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A ciência e as necessidades básicas

Science and basic human needs

Editorial

Editorial

A ciência e as necessidades básicas

Science and basic human needs

Diz-se que, ao menos na nossa tão louvada civilização ocidental, as etapas fundamentais de cada habitante seriam três: nascer, morrer e pagar impostos. Ao longo dos séculos, tem-se assistido ao cumprimento dessas fases e, no caso de ocorrer deficiência da terceira, lançou-se mão das outras duas. Agora, ao se chegar ao início do segundo milênio e da tão decantada "globalização", convirá lançar olhar retrospectivo. E isso para avaliar, ao menos panoramicamente, o que a ciência fez pela humanidade.

Nesse sentido vem muito a propósito a leitura de Swaminathan (2000)1. No seu recente editorial para a revista norte-americana Science, esse autor conclui com o pensamento atribuído a Mahatma Gandhi para caracterizar as prioridades científicas destinadas às necessidades básicas do homem: "Lembre-se do rosto dos mais pobres e fracos que você viu e pergunte-se se as etapas que tem atingido lhes foram de alguma utilidade. Se lhes foram de algum ganho. Se lhes estabeleceram o controle sobre a própria vida e destino".

Ao século XX e, particularmente, aos últimos decênios, deve-se impressionante avanço no sentido de possíveis benefícios trazidos pela ciência e conseqüente desenvolvimento tecnológico. Cresceu a biotecnologia e a subseqüente manipulação genética. Deu-se impulso à exploração espacial, com o planejamento de viagens a outros planetas. Incrementou-se a produção de alimentos e a solução de vários problemas de saúde pública.

Em parte devido a isso, o número de habitantes humanos do planeta atingiu a casa dos 6 bilhões, aos quais se acrescentará outro bilhão daqui a pouco mais de um decênio, a continuar assim o crescimento populacional do Terceiro Mundo. Não obstante, deixou-se de encontrar soluções para problemas fundamentais, bem como outros surgiram. Por exemplo, em que pesem esses avanços tecnológicos, a fome endêmica deixou de ser erradicada, embora não mais constitua ameaça para o Primeiro Mundo. Além disso, o emprego e a exclusão social continuam a intimidar os pobres do mundo.

A despeito do considerável acúmulo de conhecimentos científicos e de inovações técnicas, a probreza e a desigualdade social continuam a ter significativa presença. Mais de 4 bilhões vivem com dois dólares, ou menos, por dia. Boa parte da humanidade está em situação de extrema pobreza e o baixo peso ao nascer atinge cerca de um quarto ou mesmo metade da população em algumas regiões, devido à desnutrição materna. Além disso, tem-se assinalado o aparecimento de infecções emergentes ou então o aparecimento de outras, estas tidas como eliminadas. Tal circunstância inclui países do Terceiro Mundo, com as endemias em ascensão.

Todavia, existe atualmente maior conscientização política de atacar tal problemática. Há maior disposição, embora não tanto quanto à da economia neoliberal, para procurar soluções. Ao menos para minimizar situações como, a acentuada diferença entre ricos e pobres, o incremento do desemprego, o crescimento populacional, as alterações climáticas antropogênicas, a destruição de florestas e da biodiversidade, além do surgimento de novas doenças infecciosas. A pesquisa científica está em frente a tais desafios. Seria oportuno que se dedicasse a estudá-los. E a curto prazo.

Oswaldo Paulo Forattini

Editor Científico

REFERÊNCIA

1. Swaminathan MS. Science in response to basic human needs. Science 2000;287:25

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Ago 2001
  • Data do Fascículo
    Abr 2000
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