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Deslocamento para o trabalho e fatores associados em industriários do sul do Brasil

Desplazamiento para el trabajo y factores asociados en industriales del sur de Brasil

Resumos

Estudo transversal visando estimar a prevalência das formas de deslocamento para o trabalho e identificar fatores associados em trabalhadores do Estado do Rio Grande do Sul. Um total de 2.265 trabalhadores responderam questionário sobre a forma de deslocamento utilizado para ir ao trabalho: caminhada/bicicleta, ônibus ou de carro/moto. Para estimar a associação entre o desfecho e variáveis sociodemográficas, ocupacionais e comportamental foi utilizada a regressão logística multinomial. O principal meio de deslocamento para o trabalho foi o ônibus (45,7%). Trabalhadores com maior condição socioeconômica tiveram maior probabilidade de deslocamento passivo.

Trabalhadores; Mobilidade Residencial; Transportes; Local de Trabalho; Estudos Transversais


Estudio transversal buscando estimar la prevalencia de las formas de desplazamiento para el trabajo e identificar factores asociados en trabajadores del Estado do Rio Grande do Sul (sur de Brasil). Un total de 2.265 trabajadores respondieron cuestionario sobre la forma de desplazamiento utilizado para ir al trabajo: caminata/bicicleta, autobús o en carro/moto. Para estimar la asociación entre el resultado y variables sociodemográficas, ocupacionales y conductual se utilizó la regresión logística multinomial. El principal medio de desplazamiento para el trabajo fue el autobús (45,7%). Trabajadores con mayor condición socioeconómica tuvieron mayor probabilidad de desplazarse de forma pasiva.

Trabajadores; Movilidad Residencial; Transportes; Lugar de Trabajo; Estudios Transversales


Cross-sectional study that aimed to estimate the prevalence of forms of commuting to and from work and to identify factors associated among industrial workers in the State of Rio Grande do Sul, southern Brazil. A total of 2,265 workers completed a questionnaire on the forms of commuting to and from work (walking/biking, bus or car/motorcycle). Multinomial logistic regression was used to estimate the association between the outcome and sociodemographic, occupational and behavioral variables. The main form of commuting to and from work was by bus (45.7%). Workers with higher socioeconomic condition were more likely to engage in passive commuting.

Workers; Residential Mobility; Transportation; Workplace; Cross-Sectional Studies


Deslocamento para o trabalho e fatores associados em industriários do sul do Brasil

Desplazamiento para el trabajo y factores asociados en industriales del sur de Brasil

Shana Ginar da SilvaI; Giovâni Firpo Del DucaI; Kelly Samara da SilvaI; Elusa Santina Antunes de OliveiraII; Markus Vinícius NahasI

IPrograma de Pós-Graduação em Educação Física, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil

IIServiço Social da Indústria. Florianópolis, SC, Brasil

Correspondência | Correspondence Correspondência | Correspondence: Shana Ginar da Silva Coordenadoria de Pós-Graduação em Educação Física Campus Universitário Trindade 88040-900 Florianópolis, SC, Brasil E-mail: sginar@gmail.com

RESUMO

Estudo transversal visando estimar a prevalência das formas de deslocamento para o trabalho e identificar fatores associados em trabalhadores do Estado do Rio Grande do Sul. Um total de 2.265 trabalhadores responderam questionário sobre a forma de deslocamento utilizado para ir ao trabalho: caminhada/bicicleta, ônibus ou de carro/moto. Para estimar a associação entre o desfecho e variáveis sociodemográficas, ocupacionais e comportamental foi utilizada a regressão logística multinomial. O principal meio de deslocamento para o trabalho foi o ônibus (45,7%). Trabalhadores com maior condição socioeconômica tiveram maior probabilidade de deslocamento passivo.

Descritores: Trabalhadores. Mobilidade Residencial. Transportes. Local de Trabalho. Estudos Transversais.

ABSTRACT

Cross-sectional study that aimed to estimate the prevalence of forms of commuting to and from work and to identify factors associated among industrial workers in the State of Rio Grande do Sul, southern Brazil. A total of 2,265 workers completed a questionnaire on the forms of commuting to and from work (walking/biking, bus or car/motorcycle). Multinomial logistic regression was used to estimate the association between the outcome and sociodemographic, occupational and behavioral variables. The main form of commuting to and from work was by bus (45.7%). Workers with higher socioeconomic condition were more likely to engage in passive commuting.

Descriptors: Workers. Residential Mobility. Transportation. Workplace. Cross-Sectional Studies.

RESUMEN

Estudio transversal buscando estimar la prevalencia de las formas de desplazamiento para el trabajo e identificar factores asociados en trabajadores del Estado do Rio Grande do Sul (sur de Brasil). Un total de 2.265 trabajadores respondieron cuestionario sobre la forma de desplazamiento utilizado para ir al trabajo: caminata/bicicleta, autobús o en carro/moto. Para estimar la asociación entre el resultado y variables sociodemográficas, ocupacionales y conductual se utilizó la regresión logística multinomial. El principal medio de desplazamiento para el trabajo fue el autobús (45,7%). Trabajadores con mayor condición socioeconómica tuvieron mayor probabilidad de desplazarse de forma pasiva.

Descriptores: Trabajadores. Movilidad Residencial. Transportes. Lugar de Trabajo. Estudios Transversales.

INTRODUÇÃO

Segundo evidências científicas pessoas que caminham ou pedalam como forma de deslocamento para ir ao trabalho apresentam menor risco de morbimortalidade por doenças crônicas não-transmissíveis, o que pode representar importantes resultados em termos de saúde pública.3,4 Apesar de os benefícios da prática de atividade física no contexto dos deslocamentos serem bem reconhecidos, uma parcela significativa da população está exposta a baixos níveis de atividade física, tanto em países desenvolvidos5 quanto naqueles em desenvolvimento.2

Conforme a literatura, quanto menor a renda e a escolaridade, maior a prevalência de deslocamento ativo.1,5 Por outro lado, trabalhadores com nível educacional e renda familiar mais elevados tendem a ser mais ativos no lazer.

Diante desse contexto, o objetivo do presente estudo foi estimar a prevalência das formas de deslocamento para o trabalho e identificar fatores associados.

MÉTODOS

Estudo transversal, baseado na análise secundária de dados do levantamento epidemiológico intitulado "Estilo de Vida e Hábitos de Lazer de Trabalhadores da Indústria do Estado do Rio Grande do Sul/Brasil", realizado no período de agosto a dezembro de 2007. A população-alvo foi composta de 670 mil trabalhadores da indústria, conforme dados fornecidos pelo Departamento Regional do Serviço Social da Indústria (SESI) do Rio Grande do Sul.

Para o cálculo do tamanho amostral foram adotados os seguintes critérios: (i) população estimada em 670.326 trabalhadores; (ii) erro amostral de 3%; (iii) intervalo de 95% de confiança (IC95%); (iv) prevalência de inatividade física no lazer de 45%; (v) efeito do delineamento amostral fixado em 1,5; e (vi) aumento de 20% no tamanho amostral em função das possíveis perdas e recusas no processo de coleta.

A amostra foi determinada em dois estágios. No primeiro estágio, recorreu-se à seleção aleatória de empresas, segundo a distribuição dos trabalhadores em empresas de grande (> 500), médio (100 a 499) e pequeno porte (< 100). No segundo estágio, foram selecionados, também de forma aleatória, trabalhadores de ambos os sexos em número proporcional ao porte da empresa.

A coleta foi realizada em pequenos grupos (três a 15 trabalhadores) pelos profissionais do SESI e prestadores de serviço mediante aplicação de instrumento auto-administrado.

Para o levantamento das informações, usou-se um questionário previamente validado e originalmente construído para tal população.ª a Barros MVG. Atividades físicas no lazer e outros comportamentos relacionados à saúde dos trabalhadores da indústria no Estado de Santa Catarina, Brasil [dissertação de mestrado]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 1999. O desfecho deslocamento para o trabalho foi mensurado por meio da questão fechada: "Na maioria dos dias da semana, como você se desloca para ir ao trabalho?". As opções de resposta foram: a pé, de bicicleta, de ônibus, de carro/moto. Deslocamentos para o trabalho a pé e de bicicleta foram considerados formas de deslocamento ativo. As variáveis relacionadas ao trabalho, como porte da empresa e atividade física ocupacional, foram categorizadas conforme consta na Tabela. Já a variável prática de atividade física no lazer foi mensurada com base na questão: "Você realiza regularmente algum tipo de atividade física no seu lazer, como: exercícios físicos (ginástica, caminhada, corrida), esportes, danças ou artes marciais?". Foram considerados ativos no lazer aqueles que reportaram praticar atividade física no mínimo uma vez por semana. As variáveis sociodemográficas estudadas foram: idade, sexo, nível de escolaridade e renda familiar bruta.

Na análise bruta recorreu-se à aplicação do teste de qui-quadrado para heterogeneidade ou tendência linear, adotando uma significância de 0,05 (p < 0,05). A análise ajustada foi realizada por regressão logística multinomial, assumindo como categoria de referência o deslocamento ativo para o trabalho. O modelo hierárquico foi constituído de quatro níveis: 1) variáveis demográficas (sexo e idade); 2) variáveis socioeconômicas (escolaridade e renda familiar) e porte da empresa; 3) atividade física ocupacional; e 4) prática de atividade física no lazer. Para seleção das variáveis que permaneceram no modelo de regressão foi utilizado o processo backward, ficando no modelo final as variáveis que apresentaram valor p < 0,20.

Foi possível detectar significância estatística para odds ratio (OR) > 1,34 para deslocamento de ônibus e OR > 1,45 para deslocamento de carro, caso as prevalências dos desfechos nos grupos de não expostos fossem de 25,6% e 14,5%, respectivamente, fixando-se um intervalo de 95% de confiança e poder de 80%.

A montagem do banco de dados foi efetuada mediante leitura óptica dos questionários (software SPHYNX - Software Solutions Inc., Washington DC, Estados Unidos). Para análise estatística, utilizou-se o programa Stata versão 11.0.

O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade Federal de Santa Catarina (n° 099/2007). Todos os trabalhadores foram informados do caráter voluntário da participação no estudo e do sigilo de suas respostas.

RESULTADOS

Dos 2.527 sujeitos elegíveis para o estudo, obteve-se uma taxa de resposta de 89,6%. A amostra final foi de 2.265 trabalhadores, dos quais 56,2% eram do sexo masculino. Observou-se maior proporção de trabalhadores com idade igual ou inferior a 30 anos (47,6%), ensino médio completo (52,2%), renda familiar entre R$ 601,00 e R$ 1.500,00 (45,6%) e pertencentes a empresas de médio porte (42,2%). Também foi observado que 54,4% da amostra era fisicamente ativa no lazer e 49,8% realizava atividade física ocupacional moderada.

A prevalência de deslocamento ativo (caminhada/pedalada) para o trabalho foi de 26,5%. A prevalência de deslocamento de ônibus foi de 45,7% e de carro/moto 27,8%.

Trabalhadores inativos no lazer apresentaram chance maior (OR = 1,60; IC95%: 1,29;1,98) de se deslocarem de ônibus que de forma ativa, e aqueles que tinham atividade física ocupacional moderada utilizavam mais o deslocamento ativo (OR= 0,65; IC95%: 0,46;0,92) em comparação àqueles com atividade física ocupacional vigorosa (Tabela).

Ao comparar o uso de carro/moto versus o deslocamento ativo para o trabalho observou-se tendência de aumento da utilização nos veículos de transporte motorizado conforme o aumento da escolaridade e da renda familiar. Além disso, a chance de utilizar o carro/moto versus caminhada/pedalada foi maior entre os homens (OR = 1,53; IC95%: 1,22;1,92), entre os trabalhadores com atividade física ocupacional leve (OR = 1,69; IC95%: 1,04;2,76) e entre os considerados inativos no lazer (OR = 1,42; IC95%: 1,10;1,83), quando comparados aos ativos (Tabela).

DISCUSSÃO

O presente estudo foi pioneiro na investigação das formas de deslocamento para o trabalho em uma amostra representativa de trabalhadores do setor industrial do Estado do Rio Grande do Sul. A prevalência de utilização de caminhada/bicicleta no deslocamento para o trabalho foi mais alta (26,5%) que as estimadas em outros levantamentos nacionais.2 Porém, observa-se uma falta de consenso quando comparado à literatura internacional, diante das diferentes prevalências encontradas segundo a realidade de cada país.

Os resultados deste estudo mostram que os fatores socioeconômicos associados ao deslocamento ativo vão ao encontro das evidências apresentadas na literatura.4 É consensual, principalmente em países em desenvolvimento como o Brasil, que pessoas com condições econômicas desfavoráveis utilizem o deslocamento ativo por necessidade e não por opção. Trabalhadores de classes sociais mais baixas utilizam a bicicleta por ser mais econômica perante os custos de obtenção e manutenção de um automóvel e da utilização de transporte coletivo.1

Com relação aos domínios da atividade física, trabalhadores considerados inativos no lazer apresentaram maior probabilidade de se deslocarem passivamente, comparados àqueles classificados como fisicamente ativos no lazer. Ademais, trabalhadores envolvidos em atividades ocupacionais leves tinham maior probabilidade de utilizarem meios de deslocamento passivos para o trabalho. Entretanto, a relação das atividades físicas no deslocamento com outros domínios da atividade física é controversa e pesquisadores vêm mostrando uma relação positiva entre os domínios do lazer e do deslocamento.2

Algumas limitações do estudo precisam ser consideradas. O emprego do delineamento transversal na pesquisa impede o entendimento das relações causais entre as formas de deslocamento para o trabalho e muitas das exposições investigadas, principalmente pela dificuldade de se estabelecer temporalidade. Além disso, para avaliar prática de atividades físicas segundo as recomendações de saúde pública, torna-se relevante analisar freqüência, intensidade e duração da atividade, no entanto intensidade do deslocamento para o trabalho e o tempo despendido não foram considerados. Por outro lado, o estudo apresenta pontos positivos, como o alto percentual de resposta (89,6%), o tipo de análise utilizada e a associação das formas de deslocamento com outros domínios da atividade física em uma população pouco explorada na literatura.

Em síntese, sexo feminino, baixos níveis de renda e escolaridade, empresas de pequeno porte, prática de atividade física no lazer e ocupacional estiveram associados ao deslocamento ativo para o trabalho.

Além dos benefícios sociais, ambientais e econômicos, o deslocamento ativo é uma atividade comumente utilizada na vida diária e realizada em maior escala populacional que programas de exercícios físicos. Logo, o desenvolvimento de políticas públicas centradas em ações intersetoriais, envolvendo planejamento urbano, informação em saúde e incentivo por parte das empresas, pode incentivar os trabalhadores a incorporar um estilo de vida ativo.

Recebido: 21/6/2011

Aprovado: 15/9/2011

Oliveira ESA é apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Bolsista de Desenvolvimento Técnico Industrial; processo nº 384417/2010-8).

Silva SG é apoiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes - bolsa de mestrado).

Del Duca GF é apoiado pela Capes-Programa de Apoio a Planos e Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (bolsa de doutorado).

Os autores declaram que não há conflitos de interesses.

  • 1. Bacchieri G, Gigante DP, Assunção MC. Determinantes e padrões de utilização de bicicleta e acidentes de trânsito sofridos por ciclistas trabalhadores da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saude Publica. 2005;21(5):1499-508. DOI:10.1590/S0102-311X2005000500023
  • 2. Florindo AA, Hallal PC, Moura EC, Malta DC. Prática de atividades físicas e fatores associados em adultos, Brasil, 2006. Rev Saude Publica. 2009;43(Supl 2):65-73. DOI:10.1590/S0034-89102009000900009
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  • 4. Hu G, Sarti C, Jousilahti P, Silventoinen K, Barengo NC, Tuomilehto J. Leisure time, occupational, and commuting physical activity and the risk of stroke. Stroke. 2005;36(9):1994-9.DOI:10.1161/01.STR.0000177868.89946.0c
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  • Correspondência | Correspondence:

    Shana Ginar da Silva
    Coordenadoria de Pós-Graduação em Educação Física
    Campus Universitário Trindade
    88040-900 Florianópolis, SC, Brasil
    E-mail:
  • a
    Barros MVG. Atividades físicas no lazer e outros comportamentos relacionados à saúde dos trabalhadores da indústria no Estado de Santa Catarina, Brasil [dissertação de mestrado]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 1999.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2012

    Histórico

    • Recebido
      21 Jun 2011
    • Aceito
      15 Set 2011
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