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Interação de fatores riscos em tuberculose

Interaction of factors on pulmonary tuberculosis

Resumos

Estudou-se o possível sinergismo dos fatores alcoolismo e tabagismo na tuberculose pulmonar, a partir de dados de um estudo caso-controle onde 854 pessoas foram entrevistadas (sendo 427 casos-pacientes portadores de tuberculose pulmonar e 427 controles) e questionadas quanto ao hábito de ingestão alcoólica e o de fumar em períodos precedendo ao diagnóstico da doença. Concluiu-se que existe pequena interação destes fatores na tuberculose pulmonar; o hábito de fumar estaria relacionado com a doença tuberculose através de sua associação com a ingestão de bebidas alcoólicas.

Tuberculose pulmonar; Epidemiologia; Bebidas alcoólicas; Fumo


A case-control study was made of the possible synergetic effect of smoking and alcohol drinking on pulmonary tuberculosis. Analysis of the results of 854 interviews showed that there is little interactive effect in the multiplicative sense (synergism) between these factors and pulmonary tuberculosis. It is suggested that the habit of smoking may be related to pulmonary tuberculosis only through its association with that of alcohol drinking.

Tuberculosis, pulmonary; Epidemiology; Alcoholic beverages; Smoking


ARTIGOS ORIGINAIS

Interação de fatores riscos em tuberculose

Interaction of factors on pulmonary tuberculosis

Antônio Ruffino-NettoI; Marcia Caron-RuffinoII

IDo Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto — USP. "Campus" de Ribeirão Preto — 14100 — Ribeirão Preto, SP — Brasil

IIDo Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto — USP. "Campus" de Ribeirão Preto — 14100 — Ribeirão Preto, SP — Brasil

RESUMO

Estudou-se o possível sinergismo dos fatores alcoolismo e tabagismo na tuberculose pulmonar, a partir de dados de um estudo caso-controle onde 854 pessoas foram entrevistadas (sendo 427 casos-pacientes portadores de tuberculose pulmonar e 427 controles) e questionadas quanto ao hábito de ingestão alcoólica e o de fumar em períodos precedendo ao diagnóstico da doença. Concluiu-se que existe pequena interação destes fatores na tuberculose pulmonar; o hábito de fumar estaria relacionado com a doença tuberculose através de sua associação com a ingestão de bebidas alcoólicas.

Unitermos: Tuberculose pulmonar. Epidemiologia, fatores de risco. Bebidas alcoólicas. Fumo.

ABSTRACT

A case-control study was made of the possible synergetic effect of smoking and alcohol drinking on pulmonary tuberculosis. Analysis of the results of 854 interviews showed that there is little interactive effect in the multiplicative sense (synergism) between these factors and pulmonary tuberculosis. It is suggested that the habit of smoking may be related to pulmonary tuberculosis only through its association with that of alcohol drinking.

Uniterms: Tuberculosis, pulmonary. Epidemiology, risk factors. Alcoholic beverages. Smoking.

INTRODUÇÃO

Vários processos têm sido assinalados para se medir a associação entre 2 variáveis no campo da epidemiologia, tais como: a) estatística qui-quadrado (c2); b) medidas baseadas no qui-quadrado como: contingência quadrática média; coeficiente de contingência (PEARSON); c) coeficiente de associação (YULE); d) coeficiente de coligação (YULE); e) risco relativo; f) risco adicional; g) logarítmo do risco adicional, etc. Silva-Guedes3 (1977) discute os usos e indicações adequadas de cada uma das medidas.

O risco adicional é uma medida que tem sido bastante utilizada em estudos modelo caso-controle (tabelas 2 x 2) e seu valor aproxima-se tanto mais para o do risco relativo quanto mais rara for a doença cujo fator risco esteja em estudo2.

Worcester4 (1971) enfatiza o uso do risco adicional para descrever a relação quando mais de duas variáveis estão em jogo, mostrando que o valor obtido nestas circunstâncias pode ser a medida de interação entre as variáveis.

Caron-Ruffino1 (1977) desenvolveu uma investigação em nosso meio, seguindo uma metodologia caso-controle para estudar a associação dos fatores alcoolismo e tabagismo com a tuberculose pulmonar. Para cada caso (paciente portador de tuberculose pulmonar), internado no Sanatório Nestor Goulart dos Reis (Américo Brasiliense — SP) e no Abrigo Ana Diederichsen (Ribeirão Preto — SP) tomou um controle (paciente não-portador de tuberculose pulmonar internado no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto — SP), pareados com respeito às variáveis idade, sexo, procedência e estado civil. Entrevistou 427 casos e 427 controles, obtendo informações sobre o hábito de fumar e de ingestão de bebidas alcoólicas (segundo critérios definidos) em períodos que precederam à doença. Entre as várias conclusões obtidas, mostrou que havia uma associação entre tuberculose e o hábito de ingestão alcoólica nos últimos 2 anos que precederam ao diagnóstico da enfermidade c2 = 21,30; p < 0,01; risco adicional 1,94); assinalou também associação entre tuberculose pulmonar e o hábito de fumar precedendo ao diagnóstico da doença c2 = 6,07; p < 0,05; risco adicional de 1,40).

No presente trabalho nos propomos a retomar os dados do trabalho referido1 e estudar a possível interação e/ou sinergismo destes fatores (alcoolismo e tabagismo) na tuberculose pulmonar, segundo o modelo proposto por Worcester4.

MODELO

Sejam A1 a presença de uma doença (tuberculose pulmonar) e B1 (hábito de fumar) e C1 (hábito de ingestão alcoólica) os fatores supostos como riscos, A2, B2 e C2, indicarão suas ausências, ou seja:

Chamando-se:

XAB = o risco adicional de 1a ordem — mede a relação entre A e B na ausência de C;

XAB* — o risco adicional entre A e B (na ausência e na presença de C);

XAC = o risco adicional de 1a ordem — mede a relação entre A e C na ausência de B;

XAC* = o risco adicional entre A e C (na ausência e na presença de B);

XBC = o risco adicional de 1a ordem — mede a relação entre B e C na ausência de A;

XABC = o risco adicional de 2a ordem — mede o efeito conjunto (interação ou sinergismo) de B e C sobre A. Por hipótese, se XABC é igual a 1 (um), B e C seriam ditos exercer efeitos independentes sobre A, os quais seriam medidos respectivamente por XAB e XAC que serão calculados respectivamente por:

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Tabela é apresentada a distribuição dos casos e controles segundo o hábito de fumar e de ingestão alcoólica no período que precedeu ao diagnóstico da doença.

Os valores dos riscos encontrados (de 1a ou de 2a ordem) foram: XAB = 1,06; XAB* = 1,40; XAC = 1,73; XAB* = 1,94; XBC = 6,08; XABC = 1,12.

Observamos assim que o fator hábito de fumar apresenta pequena associação com tuberculose pulmonar (XAB = 1,06) na ausência do fator C (alcoolismo), sendo esta associação um pouco reforçada quando é acrescentado o fator C (XAB* = 1,40).

Por outro lado, o hábito da ingestão alcoólica apresenta uma associação mais significativa com a doença (XAC = 1,73), que é ligeiramente potencializada pelo fator B (XAC* = 1,94).

Como XAB é aproximadamente igual a XABC que por sua vez é próximo de 1, e como o risco adicional entre A e C é alto (XAC = 1,73; XAC* = 1,94), sugere portanto que existe pequena interação dos fatores B e C sobre A e que o hábito de fumar estaria relacionado com tuberculose-doença somente através de sua associação com o hábito de beber. Pode-se, por sinal, observar que a associação mais forte que existe é entre B e C (XBC = 6,08).

CONCLUSÃO

Concluimos, portanto, que existe pequeno efeito sinérgico dos fatores hábito de fumar e de ingestão alcoólica sobre a tuberculose pulmonar. O hábito de fumar estaria relacionado com a tuberculose através de sua associação com o hábito de beber.

AGRADECIMENTOS

Ao Sr. Norberto Francisco Petersén pela colaboração na tabulação dos dados.

Recebido para publicação em 05/03/1979

Aprovado para publicação em 22/03/1979

  • 1. CARON-RUFFINO, M. Estudo de alcoolismo e tabagismo associados com a tuberculose pulmonar. Ribeirão Preto, 1977. [Dissertação de Mestrado-Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto USP].
  • 2. MacMAHON, B. & PUGH, T. F. Epidemiology: principles and methods. Boston, Little Brown, 1970.
  • 3. SILVA-GUEDES, M. B. L. de A combinação de riscos relativos na medida do grau comum de associação. Ribeirão Preto, 1976. [Dissertação de Mestrado Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto USP].
  • 4. WORCESTER, J. The relative odds in the 23 contingency table. Amer. J. Epidem., 93:145-9, 1971.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Mar 2006
  • Data do Fascículo
    Jun 1979

Histórico

  • Aceito
    22 Mar 1979
  • Recebido
    05 Mar 1979
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