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Curso de Saúde Pública em um semestre: algumas considerações

A one semester course in Public Health: commentaries

Resumos

São discutidos problemas quanto à formação de sanitaristas pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e apresentado um programa que permite que esta formação seja abreviada para um semestre.

Saúde Pública; Ensino; Faculdade de Saúde Pública


Problems refering to the School curriculum of graduates in Public Health are discussed, and a programme for a one semester course is presented, in order to shorten this preparation.

Public Health; Teaching; School of Public Health


CLÁSSICOS DOS PRIMEIROS DEZ ANOS LANDMARKS FROM THE FIRST TEN YEARS

Curso de Saúde Pública em um semestre: algumas considerações

A one semester course in Public Health: commentaries

José Maria Pacheco de SouzaI; Otávio Azevedo MercadanteII; Gilberto Ribeiro ArantesIII; Sonia Apparecida FerreiraIV; Tércio Pessoa de VasconcelosV

IDo Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública

IIDo Departamento de Medicina Social da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa

IIIDa Divisão Regional de Saúde de Ribeirão Preto, da Secretaria da Saúde

IVDo Departamento Técnico Normativo da Secretaria da Saúde

VDa Campanha de Erradicação da Varíola da Secretaria da Saúde

RESUMO

São discutidos problemas quanto à formação de sanitaristas pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e apresentado um programa que permite que esta formação seja abreviada para um semestre.

Unitermos: Saúde Pública. Ensino. Faculdade de Saúde Pública.

SUMMARY

Problems refering to the School curriculum of graduates in Public Health are discussed, and a programme for a one semester course is presented, in order to shorten this preparation.

Uniterms: Public Health. Teaching. School of Public Health.

Quando em São Paulo usa-se a expressão Saúde Pública, pode-se localizar dois polos nítidos: formação, exclusivamente através da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e aproveitamento, principalmente pela Secretaria da Saúde. Pareceu-nos oportuno abordar o tema da formação em saúde pública pela sua atualidade e, também, na esperança que seja despertado um novo interesse para a discussão de tal assunto. Para o presente trabalho foram muito importantes trocas de idéias tidas com várias pessoas, principalmente Vera Shirley C. Ronchezel, Zilah Altair Wendel Abramo e Tristão Pereira da Fonseca Filho, a quem agradecemos.

1 — Vários autores definem Saúde Pública de maneiras diferentes. Assim, tem-se a definição de Winslow 6: "É a ciência e a arte de prevenir a doença, prolongar a vida e promover a saúde e a eficiência física e metal, através de esforços organizados da comunidade para o saneamento do meio, o controle das doenças transmissíveis, a educação do indivíduo em princípios de higiene pessoal, a organização de serviços médicos e de enfermagem para o diagnóstico precoce e tratamento preventivo da doença e o desenvolvimento da maquinária social de modo a assegurar a cada indivíduo na comunidade um padrão de vida adequado à manutenção da saúde." Mascarenhas 2 propõe Saúde Pública como "a ciência e a arte de promover, proteger e recuperar a saúde física e mental, através de medidas de alcance coletivo e de motivação da população." Seixas e Mercadante 4 definem Saúde Pública operacionalmente como "campo de conhecimentos e atividades que têm por objetivo, a partir do diagnóstico do nível de saúde das populações, elevar tais níveis, através da aplicação de medidas de alcance coletivo com a participação da comunidade". Qualquer que seja o conceito, fica implícita a idéia de um campo de trabalho multidisciplinar, exercido por uma equipe de profissionais, que podem ser chamados de sanitaristas, atualmente recrutados em várias áreas do conhecimento e treinados especificamente para executarem Saúde Pública.

2 — Apesar de ser possível formar-se um sanitarista diretamente no nível de graduação, a partir do estudante recém-ingressado na Universidade, tradicionalmente o sanitarista é um elemento que já tem uma formação prévia universitária completa e recebe formação complementar em escola de saúde pública. Assim, tem-se enfermeira em saúde pública, bacharel em ciências jurídicas em saúde pública, estatístico em saúde pública, médico em saúde pública, etc. Convém lembrar que a adjetivação "em saúde pública" é o grau universitário obtido por aqueles que completam de forma satisfatória o curso de Saúde Pública para Graduados da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Fora deste contexto universitário é bastante comum ter-se a expressão médico-sanitarista, dentista-sanitarista, veterinário-sanitarista, etc., ou, simplesmente, "sanitarista".

3 — Na formação do sanitarista é muito importante não se descuidar do ensino integrado, colocando-se lado a lado, estudando matérias comuns, médicos, dentistas, educadores, administradores hospitalares, engenheiros, enfim, todos os profissionais que formam a chamada equipe de saúde pública. Mas é lícito, também, isolar-se um tipo de profissional e analisá-lo separadamente, dentro do princípio de observar-se as partes para se compreender o todo. Assim, decidiu-se, aqui, analisar o problema do médico-sanitarista, principalmente em função das atuais necessidades da Secretaria da Saúde de São Paulo e aproveitando a experiência da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo na formação de sanitaristas. Esta abordagem, todavia, pode ser generalizada, quer em relação a outro profissional de saúde pública, a outro órgão que necessite este profissional ou a outra escola que possa formá-lo.

4 — Médico em saúde pública ou médico-sanitarista ou sanitarista com formação médica é o profissional com condições de colaborar na consecução dos objetivos propostos na definição de Saúde Pública, utilizando os conhecimentos conjugados de medicina e saúde pública, quer em nível local, regional ou central. A Secretaria da Saúde tem necessidade de médicos-sanitaristas que possam atuar em qualquer destes três níveis; e é interessante notar-se que, à medida que o médico-sanitarista passa a atuar em nível superior, a ênfase na mudança é muito mais em termos de responsabilidade funcional e administrativa do que técnica 1. Assim, parece que a Faculdade de Saúde Pública, em relação às aspirações da Secretaria da Saúde, adota uma política certa na formação do médico em saúde pública, pois, segundo Reinaldo Ramos* * Professor coordenador do curso de Saúde Pública para Graduados, na área dos médicos. , em comunicação pessoal, o objetivo do curso é o de formar pessoal para nível local, acreditando ele que a atuação em nível regional e central dependem muito de experiência e amadurecimento, além, é claro, dos conhecimentos de saúde pública. Explicitamente, o aluno do curso de Saúde Pública para Graduados deverá, ao fim do curso, "ser capaz de fazer o diagnóstico das condições de saúde local, colocar os problemas dentro de uma ordem de prioridades, propor medidas e estimar os recursos necessários ao equacionamento e solução dos problemas, administrando as atividades correspondentes". Maiores conhecimentos, além da experiência e amadurecimento que habilitem a um exercício em níveis regional e central podem ser obtidos através de cursos de especialização e aperfeiçoamento, que devem ser criados à medida que se fizerem necessários. Pode-se visualizar os atributos e conhecimentos necessários ao médico-sanitarista no esquema seguinte:

5 — Um problema sério para a Secretaria da Saúde de São Paulo é a necessidade premente de um número maior de médicos-sanitaristas. Existem fatores de ordem legal, burocrática, salarial, que impedem completar o respectivo quadro em pouco tempo. Eliminados estes fatores, de âmbito exclusivo da Secretaria, possivelmente restarão outros; entre eles, está o da formação do médico-sanitarista, que em São Paulo está a cargo da Faculdade de Saúde Pública, com um curso atualmente de um ano (9 meses efetivos). no total de 900 horas. Seria interessante que esta formação pudesse ser acelerada, sem perda da qualidade, abreviando-se o curso para meio ano (5 meses efetivos), com um programa de 770 horas. É claro, então, que deve-se ter em conta que não é função da Faculdade preparar médicos-sanitaristas exclusivamente para a Secretaria da Saúde. Assim, em qualquer programa a ser proposto, não há que pensar em atender todas as possíveis necessidades da Secretaria, nem em eliminar assuntos que não interessem a esta entidade. A Figura à página anterior procura mostrar como as necessidades da Secretaria da Saúde e o programa de saúde pública da Faculdade devem se harmonizar.

Ou seja, um médico em saúde pública deve receber da Faculdade certos conhecimentos não julgados necessários pela Secretaria e, possivelmente, deixar de receber outros julgados necessários, havendo, porém, um conjunto muito grande de conhecimentos julgados necessários e ministrados. A razão disto é que nem todos os alunos irão atuar na Secretaria da Saúde e os que irão podem receber uma completamentação específica dentro do seu próprio setor.

6 — No item 7 será sugerido um programa de saúde pública, correspondendo à área da Faculdade (hachureado horizontal na Figura já referida). Tal programa é bastante semelhante a outro proposto por Seixas 3 à Faculdade de Saúde Pública em 1972, tendo sido, no entanto, estruturado independentemente, sem conhecimento prévio do anterior; posteriormente foram incorporadas idéias contidas no projeto de Seixas. Os conhecimentos complementares que a Secretaria da Saúde acredita serem necessários ao seu médico-sanitarista devem ser buscados ou na própria Secretaria, sob a forma de treinamento em serviço, cursos rápidos regionais, etc., ou em instituições de ensino, sob a forma de cursos de especialização ou aperfeiçoamento. Tomou-se como base o período março-julho (22 semanas), repetindo-se o mesmo curso no período julho-novembro; as 4 últimas semanas de julho e de novembro seriam dedicadas a treinamento de campo, sob a forma de estágio, usando-se as 18 primeiras semanas de cada período para o curso formal. Admitindo-se 5 dias úteis por semana e 7 horas úteis por dia, tem-se um total de 630 horas, a serem distribuídas sob a forma de aulas expositivas, seminários, trabalhos práticos, avaliação, etc. Os estágios de julho e novembro seriam em pequenos grupos multiprofissionais de aproximadamente cinco alunos, em centro de saúde-escola e órgãos oficiais, sob orientação de um docente e de um representante da Secretaria da Saúde, cobrindo 140 horas. Assim, o total geral de horas do curso proposto seria de 630 + 140 = 770 horas, pouco menos, portanto, que as atuais 900 horas.

7 — No programa sugerido a seguir, as disciplinas estão agrupadas por área de ensino. As matérias marcadas com asterisco (*) são as que podem ser consideradas como básicas na formação de qualquer sanitarista. As matérias não assinaladas podem ser consideradas específicas para médico em saúde pública, sendo substituíveis por outras, segundo a formação acadêmica original do futuro sanitarista:

8 — Deve-se insistir em chamar a atenção para o fato de que o programa sugerido é aplicável, com modificações e adaptações pertinentes, a outros profissionais que não médicos, permitindo, assim, um curso simultâneo, multiprofissional. Esta proposta permitiria dobrar-se a quantidade de novos sanitaristas formados por ano. Um aspecto interessante, diretamente ligado à atual estrutura de cursos de pós-graduação em saúde pública da Faculdade de Saúde Pública, é a possibilidade de a conclusão do curso de sanitarista, ora apresentado, ser solicitada como pré-requisito incondicional para pós-graduação: candidatos a pós-graduação que desejassem iniciar seu programa no 2.° semestre, simplesmente se matriculariam para o curso de saúde pública no 1.° semestre. Os matriculados em saúde pública no 2.° semestre, aguardariam apenas seis meses após sua diplomação para continuarem em pós-graduação; não haveria, desta forma, desculpa para sobreposição dos dois cursos, graduados e pós-graduação em saúde pública.

9 — Várias alternativas podem ser pensadas para a implementação do curso apresentado, entre elas, convênios. Em relação especificamente à Faculdade de Saúde Pública, são fatores importantes a serem considerados o aumento do pessoal docente permanente e do pessoal técnico-administrativo, problemas de espaço físico (talvez a ser solucionado com mudança urgente para a Cidade Universitária), locais de estágio de campo, bolsas de estudo, denominação acadêmica do curso e grau universitário conferido. Estes dois últimos itens não deveriam ser, todavia, preocupação, pois, admite-se, aqui, que o curso de um semestre sugerido deva vir a substituir o atual curso clássico de Saúde Pública para Graduados de um ano, não só em função das possíveis necessidades da Secretaria da Saúde de São Paulo, mas, também, devido à grande demanda de sanitaristas e à situação de saúde pública do Brasil.

2. MASCARENHAS, R.S. — Apostila mimeografada, s.d.

4. SEIXAS, J. C. & MERCADANTE, O. A. — Apostila, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, s.d.

Recebido para publicação em 13-12-74

Aprovado para publicação em 13-01-75

  • 1. COELHO, A.R. et al. Funções dos médicos nos diferentes níveis de operação de uma Secretaria Estadual de Saúde. [Trabalho apresentado à Disciplina de Administração Sanitária IV, do Departamento de Prática de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública, São Paulo, 1974].
  • 3. SEIXAS, J.C. Programação do I Curso Livre intensivo de Introdução à Saúde Pública para Médicos. [Apresentada à consideração da Faculdade de Saúde Pública, S. Paulo, 1972].
  • 5. WINSLOW, C. E. A. The untilled fields of public health. Science, 51 (1306): 23-33, Jan. 1920.
  • *
    Professor coordenador do curso de Saúde Pública para Graduados, na área dos médicos.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jul 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2006

    Histórico

    • Aceito
      13 Jan 1974
    • Recebido
      13 Dez 1974
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