Acessibilidade / Reportar erro

Fração atribuível populacional: planejamento de ações de prevenção de doenças no Brasil

RESUMO

Epidemiologia é o estudo da ocorrência, distribuição e determinantes de eventos relacionados à saúde da população, incluindo a aplicação desse conhecimento para a prevenção e o controle dos problemas de saúde. Entretanto, estudos epidemiológicos, na maioria das vezes, têm limitado suas perguntas de pesquisa aos fatores determinantes de desfechos em saúde. Pesquisas relacionadas à aplicação do conhecimento para ações de prevenção e controle de doenças têm sido negligenciadas. Nesse comentário, apresentamos uma descrição de como as estimativas de fração atribuível populacional podem fornecer importantes elementos para planejamento de ações de prevenção e controle de doenças no Brasil.

Risco Atribuível; Prevenção Primária; Medidas de Associação, Exposição, Risco ou Desfecho; Estudos Epidemiológicos

ABSTRACT

Epidemiology is the study of occurrence, distribution and determinants of health-related events, including the application of that knowledge to the prevention and control of health problems. However, epidemiological studies, in most cases, have limited their research questions to determinants of health outcomes. Research related to the application of knowledge for prevention and control of diseases have been neglected. In this comment, we present a description of how population attributable fraction estimates can provide important elements for planning of prevention and control of diseases in Brazil.

Attributable Risk; Primary Prevention; Measures of Association, Exposure, Risk or Outcome; Epidemiologic Studies

INTRODUÇÃO

Epidemiologia é o estudo da ocorrência e distribuição de eventos relacionados à saúde da população, incluindo seus determinantes, e a aplicação desse conhecimento para prevenção e controle dos problemas de saúde1616. Porta M. A dictionary of epidemiology. 5th ed. New York: Oxford University Press; 2008.. Em outras palavras, a epidemiologia tem duas ações centrais: 1) identificar as causas dos eventos relacionados à saúde; 2) promover, proteger e restaurar a saúde da população66. Galea S. An argument for a consequentialist epidemiology. Am J Epidemiol. 2013;178(8):1185-91. DOI:10.1093/aje/kwt172
https://doi.org/10.1093/aje/kwt172...
. Um dos mais claros exemplos dessa dupla ação da epidemiologia ficou evidente no combate à cólera em Londres. Em 1849, John Snow, ao mapear os casos de cólera em Londres, identificou que a incidência da doença estava relacionada com a distribuição de água, contrariando a teoria dos miasmas, então predominante na época. Em um segundo momento, John Snow esteve envolvido diretamente nas ações de prevenção e controle da cólera, inclusive na remoção da Broad Street pump66. Galea S. An argument for a consequentialist epidemiology. Am J Epidemiol. 2013;178(8):1185-91. DOI:10.1093/aje/kwt172
https://doi.org/10.1093/aje/kwt172...
,2020. Snow J. On the mode of communication of cholera. 2nd ed. London: John Churchill; 1860.. Recentemente, essa transferência do conhecimento oriundo de estudos epidemiológicos para o planejamento de políticas e ações de prevenção populacional de doenças tem recebido o nome de “epidemiologia translacional”1111. Khoury MJ, Gwinn M, Ioannidis JP. The emergence of translational epidemiology: from scientific discovery to population health impact. Am J Epidemiol. 2010;172(5):517-24. DOI:10.1093/aje/kwq211
https://doi.org/10.1093/aje/kwq211...
.

Depois de Snow, muitos outros exemplos ao longo da história conseguiram preencher a lacuna entre o saber e o fazer55. Fine P, Victora CG, Rothman KJ, Moore PS, Chang Y, Curtis V, et al. John Snow’s legacy: epidemiology without borders. Lancet. 2013;381(9874):1302-11. DOI:10.1016/S0140-6736(13)60771-0
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(13)60...
. Entretanto, na história recente, a segunda ação da epidemiologia tem sido negligenciada. Desde o início da chamada “Epidemiologia Moderna”, epidemiologistas têm focado suas ações, quase que de forma obsessiva, em encontrar relações causais, utilizando para isso os métodos epidemiológicos55. Fine P, Victora CG, Rothman KJ, Moore PS, Chang Y, Curtis V, et al. John Snow’s legacy: epidemiology without borders. Lancet. 2013;381(9874):1302-11. DOI:10.1016/S0140-6736(13)60771-0
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(13)60...
. É compreensível que o campo tenha tomado tal caminho no passado, pois pouco se conhecia sobre os fatores determinantes das doenças na população e, obviamente, não se pode combater o que não se conhece. Entretanto, mesmo após a identificação desses determinantes, não se tem percebido o mesmo engajamento com a segunda ação relacionada à epidemiologia – aplicação do conhecimento para ações de prevenção e controle de doenças66. Galea S. An argument for a consequentialist epidemiology. Am J Epidemiol. 2013;178(8):1185-91. DOI:10.1093/aje/kwt172
https://doi.org/10.1093/aje/kwt172...
.

A dupla ação da epidemiologia está presente nas medidas de associação utilizadas em estudos populacionais. As medidas de associação utilizadas para estimar o real efeito da exposição na ocorrência da doença (teórico)1919. Rothman, KJ, Greenland S, Lash TL. Modern epidemiology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2008. são de dois tipos: 1) diferença relativa ou razão da incidência da doença entre expostos e não expostos ao fator; 2) diferença absoluta da incidência da doença entre expostos e não expostos ao fator. As medidas de associação baseadas em diferenças relativas ou razões indicam a força de associação, e estão predominantemente presentes em estudos etiológicos, cujo objetivo principal é investigar as causas de desfechos relacionados à saúde. Já as medidas de associação baseadas em diferenças absolutas trazem uma perspectiva de estratégias de prevenção populacional ou impacto em saúde pública, uma vez que informam o excesso do risco da doença associado à exposição. Para uma maior compreensão das medidas de associação utilizadas em estudos epidemiológicos, uma vasta e detalhada literatura encontra-se disponível em livros-texto de epidemiologia77. Gordis L. Epidemiology. 5th edition. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2014.,1919. Rothman, KJ, Greenland S, Lash TL. Modern epidemiology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2008.,2222. Szklo M, Nieto FJ. Epidemiology: beyond basics. 3rd ed. Burlington: Joes & Bartlett Learning; 2014..

Para ilustrar a predominância de estudos etiológicos em epidemiologia, realizamos busca no Medline em 15 de junho de 2015, sem limite de data, utilizando como descritores as medidas de associação baseadas em diferenças relativas (“relative differences” OR “prevalence ratio” OR “odds ratio” OR “risk ratio” OR “relative risk” OR “hazard ratio”) e absolutas (“absolute differences” OR “excess fraction” OR “etiologic fraction” OR “impact fraction” OR “attributable fraction” OR “attributable risk” OR “population attributable risk” OR “population attributable fraction”).

No mundo, encontramos 268.750 registros baseados em diferenças relativas e somente 4.784 registros sobre diferenças absolutas. No Brasil, encontramos 4.352 registros sobre diferenças relativas e apenas 82 sobre diferenças absolutas. Vale ressaltar que, possivelmente, parte dos documentos (artigos, relatórios, livros e outras produções) que utilizam medidas de associação baseadas em diferenças absolutas esteja na literatura cinza. Entretanto, é improvável que a grande predominância encontrada em prol das medidas de associação de diferenças relativas seja muito menor quando considerada a literatura cinza.

Nesse contexto, apresentamos comentário com breve descrição de como as estimativas de fração atribuível populacional (FAP) podem ser calculadas a fim de fornecer importantes elementos para planejamento de ações de prevenção e controle de doenças no Brasil, possibilitando aproximar epidemiologistas do serviço de saúde e, consequentemente, de uma epidemiologia translacional.

Estimativas de fração atribuível populacional

A FAP, baseada em diferenças absolutas, estima a proporção da doença ou evento relacionado à saúde que seria prevenido na população caso o fator de risco fosse eliminado. Para tanto, a FAP fornece uma perspectiva de ações de prevenção da doença considerando o risco da doença em indivíduos expostos e a prevalência da exposição na população. Assim, alta magnitude do risco da doença em indivíduos expostos (medida baseada em diferença relativa ou razão) pode ter baixo impacto populacional se os fatores de risco a ela associados forem raros, ao passo que baixos riscos poderão impactar a saúde pública quando as exposições forem frequentes. Esse conceito remete à celebre frase de Geoffrey Rose: “A large number of people at small risk may give rise to more cases of disease than a small number of people at high risk1818. Rose G. Sick individuals and sick populations. Int J Epidemiol. 1985;14(1):32-8. DOI:10.1093/ije/14.1.32
https://doi.org/10.1093/ije/14.1.32...
. Nesse sentido, assim como as demais medidas de associação baseadas em diferenças absolutas, a FAP fornece importantes informações sobre o potencial impacto de programas de prevenção e intervenções em saúde pública, sendo extremamente útil para políticos, gestores e tomadores de decisão1919. Rothman, KJ, Greenland S, Lash TL. Modern epidemiology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2008.,2222. Szklo M, Nieto FJ. Epidemiology: beyond basics. 3rd ed. Burlington: Joes & Bartlett Learning; 2014..

A FAP, em geral, é estimada em estudos de coorte, nos quais indivíduos expostos e não expostos ao fator de risco são acompanhados ao longo do tempo, permitindo medir a incidência do desfecho em ambos os grupos. A FAP pode ser estimada a partir da equação1313. Levin M. The occurrence of lung cancer in man. Acta Unio Int Contra Cancrum. 1953;9(3):531-41.:

Em que Ipop é a incidência da doença em toda a população e Io é a incidência da doença no grupo não exposto.

Entretanto, no Brasil, ainda são incipientes estudos de coorte que permitem a mensuração da FAP, mas existem algumas equações que permitem estimá-la por meio de dados secundários disponíveis.

Em 1953, Morton Levin mostrou que a equação 1 é uma função do risco relativo e da frequência do fator de risco na população. Portanto, a FAP também poderia ser estimada por meio da seguinte equação1313. Levin M. The occurrence of lung cancer in man. Acta Unio Int Contra Cancrum. 1953;9(3):531-41.:

Em que Pe é a prevalência da exposição na população e RR é o risco relativo.

Assim, seria possível estimar a FAP utilizando dados epidemiológicos sobre a prevalência da exposição no Brasil e o risco relativo da doença para a exposição de interesse. Diversos inquéritos representativos da população do Brasil disponibilizam informações de prevalência de fatores de risco e proteção, permitindo, inclusive, a estratificação pelas cinco regiões do País, unidades da federação, capitais e não capitais. São exemplos de inquéritos nacionais: Pesquisa de Orçamento Familiar99. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009: análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2011., Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico1515. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2013: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014., Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar1010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde do escolar 2012. Rio de Janeiro (RJ): Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2013. e Pesquisa Nacional de Saúde2323. Szwarcwald CL, Malta DC, Pereira CA, Vieira MLFP, Conde WN, SOUZA Junior PRB, et al. Pesquisa Nacional de Saúde no Brasil: concepção e metodologia de aplicação. Cienc Saude Coletiva. 2014;19(2):333-42. DOI:10.1590/1413-81232014192.14072012
https://doi.org/10.1590/1413-81232014192...
.

Em relação ao risco relativo, idealmente, esses deveriam ser obtidos de estudos longitudinais com baixo risco de erros sistemáticos e confundimento. Além disso, estimativas de odds ratio de estudos caso-controle também têm sido utilizadas para estimar FAP1414. Levin ML, Bertell R. RE: “simple estimation of population attributable risk from case-control studies.” Am J Epidemiol. 1978;108(1):78-9.. Essas medidas de associação deveriam ser oriundas de estudos que tivessem a mesma população alvo para a qual as estimativas de FAP seriam calculadas. Entretanto, com frequência, esses estudos não estão presentes em países de baixa e média renda, incluindo o Brasil. Portanto, na prática, utilizam-se estimativas disponíveis em revisões sistemáticas com meta-análise, além de estudos de coorte internacionais bem conduzidos. Essa portabilidade do RR oriundo de outra população alvo assume alguns pressupostos2121. Steenland K, Armstrong B. An overview of methods for calculating the burden of disease due to specific risk factors. Epidemiology. 2006;17(5):512-9. DOI:10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
https://doi.org/10.1097/01.ede.000022915...
: 1) exposição medida nas coortes; e a 2) latência da doença são similares à da população onde a FAP será estimada; 3) ausência de modificação de efeito.

A limitação inerente à equação 2 é a necessidade da utilização do RR bruto (não ajustado). Entretanto, na maioria das vezes, associações medidas em estudos epidemiológicos são acometidas por confundimento e estratégias para ajuste são incorporadas. Quando estimativas de RR ajustadas são utilizadas na equação 2, ocorre um viés na medida de FAP. Na presença de confundimento positivo (RR bruto > RR ajustado), a FAP será subestimada, ao passo que para confundimento negativo (RR bruto < RR ajustado), será superestimada. O viés da FAP dependerá então da magnitude do confundimento (quanto maior a magnitude, maior o viés), da prevalência da variável de confusão (menor prevalência, maior o viés) e da força de associação entre exposição e desfecho (quanto menor a magnitude de associação, maior o viés)33. Darrow LA, Steenland NK. Confounding and bias in the attributable fraction. Epidemiology. 2011;22(1):53-8. DOI:10.1097/EDE.0b013e3181fce49b
https://doi.org/10.1097/EDE.0b013e3181fc...
.

Na presença de confundimento, recomenda-se a utilização da seguinte equação1717. Rockhill B, Newman B, Weinberg C. Use and misuse of population attributable fractions. Am J Public Health. 1998;88(1):15-9. DOI:10.2105/AJPH.88.1.15
https://doi.org/10.2105/AJPH.88.1.15...
:

Em que Pc é a prevalência da exposição entre os casos da doença e o RRadj é o risco relativo ajustado por variáveis de confusão.

Sendo assim, para obter a Pc, faz-se necessário medir a prevalência do fator de risco em subgrupos populacionais ou, pelo menos, considerar a variação possível da exposição nesse subgrupo. Uma forma de obtê-la é medir a razão da prevalência da exposição entre a população de casos e a população geral, reportada nos estudos de coorte. Conhecendo a diferença relativa da prevalência da exposição entre casos da doença e a população geral, esse fator de correção poderá ser aplicado sobre a prevalência da exposição na população geral, a fim de se obter a prevalência da exposição entre os casos da doença. Por exemplo, a prevalência de inatividade física entre casos de câncer de cólon é 1,22 vezes a da população geral1212. Lee IM, Shiroma EJ, Lobelo F, Puska P, Blair SN, Katzmarzyk PT. Effect of physical inactivity on major non-communicable diseases worldwide: an analysis of burden of disease and life expectancy. Lancet. 2012;380(9838):219-29. DOI:10.1016/S0140-6736(12)61031-9
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(12)61...
. Dessa forma, se a prevalência de inatividade física no Brasil é de aproximadamente 20,0%, estima-se que a prevalência de inatividade física entre os casos de câncer de cólon no Brasil seja de 24,4%.

Quando os dados de exposição e os valores de risco relativo estão disponíveis, respectivamente, de forma contínua (exemplo: grama/dia) e por unidade de aumento na exposição (RR dose-resposta), utiliza-se a seguinte fórmula para obter a FAP:

Em que R = exp [In(RRdose) ×

RRdose = risco relativo da doença por unidade de aumento da exposição.

= média da exposição na população alvo.

Essa equação assume uma relação log-linear entre exposição e desfecho22. Boffetta P, Tubiana M, Hill C, Boniol M, Aurengo A, Masse R, et al. The causes of cancer in France. Ann Oncol. 2009;20(3):550-5. DOI:10.1093/annonc/mdn597
https://doi.org/10.1093/annonc/mdn597...
.

Essas medidas de impacto em saúde pública têm sido utilizadas por diversas organizações ao redor do mundo a fim de priorizar intervenções, determinar metas e iniciar políticas públicas. Como exemplo, podemos citar a Organização Mundial da Saúde, que, por meio do Global Burden of Disease study, fornece informações dos principais fatores de risco modificáveis para doenças e agravos, utilizadas, inclusive, para determinação das metas de redução de doenças crônicas não transmissíveis para 20252525. World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2014. Geneva: World Health Organization; 2014.. Na América, desde 2009, a Organização Pan-americana de Saúde, a partir da publicação das estimativas de mortes atribuíveis ao consumo de sódioa a Pan American Health Organization. A guide for setting targets and timelines to reduce the salt content of food: 2013. Washington (DC): Pan American Health Organization; 2013 [citado 2015 jun 15]. Disponível em: http://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=21493+&Ite , apoia um Grupo Consultivo Técnico que visa mobilizar políticas e intervenções para redução do consumo de sal. Nos Estados Unidos, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) fornece informações de anos de vida perdidos, anos de vida perdidos ajustado por incapacidade, e custos econômicos atribuíveis a alguns fatores de risco (por exemplo, o tabagismo)b b Center for Disease Control and Prevention. Smoking & Tobacco Use. [citado 2015 jun 15]. Disponível em: http://www.cdc.gov/tobacco/data_statistics/index.htm .

Para exemplificar a utilização das estimativas no Brasil, calculamos a FAP de mortalidade por doença cardiovascular associada à baixa ingestão de hortaliças. Segundo dados da Pesquisa de Orçamento Familiar realizada em 2008, a disponibilidade média de hortaliças nos domicílios brasileiros foi de 74,2 gramas per capita por dia99. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009: análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2011.. A recomendação mínima de ingestão de frutas e hortaliças é de 400 gramas/dia, que podem ser distribuídos em 240 gramas de hortaliças e 160 gramas de frutas. Meta-análise recente encontrou associação inversa entre o consumo de hortaliças e mortalidade por doenças cardiovasculares (HR 0,96 para cada porção de hortaliças/dia, equivalente a 77 gramas/dia)2424. Wang X, Ouyang Y, Liu J, Zhu M, Zhao G, Bao W, et al. Fruit and vegetable consumption and mortality from all causes, cardiovascular disease, and cancer: systematic review and dose-response meta-analysis of prospective cohort studies. BMJ. 2014;349:g4490. DOI:10.1136/bmj.g4490.
https://doi.org/10.1136/bmj.g4490...
. Utilizando a equação 4, estimamos que aproximadamente 9,6% das mortes por doenças cardiovasculares seriam evitadas se a recomendação mínima diária de hortaliças fosse atingida no Brasil.

Para maior compreensão sobre estimativas de FAP, uma vasta literatura pode ser consultada a fim de obter maiores detalhes sobre as diferentes equações, limitações, pontos fortes e perspectivas do método11. Benichou J. A review of adjusted estimators of attributable risk. Stat Methods Med Res. 2001;10(3):195-216. DOI:10.1191/096228001680195157
https://doi.org/10.1191/0962280016801951...
,33. Darrow LA, Steenland NK. Confounding and bias in the attributable fraction. Epidemiology. 2011;22(1):53-8. DOI:10.1097/EDE.0b013e3181fce49b
https://doi.org/10.1097/EDE.0b013e3181fc...
,44. Darrow LA. Commentary: errors in estimating adjusted attributable fractions. Epidemiology. 2014;25(6):917-8. DOI:10.1097/EDE.0000000000000177
https://doi.org/10.1097/EDE.000000000000...
,88. Greenland S, Robins JM. Conceptual problems in the definition and interpretation of attributable fractions. Am J Epidemiol. 1988;128(6):1185-97.,1717. Rockhill B, Newman B, Weinberg C. Use and misuse of population attributable fractions. Am J Public Health. 1998;88(1):15-9. DOI:10.2105/AJPH.88.1.15
https://doi.org/10.2105/AJPH.88.1.15...
,2121. Steenland K, Armstrong B. An overview of methods for calculating the burden of disease due to specific risk factors. Epidemiology. 2006;17(5):512-9. DOI:10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
https://doi.org/10.1097/01.ede.000022915...
. A partir disso, é possível compreender algumas medidas de impacto em saúde pública derivadas da FAP, como anos de vida perdidos, anos de vida vividos com incapacidade e anos de vida perdidos ajustado por incapacidade2121. Steenland K, Armstrong B. An overview of methods for calculating the burden of disease due to specific risk factors. Epidemiology. 2006;17(5):512-9. DOI:10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
https://doi.org/10.1097/01.ede.000022915...
. Também é possível obter subsídios para estimar intervalos de confiança da FAP, pelo cálculo da variância da FAP ou mesmo por simulações de Monte Carlo2121. Steenland K, Armstrong B. An overview of methods for calculating the burden of disease due to specific risk factors. Epidemiology. 2006;17(5):512-9. DOI:10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
https://doi.org/10.1097/01.ede.000022915...
.

CONCLUSÃO

O objetivo desse comentário foi debater as possibilidades de utilização das estimativas de FAP por epidemiologistas no Brasil e a sua importância para o planejamento de políticas e ações de prevenção de doenças. Entendemos que epidemiologistas têm papel fundamental nessas ações, muitas vezes negligenciadas, e que, pelo uso de dados secundários disponíveis, as estimativas de FAP configuram-se importante via de aproximação e trabalho entre epidemiologistas e os serviços de saúde.

Agradecimentos

Catarina Machado Azeredo, pelos comentários e contribuições durante a elaboração do manuscrito.

REFERENCES

  • 1
    Benichou J. A review of adjusted estimators of attributable risk. Stat Methods Med Res 2001;10(3):195-216. DOI:10.1191/096228001680195157
    » https://doi.org/10.1191/096228001680195157
  • 2
    Boffetta P, Tubiana M, Hill C, Boniol M, Aurengo A, Masse R, et al. The causes of cancer in France. Ann Oncol 2009;20(3):550-5. DOI:10.1093/annonc/mdn597
    » https://doi.org/10.1093/annonc/mdn597
  • 3
    Darrow LA, Steenland NK. Confounding and bias in the attributable fraction. Epidemiology 2011;22(1):53-8. DOI:10.1097/EDE.0b013e3181fce49b
    » https://doi.org/10.1097/EDE.0b013e3181fce49b
  • 4
    Darrow LA. Commentary: errors in estimating adjusted attributable fractions. Epidemiology 2014;25(6):917-8. DOI:10.1097/EDE.0000000000000177
    » https://doi.org/10.1097/EDE.0000000000000177
  • 5
    Fine P, Victora CG, Rothman KJ, Moore PS, Chang Y, Curtis V, et al. John Snow’s legacy: epidemiology without borders. Lancet 2013;381(9874):1302-11. DOI:10.1016/S0140-6736(13)60771-0
    » https://doi.org/10.1016/S0140-6736(13)60771-0
  • 6
    Galea S. An argument for a consequentialist epidemiology. Am J Epidemiol 2013;178(8):1185-91. DOI:10.1093/aje/kwt172
    » https://doi.org/10.1093/aje/kwt172
  • 7
    Gordis L. Epidemiology. 5th edition. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2014.
  • 8
    Greenland S, Robins JM. Conceptual problems in the definition and interpretation of attributable fractions. Am J Epidemiol 1988;128(6):1185-97.
  • 9
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009: análise do consumo alimentar pessoal no Brasil. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2011.
  • 10
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde do escolar 2012. Rio de Janeiro (RJ): Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2013.
  • 11
    Khoury MJ, Gwinn M, Ioannidis JP. The emergence of translational epidemiology: from scientific discovery to population health impact. Am J Epidemiol 2010;172(5):517-24. DOI:10.1093/aje/kwq211
    » https://doi.org/10.1093/aje/kwq211
  • 12
    Lee IM, Shiroma EJ, Lobelo F, Puska P, Blair SN, Katzmarzyk PT. Effect of physical inactivity on major non-communicable diseases worldwide: an analysis of burden of disease and life expectancy. Lancet 2012;380(9838):219-29. DOI:10.1016/S0140-6736(12)61031-9
    » https://doi.org/10.1016/S0140-6736(12)61031-9
  • 13
    Levin M. The occurrence of lung cancer in man. Acta Unio Int Contra Cancrum 1953;9(3):531-41.
  • 14
    Levin ML, Bertell R. RE: “simple estimation of population attributable risk from case-control studies.” Am J Epidemiol 1978;108(1):78-9.
  • 15
    Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2013: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014.
  • 16
    Porta M. A dictionary of epidemiology. 5th ed. New York: Oxford University Press; 2008.
  • 17
    Rockhill B, Newman B, Weinberg C. Use and misuse of population attributable fractions. Am J Public Health 1998;88(1):15-9. DOI:10.2105/AJPH.88.1.15
    » https://doi.org/10.2105/AJPH.88.1.15
  • 18
    Rose G. Sick individuals and sick populations. Int J Epidemiol 1985;14(1):32-8. DOI:10.1093/ije/14.1.32
    » https://doi.org/10.1093/ije/14.1.32
  • 19
    Rothman, KJ, Greenland S, Lash TL. Modern epidemiology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2008.
  • 20
    Snow J. On the mode of communication of cholera. 2nd ed. London: John Churchill; 1860.
  • 21
    Steenland K, Armstrong B. An overview of methods for calculating the burden of disease due to specific risk factors. Epidemiology 2006;17(5):512-9. DOI:10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
    » https://doi.org/10.1097/01.ede.0000229155.05644.43
  • 22
    Szklo M, Nieto FJ. Epidemiology: beyond basics. 3rd ed. Burlington: Joes & Bartlett Learning; 2014.
  • 23
    Szwarcwald CL, Malta DC, Pereira CA, Vieira MLFP, Conde WN, SOUZA Junior PRB, et al. Pesquisa Nacional de Saúde no Brasil: concepção e metodologia de aplicação. Cienc Saude Coletiva 2014;19(2):333-42. DOI:10.1590/1413-81232014192.14072012
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232014192.14072012
  • 24
    Wang X, Ouyang Y, Liu J, Zhu M, Zhao G, Bao W, et al. Fruit and vegetable consumption and mortality from all causes, cardiovascular disease, and cancer: systematic review and dose-response meta-analysis of prospective cohort studies. BMJ 2014;349:g4490. DOI:10.1136/bmj.g4490.
    » https://doi.org/10.1136/bmj.g4490
  • 25
    World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2014. Geneva: World Health Organization; 2014.
  • Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP – Processo 2014/25614-4 – bolsa de doutorado para LFMR).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2015
  • Aceito
    20 Jul 2015
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo Avenida Dr. Arnaldo, 715, 01246-904 São Paulo SP Brazil, Tel./Fax: +55 11 3061-7985 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@usp.br