Análise do preparo de canais radiculares utilizando-se a diafanização

Analysis of root canal preparation using to clearing technique

Resumos

Introdução:

Os tratamentos endodônticos têm evoluído com a finalidade de preparar o sistema de canais radiculares para receber uma obturação hermética deste sistema e assim preservar a saúde dos tecidos periapicais e/ou restabelecê-la, quando acometidos por lesões. Tais metas são alcançadas mediante obediência de uma adequada preparação químico-mecânica dos canais radiculares, seguida da obturação dos mesmos.

Objetivo:

Analisar o preparo químico-mecânico dos canais radiculares realizado in vitro pelos alunos do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo, utilizando-se da diafanização.

Material e método:

Foram utilizados 88 espécimes dentários (caninos inferiores), cujo preparo químico-mecânico in vitro foi realizado pelos alunos. Esses dentes foram radiografados e posteriormente submetidos à técnica de diafanização. Nestes, se analisou a qualidade das técnicas de preparo químico-mecânico quanto à modelagem do canal radicular e, comparativamente, o melhor resultado das mesmas; visualizaram-se as características anatômicas do sistema de canais radiculares, e compararam-se o exame radiográfico e a diafanização dos dentes.

Resultado:

Quanto à modelagem dos canais radiculares analisados pela técnica da diafanização, 67% foram modelados com significância estatística de 0,002 (p<0,05) e, quanto à concordância dos resultados da variável modelagem do canal, entre o exame radiográfico e a técnica da diafanização, obteve-se um valor Kappa=0,511, mostrando uma concordância moderada entre as duas técnicas de visualização.

Conclusão:

A radiografia revelou-se limitada na visualização da modelagem dos canais e das características anatômicas do sistema de canais radiculares, e a diafanização é uma técnica de visualização acessível e imprescindível para a evolução do ensino na Endodontia.

Endodontia; preparo do canal radicular; diafanização

Introduction:

The endodontic treatments have evolved in order to prepare the root canal system to receive a hermetic filling of the system and preserve the health of periapical and/or restore it when affected by tissue injury. These are achieved through obedience the a suitable chemical-mechanical preparation, then the filling of the same.

Objective:

Analyze the chemo-mechanical preparation of root canals performed in vitro by students of Dentistry of the Federal University of Espírito Santo, using the clearing technique.

Material and method:

88 dental specimens (lower canines) were used, and provided to students who performed in vitro preparation chemo-mechanical. These specimens were radiographed and subsequently submitted to leaf clearing technique. The quality of the preparation chemical-mechanical techniques was examined concern the shaping of the root canal and compared the best result of the same, visualized the anatomical features of the root canal system, compared the radiographic exam of the teeth and clearing technique.

Result:

the modeling of root canals analyzed by the clearing technique, 67% were modeled with a statistical significance of 0.002 (p<0.05) and as the concordance of the results of variable modeling of the root canals between the radiographic examination and clearing technique yielded a Kappa value=0.511 showing a moderate agreement between the two visualization techniques.

Conclusion:

The radiography proved to be limited in view of the channel modeling and also in view of the anatomical features of the root canal system, and also that the clearing technique is a visualization technique accessible and essential to the evolution of education in Endodontics.

Endodontics; root canal preparation; clearing technique

INTRODUÇÃO

O tratamento endodôntico tem, então, por finalidade possibilitar a permanência, na cavidade bucal, do elemento dentário sem vitalidade, para que este continue a exercer suas funções na fisiologia bucal, sem se tornar um agente propiciador de doenças aos tecidos perirradiculares, segundo afirmam Grossman¹, Sommer et al.² e Cohen, Hargreaves³.

Cohen, Hargreaves³ e Leonardo, Leonardo⁴ afirmam que para se alcançar, então, o sucesso do tratamento endodôntico, é necessária uma completa remoção de restos orgânicos pulpares e possíveis microrganismos instalados dentro dos canais radiculares, ampliando o diâmetro destes, dando a forma adequada para acomodar o material obturador (processo de sanificação e modelagem) e para seu completo preenchimento com materiais biocompatíveis, impedindo sua contaminação.

Assim, os tratamentos endodônticos têm evoluído com a finalidade de preparar o sistema de canais radiculares para receber uma obturação hermética deste sistema e assim preservar a saúde dos tecidos periapicais e/ou restabelecê-la, quando acometidos por lesões. Tais metas são alcançadas mediante obediência a dois requisitos essenciais: primeiro, um profundo conhecimento da morfologia interna dos canais radiculares, inclusive das suas características morfológicas mais frequentes; e segundo, uma adequada preparação químico-mecânica, seguida da obturação dos mesmos, segundo Ferrari^*.

Os insucessos na terapia endodôntica são, na maioria das vezes, resultantes de falhas técnicas, muitas destas durante a etapa de preparo biomecânico do sistema de canais radiculares. Falhas estas que impossibilitam a conclusão adequada dos procedimentos intracanais posteriores (obturação), voltados para o controle e a prevenção da infecção endodôntica, segundo Aryanpour et al.⁵ e Lopes, Siqueira Jr.⁶.

Zhang et al.⁷ afirmaram que houve uma grande evolução do tratamento endodôntico após o surgimento, a evolução e a aplicação de métodos de visualização no pré, trans e pós-tratamento; e, principalmente, no estudo da anatomia interna dos dentes, segundo. Muitas técnicas têm sido empregadas para o estudo da anatomia dental, principalmente do endodonto. Entre estas, têm sido incluídos estudos radiográficos, desgastes, cortes histológicos, diafanização, injeção de corantes associados ou não à diafanização, técnicas de processamento digital, isótopos radioativos, microscopia eletrônica e tomografia computadorizada, segundo Neelakantan et al.⁸.

A prática laboratorial nos cursos de Endodontia utilizando dentes in vitro permite o estudo da Anatomia externa e interna, observar a realização do protocolo do tratamento endodôntico com maior detalhe, e permite ao corpo docente avaliar de forma mais apurada o resultado final utilizando-se da técnica de diafanização, segundo Picosse^**, Omer et al.⁹, Azeredo et al.¹⁰ e Pécora^***.

O presente estudo tem por objetivo analisar o preparo químico-mecânico de canais radiculares realizados in vitro, na Disciplina de Endodontia I, pelos alunos do 5º período do Curso de Odontologia da UFES, utilizando-se da diafanização, verificando os conhecimentos e as habilidades adquiridas por eles. Objetiva-se, também, demonstrar a relevância da diafanização como método de avaliação dos canais modelados endodonticamente em dentes in vitro nos cursos de Graduação e Pós-Graduação, para a percepção das possíveis falhas no aprendizado e assim corrigi-las.

MATERIAL E MÉTODO

A presente pesquisa observacional e quantitativa foi realizada in vitro, para análise do preparo químico-mecânico dos canais radiculares executado em dentes humanos previamente extraídos. Foi executada no âmbito laboratorial, pelos alunos do 5º período do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Esta avaliação foi obtida através da análise radiográfica e da utilização da técnica de diafanização.

Foram utilizados 88 espécimes dentários hígidos (caninos inferiores) escolhidos de forma aleatória, que foram adquiridos através do Banco de Dentes Humanos da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FAOUSP - Divisão Dentes Permanentes), com sua devida autorização. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo, sob o número de registro no CEP - 266/11.

Os dentes foram cedidos a 44 acadêmicos que cursavam, no ano de 2011, a Disciplina de Endodontia I (laboratorial) do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Espírito Santo.

Foram distribuídos dois dentes para cada acadêmico de forma aleatória, sem os mesmos saberem que iriam ser utilizados na pesquisa. Os graduandos realizaram então a prática laboratorial de preparo químico-mecânico dos canais radiculares, seguindo o planejamento adotado pela Disciplina, como se segue:

1. Abertura Coronária

Foi realizada para o grupo de dente escolhido (caninos inferiores), de acordo com os padrões endodônticos preconizados pela literatura, segundo Leonardo, Leonardo⁴ e Lopes, Siqueira Jr.⁶.

2. Técnicas de Preparo Químico-mecânico do Sistema de Canais Radiculares

Antes do início do preparo, realizaram-se a exploração do canal radicular e a odontometria, registrada através de radiografia periapical inicial. A modelagem foi feita segundo o que preconiza autores como Leonardo, Leonardo⁴, utilizando duas técnicas de preparo químico-mecânico, sendo uma para cada dente cedido: a Técnica Escalonada ápice-Coroa e a Técnica de Oregon Modificada ou Biescalonada.

A irrigação foi realizada, criteriosamente, utilizando-se hipoclorito de sódio na concentração de 5,25% - devidamente manipulado para se conseguir essa concentração - e executada a cada período do preparo. Posteriormente ao preparo do canal, foi feita irrigação com EDTA a 17%, que consistiu de introdução de uma lima de menor diâmetro fazendo movimentos oscilatórios no interior do canal por 30 segundos para movimentação da solução, repetindo-se esse procedimento por mais uma vez e, ao final, novamente realizada a irrigação com hipoclorito de sódio, semelhantemente à utilizada no preparo do canal. Após esta etapa, foi feita a secagem do canal com cones de papel.

Depois de concluída a etapa de preparo químico-mecânico, os dentes foram devidamente identificados. Essa identificação permitia o acesso à pasta com as especificações de cada dente, a técnica de preparo químico-mecânico realizada pelo acadêmico e as radiografias do processo de modelagem do canal.

As radiografias pré-operatórias e transoperatórias - assim como a pasta, requerida pela Disciplina de Endodontia I, com a técnica de preparo químico-mecânico usada para cada dente, a odontometria, as limas utilizadas e as dificuldades encontradas na realização do preparo - foram aproveitadas para a realização do estudo, que consistiu em submeter esses dentes preparados endodonticamente a radiografias pós-operatórias e à técnica de Diafanização.

3. Técnica Radiográfica

Os dentes foram colocados sob as películas (Kodak Dental Intraoral E-Speed Film) radiográficas e afixados com cera utilidade no sentido vestibulolingual com a face lingual voltada para a película, posicionando-os de tal forma que os feixes de Raios X (Raios-X Timex 70 E - GNATU) incidissem de forma perpendicular ao dispositivo. O colimador foi colocado, com auxílio de um posicionador, de forma a estar paralelo com o eixo do dispositivo para, assim, adquirir-se uma imagem com dimensão mais próxima da dimensão do objeto (dente).

Essas películas foram devidamente processadas (processo de obtenção da imagem na película radiográfica), utilizando uma padronização na utilização das soluções (revelador - Kodak Dental Revelador 475ml e fixador - Kodak Dental Fixador 475ml) e no tempo de processamento. Foi realizada também uma tomada radiográfica no sentido mesiodistal dos dentes, para se conseguir uma observação que não é possível in vivo.

4. Técnica de Diafanização

Com o auxílio de uma seringa carpule, uma agulha descartável e anestubos contendo no seu interior tinta nankin (Acrilex Nankin Profissional - Tinta China Preto 520 (20ml)), os dentes foram injetados com a tinta, com a finalidade de ocupar todo o sistema de canais. Em seguida, os espécimes foram imersos na tinta, centrifugados, aquecidos em uma estufa regulada para 60°C durante uma hora e depois secos naturalmente. Note-se que este procedimento foi repetido.

Os dentes foram vedados em sua parte coronária, local em que fora feito o acesso cirúrgico, com resina acrílica autopolimerizável (Dencôr Clássico - Resina acrílica autopolimerizável). Este procedimento tem como objetivo impedir a perda do corante injetado anteriormente, durante as fases subsequentes do processo. Posteriormente, os dentes foram limpos externamente.

A descalcificação seguiu-se com a imersão dos espécimes em ácido clorídrico a 10%, durante aproximadamente 72 horas, com trocas diárias da solução até se obter o estado borrachoide requerido para sua descalcificação. Obtido o ponto específico de descalcificação, estes dentes então foram lavados em água corrente por 24 horas.

Os dentes foram então imersos em soluções de álcool com concentrações crescentes: 50%, 60%, 70%, 80%, 90%, 95% e absoluto, permanecendo nestas por uma hora em cada. Os espécimes foram submetidos a uma segunda troca com álcool absoluto, permanecendo neste por 24 horas. Posteriormente, foram imersos em xilol por 48 horas, com troca do mesmo, após 24 horas. Em sequência, os espécimes foram colocados em salicilato de metila e mantidos para serem analisados e fotografados.

Para visualização e análise, um observador calibrado utilizou uma lupa estereoscópica (Olympus SZ - 0.5x objetiva / ocular 10×.) e as imagens foram capturadas por uma máquina fotográfica digital

5. Avaliação dos Dentes

Para análise do preparo químico-mecânico realizado nos dentes submetidos à técnica de diafanização, foi criada uma ficha para cada elemento dentário, na qual constaram os aspectos que foram analisados em cada espécime, como: modelagem do canal, limite apical do preparo, presença de delta apical, canais secundários, canais laterais, canais de fundo cego e permeabilidade dentinária.

Todas as radiografias pré, trans e pós-operatórias realizadas foram analisadas também pelo mesmo observador calibrado, sendo que os aspectos observados foram: modelagem do canal e limite apical do preparo.

6. Análise Estatística

Foi realizada uma análise estatística descritiva por meio de gráficos e tabelas. Posteriormente, foi realizado o Teste Binomial Não Paramétrico para comparação de proporções. A aplicação deste teste estatístico justifica-se, pois os dentes parcialmente modelados e não modelados pertencem a um mesmo grupo, evidenciando o insucesso, enquanto os dentes totalmente modelados evidenciam o sucesso.

Para correlacionar as técnicas de preparo químico-mecânico na modelagem dos canais, utilizou-se o teste não paramétrico Qui-quadrado, que se destina a encontrar um valor de dispersão entre duas variáveis nominais, avaliando a associação existente entre variáveis qualitativas. O teste foi calculado com 95% de confiança; assim, ao encontrarmos um p-valor < 0,05, estamos rejeitando a hipótese H₀, segundo Vieira¹¹.

Para analisar a concordância entre a técnica de diafanização e o exame radiográfico, utilizou-se o teste Kappa. A análise estatística utilizou-se dos seguintes softwares: Excel 2010, BioStat 5.8.4 e SPSS 20.0 - Social Package Statistical Science - for Windows.

RESULTADO

A distribuição de frequência dos dentes quanto à modelagem dos canais de acordo com a técnica de visualização utilizada foi: para a Técnica de diafanização - modelados 59 dentes (67%) e não modelados 29 dentes (33%), e para o Exame radiográfico - modelados 65 dentes (73,8%) e não modelados 23 dentes (26,2%).

A Tabela 1 mostra a frequência absoluta e relativa das variáveis relacionadas às características anatômicas visualizadas durante a análise final da modelagem dos canais.

Tabela 1
Frequência absoluta e relativa das características anatômicas dos canais

VARIÁVEL	CATEGORIA	Frequência absoluta	Frequência Relativa (%)
Canais laterais	Presente	4	4,6
	Ausente	84	95,4
	Total	88	100,0
Canais Secundários	Presente	42	47,7
	Ausente	46	53,3
	Total	88	100,0
Permeabilidade Dentinária	Presente	84	95,4
	Ausente	4	4,6
	Total	88	100,0
Canais de fundo cego	Presente	2	2,3
	Ausente	86	97,7
	Total	88	100,0
Delta Apical	Presente	12	13,6
	Ausente	76	86,4
	Total	88	100

A Tabela 2 mostra a eficiência na modelagem dos canais pela Técnica Escalonada ápice-Coroa e pela Técnica de Oregon Modificada.

Tabela 2
Teste Binomial para modelagem dos canais para cada técnica de preparo químico-mecânico quando observados pela técnica da diafanização

		Valor	Proporção	Proporção	Significância
		Absoluto	Observada	Teste
Técnica Escalonada ápice-Coroa	Modelado	29	65,9%	0,5	0,049
	Não Modelado	15	34,1%
	Total	44	100,0%
Técnica de Oregon Modificada	Modelado	30	68,2%	0,5	0,023
	Não Modelado	14	31,8%
	Total	44	100,0%

A Tabela 3 mostra os índices de concordância (valores de Kappa) entre a técnica de diafanização e o exame radiográfico em relação à modelagem do canal. O índice Kappa foi de 0,511, com intervalo de confiança de 95%, índices entre 0,305 e 0,718, mostrando que a concordância entre as técnicas de visualização utilizadas foi de média a baixa, pois quanto mais próximo o índice Kappa for de um (1), maior a concordância.

Tabela 3
Concordância entre a técnica de diafanização e o exame radiográfico

		Modelagem do canal	p valor do Kappa	Kappa
Técnica da Diafanização	Modelado	59	0,001	0,511
	Não Modelado	29
	Total	88
Exame Radiográfico	Modelado	65	0,001	0,511
	Não Modelado	23
	Total	88

Na Tabela 4, observa-se a análise bivariada entre técnicas de preparo químico-mecânico na modelagem do canal. A inferência estatística apresentou p=0,8206, concluindo-se, assim, que estatisticamente não houve diferença entre as técnicas no que tange à finalidade das mesmas, que é a modelagem do sistema de canais radiculares.

Tabela 4
Teste Qui-quadrado para variáveis técnicas de preparo químico-mecânico e modelagem do canal

		Frequência Absoluta	Frequência Relativa (%)	p-valor
Técnica Escalonada ápice-Coroa	Modelado	29	65,9	0,8206
	Não Modelado	15	34,1
	Total	44	100
Técnica de Oregon Modificada	Modelado	30	68,2
	Não Modelado	14	31,8
	Total	44	100

DISCUSSÃO

Observados pela técnica da diafanização, a frequência relativa de 67% de dentes considerados sucessos quanto à modelagem (Figura 1), confirma os resultados encontrados por Dessaune Neto^**** que, em pesquisa na mesma Disciplina, porém analisando os dentes obturados pelo mesmo método de estudo, também obteve 67% dos dentes modelados e obturados, utilizando três técnicas de preparo químico-mecânico. Isso mostra que os estudantes estão assimilando o conteúdo da Disciplina, visto que é o primeiro contato que os mesmos têm com a prática odontológica em dentes humanos.

Figura 1
a) Canino inferior modelado submetido à técnica de diafanização. Observa-se a conicidade (CABEçAS DE SETA) dada no preparo do canal (*). b) Imagem ampliada do terço apical. Observa-se a presença do batente apical 0,5mm aquém do ápice radicular (SETAS).

Os 33% de insucessos na modelagem dos dentes analisados (Figura 2), quando confrontados com o mesmo resultado encontrado por Dessaune Neto**** na obturação final do sistema de canais radiculares, confirmam a importância da fase de preparo químico-mecânico, sendo esta etapa fundamental, pois condiciona e facilita de forma efetiva o processo de obturação hermética do sistema de canais radiculares, como concluem os autores Torabinejad et al.¹², Peters¹³ e Cohen, Hargreaves³.

Figura 2
Canino inferior modelado submetido à técnica de diafanização e ao exame radiográfico. Observa-se que no exame radiográfico convencional (b) não evidenciamos a permeabilidade dentinária (SETAS) e os canais secundários (CABEçAS DE SETA), evidenciados na técnica da diafanização (a).

Quando analisamos estatisticamente a técnica Escalonada ápice-Coroa e a técnica de Oregon Modificada na modelagem do canal, a inferência estatística apresentou um p de 0,8206, o que indica estatisticamente que não houve diferença entre os resultados de sucesso (modelagem do canal) de uma técnica em relação à outra. Tal fato se comprova também em outros estudos, nos quais são comparadas técnicas de preparo químico-mecânico. Nesses estudos, não é relatada supremacia nos resultados de sucesso do tratamento endodôntico de uma técnica em relação à outra, mas ressaltam-se as vantagens de cada técnica e enfatiza-se a importância da indicação correta das mesmas, de acordo com as características biológicas e endodônticas do dente a ser tratado, segundo afirmam Lopes, Siqueira Jr.⁶, Vanzin et al.¹⁴ e Zmener et al.¹⁵.

A influência das técnicas de preparo químico-mecânico e obturação na Endodontia tem sido pouco explorada na investigação dos sucessos dos tratamentos endodônticos, sendo que, na maioria dos artigos, os resultados de sucesso do tratamento são direcionados à influência do estado pulpar e periapical no pré-tratamento. Este fato foi confirmado por Ng et al.¹⁶, que realizaram uma revisão sistemática da literatura envolvendo o sucesso do tratamento endodôntico e identificaram 119 artigos em quatro revistas científicas: International Endodontics Journal, Journal of Endodontics, Oral Surgery Oral Medicine Oral Pathology Endodontics Radiology e Dental Traumatology & Endodontics. O resultado foi que, em média, a taxa de sucesso endodôntico após um ano variou entre 68 e 85%, sendo que, nas mesmas pesquisas, a influência da técnica de preparo dos canais utilizada foi pouco explorada para determinar o sucesso nos tratamentos.

As características anatômicas encontradas nos caninos inferiores preparados endodonticamente foram descritas por De Deus¹⁷. Embora a frequência dos canais laterais (4,6%) se equivalesse à do autor, as pesquisas das revistas diferiram quanto aos canais secundários (47,7%), canais de fundo cego (2,3%) e delta apical (13,6%), sendo que o mesmo relatou uma frequência de 2,2% para canais secundários, 0% de canais de fundo cego e 27,9% de deltas apicais para o mesmo grupo dental.

Estas características anatômicas encontradas comprovam que a modelagem, a limpeza e a sanificação do sistema de canais, quando executadas de forma correta, não modificam as características anatômicas dos canais, como, por exemplo, a obliteração desses pequenos canais por 'raspas' de dentina. As ramificações dos canais radiculares tornam-se importantes do ponto de vista da obturação hermética do sistema de canais, pois o cimento endodôntico deve preencher e conferir o vedamento completo de todas as pequenas ramificações deste sistema, segundo Cohen, Hargreaves³.

Um dos métodos de verificação dos resultados de nossa pesquisa foi o exame radiográfico, que se apresentou limitado na visualização de algumas características anatômicas do endodonto, como, por exemplo, a permeabilidade dentinária, que não pode ser observada radiograficamente, embora esta característica tenha sido observada na técnica da diafanização em 95,4% dos canais radiculares. Este resultado, comparado com a frequência de permeabilidade dentinária de 45% observada por Azeredo et al.¹⁸, em dentes não preparados endodonticamente, confirma que o processo de modelagem complementado pela ação das substâncias irrigadoras como as que foram empregadas na pesquisa (hipoclorito de Sódio a 5,25% e EDTA a 17%) aumenta significativamente a presença de graus variados de permeabilidade dentinária nos diferentes terços, fato também relatado por Kovac, Kovac¹⁹.

As frequências de sucessos e insucessos na modelagem dos canais foram analisadas por duas técnicas de visualização: a diafanização e o exame radiográfico, sendo que o índice de sucesso obtido foi de 67% e 73,8%, respectivamente. Quando utilizamos o índice de concordância (valores de Kappa) entre a técnica de diafanização e o exame radiográfico, em relação à modelagem do canal, obtivemos p=0,511, mostrando que a concordância entre as duas técnicas de visualização utilizadas foi de média a baixa. Este fato confirma as limitações da técnica radiográfica na observação de pequenas características do sistema de canais radiculares, como o batente apical, e também na modelagem do canal, fato confirmado também por Dessaune Neto***** (Figura 3).

Figura 3
a) Canino inferior não modelado submetido à técnica de diafanização. Observa-se ampliação somente do terço cervical e médio do canal radicular (SETAS), e a não modelagem do terço apical (CABEçAS DE SETA). b) Imagem ampliada do terço apical não modelado. Evidencia-se a não confecção do batene apical e terço apical não modelado (sem conicidade).

As falhas encontradas na modelagem dos canais podem estar relacionadas à inabilidade dos alunos de determinarem a odontometria correta e o comprimento de trabalho dos dentes, além da localização correta da abertura do forame apical (Figura 4). Azeredo et al.^{10 , 18} e Boruah et al.²⁰ lembram que o comprimento do canal não coincide com o comprimento da raiz e essa diferença dificilmente é identificada na imagem radiográfica.

Figura 4
Terço apical de um canino inferior não modelado diafanizado. Observam-se degraus formados na modelagem do canal (SETAS VAZADAS); uma pequena curvatura do canal principal no terço apical (*) e um canal secundário (SETA PRETA)

Autores como Chang et al.²¹ analisaram diferentes técnicas de visualização na área da Endodontia e concluíram que as imagens radiográficas não reproduzem de forma efetiva as características anatômicas encontradas no sistema de canais radiculares. Sendo assim, sugerimos a implantação de outras técnicas de visualização principalmente na prática laboratorial, como, por exemplo, a técnica de diafanização, que se mostra eficaz. Tal sugestão se faz necessária, pois Nattress, Martin²² e Ebert et al.²³ verificaram que a radiografia periapical convencional, tomada imediatamente após a conclusão do tratamento endodôntico, não é suficiente para determinar o sucesso ou o insucesso do tratamento.

O uso da técnica de diafanização é perfeitamente viável no ensino laboratorial, pois se trata de uma técnica simples, de baixo custo, e que permite a conservação dos espécimes por longos períodos, possibilitando uma visualização de todo o processo do tratamento endodôntico, segundo Omer et al.⁹, Azeredo et al.¹⁰, Galafassi et al.²⁴ e Chang et al.²¹.

Mesmo assim, não se pode simplesmente descartar o exame radiográfico, pois este é ainda um método imprescindível para a avaliação do tratamento endodôntico in vivo, pois é o único parâmetro mais acessível para visualização do tratamento executado, visto que os exames mais modernos, como as tomografias computadorizadas, ainda são de alto custo, segundo Boruah et al.²⁰.

Seijo^****** avaliou a percepção dos estudantes de Endodontia, da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Minas Gerais, e concluiu que um dos fatores que podem afetar o aprendizado em Endodontia é o pouco treinamento pré-clínico laboratorial; sugeriu, assim, um tempo maior para que os alunos pudessem realizar um maior número de tratamentos endodônticos in vitro e, consequentemente, adquirir uma maior experiência.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos nesta pesquisa nos levam a concluir que:

• As técnicas Escalonada ápice-Coroa e Oregon Modificada mostraram-se eficazes na modelagem dos canais, o que foi demonstrado nos resultados estatisticamente semelhantes de sucesso, em relação à modelagem do sistema de canais radiculares;

• O alto grau e a frequência de permeabilidade dentinária, e as pequenas ramificações dos canais (canais secundários, canais laterais e deltas apicais) observadas sugerem que a técnica de irrigação aplicada com a combinação de hipoclorito de sódio a 5,25% e EDTA a 17%, conjuntamente com a técnica de preparo, foram eficazes na limpeza e na modelagem dos canais radiculares;

• O exame radiográfico foi menos eficaz do que a diafanização para a interpretação dos resultados encontrados, no preparo dos canais, na presente pesquisa;

• A técnica de diafanização mostrou-se um excelente método didático para visualização dos sucessos e insucessos na modelagem do sistema de canais radiculares e confirmou a necessidade de ser associada à Disciplina de Endodontia (laboratorial), para sedimentar os conhecimentos teóricos aplicados.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Mar-Apr 2014

Histórico

• Recebido
  03 Dez 2013
• Aceito
  28 Jan 2014