Novos registros de distribuição geográfica em Sobralia (Orchidaceae: Epidendroideae) para a Região Centro-Oeste do Brasil

New records of geographic distribution in Sobralia (Orchidaceae: Epidendroideae) for the Central-West region of Brazil

Resumo

O presente trabalho apresenta os novos registros de Sobralia bletiae e S. macrophylla para o estado do Mato Grosso. São apresentadas as descrições, comentários taxonômicos e ecológicos, e uma prancha fotográfica das espécies estudadas.

Palavras-chave:
Amazônia; epífita; nova ocorrência; orquídea; região neotropical

Abstract

This paper presents new records of Sobralia bletiae and S. macrophylla in the Mato Grosso state. Descriptions, taxonomic and ecological commentaries, and a photo board of the studied species are presented.

Key words:
Amazon; epiphyte; new record; orchid; neotropics

Sobralia Ruiz & Pav. é constituído por cerca de 155 espécies, distribuídas do México até o Brasil (Govaerts 2016). Apesar de possuir flores vistosas, estas são delicadas e possuem uma vida curta (normalmente um dia), dificultando sua preservação e tornado o gênero de difícil classificação (Dressler & Pupulin 2014). Neste contexto, o exame de material fresco ajuda muito na verificação morfológica e consequente identificação taxonômica.

No sistema de classificação atual, Sobralia está enquadrada na família Orchidaceae, subfamília Epidendroideae e tribo Sobralieae (Chase et al. 2015). Apesar da monofilia de Sobralieae, estudos filogenéticos moleculares apontam para o polifiletismo de Sobralia (Neubig et al. 2011).

Dentre as 23 espécies do gênero que ocorrem no Brasil, são citadas para o estado do Mato Grosso a ocorrência de cinco: Sobralia augustaHoehne; S. cataractarumHoehne; S. liliastrumSalzm. ex Lindl.; S. rondoniiHoehne; e S. sessilisLindl. (BFG 2015).

Durante o resgate de flora da Usina Hidrelétrica Colíder, no estado do Mato Grosso, foi coletado material de Sobralia bletiaeRchb.f. e S. macrophyllaRchb.f., que correspondem a novos registros de distribuição geográfica para este estado.

A Usina encontra-se no Rio Teles Pires, nos municípios de Cláudia, Colíder, Itaúba e Nova Canaã do Norte, na região Centro-Norte do estado, borda Sul da Amazônia brasileira, região de ecótono entre os domínios Amazônia e Cerrado (mapa da área em Engels & Ferneda Rocha 2016).

O material coletado foi herborizado segundo Fidalgo & Bononi (1989) e destinado para depósito nos Herbários CNMT, HERBAM, MBM, acrônimos de acordo com Thiers (continuamente atualizado) e TANG, Herbário da Universidade do Estado de Mato Grosso - Tangará da Serra, não indexado no Index Herbariorum.

O presente trabalho apresenta estes novos registros, trazendo descrições, comentários taxonômicos e ecológicos, bem como uma prancha fotográfica destas espécies.

Taxonomia

1. Sobralia bletiaeRchb.f., Bot. Zeitung (Berlin) 10: 713. 1852.

= Sobralia suaveolensRchb.f., Gard. Chron., n.s., 9: 622. 1878.

= Sobralia epiphyticaSchltr., Repert. Spec. Nov. Regni Veg. 12: 213. 1913.Fig. 1a-f

Figura 1
a-f. Sobralia bletiae - a. hábito; b-d. flor; b. vista frontal; c. vista lateral; d. vista fronto-lateral; e. perianto distendido; f. detalhe do labelo. g-l. S. macrophylla - g. hábito; h-j. flor; h. vista frontal; i. vista lateral; j. vista fronto-lateral; k. perianto distendido; l. detalhe do labelo.
Figure 1
a-f. Sobralia bletiae – a. habit; b-d. flower; b. frontal view; c. lateral view; d. fronto-lateral view; e. flat perianth; f. detail of lip. g-l. S. macrophylla – g. habit; h-j. flower; h. frontal view; i. lateral view; j. fronto-lateral view; k. flat perianth; l. detail of lip.

Erva epífita, cespitosa. Raízes 2-3 mm larg., sub-cilíndricas, castanha. Rizoma ca. 2 mm larg., cilíndrico, castanho, ca. 1 mm entre cormos. Caule colmoso 25 × 0,2 cm, cilíndrico. Folhas 11,6-13,4 × 2,6-3,1 cm, lanceolado-elípticas, planas, verdes; base aguda, margem inteira, ápice agudo. Inflorescência apical, palciflora, uma flor por vez (flores não consecutivas); pedúnculo e raque inconspícuas, internos a bainha foliar distal. Flor ressupinada; ovário + pedicelo ca. 2 × 0,1 cm, sub-triangular, alvo; sépalas livres entre si, amarelas claras; sépala dorsal 2,4-2,8 × 0,5 cm, elíptica, base aguda, margem inteira, ápice agudo; sépalas laterais 2,2-2,5 × 0,4-0,6 cm, elíptico-lanceoladas, base aguda, margem inteira, ápice agudo; pétalas 2,2-2,5 × 0,4-0,5 cm, elíptico-lanceoladas, base aguda, margem inteira, ápice agudo, amarelo claro; labelo 2,1-2,2 × 1-1,2 cm, trilobado, alvo amarelado com centro e carenas amarelo mais escuro, lobos laterais ca. 1,3 × 0,3 cm, obovalados, margem lisa se tornando fimbriada no terço apical, lobo central ca. 0,5 × 0,4 cm, arredondado-deltoide, margem fimbriada, obtuso-acuminado, carenas fimbriadas; coluna ca. 1,4 × 0,1 cm, alva; antera ca. 1 mm, globosa. Frutos não vistos.

Material examinado: BRASIL. MATO GROSSO: Nova Canaã do Norte, Resgate de FLORA da UHE Colíder, lote A de supressão. 28.II.2015, fl., M.E. Engels 3155 (MBM).

Sobralia bletiaeocorre na Costa Rica, Nicarágua, Panamá, Guiana Francesa, Suriname, Venezuela, Equador, Peru e Brasil (Govaerts 2016). No Brasil ocorre na região Norte, nos estados do Amazonas, Amapá, Pará e Rondônia (BFG 2015), sendo novo registro de distribuição geográfica para a região Centro Oeste, no estado do Mato Grosso.

Esta espécie pode ser reconhecida, dentre as demais que ocorrem no estado do Mato Grosso, pela forma de vida epífita; pelo porte pequeno (até ca. 30 cm); flores com pétalas e sépalas amarelas claras e labelo alvo amarelado com centro e carenas amarelo mais escuro; e pelo labelo trilobado com margem e carenas fimbriadas. Ocorre como epífita na altura do estrato médio (floresta com 15-20 m de altura), em áreas úmidas ou periodicamente inundáveis. Floração em fevereiro. Pouco frequente na área onde foi coletada.

2. Sobralia macrophyllaRchb.f., Bot. Zeitung (Berlin) 10: 713.1852.

= Sobralia chloranthaHook., Bot. Mag. 78: t. 4682. 1852. ≡ Cattleya chlorantha(Hook.) Beer, Prakt. Stud. Orchid.: 209. 1854.

= Cyathoglottis macranthaLem., Jard. Fleur. 4(1): 855. 1854.

= Sobralia rolfeanaSchltr., Repert. Spec. Nov. Regni Veg. Beih. 17: 12. 1922.Fig. 1g-l

Erva epífita, cespitosa. Raízes 0,7-1 cm larg., cilíndricas, castanha. Rizoma ca. 8 mm larg., cilíndrico, verde acastanhado, ca. 1 cm entre colmos. Caule colmoso 30-80 × 0,4-0,5 cm, cilíndrico. Folhas (6-)12,8-20,7 × (3,1-)4,8-7,6 cm, elípticas, planas, verdes; base aguda, margem inteira, ápice agudo a acuminado. Inflorescência apical, palciflora, uma flor por vez (flores não consecutivas); pedúnculo e raque inconspícuas, internos a bainha foliar distal. Flor ressupinada; ovário + pedicelo 2,8-4,5 × 0,3-0,4 cm, sub-triangular, alvo; sépalas conadas ca. 1 cm basal, alvas; sépala dorsal 5-7,5 × 1,1-1,4 cm, elíptica a elíptico oblanceolada, base aguda, margem inteira, ápice agudo a agudo acuminado; sépalas laterais 5-7,5 × 1,2-1,5 cm, elípticas a elíptico oblanceoladas, base aguda, margem inteira, ápice agudo acuminado; pétalas 5-6,2 × 1,2-1,5 cm, oblanceoladas, base aguda, margem inteira, ápice agudo a obtuso, alvas; labelo 5,5-6,7 × 3,8-4,4 cm, obovado, base cuneada, margem crespa, ápice retuso, alva com centro amarelo claro; coluna 3-4 × 0,6-0,9 cm, sub-triangular, alva; antera 0,4-0,5 × 0,3-0,4 cm, elíptica, alvo amarelado. Fruto maduro passados 10-12,5 × 1,8-4 cm, castanho quando seco e deiscente.

Material examinado: BRASIL. MATO GROSSO: Colíder, Resgate de FLORA da UHE Colíder, lote B de supressão, 10.XI.2014, fl. e fr., M.E. Engels 4072 (HERBAM, MBM). Itaúba, Resgate de FLORA da UHE Colíder, lote E de supressão, 14.XII.2014, fl., M.E. Engels 3278 (HERBAM, MBM, TANG, CNMT); lote D de supressão, 23.I.2015, fl., M.E. Engels 4071 (MBM); lote G de supressão, 28.X.2015, fl., M.E. Engels 3747 (HERBAM, MBM).

Sobralia macrophylla ocorre na Costa Rica, Nicarágua, Panamá, Guiana Francesa, Guiana, Suriname, Venezuela, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Brasil (Govaerts 2016). No Brasil ocorre nas regiões Norte e Nordeste, nos estados do Amazonas, Amapá, Pará e Maranhão (BFG 2015), deste modo, este é um novo registro de distribuição geográfica para a região Centro Oeste, no estado do Mato Grosso, além de representar o limite austral da espécie.

Esta espécie pode ser reconhecida, dentre as demais que ocorrem no estado do Mato Grosso, pela forma de vida epífita; folhas grandes e vistosas (até ca. 20 cm compr.), elípticas e verde escuras; pela inflorescência com pedúnculo e raque inconspícuos, internos a bainha foliar distal; flores alvas com centro do labelo amarelo; sépalas com base conadas; labelo inteiro, obovado, e margem crespa. Foi encontrada como epífita no estrato médio (floresta com 15-20 m de altura) de matas paludosas, periodicamente inundáveis ou nas margens de pequenos riachos que desembocam no rio Teles Pires. A forma de vida de S. macrophylla no Brasil é citada como terrícola (BFG 2015), contudo, na área de estudo apenas foi encontrada como epífita. Floração de outubro a janeiro.

O presente trabalho contribui com o conhecimento de Sobralia no estado de Mato Grosso, com a ampliação da distribuição geográfica conhecida de S. bletiae e de S. macrophylla para este estado e para a região Centro-Oeste, bem como fornece dados taxonômicos e ecológicos destas espécies.

Há poucos trabalhos florísticos e taxonômicos realizados no Mato Grosso (Koch & Silva 2012), e o desenvolvimento de estudos no estado resulta no aparecimento de diversas novidades (ver Engels et al. 2016). No caso de Sobralia, é perceptível que para um satisfatório conhecimento do gênero, é necessária a realização de um estudo que abranja uma significativa amostragem em todo o território mato-grossense, para saber a totalidade de espécies que ocorrem e sua real distribuição, o que permite obter dados taxonômicos, ecológicos e de conservação mais precisos.

• Editor de área: Dr. Luiz Menini Neto

Agradecimentos

À Companhia Paranaense de Energia (COPEL), por permitir e incentivar a publicação dos dados aqui contidos. Ao Consórcio CIA Ambiental e seus colaboradores.

Referências

• BFG - The Brazil Flora Group (2015) Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.
• Chase MW, Cameron KM, Freudenstein JV, Pridgeon AM, Salazar G, van den Berg C & Schuiteman (2015) An updated classification of Orchidaceae. Botanical journal of the Linnean Society 177: 151-174.
• Dressler RL & Pupulin F (2014) Two new white-flowered species of Sobralia (Orchidaceae) from Costa Rica. Harvard Papers in Botany 19: 117-122.
• Engels ME & Ferneda Rocha LC (2016) Vanilla appendiculata (Orchidaceae): primeiro registro para o estado do Mato Grosso, Brasil. Rodriguésia 67: 855-858.
• Engels ME, Ferneda Rocha LC & Petini-Benelli A (2016) A new species of Catasetum (Orchidaceae, Epidendroideae, Cymbidieae) from the Southern brazilian Amazon. Lankesteriana 16: 329-333.
• Fidalgo O & Bononi VLR (1989) Técnicas de coleta, preservação e herborização de material botânico. Reimpressão. Instituto de Botânica, São Paulo. 62p.
• Govaerts R (2016) World Checklist of Orchidaceae. Facilitated by the Royal Botanic Gardens, Kew. Disponível em <http://apps.kew.org/wcsp>. Acesso em 15 janeiro 2017.
  » http://apps.kew.org/wcsp
• Koch AK & Silva CA (2012) Orquídeas nativas de Mato Grosso. Carlini & Caniato Editorial, Cuiabá. 112p.
• Neubig KM, Whitten WM, Blanco MA, Endara L, Williams NH & Korhler S (2011) Preliminary molecular phylogenetics of Sobralia and relatives (Orchidaceae: Sobralieae). Lankesteriana 11: 307-317.
• Thiers B [continuamente atualizado] Index Herbariorum: The Herbaria of the world. Disponível em <http:// sweetgum.nybg.org/ih/>. Acesso em 15 janeiro 2017.
  » http:// sweetgum.nybg.org/ih/

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jul-Sep 2017

Histórico

• Recebido
  19 Ago 2016
• Aceito
  25 Jan 2017