen den Wänden des Diskurses

Resumos

Este artigo realizou uma investigação teórica acerca das articulações entre o DSM e a lógica classificatória de Simão Bacamarte. O referido manual foi tomado pelo discurso psicopatológico hegemônico no contemporâneo a partir de uma leitura psicanalítica, enquanto a classificação de Bacamarte compõe a obra “O alienista” de Machado de Assis. Apontamos que o lugar que uma sociedade destina aos avessos da razão delimita o espaço da liberdade, revelando as formas de laço social de uma coletividade. A liberdade estaria intimamente relacionada com uma posição política, constatação que admite que se aborde a psicopatologia sob a mesma perspectiva. Depreendemos que se a loucura venceu os muros dos manicômios, ela permanece, mais do que nunca, aprisionada entre os muros do discurso das excessivas classificações, uma vez que neutraliza aquilo que faz o sujeito do inconsciente falar.

Palavras-chave:
Discurso; doença mental; loucura; psicopatologia; psicanálise


This paper reports a theoretical study of the connections between the DSM and the classificatory logic by Simão Bacamarte. The contemporary hegemonic psychopathological discourse of the DSM was taken from the point of view of a psychoanalytic reading, while Bacamarte’s classification composes Machado de Assis’ work “The alienist”. We point out that the space a society allocates to the reverse of reason defines the space of freedom, revealing the forms of the social bond of a collectivity. Thus, freedom is closely related to a political position, a conclusion that allows to approach psychopathology from the same perspective. We find that if madness has been freed from the asylum walls, it remains more than ever trapped within the walls of the discourse of excessive DSM classifications, since that discourse neutralizes what makes the subject of the unconscious speak.

Key words:
Speech; mental disorders; madness; psychopathology


Cet article décrit une enquête théorique sur les rapports entre le DSM et la logique de la classification de Simão Bacamarte. Le DSM, caractérisé par un discours psychopathologique hégémonique contemporain, a été analysé à partir d’une lecture psychanalytique, tandis que la classification de Bacamarte compose l’œuvre littéraire « L’aliéniste » de Machado de Assis. Nous soulignons que la place qu’une société destine aux envers de la raison délimite l’espace de la liberté et révèle les formes de lien social d’une collectivité. La liberté serait étroitement liée à une position politique, constatation qui admet que la psychopathologie soit abordée par la même perspective. Nous observons que si la folie a réussi à s’évader des murs des asiles, elle reste néanmoins emprisonnée par les murs du discours des classifications DSM excessives, étant donné que celuici neutralise ce qui fait parler le sujet de l’inconscient.

Mots clés:
Discours; maladie mentale; folie; psychopathologie


Este artículo realizó una investigación teórica acerca las articulaciones entre el DSM y la lógica clasificatoria de Simão Bacamarte. El DSM fue invadido por el discurso psicopatológico hegemónico en lo contemporáneo a partir de una lectura psicoanalítica, mientras que la clasificación de Bacamarte compone la obra “El alienista”, de Machado de Assis. Señalamos que el lugar que una sociedad destina a los contrarios de la razón delimita el espacio de la libertad, revelando las formas de lazo social de una colectividad. La libertad estaría íntimamente relacionada con una posición política, constatación que admite que se aborde la psicopatología bajo la misma perspectiva. Comprendimos que, si la locura venció los muros de los manicomios, ella permanece, más que nunca, encarcelada entre los muros del discurso de las excesivas clasificaciones del DSM, una vez que neutraliza lo que hace al sujeto del inconsciente hablar.

Palabras clave:
Discurso; trastornos mentales; locura; psicopatología


Dieser Artikel beschreibt eine theoretische Untersuchung der Verbindungen zwischen dem DSM und der Klassifikationslogik von Simão Bacamarte. Der gegenwärtige hegemoniale psychopathologische Diskurs des DSM wurde unter dem Blickwinkel der Psychoanalyse übernommen, während Bacamarte‘s Klassifikationen aus Machado de Assis‘ Werk „O Alienista“ („der Irrenarzt“) stammt. Wir kommen zum Schluss, dass der Ort, den eine Gesellschaft der Schattenseite der Vernunft zuordnet, den Raum der Freiheit begrenzt und die Formen der sozialen Bindung einer Kollektivität offenbart. Freiheit steht in enger Verbindung mit politischer Position und diese Feststellung lässt zum Schluss kommen, dass die Psychopathologie aus derselben Perspektive angegangen werden kann. Auch wenn der Wahnsinn den Mauern der Anstalten entkommen ist, bleibt er mehr als je zuvor in den Mauern des Diskurses übermäßiger DSM-Klassifikationen gefangen, da dieser neutralisiert, was das Subjekt des Unbewussten zum Sprechen bringt.

Schlüsselwörter:
Diskurs; Geisteskrankheit; Wahnsinn; Psychopathologie


À guisa de compreensão: o caráter transitório da psicopatologia

Ao refletirmos sobre a psicopatologia, invariavelmente, lançamo-nos em seu terreno etimológico que possibilita tracejar, mesmo que de forma breve, algumas bordas que descortinam as veredas a serem seguidas neste artigo. Essa trilha nos leva à origem do vocábulo que, no grego, faz a junção de três termos - psychê, pathos e logos - permitindo-nos significá-lo como sendo um discurso sobre a paixão da psique, ou melhor, um discurso sobre o sofrimento psíquico (Cheniaux Junior, 2015Cheniaux Júnior, E. (2015). Psicopatologia/Questões gerais. In Manual de psicopatologia (5ª ed., cap. 1, pp. 1-3). Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan.). Porém, não se trata somente de realizar um estudo sobre o pathos psíquico, mas sim de “realizar a articulação do pathos, entendido aqui como a (dis)posição afetiva fundamental que move o sujeito, constituindo-o na sua humanidade, com o psíquico, articulação essa que se eleva ao nível do conhecimento (Logia)” (Martins, 2005Martins, F. (2005). Psicopatologia I - Prolegômenos. Belo Horizonte, MG: PUC Minas., p. 18).

Em outras palavras, podemos falar de uma dimensão pathica que habita todo sujeito, uma dimensão que revela o modo próprio como ele é afetado pelo que vive e as respostas que formula (Vorcaro, 2015Vorcaro, A. (2015). Paradoxos de uma psicopatologia psicanalítica de crianças. In M. Kamers, R. Mariotto, & R. Voltolini (Orgs.), Por uma (nova)psicopatologia da infância e da adolescência (pp. 117-147). São Paulo, SP: Escuta.). Portanto, a resposta do sujeito a uma patologia é sempre singular, pois implica um conhecimento elevado à condição de saber, mesmo que seja um saber inconsciente, um saber que não se sabe, mas que orienta o sujeito, de algum modo, na sua relação com o Outro da determinação simbólica.

Nesse sentido, apontamos que a psicopatologia faz uso tanto das ciências humanas quanto da biologia na construção de seu discurso que “requer constante reflexão histórica e epistemológica, se partirmos do suposto de que os ditos transtornos mentais não são objetos naturais, mas objetos híbridos, com elementos originários dos mundos natural e social” (Oda, 2017Oda, A. M. G. R. (2017, jun.). A História na Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental. Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., São Paulo, 20(2), 225-230. Recuperado de: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-47142017000200225>.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 227).

No entanto, os manuais classificatórios se fundamentam em uma noção de transtorno mental “como entidade patológica autônoma, que se instala na vida mental do paciente” (Misès & Silva Junior, 2018Misès, R., & Silva Junior, P. (2018). Classificação francesa dos transtornos mentais da criança e do adolescente. São Paulo, SP: Instituto Langage., p. 11), ou seja, um elemento estrangeiro que se apossa da psique e, por isso, em algum momento, terá que ser extirpado por uma intervenção terapêutica que, na maior parte das vezes, baseia-se na farmacológica desconsiderando a participação de elementos subjetivos no tratamento. Não sem consequência, o termo transtorno foi traduzido a partir de disorder, implicando um fenômeno que está fora de alguma ordem, ou seja, um déficit que será sanado pelo medicamento.

Se falamos em elevar ao nível do conhecimento uma (dis)posição afetiva fundamental, precisamos ter em mente que esse movimento do Logos, como um “discurso racional, argumentativo, cujas explicações são justificadas e estão sujeitas à crítica e discussão” (Martins, 2005Martins, F. (2005). Psicopatologia I - Prolegômenos. Belo Horizonte, MG: PUC Minas., p. 34), estará intimamente relacionado ao modelo de homem existente em dada época. O que significa admitir como premissa o caráter transitório da psicopatologia. Com base nessa premissa indagamos: Como se cuidou do sofrimento psíquico nos diversos contextos e momentos históricos? Como o mal-estar foi captado pela narrativa médica?

Essas questões nos levam a um olhar histórico da humanidade, revelando-nos que a tentativa do homem de nomear e, por conseguinte, compreender o sofrimento psíquico não é recente, ou seja, não surgiu com o advento da ciência. Já na Grécia antiga, ele era visto a partir de uma perspectiva mitológica com poetas como Homero e Hesíodo, na qual havia um “capricho” dos deuses mediante a hybris (desmedida, excesso) dos homens. Nesse contexto, o sofrimento era externo ao indivíduo, posto que era produto de alguma interferência divina (Vieceli, 2014Vieceli, A. P. (2014, maio). Arquitetura da loucura na antiguidade clássica: a loucura ritual, o teatro e os templos da cura. II Congresso de Pesquisa e Extensão da Faculdade da Serra Gaúcha, Caxias do Sul - RS, 2(2), 46-64. Recuperado de: <http://ojs.fsg.br/index.php/pesquisaextensao/issue/view/85>.
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). Essa visão foi substituída pelo modelo racionalista hipocrático, no qual a loucura passou a ser tratada como um efeito do desarranjo na natureza orgânica do ser humano (teoria dos humores).

Na Idade Média, com a hegemonia do Cristianismo, o sofrimento psíquico passou a ser associado à possessão demoníaca; falava-se de dois tipos de possessão: o alojamento do diabo no corpo da pessoa e a obsessão, na qual o demônio alterava percepções e emoções da mesma. Com o nascimento da medicina moderna, no século XVIII, o sofrimento passou a ser pensado nos moldes da ciência empírica; para isso, reduziu-se “a complexidade da experiência do sofrimento a algo que [pudesse] se submeter às condições de regularidade, previsibilidade e generalização exigidas” (Silveira, Feitosa & Palácio, 2014Silveira, L. C., Feitosa, R. M. M., & Palácio, P. D. B. (2014, abr.). A escuta do sofrimento psíquico relacionado ao trabalho: contribuições da psicanálise para o cuidado em saúde. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, 20(1), 19-33. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/per/v20n1/v20n1a03.pdf>.
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, p. 21), de modo que esse sofrimento fosse localizado no espaço anatômico do corpo humano.

Em decorrência desse reducionismo, Banzato e Zorzanelli (2017Banzato, C. E. M., & Zorzanelli, R. T. (2017). Conhecimento tácito e raciocínio clínico em psiquiatria. Psicopatologia Fenomenológica Contemporânea, 6(2), 81-92. Recuperado de: <https://www.researchgate.net/publication/321170879_Conhecimento_tacito_e_raciocinio_clinico_em_psiquiatria_Tacit_knowledge_and_clinical_reasoning_in_psychiatry>.
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) apontam a exclusão de toda dimensão subjetiva do sofrimento e o surgimento de novas e múltiplas formas de nomeações classificatórias nosográficas, desenvolvidas no decorrer dos séculos XIX, XX e XXI. Esse desenvolvimento gerou um excesso classificatório que nos levou a sofrer de nomeações em demasia (Silva, 2017Silva, S. G. da. (2017). Travessias entre a sala de aula e o consultório: trajetórias docentes, adoecimento e narrativas de sofrimento psíquico de professores. Tese (doutorado em Sociologia) - Universidade Federal do Ceará, Fortaleza. Recuperado de: <http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/22463/1/2017_tese_sgsilva.pdf>.
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) e a procurar nos psicofármacos o alívio de todas as dores (Campagna, Lima & Negrisoli, 2017Campagna, R. Z., Lima, G. A. de, & Negrisoli, L. (2017, out.). A influência da psicopatologia moderna na medicalização da vida. 6ª Jornada Científica e Tecnológica da Faculdade de Tecnologia - FATEC de Botucatu, São Paulo, Brasil. Recuperado de: <http://www.fatecbt.edu.br/ocs/index.php/VIJTC/VIJTC/paper/viewFile/1307/1657>.
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).

Contudo, esse modo de compreensão histórica da psicopatologia é somente um entre outros. Como cita Karwowski (2015Karwowski, S. L. (2015, jan.-jun.). Por um entendimento do que se chama psicopatologia fenomenológica. Revista da Abordagem Gestáltica - Phenomenological Studies, Goiânia, 21(1), 62-73. Recuperado de: <http://www.redalyc.org/html/3577/357742812007/>.
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), podemos pensar a psicopatologia por meio de modelos: primitivo, grego, cartesiano, romântico e biomédico, ou, ainda, por meio da noção de perspectivas: ateórica, objetivista, etológica, desenvolvimentista, estruturalista, social e compreensiva.1 1 Para um aprofundamento do assunto, recomendamos a leitura de Karwowski (2015), “Por um entendimento do que se chama psicopatologia fenomenológica”.

Buscamos com esses fragmentos históricos e epistemológicos evidenciar que o sofrimento psíquico é constitutivo da condição humana, porém, a forma como trataremos essa condição dependerá do contexto histórico e socio-político. Isso porque em cada época o sofrimento é nomeado, percebido e tratado a partir dos jogos de poder e do discurso hegemônico de cada sociedade em determinado espaço de tempo como evidencia Foucault (1996Foucault, M. (1996). Microfísica do poder. Rio de Janeiro, RJ: Graal.).

Não se trata, pois, de julgar em termos de certo e errado os discursos psicopatológicos, mas de conhecê-los para compreender as sociedades e as subjetividades forjadas em cada época. Assim, refletir sobre a psico-patologia ultrapassa as fronteiras de entendimento do sofrimento psíquico e seus processos, uma vez que descortina o modo de viver e pensar de uma sociedade. Com isso, queremos dizer que o lugar destinado aos avessos da razão por uma sociedade, ou seja, ao que está fora das normas sociais estabelecidas, fora das malhas do discurso, delimita o espaço da liberdade, revelando as formas de laço social de uma coletividade. Portanto, a psicopatologia, para além de ser uma disciplina, é uma questão política (Martins, 2005Martins, F. (2005). Psicopatologia I - Prolegômenos. Belo Horizonte, MG: PUC Minas.).

Em linhas de princípio, destacamos alguns conceitos essenciais para uma investigação psicopatológica na atualidade, são eles: discurso, laço social e liberdade. A noção de discurso é empregada como “um conjunto de regras anônimas, históricas sempre determinadas no tempo espaço, que definiram em uma dada época, e para uma área social, econômica, geográfica, ou linguística dada, as condições de exercício da função enunciativa” (Foucault, 2009Foucault, M. (2009). A arqueologia do saber. Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária., p. 133). Esses discursos refletem o funcionamento da sociedade e suas produções subjetivas, como reconhece Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70). ao afirmar que algo da realidade da dinâmica social é passível de ser simbolizada, pois é na condição de funcionar como discurso que a realidade produz efeitos no mundo. Dessa forma, a função de um discurso implicaria a proposição de um laço social, já que eles seriam “tecidos e estruturados pela linguagem” (Quinet, 2006Quinet, A. (2006). Psicose e laço social. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 17).

Na altura do Seminário 17, que trata do que seria o avesso da psicanálise, Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70). expõe sua concepção de discurso como um modo de relacionamento social representado por uma estrutura, mas sem palavras. Isso significa que um discurso é antes uma estrutura do laço do que um conjunto específico de enunciados, tanto é que o psicanalista francês os concebe como matemas, ou seja, puras letras esvaziadas de sentido, mas capazes de representar modos de relação a partir de uma leitura.

Haveria, para Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70)., um discurso do mestre ou do inconsciente, da histérica ou dos modos de se fazer desejar, da universidade ou do saber científico, e do analista ou do modo de sustentar o desejo do outro ao escutá-lo. A estrutura do discurso tipifica a posição do sujeito como agente de uma verdade à qual ele não tem acesso, mas que ainda assim o causaria em sua relação com o outro. Dessa relação temos um resto ou um produto. Com isso, a produção do agente em sua relação com o outro não teria relação com a verdade enquanto causa, ou seja, a dinâmica do laço social se sustentaria em um não querer saber de sua verdade. Já o laço social seria um modo de fazer laço libidinal, um modo de enlaçar o outro, mas dentro de uma estrutura comum, a saber, os discursos da cena social.

Com Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70)., portanto, os discursos envolvem uma articulação do campo do sujeito com o campo do Outro, a partir de quatro elementos: S1 (significante-mestre, pelo qual os outros significantes são ordenados), S2 (saber constituído enquanto cadeia significante), Ꞩ (sujeito barrado pelo significante), a (mais-gozar, condensador de gozo e causa-do-desejo). Esses elementos são permutados pelo psicanalista entre quatro posições: agente, outro, produção e verdade (Figura 1).

Figura 1
Estrutura dos discursos (Quinet, 2006Quinet, A. (2006). Psicose e laço social. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 29)

Esses discursos ocorrem no número de quatro até que Lacan escreva o discurso do capitalista, mas no geral o que se percebe é a relação lógica entre letras, posições, trajetos e funções que visam descrever a forma como o sujeito se vê posto na cena discursiva e a partir daí opera trocas. Há uma relação estrutural entre os discursos, de modo que cada um deles admite como agente que condiciona seu enlace, como bem podemos ler entre os parênteses de cada discurso apresentado a seguir (Figura 2).

Figura 2
Os discursos (Quinet, 2006Quinet, A. (2006). Psicose e laço social. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 29)

No que se refere à defesa que fazemos neste artigo, de que os jogos de poder sustentados pelo discurso hegemônico vigente em uma sociedade influencia o modo como o sofrimento é nomeado, percebido e tratado, podemos localizar com Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70). que os “muros” do discurso nos quais a loucura se mantém confinada toma a forma do discurso do mestre. Nessa modalidade do discurso (Figura 3), o lugar do agente é ocupado pelo mestre (S1), como aquele que determina a ordem social, o que o caracteriza como um discurso do poder, mas que oculta a verdade de que o mestre também é castrado (Ꞩ), ou seja, também falha. Ao exercer sua força sobre aquele que domina (S2), o mestre o obriga a produzir objetos para seu gozo (a).

Figura 3
Discurso do mestre (Lacan, 1969-70/1992Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70)., p. 27)

Que leitura podemos fazer dos elementos desse discurso enquanto matema, ou seja, como aquilo que se escreve do discurso? O significante mestre (S1) que dita como o sofrimento é alçado à categoria de transtorno mental é o dispositivo classificatório, aqui “encarnado” pelo DSM. No entanto, o que está por trás desse significante é justamente o sujeito barrado (Ꞩ) que acaba sendo inteiramente desconsiderado e passa a funcionar como a verdade das práticas classificatórias. Em outras palavras, a verdade é que tais práticas não são capazes de funcionar plenamente, pois o ato de homogeneizar as manifestações de sofrimento psíquico ignora o estatuto singular e incontrolável da pulsão que age em cada sujeito, o que faz dele um sujeito único, cuja história abarca os discursos vigentes, mas sem se restringir a eles.

Quando afirmamos que o mestre também falha é porque entendemos que há um ponto no qual a função classificatória do DSM tropeça, a saber, no ponto de desconsiderar o contingente em jogo na formação do sintoma de cada sujeito, pois é no espaço da contingência - que funda um ponto de exceção na classificação - que temos um ato do sujeito. Além do fato de que no discurso a letra que ocupa o lugar de agente é o significante mestre, o S1, posto em cima da barra que serve justamente para escamotear sua verdade, que há uma divisão, uma cisão na posição do sujeito que sustenta um significante capaz de ditar uma ordem posta na posição de mestre, de modo que a verdade da mestria é sempre comprometida com o que ela ambiciona recalcar, ou seja, sua divisão, sua inconsistência fundamental, que é justamente o ponto do discurso que determina, mas que não é determinado na volta do giro discursivo.

Assim, o DSM, no lugar do significante-mestre (S1) submete o sujeito ao ideal médico-científico vigente (S2), assumindo um lugar de saber que dita quais sintomas são índices de um transtorno mental e como os mesmos devem ser tratados. Dessa forma, os sujeitos capturados (a) por esse ideal se configuram como produto da tarefa classificatória do referido manual que entende o sintoma como algo a ser extirpado com o uso de medicamentos, desconsiderando qualquer implicação do sujeito no seu sintoma. Assim, o laço social promovido por esse mestre contemporâneo enlaça o sujeito às malhas do capitalismo, submetendo-os a uma lógica desenfreada de consumo de psicofármacos.

Retomando os conceitos essenciais para uma investigação psicopatológica, na atualidade, a liberdade é, antes de tudo, um modo de saber fazer com sua condição de sujeito, ou seja, com seu sintoma. Em seu sentido prático, a liberdade estaria intimamente relacionada com a ética, nesse sentido, ela seria a possibilidade de o sujeito tomar consciência de sua condição, do caráter de determinação que sua história lhe impõe, de modo que para Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70)., a liberdade faria menção à posição ética do sujeito frente aos impasses de seu desejo, impasses que sempre implicariam o outro e seus imperativos de satisfação. Trata-se de uma posição política, constatação que admite que se aborde a psicopatologia sob a mesma perspectiva, de forma que sua dimensão política se sobreponha ao seu doutrinal de ciência, dimensão puramente disciplinar.

A partir dessa compreensão, objetivamos pensar a psicopatologia na atualidade, de modo a efetuar uma leitura crítica dos impasses impostos pelo modo contemporâneo de nomear/classificar o sofrimento psíquico. Para tanto, lançamos mão de uma investigação teórica com enfoque no discurso psicopatológico contemporâneo, tendo por base o livro de Machado de Assis, O alienista, para refletir sobre a lógica de construção do DSM (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) que, no hodierno, fundamenta-se no diagnóstico preciso de transtornos mentais e em sua eliminação por meio de intervenções psicofarmacológicas.

Sendo assim, utilizamos a referida obra machadiana por ser considerada, “por muitos estudiosos da saúde mental e da Reforma psiquiátrica no Brasil, como a primeira obra do saber médico-psiquiátrico em que pese o fato de uma obra literária e não científica” (Santos, 2012Santos, C. B. do. (2012). O alienista e o mal-estar - Entre a razão e a desrazão: “para quê transpor a cerca”?. Dissertação (mestrado em Psicologia social e institucional) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Recuperado de: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/66648/000870026.pdf?sequence=1>.
https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/hand...
, p. 9; grifos da autora).

A escolha da literatura como suporte investigativo não se deu sem consequências, visto que ao refletirmos sobre a escrita enquanto um processo de transformação da experiência subjetiva em equivalentes culturais legitimados pela sociedade, entendemos que a literatura pode ser pensada como uma forma de expressão humana que admite, desde suas bases, leituras dos modos de subjetivação em dado contexto histórico (Simões, 2017Simões, R. B. S. (2017, jul./dez.). Psicanálise e literatura: o texto como sintoma. Analytica, 6(11), 159-179. Recuperado de: <http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/analytica/issue/view/143>.
http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/an...
). Assim, poderemos ter uma noção do discurso da sociedade na época de Machado de Assis sobre o sofrimento psíquico, analisando o que permanece nos dias atuais.

Tendo em vista a importância da compreensão dos processos psico-patológicos e os modos de subjetivação do contemporâneo, torna-se fundamental discutir sobre essas manifestações em nossa época, principalmente para a psicologia e a psicanálise que possuem um compromisso estreito com o campo da saúde mental em contribuir para uma reflexão acerca do sofrimento e seus modos singulares de manifestação.

Psicopatologia contemporânea: a passagem de um “escutar” para um “olhar”

A prática clínica psiquiátrica contemporânea, baseada em evidências, fundamenta-se em uma psicopatologia pragmática, sem preocupação com a etiologia do sofrimento mental, visto que os critérios estatísticos e empírico-experimentais são suficientes para não só compor um diagnóstico, mas para torná-lo facilmente comunicável. Se afirmarmos que a psiquiatria se fez em um contexto eminentemente hospitalar, baseado em uma ciência estritamente positivista, poderemos deduzir que a visão sobre o sofrimento psíquico passa a ter um viés biologicista, na tentativa de estabelecer um estatuto patológico para tal sofrimento (Volich, 2015Volich, R. M. (2015). Hipocondria: impasses da alma, desafios do corpo (3ª ed.). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.).

Assim, o método anatomopatológico, inaugurado por Bichat, anatomista e fisiologista francês, passa a ser utilizado por Bayle, médico francês, em 1822, com o intuito de encontrar a causa biológica (o substrato orgânico) das doenças mentais, em uma tentativa vã de compreender e descrever todos os processos da loucura (Amarante, 2000Amarante, P. D. de (2000). O paradigma psiquiátrico. In O homem e a serpente: outras histórias para a loucura e a psiquiatria (cap. 2, pp. 37-64). Rio de Janeiro, RJ: Fiocruz.). Na atualidade, elas são conhecidas como psicoses orgânicas, ou seja, o estado de demência é oriundo de um quadro clínico orgânico como a paralisia geral progressiva - PGP (descoberta por Bayle), demência no Alzheimer, dentre outras. Contudo, a maioria das doenças mentais não apresenta um “corpo doente”, situação que dificulta a compreensão positivista das mesmas (Volich, 2015Volich, R. M. (2015). Hipocondria: impasses da alma, desafios do corpo (3ª ed.). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.).

Ainda assim, inúmeras escolas de psiquiatria se debruçaram em categorizar o sofrimento psíquico por meio de diversos critérios (especificidade etiológica, desenvolvimento dos sintomas, dentre outros). Com efeito, no campo clínico, a classificação diagnóstica permite ao profissional cartografar os sintomas, traçando possíveis formas de intervenção. Nesse sentido, a classificação assume status de uma importante ferramenta (Dalgalarrondo, 2008Dalgalarrondo, P. (2008).Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais (2ª ed.). Porto Alegre, RS: Artmed.).

No entanto, com o surgimento do DSM e o estabelecimento de seus cuidados à American Psychiatric Association (APA), essas classificações ganharam proporções e consequências inéditas ao deixarem de ser uma ferramenta de auxílio clínico para se tornar a “única” forma de diagnóstico e intervenção. Essas consequências não se restringiram à psiquiatria e ao discurso psicopatológico, uma vez que modificaram diversos aspectos do campo da saúde mental e, por extensão, influenciaram o olhar da sociedade em relação ao sofrimento psíquico e os destinos dados ao mesmo (Martinhago, 2017Martinhago, F. (2017). Contágio social de transtornos mentais: análise das estratégias biopolíticas de medicalização da infância. Tese (doutorado em Ciências humanas) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Recuperado de: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/185563/PICH0184-T.pdf?sequence=-1>.
https://repositorio.ufsc.br/bitstream/ha...
).

Nesse sentido, questões como o uso de nomenclaturas diagnósticas pela população como rótulos estanques do mal-estar e do sofrimento psíquico contemporâneo, assim como o excesso do uso de psicofármacos com o intuito de se extirpar tal sofrimento, interferem no processo de construção das subjetividades como aponta Martinhago (2017Martinhago, F. (2017). Contágio social de transtornos mentais: análise das estratégias biopolíticas de medicalização da infância. Tese (doutorado em Ciências humanas) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Recuperado de: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/185563/PICH0184-T.pdf?sequence=-1>.
https://repositorio.ufsc.br/bitstream/ha...
). Para Caponi (2012Caponi, S. (2012, jul./dez.). Classificar e medicar: a gestão biopolítica dos sofrimentos psíquicos. Revista Internacional Interdisciplinar INTERthesis, Florianópolis, 9(2), 101-122. Recuperado de: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/interthesis/article/view/1807-1384.2012v9n2p101>.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/int...
), essa situação evidencia uma biopolítica do sofrimento psíquico que “exclui as narrativas dos sujeitos e suas histórias de vida ou as subordina a explicações biológicas referidas a alterações ou déficit nos neurotransmissores” (p. 119).

Nesses termos, indicadores epidemiológicos constatam o seguinte: os ansiolíticos foram as substâncias de venda controlada mais consumidas pela população brasileira no período de 2007 a 2010 (Silva & Iguti, 2013Silva, T. O. da, & Iguti, A. M. (2013, mar.). Medicamentos psicotrópicos dispensados em unidade básica de saúde em grande município do Estado de São Paulo. Revista Eletrônica Gestão & Saúde, 1(1), 1726-1737. Recuperado de: <http://periodicos.unb.br/index.php/rgs/article/view/22972/16494>.
http://periodicos.unb.br/index.php/rgs/a...
); o consumo de antidepressivos entre 2005 e 2009 teve um aumento de 44,8% e a venda de metilfenidato (indicado para tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), entre 2004 e 2008, apresentou um aumento alarmante de 930% (Resende, 2014Resende, M. S. de. (2014). Transtornos mentais ou psicopatologia da vida cotidiana: a questão diagnóstica na atualidade. Dissertação (mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de São João Del Rei, São João Del Rei.). Tais indicadores não devem ser menosprezados, uma vez que revelam um abuso de diagnósticos e prescrições. Para Resende (2014)Resende, M. S. de. (2014). Transtornos mentais ou psicopatologia da vida cotidiana: a questão diagnóstica na atualidade. Dissertação (mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de São João Del Rei, São João Del Rei., essa prevalência das prescrições e do uso de psicotrópicos no Brasil se deve à associação direta entre a psiquiatria dos DSM’s e a farmacologia.

Com o advento do DSM-5 e a consolidação da nomeação do sofrimento psíquico a qualquer custo, a saúde mental toma um novo contorno, uma vez que se instala, de modo significativo, um processo de patologização da existência que culmina com a chamada medicalização da vida, em que qualquer desvio da ordem estipulada socialmente torna-se passível de medicação (Resende, 2014Resende, M. S. de. (2014). Transtornos mentais ou psicopatologia da vida cotidiana: a questão diagnóstica na atualidade. Dissertação (mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de São João Del Rei, São João Del Rei.).

Assim, “o conceito de transtorno ignora toda a história da psicopatologia e rompe de vez com as escolas de pensamento, principalmente, com a psicanálise, em uma tentativa de ignorar o sujeito” (Resende, 2014Resende, M. S. de. (2014). Transtornos mentais ou psicopatologia da vida cotidiana: a questão diagnóstica na atualidade. Dissertação (mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de São João Del Rei, São João Del Rei., pp. 12-13). Pois, como aponta Dunker (2012Dunker, C. I. L. (2012). Crítica da razão diagnóstica: psicanálise, psicopatologia, DSM. In F. Kyrillos Neto, & R. Calazans (Orgs), Psicopatologia em debate: controvérsias sobre os DSM’s (pp. 33-74). Barbacena, MG: EdUEMG.), a novidade psicanalítica está em considerar “o diagnóstico pré-constituído, dado pelo próprio paciente. Algumas vezes, todo o trabalho clínico passa pela desconstrução de um diagnóstico: educacional, familiar, trabalhista, médico, estético” (p. 35). Isso porque a clínica psicanalítica “valoriza a diagnóstica espontânea trazida pelo próprio paciente, ou seja, sua autodiagnóstica, [seus] esforços de nomeação do sintoma, na transferência e no discurso ao longo do tratamento” (Dunker, 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo., p. 277).

No discurso propalado pelo DSM, o conhecimento está nas evidências constatadas pelo olhar do médico e informadas ao paciente que receberá uma prescrição medicamentosa que eliminará o transtorno. Já no setting analítico, em vez de se preencher rapidamente um checklist, escuta-se o sujeito que sofre. Não é o caso de impor um diagnóstico, mas de convidá-lo a expor um saber sobre seu mal-estar e o sofrimento que lhe advém, nomeando um sintoma e não sendo “encaixado” em uma lista de transtornos. Nesse caso, o mal-estar não é, necessariamente, o signo de uma doença; o sofrimento, por ser singular, não se encontra descrito em um manual; e o sintoma, enquanto uma formação do inconsciente que oculta a verdade do sujeito ao mesmo tempo em que aponta para um modo singular de satisfação pulsional, não pode ter seu sentido homogeneizado.

É dessa forma que o diagnóstico classificatório prende o sujeito em uma identidade atrelada ao nome do transtorno. Assim, esse sujeito é representado por nomes como depressivo, ansioso, bipolar, hiperativo, dentre tantos outros, que saíram dos manuais classificatórios para fazer parte do nosso vocabulário ordinário. Um diagnóstico que prende o sujeito a uma condição deficitária impede o laço social com outros sujeitos, fazendo com que esse laço, que seria melhor representado por um nó, seja feito com o medicamento.

Nesse ponto, a psicanálise não coaduna com um diagnóstico classificatório como o DSM, já que a proposta de uma classificação é estabelecer critérios para a inclusão em um grupo. A psicanálise tem a proposta ética de destacar o sujeito da massa, desalienando-o, libertando-o do diagnóstico massificado imposto de fora, assim como incentivar um laço com o sintoma, enquanto produção do sujeito na qual está implicado e pela qual se responsabiliza. Se o DSM se propõe nosológico, estatístico, empírico e ateórico, ou seja, sem o objetivo de explicar as patologias, a psicanálise toma como trabalho do analista convocar o paciente a buscar o sentido do seu sintoma.

Nessa perspectiva, o sintoma se articula à subjetivação, como “processo de apropriação discursiva através do qual o mal-estar é singularizado, adquirindo assim a forma de uma demanda, de uma queixa ou de um clamor” (Dunker, 2004Dunker, C. I. L. (2004). Formas de apresentação do sofrimento psíquico: alguns tipos clínicos no Brasil contemporâneo. Revista Mal-estar e Subjetividade, 4(1), pp. 94-111. Recuperado de: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=27140105>.
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=27...
, p. 96). Em contraponto ao DSM que se fundamenta na observação empírica verticalizada em que o médico aponta a doença, a psicanálise concebe o sofrimento psíquico como uma mensagem construída pelo sujeito cujo código somente ele pode decifrar. O trabalho de decifração implica a possibilidade de o sujeito interrogar o sintoma, de tê-lo como enigma, para que possa se aproximar do lugar de onde parte a causa de seu desejo, por mais recôndita, incompleta e parcial que ela seja. E para interrogar seu sintoma, o sujeito precisa direcionar suas questões a alguém, ou seja, precisa ser escutado.

A escuta implica que as elaborações do paciente serão construídas em análise e não encontradas a priori definidas em um manual. É por isso que o método psicanalítico aponta para o caso a caso, posto que “está-se continuamente à espreita daquilo que o sintoma comporta como solução subjetiva incalculável, assim como da resposta que cada um traz a problemas para cuja saída não havia coordenadas previstas” (Teixeira, 2010Teixeira, A. (2010). Política, classes e singularidade. Revista Cult. Recuperado de: <https://revistacult.uol.com.br/home/politica-classes-e-singularidade/>.
https://revistacult.uol.com.br/home/poli...
, [s.p.]). Se a psicanálise opera com a perspectiva do sintoma é porque sustenta que há algo aí a ser resolvido e não eliminado por um medicamento, como sugere a noção de transtorno, noção que implica uma transformação epistemológica importante, como destaca Jerusalinsky (2011Jerusalinsky, A. (2011). Gotinhas e comprimidos para crianças sem história. Uma psicopatologia pós-moderna para a infância. In A. Jerusalinsky, & S. Fendrik (Orgs.). O livro negro da psicopatologia contemporânea (pp. 231-242). São Paulo, SP: Via Lettera.):

Os nomes das categorias não são inocentes, e essa transformação corresponde à ordem do discurso ter tomado o homem nesta posição de objeto sacrificial, objeto descartável, não havendo, por isso, nada a lhe ser perguntado: é um número ou dado a registrar, um elemento na conta que pode estar a mais ou a menos. (p. 238)

Com a proposta de trabalhar o um a um, a psicanálise compreende que cada caso é singular na medida em que “não parece com nada: ele [o singular] exsiste à semelhança, ou seja, ele está fora do que é comum” (Miller, 2011Miller, J.-A. (2011). Sexta lição. In Perspectivas dos “Escritos” e “Outros Escritos” de Lacan. Entre desejo e gozo (pp. 88-98). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 88). Por isso, o singular está fora do DSM porque o que se encontra em tal manual é justamente uma forma de generalização, de inclusão de um elemento - nesse caso o paciente - em uma categoria diagnóstica, dispensando-lhe o caráter de entidade única e específica. É nesse sentido que o discurso científico foraclui o sujeito (Lacan, 1965-66/1998bLacan, J. (1998b). A ciência e a verdade. In Escritos (pp. 869-892). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1965-66).), pois não leva em conta as singularidades. França Neto (2007França Neto, O. (2007). Psicanálise: arte ou ciência (II)? In O. França Neto. Freud e a sublimação: arte, ciência, amor e política (cap. 7, pp. 151-160). Belo Horizonte, MG: Editora UFMG.) define as singularidades como “premissas não apreensíveis em si pelo discurso universal” (p. 158). Esse discurso do universal é justamente o modo como se apresenta o DSM, um discurso que dita como o pathos deve ser classificado, retirando do sujeito a possibilidade de expor sua fala enquanto um discurso do singular, ou seja, impedindo o sujeito de fazer a experiência discursiva ou narrativa de seu sofrimento em primeira pessoa.

O que se percebe no contemporâneo, portanto, é uma forma de agenciamento do sofrimento em que ele é excessivamente medicalizado e judicializado por não ser suficientemente narrado. Esse excesso caminha ao lado do que é possível reconhecer como uma falência das agências de nomeação responsáveis por admitir o campo no qual o sofrimento possa permanecer como experiência discursiva.

O discurso científico suprime o sujeito, impede que ele se responsabilize por sua dimensão pathica. Por isso o tratamento que é encontrado exclusivamente fora do sujeito o desresponsabiliza de sua experiência; em outras palavras, a solução não é uma atividade do sujeito - que resta passivo - pois a solução é dada pelo medicamento.

DSM: uma repetição da lógica classificatória de Simão Bacamarte?

O DSM, “dispositivo oficial de traçar os diagnósticos psiquiátricos nos Estados Unidos” (Resende, Pontes & Calazans, 2015Resende, M. S. de, Pontes, S., & Calazans, R. (2015). O DSM-5 e suas implicações no processo de medicalização da existência. Psicologia em Revista, 21(3), 534-546. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-11682015000300008>.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
, p. 535), é organizado e editado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA). Essa tabela classificatória de diagnósticos relativos ao sofrimento psíquico, além de exercer grande influência sobre a Classificação Internacional de Transtornos Mentais da Organização Mundial de Saúde (OMS), também orienta os profissionais da saúde mental da área clínica, visando se estender a outras áreas de atuação, tais como a jurídica, escolar e organizacional.

É nesse contexto que percebemos que o referido manual se tornou escopo central da psicopatologia, na contemporaneidade, figurando como o representante de um discurso biologizante que, principalmente, a partir de sua terceira versão, passou a substituir “as grandes categorias (neurose, psicose, esquizofrenia) por descrições especificadas de fenômenos objetivos, trazendo um empobrecimento à lógica diagnóstica psiquiátrica, pois se privilegia a descrição dos sintomas ao invés da patologia” (Kyrillos Neto et al., 2011Kyrillos Neto, F. et al. (2011, dez.). DSM e psicanálise: uma discussão diagnóstica. Revista da SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo, Ribeirão Preto, 12(2), 44-55. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702011000200006>.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
, p. 47). A pretensão desse manual é “ser um instrumento científico e principalmente ateórico de diagnóstico que [consiga] ultrapassar as diversas teorias que existem no campo da psicopatologia, de modo a unificar os sistemas diagnósticos no campo do sofrimento psíquico” (Resende, Pontes & Calazans, 2015Resende, M. S. de, Pontes, S., & Calazans, R. (2015). O DSM-5 e suas implicações no processo de medicalização da existência. Psicologia em Revista, 21(3), 534-546. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-11682015000300008>.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
, p. 535).

Por esse viés, recorremos a Machado de Assis, no conto O Alienista, “inicialmente publicado em forma de folhetim no periódico ‘A Estação’ em 1881, sendo incluído em Papéis Avulsos no ano seguinte” (Andrade, Lima & Santos, 2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
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, p. 37). O romance narra as histórias de dr. Simão Bacamarte, o alienista de Itaguaí, que acredita ser o baluarte da ciência na referida cidade. Assim, busca estabelecer a loucura como fato médico objetivo e incontestável, o que o leva a inaugurar a Casa Verde, primeiro hospício do Brasil, local onde passa a internar todas as pessoas que ele diagnosticava como portadoras de alguma doença mental. Mediante seu olhar positivista criterioso, ele termina por internar toda a cidade. Porém, seu projeto acaba fracassando e ironicamente, ao final do livro, conclui que o único louco da cidade é ele próprio (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna.).

Chamou-nos a atenção o fato de Bacamarte, personagem central da história, ser um representante de uma classe burguesa brasileira que estudava no exterior e voltava ao país para aplicar os conhecimentos adquiridos na Europa (Santos, 2012Santos, C. B. do. (2012). O alienista e o mal-estar - Entre a razão e a desrazão: “para quê transpor a cerca”?. Dissertação (mestrado em Psicologia social e institucional) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Recuperado de: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/66648/000870026.pdf?sequence=1>.
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). Dotado de razão, encontrava a loucura nos outros e a lucidez somente em si próprio (Andrade, Lima & Santos, 2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
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). Assim, chega à vila de Itaguaí, aos 34 anos e profere a frase: “A Ciência é o meu emprego único; Itaguaí é o meu universo” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 3). Desse modo, vemos a vida cotidiana de uma pequena cidade ser tomada por um conhecimento estrangeiro que descartava a subjetividade das pessoas e passava a ditar os modos de viver de um povo por meio de princípios de uma ciência positivista. E nos dizeres de Bacamarte:

A loucura, objeto de meus estudos, era até agora uma ilha perdida num oceano de razão; começo a suspeitar que é um continente. [...]. Supondo o espírito humano uma vasta concha, o meu fim sr. Soares, é ver se posso extrair a pérola, que é a razão; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razão e da loucura. A razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades; fora daí insânia, insânia e só insânia. (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 27)

Para Andrade, Lima e Santos (2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
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), a personagem se autoriza a definir os critérios de diferenciação entre o comportamento normal e o patológico, por meio de um discurso imperativo, baseado na ciência, roga para si o poder de ser portador da verdade absoluta. E não é exatamente isso que o DSM-5 faz na atualidade? Um manual estadunidense que a cada versão atualiza sua lista classificatória a fim de nomear e colocar em um conjunto todos os tipos de sofrimento psíquico, de modo a controlar o que deve ou não ser considerado doença, como e quando deve ser medicalizada, a ponto de presenciarmos uma verdadeira patologização, e consequente medicalização da vida (Amarante, Pitta & Oliveira, 2018Amarante, P. D. de, Pitta, A. M. F., & Oliveira, W. F de (Orgs.). (2018). Patologização e medicalização da vida: epistemologia e política. São Paulo, SP: Zagodoni.).

Essa patologização oriunda de uma perspectiva estritamente biologicista já estava presente nos saberes de Bacamarte que apresentava explicações biológicas para todos os acontecimentos, inclusive para a escolha de sua esposa: “reunia condições fisiológicas e anatômicas de primeira ordem, digeria com facilidade, dormia regularmente, tinha bom pulso, e excelente vista; estava assim apta para dar-lhe filhos robustos, sãos e inteligentes” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 4). Por meio desse fragmento, podemos compreender como a visão organicista, que baliza a lógica classificatória do sofrimento psíquico na atualidade, baseia-se em explicações fisiopatológicas que objetivam o desenvolvimento cada vez mais sofisticado de fármacos capazes de corrigir o que o DSM julga ser um desvio neurobiológico.

Bacamarte funda a Casa Verde que seria a Casa de Orastes (sinônimo de louco) de Itaguaí. “Era na Rua Nova, a mais bela rua de Itaguaí naquele tempo, tinha cinquenta janelas por lado, um pátio no centro e numerosos cubículos para os hóspedes” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 36) e tinha como objetivo principal “estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhes os casos, descobrir enfim a causa do fenômeno e o remédio universal” (p. 36).

Em seu estudo, Andrade, Lima e Santos (2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
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) evidenciam quatro teorias explicativas de Bacamarte para a loucura: a primeira, mais simplista, definia o louco como aquele que possuía um comportamento que fugia ao comportamento da maioria, ou seja, que cometiam graves faltas morais; a segunda era mais ampla e determinista e propunha que “a razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades [...] fora daí, insânia, insânia e só insânia” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 14). Engraçado é verificar que tal definição não se encontra longe das predições da OMS sobre a saúde mental como “equilíbrio emocional entre o patrimônio interno e as exigências ou vivências externas, [que só pode ser alcançado por meio do] completo bem-estar físico, mental e social” (OPAS/OMS, 2016Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) (2016). Saúde mental depende de bem-estar físico e social, diz OMS em dia mundial. Recuperado de: <https://nacoesunidas.org/saude-mental-depende-de-bem-estar-fisico-e-social-diz-oms-em-dia-mundial/>.
https://nacoesunidas.org/saude-mental-de...
, s./p.).

Retomando, “a terceira teoria qualificava a loucura em tipologias que se restringem a quatro categorias: os leais, os justos, os honestos, os imparciais. O equilíbrio dessas qualidades implicaria lucidez, sendo o desequilíbrio o contrário” (Andrade, Lima & Santos, 2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
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, p. 45); e na quarta e mais controversa de suas teorias, o médico de Itaguaí compreendia que ele era o único louco, pois reunia em si todas as características que levavam ao “perfeito equilíbrio mental e moral; pareceu-lhe que possuía a sagacidade, a paciência, a perseverança, a tolerância, a veracidade, o vigor moral, a lealdade, todas as qualidades enfim que podem formar um acabado mentecapto” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 52).

Assis (2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna.), nessa última teoria, surpreende seus leitores ao promover um giro, uma operação de avesso que nos remete à dialética hegeliana do senhor e do escravo, pois se a lei da razão é universal e sem trégua para Bacamarte, ele passa de mestre a escravo. Quando Freud percebeu essa dinâmica científica criou a psicanálise ao se destituir do saber médico e, consequentemente, do discurso do mestre para que o saber inconsciente pudesse emergir (Dunker, 2015Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo, SP: Boitempo.). Isso porque a prática psicanalítica revela que o saber se situa no campo do Outro e opera, no sujeito, um saber que ele não sabe que possui. Com efeito, esse campo do Outro “é o campo da cultura, é o que nos precede e nos constitui, é a condição para o surgimento dos sujeitos, de e na cultura” (Santos, 2012Santos, C. B. do. (2012). O alienista e o mal-estar - Entre a razão e a desrazão: “para quê transpor a cerca”?. Dissertação (mestrado em Psicologia social e institucional) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Recuperado de: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/66648/000870026.pdf?sequence=1>.
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, p. 69).

Depreende-se que tanto Assis quanto Freud podem ser compreendidos como pensadores da cultura, cada qual conjecturando à sua maneira os problemas que abarcam a ciência médica de seu tempo (Santos, 2012Santos, C. B. do. (2012). O alienista e o mal-estar - Entre a razão e a desrazão: “para quê transpor a cerca”?. Dissertação (mestrado em Psicologia social e institucional) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Recuperado de: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/66648/000870026.pdf?sequence=1>.
https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/hand...
).

As teorias sobre a loucura formuladas pelo alienista, por sua vez, evidenciam uma crítica interessante ao modo de construção do conhecimento científico que se justifica por meio de explicações organizacionistas, mas possuem como pano de fundo uma relação moral. Isso nos leva a perceber que o “não dito” de um sistema classificatório do sofrimento psíquico está no poder que o saber passa a exercer sobre os corpos, dinâmica social que Lacan (1969-70/1992)Lacan, J. (1992). O seminário. Livro 17. O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar. (Trabalho original publicado em 1969-70). nomeou de discurso do mestre, como vimos no início deste artigo, que na lógica do DSM, semelhante ao romance machadiano, reveste-se do discurso médico-científico.

Adiante, podemos ainda analisar a lógica de classificação de Bacamarte:

O alienista [...] dividiu-os primeiro em duas classes principais: os furiosos e os mansos; daí passou às subclasses, monomanias, delírios, alucinações diversas. Isto feito, começou um estudo apurado e contínuo; analisava os hábitos de cada louco, as horas de acesso, as aversões, as simpatias, as palavras, os gestos, as tendências. Aberta a Casa Verde, assistimos a uma torrente de loucos: eram furiosos, eram mansos, eram monomaníacos, era toda a família dos deserdados de espírito. Ao cabo de quatro meses, a Casa Verde era uma povoação. (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 6)

Uma das leituras possíveis da obra machadiana acredita que a fundação da Casa Verde esteja “relacionada ao movimento higienista, datado no Brasil no final do século XIX e início do XX. O discurso higienista representava uma nova perspectiva que se propunha a cuidar da população, educando-a e ensinando-lhe novos hábitos” (Andrade, Lima & Santos, 2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6...
, p. 44). Ainda é preciso ressaltar que a lógica classificatória denunciada por Machado de Assis não se mostra estranha à perspectiva do DSM que se efetua por meio da descrição de sintomas.

É nesse contexto que Quinet (2006Quinet, A. (2006). Psicose e laço social. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 67) aponta essa classificação apresentada por Machado de Assis como “o embrião da psiquiatria”, pois parece vislumbrar uma questão que estava no ventre de futuras indagações, a saber, o que é normal e o que é patológico, “com a definição atual, que é a de todos os tempos, [o alienista] acrescentou, a loucura e a razão estão perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e a outra começa. Para quê transpor a cerca?” (Assis, 2008Assis, J. M. M. de (2008). O alienista e outros contos. São Paulo, SP: Moderna., p. 14). Pergunta que habitará não só os pensamentos freudianos, mas muitos pesquisadores como Canguilhem (1995Canguilhem, G. (1995).O normal e o patológico (4ª ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária.) a teorizar as malhas dessa distinção e muitos estudiosos da psicopatologia a se demorarem no exercício dessa reflexão.

A discussão entre normal e patológico torna possível constatar duas questões cruciais: a primeira diz respeito ao quanto é tênue a linha que separa o dito normal do patológico, o que nos faz recair em um tema muito caro para a psicanálise e, principalmente, para a psicopatologia na atualidade, é possível definir normal e patológico?, será que cabe aos profissionais da saúde mental utilizar essa rotulação? Com essas perguntas, a segunda questão se enseja: se estamos falando de um normal e um patológico, qual é o parâmetro utilizado para tal demarcação? Quem está habilitado a determinar tal parâmetro? Baseado em quais critérios?

Canguilhem (1995Canguilhem, G. (1995).O normal e o patológico (4ª ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária.) trabalha justamente com essa questão ao perguntar se existe uma ciência do normal e do patológico. De certa forma, o desenrolar das peripécias de Bacamarte deixa clara a resposta que ensaia na contemporaneidade de que normal e patológico dizem respeito ao discurso hegemônico e ao discurso marginal (que está à margem) de uma sociedade. Assim, tudo que foge ao padrão da normalidade vigente, ou seja, aquilo que não está dentro do modelo social, encontra-se à margem e, portanto, é considerado louco, (a)normal ou deficitário, como dita o DSM. Portanto, “Machado de Assis procura evidenciar no conto que a ciência não se manifesta apenas como um conhecimento superior e definitivo daquilo que se pode provar, mas que ela é feita também por meio daquilo que se pode persuadir” (Andrade, Lima & Santos, 2014Andrade, M. V., Lima, A. F. de, & Santos, M. E. A. dos (2014). A razão e a loucura na literatura: um estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, 6(1), 37-47. Recuperado de: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6n1/v6n1a06.pdf>.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpsaude/v6...
, p. 44).

Nesse sentido, verificamos que se na atualidade a loucura venceu os muros dos manicômios com a reforma psiquiátrica, ela permanece, mais do que nunca, aprisionada entre os muros do discurso do mestre, revestido pelos saberes médico-científicos, na letra que marca e molda as construções subjetivas que não conseguem redirecionar sua percepção do olhar classificatório e rotulante para o campo da escuta do sujeito.

Se pensarmos que realidade e ficção se intercruzam a ponto de não sermos capazes de delimitar onde começa uma e onde termina a outra, poderemos propor que o DSM é uma forma de repetição da lógica classificatória desenvolvida por Simão Bacamarte. Estranho é perceber que mesmo tal lógica se mostrando “furada”, ainda assim, permanece enquanto discurso hegemônico capaz de mover não somente o campo da saúde mental, mas também, e principalmente, a mídia, a economia e a política de praticamente todas as sociedades do mundo.

Considerações finais: a loucura entre os muros do discurso

O percurso desta investigação foi construído a partir do diálogo entre pensamentos da psicopatologia e a representação de aspectos culturais por meio da ficção de Machado de Assis com as peripécias de Simão Bacamarte em Itaguaí. Proferimos, então, o encontro de pathos com a literatura, explorando a capacidade das narrativas literárias atravessarem seu contexto de criação, alcançando os modos de subjetivação de dada época e podendo ser lançados como problemas conceituais mais contemporâneos. Assim, chamou-nos a atenção a atualidade de um tema problematizado há mais de um século e que, ainda hoje, figura como impasse no campo psi, a saber, a classificação do sofrimento psíquico e seus quadros nosográficos que pretendem encerrar o ser humano em uma dimensão totalizante.

Fato é que Machado de Assis parece antecipar inúmeras situações que podem ser verificadas no contemporâneo, dentre elas, destacamos: o excesso da lógica classificatória e seu viés estritamente biologizante; o limiar entre normal e patológico, loucura e liberdade, que surgem direta ou indiretamente no discurso vigente do DSM. O conto é importante, pois evidencia a crítica à concepção científica positivista e sua ineficiência de pensar o ser humano e seus sofrimentos psíquicos.

Percebemos que a reforma psiquiátrica derrubou os muros dos hospitais psiquiátricos e acreditávamos que esses muros físicos eram os responsáveis por separar, classificar e excluir as pessoas e suas dores psíquicas. Assim, tomamos a psicanálise como aporte teórico para pensar esse movimento psicopatológico da atualidade, no qual os muros do discurso aprisionam muito mais e aparecem expressos pela excessiva classificação diagnóstica, nomeação em série do sofrimento psíquico presente no DSM, e consequente uso abusivo de psicofármacos que insiste em excluir o sujeito, uma vez que neutraliza aquilo que faz o sujeito do inconsciente falar.

Portanto, cabe indagar o significado desse aprisionamento: a quem serve a construção de subjetividades que não admitem mais o sofrimento como parte constitutiva da vida? Pois como salienta Lacan (1958/1998a)Lacan, J. (1998a). A direção da cura e os princípios de seu poder. In Escritos. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar . (Trabalho original publicado em 1958)., “a impotência em sustentar autenticamente uma práxis reduz-se, como é comum na história dos homens, ao exercício de um poder” (p. 592).

  • Financiamento/Funding: Este trabalho não recebeu apoio / This work received no funding.
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    Para um aprofundamento do assunto, recomendamos a leitura de Karwowski (2015)Karwowski, S. L. (2015, jan.-jun.). Por um entendimento do que se chama psicopatologia fenomenológica. Revista da Abordagem Gestáltica - Phenomenological Studies, Goiânia, 21(1), 62-73. Recuperado de: <http://www.redalyc.org/html/3577/357742812007/>.
    http://www.redalyc.org/html/3577/3577428...
    , “Por um entendimento do que se chama psicopatologia fenomenológica”.

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Editora/Editor: Profa. Dra. Sonia Leite

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    17 Jul 2018
  • Revisado
    21 Nov 2018
  • Aceito
    13 Jul 2019
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