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Avaliação da vulnerabilidade à perda de solo no distrito de Boane em Moçambique

Resumo

O estudo da vulnerabilidade à perda de solo das unidades de paisagem constitui um dos mecanismos para o desenho de práticas sustentáveis de uso e ocupação da terra e dos recursos naturais. Atendendo a esse facto, esta pesquisa teve como objectivo avaliar a vulnerabilidade à perda do solo no distrito de Boane em 2018 aplicando a metodologia proposta por Crepani. Os materiais utilizados incluem as imagens OLI do Landsat-8 e ASTER GDTM V2 que permitiram a geração dos mapas de uso e cobertura de terra e declividade respectivamente, o banco de dados de solos, litologia, e pluviosiodade disponível no CENACARTA. Estes dados foram processados em ambiente SIG em função da metodologia proposta por Crepani para análise da vulnerabilidade à perda de solo. Os resultados obtidos mostraram que cerca de 53,3% do distrito apresentou estabilidade mediana, 34,7% moderadamente vulnerável, 11,4% moderadamente estável, 0,6% estável e 0% vulnerável. Estes resultados revelam uma situação considerada favorável, porém não se deve ficar numa situação de conforto pois com o ritmo de urbanização que se assiste nas últimas décadas e suas consequências sobre o meio ambiente, aliada à não implementação dos planos de ordenamento, pode colocar em causa esta situação.

Palavras-chave:
Boane; Estabilidade; Geogrocessamento; Perda de Solo

Abstract

The soil lost vulnerability study of the landscape units constitutes one of the mechanisms for the design of sustainable land use and cover and natural resources. Therefore, this research aimed to evaluate the soil loss vulnerability in the Boane district in 2018. The materials used included OLI Landsat 8 and ASTER GDTM V2 images, through which we generated land use and cover and slope maps respectively, soils, lithology, and precipitation databases available in CENACARTA. This data was processed in a GIS environment. The results showed that 53.3% of the district had median stability, 34.7% moderately vulnerable, 11.4% moderately stable, 0.6% stable and 0% vulnerable. These results indicate a favorable situation, but not comfortable at the short term, due to the accelerated rhythm of urbanization and its consequences to the environment that is seen in the last decades, joined to the lack or non-implementation of the main planning plans, that can change this situation in short term.

Keywords:
Boane; Stability; Geoprocessing; Soil Loss

INTRODUÇÃO

Para se analisar uma unidade de paisagem é necessário conhecer sua gênese, constituição física, forma e estágio de evolução, bem como o tipo da cobertura vegetal que sobre ela se desenvolve. Estas informações são fornecidas pela Geologia, Geomorfologia, Pedologia e Fitogeografia e precisam estar integradas para que se tenha um retrato fiel do comportamento de cada unidade frente a ocupação. Finalmente, é necessário o auxílio da Climatologia para que se conheçam algumas características climáticas da região onde se localiza a unidade de paisagem, a fim de que se anteveja o seu comportamento frente às alterações impostas pela ocupação (CREPANI et al., 2001CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; HERNANDEZ, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V.; BARBOSA, C. C. F. Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico e ao Ordenamento Territorial. São José dos Campos. SAE/INPE. 2001.).

A vulnerabilidade à perda de solo das unidades de paisagem está ligada ao desequilíbrio da dinâmica natural do meio ambiente. Cada componente da paisagem, como Geologia, Geomorfologia, Pedologia, Vegetação, Clima e a intervenção antrópica, participa desta dinâmica de forma integrada. Essas componentes participam dessa dinâmica de forma integrada (DE LA ROSA et al., 2000DE LA ROSA D.; MORENO J. A.; MAYOL F.; BONSÓN T. Assessment of soil erosion vulnerability in western Europe and potential impact on crop productivity due to loss of soil depth using the ImpelERO model. Agriculture, Ecosystems and Environment, 81, p. 179-190, 2000. https://doi.org/10.1016/S0167-8809(00)00161-4
https://doi.org/10.1016/S0167-8809(00)00...
; LU et al., 2004LU, D.; LI, G.; VALLADARES, G. S.; BATISTELLA, M. Mapping soil erosion risk in Rondonia, Brazilian Amazonia: using RUSLE, remote sensing and GIS. Land DegradDev 15(5), p. 499-512, 2004. https://doi.org/10.1002/ldr.634
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; CREPANI et al., 2008CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; PALMEIRA, A. F.; SILVA, E. F. Banco de Dados Geográficos dos Municípios de Gilbués e Monte Alegre do Piauí (pi) (Municípios pertencentes ao núcleo de desertificação de Gilbués).INPE. São Jose dos Campos, 2008.).

Para Becker e Egler (1997BECKER, B. K.; EGLER, C. A. G. Detalhamento da Metodologia para Execução do Zoneamento Ecológico-Econômico pelos Estados da Amazônia Legal. Brasília. SAE Secretaria de Assuntos Estratégicos/MMA-Ministério do Meio Ambiente, 1997.) o mapa de vulnerabilidade à perda de solo representa a análise do meio físico e biótico para a ocupação racional e uso sustentável dos recursos naturais. A sua associação com dados de potencialidade social, econômica e política oferece subsídio à gestão territorial (LU et al., 2004LU, D.; LI, G.; VALLADARES, G. S.; BATISTELLA, M. Mapping soil erosion risk in Rondonia, Brazilian Amazonia: using RUSLE, remote sensing and GIS. Land DegradDev 15(5), p. 499-512, 2004. https://doi.org/10.1002/ldr.634
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). Essa vulnerabilidade é analisada a partir da caracterização morfodinâmica dessas unidades, com base em metodologias desenvolvidas por Crepani et al.(1996CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; AZEVEDO, L. G.; HERNANDEZ FILHO, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V. Curso de sensoriamento remoto aplicado ao zoneamento ecológico econômico [CD-ROM]. In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 8. Salvador, 1996. Anais. São Paulo: Image Multimídia, 1996.).

A escala de vulnerabilidade das unidades territoriais básicas, a partir de sua caracterização morfodinâmica, é feita segundo critérios desenvolvidos a partir dos princípios da Ecodinâmica de Tricart (1977TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro, FIBGE, 1977.).

Os critérios desenvolvidos a partir desses princípios permitem a criação de um modelo onde se pode buscar a avaliação, de forma relativa e empírica, do estágio de evolução morfodinâmica das unidades territoriais básicas, atribuindo-se valores de estabilidade às categorias morfodinâmicas (CREPANI et al., 2001CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; HERNANDEZ, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V.; BARBOSA, C. C. F. Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico e ao Ordenamento Territorial. São José dos Campos. SAE/INPE. 2001.).

A partir dessa primeira aproximação procura-se contemplar maior variedade de categorias morfodinâmicas, de forma a se construir uma escala de vulnerabilidade para situações que ocorram naturalmente (CREPANI, 2001CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; HERNANDEZ, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V.; BARBOSA, C. C. F. Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico e ao Ordenamento Territorial. São José dos Campos. SAE/INPE. 2001.).

Em Moçambique a agricultura itinerante, a exploração de madeira, lenha e a produção de carvão vegetal e as queimadas descontroladas são considerados os factores preponderantes para a redução da cobertura vegetal e consequentemente erosão dos solos.

A população do distrito em análise utiliza recursos florestais como estacas, caniço e outros para a construção de habitações e, por outro lado, aproveita-se das árvores para extração da lenha, madeira e para a produção de carvão, que são os combustíveis mais utilizados pelas famílias. Por conta disso, o distrito apresenta problemas sérios de desflorestamento e erosão dos solos.

Em dez anos o distrito teve aumento populacional de quase 50%. Este incremento deveu-se à migração da população das cidades de Maputo e Matola, fazendo com que houvesse retirada da cobertura vegetal nativa para a construção das suas residências. Este facto precipita, a priori, a vulnerabilidade do distrito à perda do solo.

Pereira e Pinto (2007PEREIRA, L. H.; PINTO, S. A. F. Utilização de imagens aerofotográficas no mapeamento multitemporal do uso da terra e cobertura vegetal na bacia do rio Corumbataí - SP, com o suporte de sistemas de informações geográficas. XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto. Anais…, Florianópolis, Brasil, 21-26 abril 2007, INPE, p. 1321-1328. 2007.) afirmam que a velocidade e extensão com que os problemas ambientais vêm ocorrendo, decorrentes da intensa pressão gerada pela ocupação antrópica, exige-se a utilização de técnicas de coleta de dados e de monitoramento sistemático da superfície terrestre, compatíveis com a rapidez destas mudanças.

Nas últimas décadas técnicas de modelagem empírica associadas aos sistemas de informação geográfica e imageamento por satélite com moderada a alta resolução espacial e temporal têm facilitado o monitoramento e a quantificação das condições de mudanças ocorridas na superfície da terra e sua degradação (PONZONI et al., 2014PONZON, I F. J., MACARRINGUE, L. S., SANTOS, S. L. dos; SANTOS-JÚNIOR, J. L. Comparação entre fatores de reflectância gerados a partir de dados dos sensores TM/LANDSAT 5 e MODIS/TERRA aplicando diferentes metodologias de conversão de dados, Revista Brasileira de Cartografia, No. 66/2: p. 263-270, 2014.; VIJITH; DODGE-WAN, 2017).

Deste modo, este artigo pretende avaliar a vulnerabilidade à perda do solo no distrito de Boane em 2018. Esta análise servirá de base ou subsídio para a elaboração dos diferentes instrumentos de ordenamento territorial (a nível do distrito ou ao nível autárquico), bem como a elaboração de um planejamento ambiental, contribuindo deste modo para a elaboração de medidas de conservação e preservação.

METODOLOGIA

Localização e caracterização da área de estudo

O Distrito de Boane localiza-se a Sul da Província de Maputo e faz fronteira a Norte com o Distrito de Moamba a Oeste e Sudeste com o Distrito de Namaacha, a Sul e Sudeste com o Distrito de Matutuine e a Leste com o Município da Matola (Figura 1). Tem uma superfície aproximada de 860 Km2 e alberga uma população de 210498 habitantes segundo o Censo de 2017 (INE, 2017). É um distrito com clima tropical seco, com duas estações bem definidas, a estação seca (entre Abril e Setembro) e a chuvosa (entre Outubro e Março). A temperatura média anual é de 23,7ºC e a precipitação média anual ronda aos 752 mm (MAE, 2005).

O distrito é atravessado pelos rios Umbeluzi, Tembe e Matola pertencentes às bacias hidrográficas dos mesmos nomes, sendo o rio Umbeluzi, que nasce no vizinho e-Swatini (antiga Swazilândia) numa extensão de 70 km (MAE, 2005), o mais importante por ser a principal fonte de água potável para as cidades de Maputo (capital do país) e Matola além de ser a principal fonte de água para agricultura de irrigação.

Outrora predominavam em Boane floresta que possuía grande densidade de estrato arbóreo, árvores de tronco grosso com amplas copas que se elevavam até a uma altura de 10 a 20 m que com tempo foi sendo degradada dando lugar às áreas de pastagem e agricultura, apresentando manchas de savana secundária e árvores de fruto espontâneas ou subespontâneas (MUCHANGOS, 1999MUCHANGOS, A. Moçambique. Paisagens e Regiões Naturais. Maputo: FBM, 1999.).

Figura 1
Localização da área de estudo

Boane é constituído por material basáltico de idade Jurássico-Cretáceo (Karroo Vulcânico da série Superior), sedimentos de Mananga, seixos rolados e por sedimentos aluvionares. Os basaltos são de idade Jurássico-Cretáceo, pertencentes ao Super grupo do Karroo, formados durante a última fase, a das emanações vulcânicas denominadas de Stormberg Superior ou Serie Superior. Estes Basaltos fazem parte da cadeia dos Libombos com direcção Norte-Sul com mais de 450km de comprimento e de 20-25km de largura e inclinação para Este. Encontram-se também, nas duas margens do rio Umbeluzi, coberturas quaternárias de materiais arenosos, constituídas por depósitos aluvionares ou por aluviões com cascalho, quartzo, riólitos, alguns minerais e rochas (TIQUE; DYKSHOORN, 1993TIQUE C. A.; DYKSHOORN, J. A. Levantamento Detalhado de Solos da Área de Massaca I e II. Boane, SERIE TERRA E AGUA do Instituto Nacional De InvestigacaoAgronomica (INIA), Comunicação No. 17, Maputo, Moçambique, 1993.; VASCONCELOS, 2014VASCONCELOS, L. Breve apresentação sobre os recursos geológicos de Moçambique. Comunicações Geológicas (2014), v. 101, p. 869-874, 2014.).

O relevo do baixo curso da bacia do rio Umbeluzi é caracterizado, em geral, por uma paisagem levemente ondulada e sem grandes diferenças de altitude. Na parte Norte, Este e Sudoeste apresenta uma paisagem com pequenas diferenças de nível, formando-se uma verdadeira planície. A altitude varia de 0 a 300 metros (ALBINO, 2012ALBINO, A. J. Bases geoambientais para a gestão da bacia hidrográfica do rio umbeluzi-moçambique. Dissertação (Mestrado em Geografia) - UFRJ. PPGG. 2012.).

De acordo com Tique e Dykshoorn (1993TIQUE C. A.; DYKSHOORN, J. A. Levantamento Detalhado de Solos da Área de Massaca I e II. Boane, SERIE TERRA E AGUA do Instituto Nacional De InvestigacaoAgronomica (INIA), Comunicação No. 17, Maputo, Moçambique, 1993.), cinco unidades principais de solos podem ser encontradas na grande parte do distrito, a saber: (i) derivados de Basaltos-Bv; (ii) de Mananga com cobertura arenosa inferior a 25cm-Ml; (iii) de Post-Mananga-P; (iv) sobre seixos rolados-S; e (v) aluvionares do rio Umbeluzi-F.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizadas imagens do sensor OLI do satélite Landsat, orbita/ponto 167/78 WRS-2, projeção UTM, Zona 36S e Datum WGS84 de 15 de junho de 2018; uma imagem ASTER GDTM V2, adquiridas através do endereço: www.earthexplorer.usgs.gov.

Foi utilizada também a base de dados cartográfica digital do distrito/país contendo informação relativa aos seguintes temas solos, geologia e precipitação na escala de 1:1.000.000 para a elaboração do mapa de Vulnerabilidade à Perda do Solo.

Para o processamento das informações foi utilizado o software ArcGis 10.

A efetivação do trabalho teve vários momentos. O primeiro foi referente ao registro da imagem utilizando o método imagem/imagem por se ter percebido um pequeno deslocamento da imagem e subsequentemente foi feita a fusão das imagens OLI/ Landsat 8 colorida (30m) e a pancromática (15m), visando melhorar sua qualidade, obtendo-se deste modo uma imagem colorida com 15m de resolução espacial.

Em seguida procedeu-se o recorte da área de interesse (distrito de Boane). Utilizou-se a composição colorida falsa-cor 6R5G4B, de modo a facilitar a visualização e escolha das amostras para a classificação, tendo-se optado pela classificação supervisionada usando o método de Máxima verossimilhança (Maxver). Nesse processo, foram criadas três classes: (i) Cobertura vegetal, (ii) Área Construída e Solo exposto (uma vez que o valor de estabilidade é o mesmo) e (iii) água. Ainda neste momento, foi gerado o mapa de declividade com 6 classes conforme os critérios da Embrapa: Classe A, Plano (0-3%); Classe B, Suave Ondulado (3-8%); Classe C, Moderadamente Ondulado (8-13%); Classe D, Ondulado (13-20%); Classe E, Forte Ondulado (20-45%) e Classe F, Montanhoso ou Escarpado (>45%) (RAMALHO-FILHO; BEEK, 1995RAMALHO-FILHO, A.; BEEK, K. J. Sistema de avaliação da aptidão agrícola das terras. 3. ed. Rio de Janeiro: EMBRAPA-CNPS, 1995.).

No segundo momento, foi feita a análise e geração dos mapas temáticos. Para o caso do mapa de solo, inicialmente procedeu-se a mudança da nomenclatura dos tipos de solo (da classificação da FAO para a classificação da Embrapa), por forma a facilitar a identificação dos valores de estabilidade de cada tipo de solo, seguindo a classificação apresentada por Crepani (2001CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; HERNANDEZ, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V.; BARBOSA, C. C. F. Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico e ao Ordenamento Territorial. São José dos Campos. SAE/INPE. 2001.) e depois a elaboração do mapa de intensidade pluviométrica, elaborado a partir da relação do mapa da precipitação média anual e o número de dias com chuva, transformados em meses, isto é, através da divisão da precipitação média anual pelo número de dias com chuva ao longo do mês.

O terceiro momento foi reservado para a conversão dos mapas do formato vectorial para o matricial (reclassificados com os valores das estabilidades), bem como a organização da base de dados com toda informação necessária para a análise da ecodinâmica. Os valores de estabilidade atribuídos são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Valores da estabilidade das classes das Unidades de paisagem.

A análise da Ecodinâmica (último momento) serviu para a elaboração do mapa de Vulnerabilidade à Perda do Solo. A análise foi feita a partir da metodologia desenvolvida por Crepani et al. (1996CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; AZEVEDO, L. G.; HERNANDEZ FILHO, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V. Curso de sensoriamento remoto aplicado ao zoneamento ecológico econômico [CD-ROM]. In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, 8. Salvador, 1996. Anais. São Paulo: Image Multimídia, 1996.) tendo como base o conceito de Ecodinâmica de Tricart (1977TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro, FIBGE, 1977.) e da potencialidade para estudos integrados das imagens de satélite, que permitem visão sinótica, repetitiva e holística da paisagem, com o objetivo de subsidiar o Zoneamento (CREPANI et al., 2008CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; PALMEIRA, A. F.; SILVA, E. F. Banco de Dados Geográficos dos Municípios de Gilbués e Monte Alegre do Piauí (pi) (Municípios pertencentes ao núcleo de desertificação de Gilbués).INPE. São Jose dos Campos, 2008.).

Uma vez atribuídos valores para todas as classes de todos os mapas temáticos foi feita a integração destes mapas recorrendo a técnica de álgebra de mapas, gerando-se o Mapa de Vulnerabilidade à Perda de Solo, cujo valor final resultou da média aritmética dos valores individuais de cada tema recorrendo a seguinte equação:

V = G + R + S + V g + C 5

Onde:

V = Vulnerabilidade da Unidade de Paisagem

G = Vulnerabilidade para o tema Geologia

R = Vulnerabilidade para o tema Geomorfologia (Relevo/declividade)

S = Vulnerabilidade para o tema Solos

Vg = Vulnerabilidade para o tema Vegetação/uso de solo

C = Vulnerabilidade para o tema Clima (Intensidade Pluviométrica)

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram gerados mapas temáticos dos seguintes componentes da paisagem: litologia/geologia, declividade/geomorfologia, pedologia, cobertura da terra/vegetação e índice pluviométrico/clima (Figura 2).

Figura 2
Classes das unidades de paisagem

O processo de álgebra de mapas permitiu calcular o valor médio de vulnerabilidade, obtendo-se 18 classes de Unidades de Paisagem (Figura 3), inferindo-se deste modo que o distrito apresenta os estágios de pedogênese e morfogênese.

Figura 3
Valores médios de vulnerabilidade das Unidades de Paisagem

Estes valores médios de vulnerabilidade foram fatiados, da seguinte forma: valores entre 1 a 1,4 são consideradas como estáveis, e as que apresentaram valores de 1,4 a 1,8 foram definidas como moderadamente estáveis. O grau entre 1,8 a 2,2 representam a classe medianamente estável/vulnerável, os valores entre 2,2 a 2,6 referem-se a moderadamente vulnerável e os valores de 2,6 a 3,0 definem as áreas vulneráveis (CREPANI, 2001CREPANI, E.; MEDEIROS, J. S.; HERNANDEZ, P.; FLORENZANO, T. G.; DUARTE, V.; BARBOSA, C. C. F. Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico e ao Ordenamento Territorial. São José dos Campos. SAE/INPE. 2001.). Isto permitiu que se obtivessem cinco categorias de vulnerabilidade, nomeadamente: Estável, Medianamente Estável/Vulnerável, Moderadamente Estável, Moderadamente Vulnerável e Vulnerável (Figura 4).

Figura 4
Mapa de Vulnerabilidade à Perda do Solo do Distrito de Boane (2018)

Dos dados expostos na tabela 2, percebe-se que o distrito apresenta mais da metade da sua área (53,3%) como Medianamente Estável/Vulnerável e distribuem-se em quase todo o distrito. Esta área localiza-se em locais onde existe a maior parte da cobertura vegetal e em solos argilosos, com estrutura que favorece a retenção de água, mas que mantêm boa drenagem e contêm sais minerais em quantidade necessária para a fertilidade do solo e o crescimento das plantas.

As áreas Moderadamente Estáveis ocupam 11,4% e localizam-se na sua maioria em áreas com vegetação, rochas ácidas e nitossolos.

A área Moderadamente Vulnerável é de 34,7% e está relacionada com a existência de solo exposto devido à abertura de novas áreas para habitação e cultivo, bem como a existência de Neossolos que são solos com valores de fator topográfico alto, constituindo assim um considerável fator de risco de perda de solo (NEVES et al., 2011NEVES, S. M. A. S.; MOTINHO, M. C.; NEVES, R. J.; SOARES, E. R. C. Estimativa da perda de solo por erosão hídrica na bacia hidrográfica do rio Jauru/MT. Soc. nat., Uberlândia, v. 23, n. 3, 2011. https://doi.org/10.1590/S1982-45132011000300005
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).

As áreas estáveis localizam-se ao longo dos rios e na albufeira dos pequenos Libombos, constituindo menos de 1% da área do distrito, enquanto que as áreas vulneráveis são ínfimas, isto é, quase inexistentes.

Tabela 2
Áreas de cada classe de Estabilidade/vulnerabilidade

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo feito neste artigo diagnosticou o estado de equilíbrio e da dinâmica natural do meio ambiente do distrito que constitui um meio para o desenho de práticas sustentáveis de uso e ocupação de terra e dos recursos naturais.

Os resultados mostraram prevalência de uma estabilidade mediana (53,3% do território), uma situação considerada favorável, porém não se deve ficar numa situação de conforto, pois com o ritmo de urbanização que se assiste nas últimas décadas e suas consequências sobre o meio ambiente na falta da implementação dos planos de ordenamento, pode colocar em causa esta situação, também pelo facto de existir uma área considerável de vulnerabilidade moderada.

A metodologia aplicada no estudo mostrou-se adequada à medida que os resultados produzidos conferem com o que o se pode observar no terreno. Há que se chamar atenção aquém é de direito para a manutenção deste grau de estabilidade e à intervenção de pesquisadores das mais diversas áreas de conhecimento no sentido de realizarem-se mais estudos sobre esta temática ou afins, de forma a contribuir na garantia de um equilíbrio ecológico no distrito uma vez que há poucos estudos realizados no país sobre esta temática.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    06 Fev 2019
  • Aceito
    06 Fev 2020
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