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Memória, disputas, resistência e ressentimento: a luta pelo protagonismo na narrativa de Therezinha Zerbini

Memory, disputes, resistance and resentment: the struggle for protagonism in Therezinha Zerbini’s narrative

Resumo:

O artigo discute as narrativas produzidas pela ex-presidente nacional do Movimento Feminino pela Anistia (MFPA), Therezinha Zerbini, buscando compreender sua luta pelo protagonismo e as manifestações de disputas e ressentimento em suas versões sobre a resistência à ditadura civil-militar brasileira. Suas memórias são analisadas em contraste com outras narrativas memorialísticas, jornalísticas e acadêmicas construídas até recentemente por diferentes agentes. O movimento criado e liderado por Zerbini, morta em 2015, foi um dos primeiros a institucionalizar-se na luta contra a ditadura, mas não ocupa um lugar privilegiado nas memórias hegemônicas construídas sobre o processo de redemocratização no Brasil, tendo em vista as visões controversas de Therezinha sobre os sentidos que deveria ter a anistia.

Palavras-chave:
Ditadura Civil-Militar; Anistia; Memória; Protagonismo; Mulheres

Abstract:

The article discusses the narratives produced by the national ex-president of the Movimento Feminino pela Anistia (MFPA), Therezinha Zerbini, seeking to understand their struggle for protagonism and expressions of disputes and resentment in their versions on resistance to the Brazilian civil-military dictatorship. Her memories are analyzed in contrast to other memorialistic, journalistic and academic narratives constructed until recently by different agents. The movement created and led by Zerbini, who died in 2015, was one of the first to become institutionalized in the struggle against dictatorship, but it does not have a privileged place in the hegemonic memories built on the process of redemocratization in Brazil, in view of the controversial views of Therezinha on the senses that the amnesty should have.

Keywords:
Civil-Military Dictatorship; Amnesty; Memory; Protagonism; Women

Muitas têm sido as lutas, ao longo das últimas décadas, para a elaboração de historiografia que procure dar conta das várias dimensões da ditadura estabelecida no Brasil após o Golpe de 1964. A abertura dos arquivos e acesso aos documentos seguiu a passos lentos até o avanço promovido pelo projeto Memórias Reveladas e a lei de acesso à informação, que liberou e integrou amplos fundos documentais de todo o país, embora sigamos com muito a ser feito em termos de visibilidade à documentação pública. As disputas internas nos governos pós-abertura, todos formados em coalizão e com a presença de políticos ligados aos governos ditatoriais, representaram impasses e interdições no tratamento e revisão de acordos, como a própria Lei da Anistia de 1979, e o papel da Comissão Nacional da Verdade, de caráter mais informativo e sugestivo que deliberativo.

Um segundo fator também a dificultar o trabalho de historiadores se dá pela construção de mitos de memória, em relação ao período, que acabaram cristalizando a visão sobre alguns temas que, durante muito tempo, foram tratados como dados e não construções interessadas. Podemos citar a dicotomia estabelecida entre militares linha-dura e moderados, a tortura como excesso e não política de Estado, além da visão sobre a censura somente como interdição. Reis Filho (2004REIS F FILHO, Daniel Aarão. Ditadura e sociedade: as reconstruções da memória. In: REIS, Daniel Aarão; RIDENTI, Marcelo; MOTTA, Rodrigo Patto Sá. O golpe militar e a ditadura 40 anos depois (1964-2004). Bauru: Edusc, 2004.) chama atenção para o mito da sociedade resistente à ditadura, assim como da esquerda que lutava prioritariamente para derrubar o regime ditatorial e não pela tomada de poder. Cordeiro (2009CORDEIRO, Janaína Martins. Anos de chumbo ou anos de ouro? A memória social sobre o governo Médici. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 22, p. 85-104, 2009.) nos lembra que se para alguns os anos de ditadura foram “anos de chumbo”, para tantos outros pode ser recordada como “anos de ouro”.

Acrescentaria a essas dificuldades uma outra, articulada com as já mencionadas: as lutas de memória que em maior ou menor grau excluem figuras e seus legados e iniciativas da narrativa histórica, seja na disputa por outro modelo de sociedade, seja pelas posições políticas que os sujeitos manifestam no presente, seja por ressentimentos ou interesses nos usos do passado. Quando falo da exclusão, não penso apenas no caráter vulgarmente associado à biografia, o de ter feito a história como se fosse privilégio exclusivo de indivíduos célebres, mas das possibilidades que perdemos de analisar as complexidades de experiências de vida e ações políticas ligadas à existência num período de ditadura. Embora saibamos que a resistência e construção da abertura política não tivesse sido possível sem a articulação de amplo espectro de forças políticas, entre a esquerda e a direita, a narrativa pública construída sobre o período situado entre os anos de 1964 e 1985 continua posicionando militares versus militantes de esquerda, numa relação simplista e automática que mais atrapalha do que ajuda a entender o período e suas diferentes nuances.

Para tratar dessa temática acerca da exclusão ou invisibilidade de personagens importantes da história da resistência, trago elementos referentes à trajetória de Therezinha de Godoy Zerbini.

É impossível desvincular a origem e construção do Movimento Feminino pela Anistia (MFPA) de sua liderança. A advogada, falecida, em 2015, aos 87 anos, foi idealizadora do movimento, criado em 1975, em São Paulo, e participou ativamente dos momentos de sua implantação. Esteve presente na condução política do movimento, na fundação dos núcleos e influenciou na escolha de dirigentes, na organização de atos públicos e na redação de periódicos e documentos.

Seu papel foi reconhecido pelos órgãos de repressão, à época, considerada “conhecida subversiva”1 1 ACE 1031733/76, Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica. Fundo SNI. Arquivo Nacional. Coordenação Regional do Distrito Federal (An-Coreg), p. 2, 1976. que “mesmo antes de 1964 alimentava ideias socialistas e atuava no campo psicossocial com propósitos subversivos”.2 2 ACE 84588/75, Serviço Nacional de Informações. Fundo SNI. Arquivo Nacional. Coordenação Regional do Distrito Federal (An-Coreg), p. 1, 1975. A experiência do MFPA mudou sua vida, inserindo-a no espaço político brasileiro, até pouco antes de sua morte, embora não com o mesmo impacto. Aos 80 anos, ainda dirigia o Partido Democrático Brasileiro (PDT) em sua cidade. Além de documentos, possuía ainda um arquivo de notícias e reportagens sobre a atuação do movimento, o que a investiu de certo papel de “guardiã da memória”. Isso não implica dizer que foi voz única ou sequer a mais ouvida quando o assunto era o Movimento Feminino pela Anistia. Candau (1996CANDAU, Joel. Anthropologie de la mémoire. Paris: Presses Universitaires de France, 1996.) afirma que os guardiões da memória podem ser dotados de prestígio, valorizados pelo grupo, ou tornar-se estigmatizados e rejeitados em vista das transformações sociais que levam suas posições a serem consideradas obsoletas.

Na investigação da memória recente, produzida pela esquerda sobre a anistia brasileira, percebe-se a exclusão da figura de Zerbini, o que claramente remete à rejeição de suas posições e a identifica com o segundo comportamento. Enquanto boa parte dos movimentos nos anos finais de 1970 recusou a ideia de anistia como esquecimento e defendeu a punição de torturadores e superiores, Therezinha considerava a anistia como “pacto nacional necessário para a reconstrução da pacificação brasileira”, além de ter manifestado a opinião de que, durante o regime militar, a esquerda também teria errado, como o fez em entrevista à revista Caros Amigos, em maio de 2005: “Ali estava em jogo uma nação. Os gorilas precisavam tanto da anistia como nós. Temos de ser como o anjo de Gomorra, que diz: ‘Não olhem para trás, quem olhar para trás se transforma em estátua de sal’. A nossa gente também cometeu seus pecados, também matou” (Anjo da Guarda, 2005ANJO DA GUARDA. 2005. Disponível em: <Disponível em: http://carosamigos.terra.com.br/da_revista/edicoes/ed53/marina_amaral.asp >. Acesso em: 12 maio 2005.
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).

Foi crítica contumaz do governo Lula e do Partido dos Trabalhadores (PT), embora tenha manifestado publicamente, e em várias ocasiões, seu respeito e admiração pela presidenta Dilma Roussef, companheira de prisão e colaboradora da articulação do MFPA no Rio Grande do Sul. Em veículos de comunicação do partido se reproduziu, no entanto, a ideia de que ela era uma figura “folclórica”.3 3 O termo é utilizado por Valter Pomar, diretor nacional do Partido dos Trabalhadores, em entrevista com Helena Greco, realizada por ele para a revista Teoria e Debate, do PT. Ver Pomar (1995).

Suas posições diante dos objetivos do MFPA e formas de ação causam discordâncias com integrantes de núcleos espalhados pelo Brasil, incluindo o Ceará.4 4 Ver Duarte (2012). Em Minas Gerais, que constituiu um dos núcleos mais numerosos,5 5 O núcleo mineiro é um dos mais numerosos do Brasil. Chegou a congregar cerca de trezentas mulheres, segundo Lanna (1996, p. 118). os embates foram mais frequentes e acabaram polarizando posições e constituindo outras lideranças como a presidente do núcleo, Helena Greco.

Esta, aliás, torna-se a liderança nacional feminina mais mencionada ou ouvida nas memórias da esquerda sobre a anistia no Brasil. A hipótese mais provável para sua maior visibilidade, possivelmente, diz respeito à sua posição contrária à forma pela qual foi aprovada a Lei da Anistia no Brasil, com torturadores e mandantes recebendo o perdão por seus atos, assim como o combate às restrições para algumas categorias de presos políticos, além de sua trajetória como fundadora do PT, em Minas Gerais, onde foi eleita vereadora por dois mandatos.

Uma das obras memorialísticas mais importantes sobre a anistia no Brasil, Pela democracia, contra o arbítrio, foi organizada e lançada, em 2006, pela editora da Fundação Perseu Abramo, do Partido dos Trabalhadores que, além do livro, mantém em seu portal (www.fpabramo.org.br) depoimentos de diversas personalidades que lutaram pela redemocratização brasileira. As únicas mulheres chamadas a narrar a experiência foram: Ana Guedes, Helena Greco e Maria Luíza Fontenele.6 6 A primeira é membro do Grupo Tortura Nunca Mais, na Bahia e militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). A última foi eleita primeira prefeita de capital, pelo PT, em Fortaleza, em 1985 (Maués; Abramo 2006).

A figura de Greco, no entanto, não é mais referenciada somente quando se trata de memórias da esquerda no Brasil. As narrativas históricas também a escolhem quando o assunto é entender a ação política do Movimento Feminino pela Anistia (Greco, 2003GRECO, Heloísa Amélia. Dimensões fundacionais da luta pela anistia. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2003.). Em artigo publicado em coletânea em 2016, pela editora Letra e Voz, a historiadora Lucília de Almeida Neves Delgado dedica-se a recuperar a trajetória da senhora mineira no artigo “O Movimento Feminino pela Anistia e o humanismo intransigente de Helena Greco”. O texto recobra sua trajetória como militante pelos direitos humanos, as perseguições e atentados sofridos, sua atuação inédita na política, já que antes se dedicava ao lar e à família como a maior parte das mulheres de sua geração e posição social.

O artigo, no entanto, traz alguns equívocos e imprecisões de informação acerca da sua atuação, dando a entender, inicialmente, que ela teria ocupado a presidência nacional do movimento (Delgado, 2016DELGADO, Lucília Almeida Neves. O Movimento Feminino pela Anistia e o humanismo intransigente de Helena Greco. In: ALMEIDA, Juniele Rabêlo (Org.). História oral e movimento social. Narrativas públicas. São Paulo: Letra e Voz, 2016., p. 40), algo que nunca aconteceu, pois a única a ocupar o cargo foi Therezinha Zerbini. Greco comandou o MFPA em Minas Gerais, fundado dois anos depois do núcleo nacional em São Paulo. O artigo de Delgado afirma, ainda, que Therezinha foi presidente nacional do Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA) [p. 50], o que também não aconteceu. Ao contrário, Therezinha, muitas vezes, chegou a rivalizar com o CBA.

A partir desses equívocos, faz-se necessário pensar sobre o peso da memória construída sobre Greco em detrimento da tentativa de invisibilidade construída sobre a controversa figura de Thezinha Zerbini, ‘mulher de general’, ‘durona’, ‘antifeminista’ e ‘burguesona, graças a Deus’,7 7 Termos encontrados em diferentes textos sobre Therezinha Zerbini e ironizados por ela durante a entrevista (Zerbini, 2006) como costumava brincar com os que a acusavam.

Sua história de indignação com a ditadura militar teve início com os primeiros movimentos da empreitada golpista. Casada com o general Euryale de Jesus Zerbini, assistiu à prisão e punição do marido por ex-colegas de caserna, quando resistiu ao golpe.

A detenção arbitrária nunca foi aceita pela mulher, afinal, o companheiro estava sendo preso por defender a ordem constituída. O acontecimento propiciou a criação de laços da família com setores de resistência à ditadura, como a Igreja e o movimento estudantil. Libertado, porém cassado, o general realiza sonho antigo: cursar Filosofia. Na Universidade de São Paulo (USP), conheceu o cearense Tito de Alencar Lima, frei Tito,8 8 Frei Tito é considerado símbolo da encarnação dos horrores da ditadura brasileira (Betto, 2006). dominicano do movimento estudantil. Por meio da amizade, tem-se mais um fator de motivação para o ingresso de Therezinha Zerbini na luta pela anistia.

Em meados de 1968, frei Tito pede ajuda para a realização de um evento de estudantes, sem dizer do que se tratava. Ela dirige o pedido a um amigo do marido, dono de um sítio em Ibiúna, interior de São Paulo, que acabou sediando o 30º Congresso Nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE). A entidade havia sido extinta pelo regime e o encontro foi feito às escondidas para a eleição de seu presidente. Em 9 de outubro de 1968, 170 mulheres e 536 homens acampam no sítio para discutir estratégias de resistência do movimento estudantil.

Delatado o encontro ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops), 706 estudantes foram presos e levados ao Presídio Tiradentes, em São Paulo. Entre eles, frei Tito que, solto em seguida, é vigiado pelo aparato repressivo. A sua segunda prisão, verdadeiro martírio, aconteceria em novembro de 1969.

As investigações levaram à Therezinha Zerbini. Presa em novembro de 1969, é liberada depois de depoimento no Dops. Mas esta não seria a última vez. Numa noite de fevereiro de 1970, foi novamente presa pela Operação Bandeirantes (Oban)9 9 Operação repressiva piloto montada em São Paulo, em 1969, não formalmente vinculada ao II Exército, mas chefiada por seu comandante Canavarro Pereira. Foi composta por efetivos do Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Estadual, Federal, Civil, Força Pública, Guarda Civil e até civis paralimitares (Direito ..., 2007, p. 23) em sua casa. Investiu-se de seu papel de defensora da família, mostrando-se uma “boa dona de casa”, “cordata” e “inofensiva”, ao reagir de forma a desconcertar os policiais e a preservar o marido e os filhos da ameaça, oferecendo aos militares café e sobremesa (Direito ..., 2007DIREITO À MEMÒRIA E À VERDADE. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007., p. 23).

Conduzida à Operação Oban, ela foi interrogada e ameaçada pelos policiais e, embora não tenha sofrido tortura, foi acareada com frei Tito, que se encontrava bastante debilitado pelas sistemáticas sevícias. O encontro marca sua memória, assim como os seis meses de cárcere, dando-lhe maior compreensão sobre a crueldade contra os opositores do regime:

O rosto dele vertia sangue, estava todo inchado, meu coração apertou. Ele chegou bem pertinho e me disse com um fiozinho de voz: “Dona Therezinha, a senhora sabia para que era o sítio, não sabia? E eu: “Tito, que o Espírito Santo te ilumine, meu filho. Claro que eu sabia. Claro”. E perguntei para os torturadores qual era o órgão que coordenava os estudantes. Por sorte, um dos gorilas respondeu: “A Une, a Une”. E eu disse, com a voz cheia de desprezo: “Tá vendo, Tito, até ele sabe”. E o Tito, coitadinho: “A senhora me perdoe”. “Te perdoar do que, meu filho? Que Deus perdoe esses monstros” (Anjo da Guarda, 2005ANJO DA GUARDA. 2005. Disponível em: <Disponível em: http://carosamigos.terra.com.br/da_revista/edicoes/ed53/marina_amaral.asp >. Acesso em: 12 maio 2005.
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).

O pensamento e trajetória de Zerbini, a partir da segunda metade dos anos 1990, quando houve uma retomada mais consistente sobre a história da anistia - incentivada especialmente pela aprovação de leis estaduais e federal de reparação a perseguidos políticos e suas famílias - basicamente foi feita através de matérias esparsas em jornais e revistas.

Em 2012, o jornalista Paulo Moreira Leite10 10 Trabalhou em diversos jornais e revistas da grande imprensa brasileira como Veja, Época, Gazeta Mercantil e O Estado de S. Paulo. Atualmente dirige o jornal digital 247, de linha editorial considerada de esquerda, onde mantém coluna. lançou, pela Arquipélago Editorial, de Porto Alegre, o livro A Mulher que era o general da casa - histórias da resistência civil à ditadura militar. A publicação traz várias reportagens feitas ao longo da carreira de Leite sobre personalidades que atuaram na resistência à ditadura civil-militar brasileira, entre elas o reverendo Jaime Wright, o sociólogo Florestan Fernandes e o intelectual e ativista político Plínio de Arruda Sampaio. O título da reportagem sobre Therezinha Zerbini dá nome ao livro e é o último texto feito para a publicação.

O perfil foi elaborado a partir das memórias de Therezinha e da filha, a advogada e escritora Eugênia Zerbini que, nos últimos anos de vida da mãe, a secretariava na supervisão de entrevistas, respostas a e-mails e liberação de publicações. O perfil de Leite constrói-se a partir de algumas narrativas sobre a relação entre Therezinha e o marido, apresentado no livro como o único general que resistiu ao golpe e que, por isso, foi preso e colocado na reserva, sobre a prisão de Therezinha na Operação Bandeirantes e as repercussões desses acontecimentos para a vida dos filhos pequenos do casal. O texto traz ainda informações biográficas sobre Therezinha que tentam explicar ou buscar coerência para seu comportamento marcado pela sensibilidade social e atuação política, como o fato de ter sido criada junto a filhos de ex-empregada da mãe na mesma casa no bairro do Cambuci, em São Paulo:

Em função do arranjo com Biela, os filhos de Arminda cresceram e se divertiam em companhia de crianças que eram negras, filhos de trabalhadores. Therezinha aprendeu a partilhar brinquedos, a dividir segredos e a enfrentar ao lado delas as primeiras preocupações da adolescência e do início da vida adulta.

Ela nunca deixou de perceber diferenças nem gosta de fingir que elas não existem. Dá a impressão de apreciá-las em certa medida e discretamente. Mas Therezinha está convencida de que a infância em contato muito próximo à realidade, tão diversa e tão mais difícil, daquelas crianças ajudou a formar seu caráter, enriqueceu as visões sobre as verdades duras da existência e a preparou para tantos tormentos que iria enfrentar. “Sei que não sou uma mulher do povo, mas eu me sinto igual aos outros. Eu acho que política, no fundo, é uma questão de igualdade (Leite, 2012LEITE, Paulo Moreira. A mulher que era o general da casa. Porto Alegre: Arquipélago, 2012., p. 45).

As ações, muitas vezes, arriscadas de Therezinha, como esconder um saco de fuzis no jardim de casa, abrigar estudantes feridos em manifestações, a utilização dos filhos para enviar recados escondidos nos canos das bicicletas a moradores clandestinos do bairro, além das viagens por todo o Brasil, ajudam a referendar uma imagem de mulher forte que, após anos como dona de casa e funcionária dos Correios, assume um papel de liderança pública e subverte as relações pessoais, ocupando um lugar de mando também no espaço da casa, algo pouco usual para a esposa de um militar da mais alta patente.

As histórias de autonomia de Therezinha no trabalho, na atuação política e no casamento contrastam com a afirmação peremptória dela e celebrada, claramente, pelo jornalista, da desconsideração de sua atuação como feminista. O perfil construído sobre a senhora Zerbini naturaliza sua ação pública como extensão dos cuidados tradicionais ligados ao âmbito doméstico. “Com aquele seu jeito manso e firme, Therezinha fala de gestos que mudaram a história com a naturalidade de quem descreve as virtudes de um bom frango empanado que costuma encomendar num restaurante das vizinhanças” (Leite, 2012LEITE, Paulo Moreira. A mulher que era o general da casa. Porto Alegre: Arquipélago, 2012., p. 15).

Considerando a escrita jornalística em seu caráter ordenador que estrutura e narra uma dada realidade, a partir do julgamento de seu autor, afastando-se do pressuposto tantas vezes propagado da objetividade e neutralidade (Luca, 2008LUCA, Tânia Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi. São Paulo: Contexto, 2008., p. 139), é necessário pensar sobre o que é selecionado e esquecido por Leite para compor um perfil de Therezinha. Soihet (2005SOIHET, Rachel. Zombaria como arma antifeminista: instrumento conservador entre libertários. Revista de Estudos Feministas (Florianópolis). v. 13, n. 3, 2005.) nos recorda dos usos da ironia e da zombaria, como armas antifeministas, por periódicos e textos jornalísticos publicados inclusive em jornais alternativos como O Pasquim, nos anos 1970. O discurso de crítica e mesmo desprezo ao feminismo, como esboçado pelo jornalista em questão, era comum a muitos homens e mulheres da esquerda e continua a ser observado, ainda hoje, quando se recupera a trajetória da luta pela anistia e a participação das mulheres.

As disputas sobre a ação do MFPA e do CBA na condução dos debates e ações em torno da luta pela anistia a presos exilados e banidos atribuem ao último, quase sempre, a politização e aprofundamento como questão pública. Apesar de iniciado em muitas cidades pela ação de familiares, o MFPA reuniu centenas de mulheres em todo o Brasil que não se engajaram na luta primordialmente por laços de sangue ou parentesco, mas para a continuidade de ações políticas interrompidas ou pela solidariedade, entre outros motivos. Muitas ex-militantes do MFPA, inclusive familiares, tornaram-se feministas a partir de sua atuação no movimento. Essa heterogeneidade proporcionou uma experiência rica politicamente, mas cheia de embates entre as próprias militantes em torno de valores como amor, afeto, família, engajamento, desinteresse pessoal como motivação para a atuação política, construindo um debate sobre a anistia também marcado pelo gênero.11 11 A categoria gênero usada nas análises históricas permite aos pesquisadores focalizar as relações entre homens e mulheres, mas também entre homens e entre mulheres, verificando como, em diversos momentos do passado, alguns eventos ou acontecimentos foram produtores de gênero (Pedro, 2005).

Paulo Moreira Leite, em sua escrita, mostra uma opção que desconsidera essas pluralidades e constrói a figura contraditória de Zerbini e do MFPA, a partir de elementos ligados à tradição em torno da figura feminina. São as familiares, em suas representações de dor e sofrimento, que são escolhidas para a recuperação da ação política das mulheres.

Nas universidades e outros ambientes intelectualizados o fato de ser “feminina” e não “feminista” sempre chamava atenção. Católica capaz de alimentar a fé com erudição e muitas leituras - inclusive de Santo Agostinho, cujas ideias “O general” criticava, observando que não eram favoráveis às mulheres, Therezinha diz que a natureza fez “homens e mulheres diferentes, cada um do seu jeito, e é bom que seja assim”.

A passagem de duas décadas de feminismo ascendente se encarregou de amenizar os fervores dos primeiros anos, permitindo que, hoje, muitos psicólogos, sociólogos e antropólogos voltassem a pensar nas diferenças e semelhanças tão antigas e universais de umas e de outros. Já naquele tempo Therezinha se dizia inteiramente convencida - fala isso olhando olho no olho, suavemente, num semblante só permitido pelas certezas absolutas e pacíficas - de que as mulheres possuem uma espécie de predisposição natural a serem mais solidárias e mais generosas do que os homens. E, como para lhe dar razão, quem se recorda das reuniões cotidianas das entidades pró-anistia não deixa de lembrar do rosto daquelas senhoras, Zilahs Abramo, Judiths Klotzel, Dodoras Arantes, Vânias Santana, Cecílias Coimbra, Mirnas Leandro de Castro, todas elas militantes, mas também mães de militantes, viúvas, filhas, avós, lutadoras, muitas enrugadas, sofridas por causa daquela dor que as mulheres expressam mais, e que sempre achavam tempo para ajudar e contribuir, apesar do trabalho em casa (Leite, 2012LEITE, Paulo Moreira. A mulher que era o general da casa. Porto Alegre: Arquipélago, 2012., p. 61-62).

Não se pode negar a tentativa de diferenciação de Therezinha de militantes feministas. Sua postura já havia sido manifestada em outros momentos, ainda durante a ditadura, como em entrevista realizada pelo jornal alternativo O Pasquim, em 1977, quando ela endossa crítica à líder feminista norte-americana Betty Friedan12 12 Feminista norte-americana, morta em 2006. Tornou-se conhecida a partir da publicação do best-seller Mística feminina, em 1963, onde analisa a insatisfação das donas de casa americanas com suas vidas e casamentos. Em 1966, realizou em Washington uma Conferência Nacional onde se constituiu a Organização Nacional de Mulheres, conhecida como NOW — National Organization for Women. e afirma que as feministas “não inventaram” a participação das mulheres em lutas políticas.13 13 O Pasquim, de 08 a 14 de jul. 1977 (Zerbini, 1979, p. 22). Mas é preciso compreender o tom dessas afirmações no contexto em que foram gestadas e em que foram reformuladas ou endossadas.

Apesar da “promoção e elevação cultural da mulher”,14 14 O texto propõe a reintegração do pacto social por meio de sujeitos políticos naturalizados como promotores de sentimentos de solidariedade, justiça e paz. As mulheres colocam-se em cena no MFPA, com ação política nova, não transgressora em termos discursivos, o que não implicou embates e ações divergentes no cotidiano dos núcleos, como afirma Duarte (2012). prevista como objetivo no Estatuto do MFPA, a questão torna-se secundária com relação à luta pela anistia. O afastamento ou tentativa de desvinculação da carga simbólica depreciativa carregada pelo feminismo é um elemento a ser considerado e analisado. O incômodo do feminismo recém-chegado ao Brasil, na década de 1970, é, no entanto, compartilhado por militantes do MFPA, pelos militares e também por amplos setores da esquerda.

Enquanto nos Estados Unidos e Europa as especificidades da luta de mulheres e de grupos oprimidos expõem-se com força, no Brasil, tanto o pensamento liberal como o marxista revolucionário dividem as possibilidades de luta em dois campos: busca da democracia e derrubada da ditadura ou luta do proletariado contra a burguesia.

Há pouco espaço para a transformação das problemáticas das mulheres em debate público. Complicador é a forte campanha de depreciação sofrida pelas feministas, em veículos da grande imprensa e da imprensa alternativa, que ora ignora o debate, por achá-lo sem importância, ora utiliza-se de ironia e da galhofa para tratar as novas ideias.

Nesse contexto, compreende-se por que a líder de um movimento formado somente por mulheres, com estratégias de autonomia e fortalecimento da figura feminina rechace uma atitude feminista. Apesar de não se considerar comunista, ao refletir sobre o feminismo, Zerbini tende a se aproximar mais da retórica da esquerda, que defende o feminismo adaptado à realidade brasileira: “As feministas brasileiras procuram seguir as feministas inglesas ou americanas, o que não faz sentido num Terceiro Mundo, ou principalmente no continente latino-americano, onde nossos problemas são pão, teto, educação, saúde” (Zerbini, 1970, p. 22).

As reafirmações ou tentativas de reafirmações antifeministas em entrevistas posteriores, no entanto, para além de demonstrarem a manutenção de rivalidades com as feministas, apesar das contradições apresentadas, devem ser pensadas em suas temporalidades específicas e a partir das experiências vivenciadas pela própria Therezinha numa relação com os campos que disputam ou jogam com a memória produzida sobre aquele período, numa construção memorialística que, apesar de ter se feito hegemonicamente favorável à esquerda, está longe de ser homogênea, como esse próprio campo político, configurando muito mais aquilo que Portelli (2002PORTELLI, Alessandro. O massacre de Civitella Val di Chiana (Toscana, 29 de junho de 1944): mito e política, luto e senso comum. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaína. Usos e abusos da história oral. 5. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2002., p. 127) denominou de memórias divididas.

Em 31 de agosto de 2006, estive com Therezinha Zerbini em sua casa no Pacaembu, em São Paulo. Ela havia concordado em se deixar entrevistar para a minha tese sobre o Movimento Feminino pela Anistia, e a viagem de Fortaleza à capital paulista tinha basicamente o objetivo de ouvi-la. Ao chegar e me apresentar, impressionou-me a energia e disposição daquela senhora gordinha e de voz assertiva. Antes que eu pudesse me dar conta, ela adiou o horário da entrevista para a noite e me pediu para acompanhá-la num táxi a outra programação: sua participação num programa de rádio articulado por movimentos sindicais. Ia falar sobre o aniversário da Lei da Anistia no Brasil, mas aproveitou para analisar o momento político nacional, criticar o governo do PT, àquela altura envolvido com as denúncias sobre o processo denominado Mensalão que apurava a compra de votos no Congresso por integrantes do governo Lula, entre 2005 e 2006. Na volta para casa, lanchamos, e ela sentou-se na cadeira que seu marido, já então falecido há vários anos, costumava ocupar, como relembrado por alguns perfis e reportagens.

Considero a hipótese de que a memória de Therezinha Zerbini elaborada em suas últimas entrevistas estabelecia-se como um instrumento de defesa de sua atuação, autonomia e protagonismo. A narrativa fluente, relatos de conversas e grandes e pequenas aventuras, narradas com emoção e contundência, constituíram, acima de tudo, um espaço de afirmação de ideias, de acerto de contas e de restabelecimento de “verdades”, numa memória nitidamente em disputa sobre a trajetória da luta mais ampla pela anistia em que Therezinha não tinha muito espaço, até então.

Ela não havia, a exemplo de outros militantes, escrito ou sido objeto de uma biografia, apesar de ter empreendido nítido esforço de arquivamento de sua vida e atuação no MFPA, através da constituição de acervo pessoal e da publicação, em 1979, do livro Anistia - semente da liberdade (Zerbini, 1979ZERBINI, Therezinha Godoy. Anistia - semente da liberdade. São Paulo: Salesianas, 1979.), uma coletânea de entrevistas, matérias jornalísticas feitas sobre ela por vários veículos de imprensa. Observa-se que grande parte das mulheres que viveram experiências de repressão no Cone Sul, nos anos 1960 e 1970, optam por narrar como testemunhas do protagonismo de outros, negando ou silenciando suas próprias vivências, embora essas possam ser recolhidas a partir das narrativas de quem se identifica como tendo vivido para alguém (Jelin, 2002JELIN, Elizabeth. Los trabajos de la memoria. Madri: Siglo XXI de España Editores, 2002., p. 108).

Goldenberg (1997GOLDENBERG, Mirian. Mulheres e militantes. Revista Estudos Feministas, ano 5, n. 2, 1997., p. 352) defende a ideia de invisibilidade para discutir a forma pela qual se percebem as mulheres representadas na história da esquerda brasileira, até hoje escrita em torno da trajetória de “grandes homens”.15 15 Alguns poucos trabalhos acadêmicos, biografias e livros jornalísticos trazem relatos de mulheres que foram à luta armada, atuando direta ou indiretamente na guerrilha. Duas dissertações já publicadas estão entre as mais citadas: A resistência da mulher à ditadura militar no Brasil, de Ana Maria Colling (Rio de Janeiro: Record: Rosa dos Tempos, 1997) e Mulheres, militância e memória, de Elizabeth Ferreira (Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996). Dentre as biografias podem-se citar As moças de Minas, de Luiz Manfredini (São Paulo: Editora Alfa Ômega, 1995), que narra a história de cinco militantes da Ação Popular; Iara: reportagem biográfica, de Judith Lieblich Patarra (Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992), que narra a trajetória da militante Iara Iavelberg, militante da Vanguarda Popular Revolucionária e do Movimento 8 de Outubro, última companheira do líder guerrilheiro Carlos Lamarca, morta em Salvador. Dentre os relatos jornalísticos, pode-se citar Mulheres que foram à luta armada, de Luiz Maklouf Carvalho (São Paulo: Editora Globo, 1998). Entre as militantes do MFPA, os escritos biográficos são ainda mais escassos. Destaco o livro Glória, mãe de preso político, da militante do MFPA em Minas, escrito por seu filho Gilney Amorim Viana, publicado em 2000 pela Paz e Terra, a partir de entrevistas com a mãe. Outro filho que escreve a trajetória da mãe na luta contra a ditadura é Marcelo Rubens Paiva em Ainda estou aqui, um relato sobre a resistência da advogada Eunice Paiva, publicado em 2015 pela Alfaguara. Destaco ainda o livro de Maria Rosa Leite Monteiro, mãe de Honestino Guimarães, líder estudantil desaparecido em 1973 e declarado assassinado na prisão em decorrência de violência, apenas em 1996. Em Honestino, o bom da amizade é a não cobrança, publicado pela Da Anta Casa Editora, em 1998, ela dedica-se a narrar a trajetória do filho e as buscas da família por seu paradeiro. Suas posições no interior das organizações políticas consideram-se secundárias ou inferiores às dos companheiros, são ‘escondidas’ ou apresentadas como “filhas de”, “mulher de...”, coadjuvantes, enfim.

A exclusão poderia estar relacionada com o maior ou menor capital político das mulheres, antes do ingresso em partidos ou organizações de esquerda, em contraposição à imagem do “bom militante”, identificada com o comportamento eminentemente masculino de domínio do discurso para grandes plateias, à fala dura e impessoal, métodos de disputa agressiva e afastamento da vida pessoal e familiar como prova de abnegação à causa.16 16 Para Wolff (2007), a figura do militante ainda é ligada a valores como valentia, virilidade, coragem, firmeza, sentimentos que não se ajustavam com o discurso afetivo de esposas, mães e irmãs pela libertação dos parentes.

Esse pode ser um indício importante para pensar as razões pelas quais a história ainda é escrita pelos e para os “grandes homens”,17 17 Entre as publicações de maior repercussão sobre a atuação de líderes dos movimentos da resistência brasileira durante a ditadura podemos citar as autobiografias O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira, lançada em 1979, que já vendeu mais de 250 mil exemplares em quarenta edições e Os Carbonários: memórias da guerrilha perdida, de Alfredo Sirkis, lançado em 1980, já na 14ª edição. Entre as biografias destaca-se Mariguella, o guerrilheiro que incendiou o mundo, de autoria do jornalista Mário Magalhães, publicada em 2012, pela Companhia das Letras e em fase de adaptação para o cinema. Outro livro adaptado para o cinema, em 1994, foi Lamarca, o capitão da guerrilha, de Emiliano José e Miranda Oldack. O texto foi lançado pela primeira vez em 1980. no campo da esquerda brasileira, pois além de não serem muito incentivadas a falar, mesmo através de pesquisas as mulheres teriam ainda dificuldades de se colocar publicamente, assumindo feitos e escrever, elas mesmas, as próprias histórias de militância.

Não foi possível saber, ao certo, os motivos que levaram dona Therezinha a não escrever suas próprias memórias, mas percebe-se em sua própria compilação de materiais sobre sua vida uma notória disponibilidade para falar a jornalistas, embora não tenha encontrado trabalhos acadêmicos em que sua figura se destacasse. Sua entrevista é marcada pelas lembranças de um cotidiano de alianças e embates com diferentes grupos e a busca por não perder o controle sobre o MFPA.

Para Zerbini, assim como para outras integrantes dos movimentos de direitos humanos em países que enfrentaram ditaduras nesse período (Jelin, 1994JELIN, Elizabeth. Mulheres e os direitos humanos. Revista de Estudos Feministas, Rio de Janeiro, CIEC/ECO/UFRJ, v. 2, n. 3, 1994., p. 135), era perfeitamente concebível a aliança com feministas para divulgação de luta de mulheres em prol da anistia, o que não significava que estivesse disposta a se engajar em lutas específicas das mulheres, encampadas pelo feminismo no período, como questionamento da dupla moral sexual, direito ao corpo, da maternidade como escolha e crítica da heterossexualidade compulsória.

A discordância é explicativa do racha com a equipe do jornal Brasil Mulher.18 18 Tabloide fundado pela jornalista Joana Lopes, no Paraná. Existiu entre os anos de 1975 e 1980. Ela conta que, antes do conflito com os representantes do regime, teve caloroso embate com as feministas.

O primeiro confronto que eu tive - você vai até dar risada - não foi nem com os gorilas. Foi com as feministas (exalta-se) aqui de São Paulo. Porque elas queriam se adonar do Movimento Feminino pela Anistia. Elas diziam que a luta do MFPA era feminista. Eu digo: “Não, vocês estão equivocadas”. A luta do Movimento Feminino pela Anistia é uma luta de cidadania, da mulher cidadã. Não tem nada de feminista. Nós não estamos lutando por avanços. Depois cada um vai fazer o que quiser. (...) Daí resolvemos fazer um jornal que era o Brasil Mulher. E o jornal era de homens e mulheres. E aquilo foi andando. Daí, as feministas, que queriam uma vitrine, queriam aderir. E daí começaram. E começaram a tergiversar. Tanto é que eu me retirei do movimento, puxei o carro e elas ficaram falando sozinhas ao vento (Zerbini, 2006ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos. Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.).

A configuração do movimento, como feminino, foi apontado por Zerbini como “estratégia de guerra”. Movimento feminino, fundado no Ano Internacional da Mulher, não incomodaria tanto o regime e ainda daria proteção à intervenção ou possibilidade de aparelhamento pelas lideranças de esquerda, eminentemente masculinas, no período. Sozinhas, ou melhor, apartadas de quem sempre teve a palavra, elas podiam ficar mais à vontade para desenvolver atividade autônoma, ganhariam credibilidade por sua “neutralidade” e “ausência de objetivos políticos”, prontas para argumentar, articular, como se pode interpretar, conforme narra:

Onde o homem vai, ele inibe. Você vai numa reunião de operários, de estudantes, tem lá um grupinho de mulheres. Se tem homens, eles inibem. Porque a mulher não foi treinada, ela não tem a velocidade mental porque sempre foi o homem que mandou. Ele sempre foi o chefe e patrão. As mulheres ficavam com medo de falar bobagem. Foi arte da guerra mesmo, era treino. E mulher com mulher se entende. E meu forte nunca foi mulher. Sempre foi homem (fala enfaticamente). E eu não sabia lidar bem com elas. Mas olha, Deus dá o frio conforme o cobertor. E a coisa foi muito bem. Tanto é que quando nós começamos o movimento, diziam - a turminha do PT, a turma do PC do B - que eram eles que tinham feito. Eles queriam abocanhar. Eu dizia: não me venham fazer política dentro do movimento, que nunca houve, viu. Tanto é que conquistada a anistia, que era o objetivo, acabou. Foi cada um fazer o que queria, porque isso era o certo (Zerbini, 2006ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos. Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.).

A presença de diversos militantes de partidos e organizações de esquerda nos quadros do movimento, articulando o MFPA com grupos e setores sociais, é vista como tentativa de aparelhamento por parte de dona Therezinha. Essas tentativas teriam sido vencidas e narradas de forma a demonstrar que as divergências construídas no passado eram capazes de ser retomadas e alimentar novas disputas no presente, numa mistura de temporalidades expressa na narrativa.

Houve tentativas. E eu dou nominalmente o nome: Luís Eduardo Greenhalgh. Ele era terrível, terrível. Mas eu me vinguei dele porque eu trabalhei para o Severino. Foi a primeira tentativa de bote do PT, foi pegar a presidência da Câmara. Eu tinha saído do hospital nessa cadeira que você está vendo. Eu liguei, eu trabalhei um dia telefonando, pedindo voto para o Severino, porque a gente tinha que desmontar porque se eles tivessem pego, a história era diferente. O PC do B da Bahia,19 19 O Comitê Regional da Bahia e o Comitê Regional Estrutura 1 de São Paulo, do PCdoB, eram os principais protagonistas dos debates e enfrentamentos com o Comitê Central do Partido. Os embates na agremiação aconteciam nacionalmente, a partir de versões divergentes sobre o fracasso da Guerrilha do Araguaia. Posteriormente, a divergência com o PCdoB dá origem, no início dos anos 1980 ao Partido Revolucionário Comunista (PCR) [Sales, 2007]. quando interessava pra eles, eles levavam duas kombis cheias de gente. Lógico que ganhava na votação. Ah, eu acabei com a brincadeira. Às vezes, sou muito chocante. Eu digo: escuta aqui, vocês estão pensando o quê? Aqui na Bahia, nos cordões de vocês, nos cordões de carnaval vocês têm estatutos, vocês têm que obedecer, só pode entrar com aquelas roupas que eles vendem, não pode dançar fora da corda. Se no carnaval tem isso, no movimento de anistia não vai ter? Então, eu brincava: não é cu da mãe Joana, não (risos). Não é cu da mãe Joana! (Zerbini, 2006ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos. Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.).

As memórias dos conflitos dentro do MFPA nos anos 1970 mesclam-se aos relatos de disputas no âmbito da política nacional, no momento da entrevista, fazendo pensar sobre o lugar dos ressentimentos na narrativa de Zerbini. Para Therezinha, os ódios desencadeados por disputas nos anos 1970 foram capazes de alimentar uma vingança mais de trinta anos depois.

Com satisfação, ela relatou seu empenho na eleição do deputado Severino Cavalcanti, do Partido Progressista (PP), de Pernambuco para a presidência da Câmara dos Deputados, o que de fato veio a acontecer em fevereiro de 2005 e se configurou como uma das primeiras grandes derrotas do PT e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso Nacional. Com trezentos votos dos 498 deputados presentes, Severino, representante do baixo clero, foi eleito construindo sua candidatura com a promessa de elevar salários e de melhorar as condições de atuação dos colegas congressistas. Sete meses depois, acabou renunciando por envolvimento em denúncias de corrupção no caso que ficou conhecido como mensalinho.20 20 Ver mais em <http://acervo.oglobo.globo.com/em-destaque/severino-cavalcanti-acusado-de-corrupto-preside-camara-por-217-dias-ate-renuncia-17260847>. Acesso em: 19 out. 2017.

Membro fundador do PT, Greenhalg foi filiado de 1974 a 1980 ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido que até então reunia a oposição civil à ditadura. Trabalhou como advogado de jornais alternativos. Atuou fortemente na liderança do CBA que, em muitos momentos, tomou posturas diferenciadas com relação ao MFPA no que concerne ao entendimento sobre a forma como a anistia deveria se dar.

Para Therezinha, a criação do CBA, em 1978, reflete tão somente a tentativa de condução do processo por grupos de esquerda que não teriam encontrado espaço para aparelhamento do MFPA. Os embates travados com os grupos de esquerda são uma constante em sua narrativa marcada pela ironia e reafirmação da coragem para o enfrentamento e dão a ideia de um cotidiano de disputas e provocações na construção da luta pela anistia:

Eles queriam tomar o movimento de mulheres. Houve um encontro nacional dos movimentos de anistia, eles punham uns nomes pomposos e nós não podíamos deixar aquilo solto. A Alícia Peres, que era uma baiana bonita, ela foi comprar chicle, comprou um Estadão, me deu e disse: “Sei que você não aguenta ficar quieta com provocação, masque esse chicle e leia esse jornal”. E tinha um menino do Rio Grande do Norte que era o cão chupando manga, sabe? (risos) Ele queria provocar. Foi quando a Margarida, a nossa vice-presidente, coitadinha, ela tinha uma dor de dente horrível. Ela precisou ir no dentista e arrancou um dente. Ela veio cheia de dor, disseram que tinha de pôr gelo. Eu e a Alícia fomos ajudar, claro, porque era uma amiga que estava precisando. E ele não entendeu. Acho que pensou que o que a gente estava fazendo era descaso. (...) Eles diziam: “É porque ficam andando de cá pra lá, ficam indo tomar cafezinho, tomar água, lendo jornal”. Aquilo era para mim, porque eu tava que tava (simula ranger de dentes). E a Alícia: “Olhe, aqui, não admito! Nosso movimento é um movimento democrático. Nós não admitimos estalinismo. Você chegou ontem, está acostumado com o estalinismo no Rio Grande do Norte. (...) Mas eles vieram porque queriam tomar o movimento. Como eles não conseguiram, porque eu não dava chance... Eu dizia: gente, nós não somos donas da anistia, nós não queremos ser. Em São Paulo, os universitários pegaram a bandeira da anistia. Eu chorei na rua quando eu falei com o (Alberto) Goldman, que ele disse que eu ganhava as pessoas pela emoção. Quando eu vi os estudantes no fim do Viaduto do Chá com a bandeira da anistia, eu falei: “Graças a Deus”. Nós não estávamos mais sozinhas. A Ordem (dos Advogados do Brasil) pegou a bandeira da anistia, um sindicato pegou a bandeira da anistia. Depois, juntar tudo aquilo era um apito. Não, eles queriam dirigir. Eles queriam tomar para nos dirigir. Falei: “Não!” (Zerbini, 2006ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos. Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.).

As divergências relatadas acima por dona Therezinha aprofundaram-se com o crescimento da luta pela anistia e discussão ampliada com o CBA, principalmente depois da apresentação de projeto de lei pelo governo de João Baptista Figueiredo, em 1978, que além de não anistiar acusados por sequestros, assassinatos, atentado pessoal ou terrorismo, previa anistiar os que cometeram crimes comuns associados a crimes políticos, permitindo o perdão a policiais e militares que praticaram torturas ou assassinatos.

O MFPA não nasce, pelo menos em termos nacionais, defendendo a anistia ampla, geral e irrestrita (Ramos, 2002RAMOS, Andressa Maria Vilar. A liberdade permitida. Contradições, limites e conquistas do movimento pela anistia: 1975-1980. Dissertação (Mestrado em História), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2002., p. 62), mas apenas a anistia ampla e geral, o que significava não apoiar o perdão a acusados de “crimes de sangue”. Embora as posições entre CBAs e o MFPA tenham sido unificadas em encontro nacional, realizado em agosto de 1978, em Brasília, a fim de evitar o divisionismo e desarticulação dos setores de oposição ao governo, os conflitos não se encerraram e tinham como motivações a disputa entre os grupos de esquerda pela liderança do processo, a definição sobre a forma que deveriam ter as reivindicações, o apoio das entidades de luta pela anistia a movimentos sociais, em organização no processo de distensão e abertura, além do medo de recuo por parte do regime militar (Duarte, 2012DUARTE, Ana Rita Fonteles. Jogos da Memória: o Movimento Feminino pela Anistia no Ceará (1976-1979). Fortaleza: Inesp, UFC, 2012.).

Mas não só de conflitos e embates com feministas e militantes de esquerda é feita a narrativa da senhora Zerbini. Um dos eixos de memória presentes em seu relato, na entrevista realizada por mim, refere-se às mudanças provocadas em sua vida pessoal e subjetividade, pelo processo de forjar-se em dirigente política e militante pela anistia, ainda que as expressões políticas tradicionais para as mulheres até então, como a defesa da família e a pacificação nacional, tenham dado a tônica da construção pública do MFPA, pelo menos a partir da direção nacional. As expressões de pequenas e grandes negociações e embates com o marido, mais velho vinte anos, mostram um contentamento com as escolhas realizadas a partir de seu próprio desejo:

Inclusive aqui em casa aconteceu uma coisa muito importante. O general tinha ciúmes, claro. Eu era uma mulher bonita, andando por esse mundo de Deus, sozinha. E ele encheu porque eu andava como caixeiro viajante, com malinha pra lá, pra cá. Telefonava gente de todo lado e tudo, né? Ele disse: “Pois é, eu, agora, virei o marido da guerreira”. Eu olhei bem nos olhos dele. Saiu a voz do meu coração. Eu disse: “Nêgo, por quantos anos eu fui a mulher do guerreiro? Isso nunca me diminui. A bandeira está no chão. Alguém tem que pegar. Você não entende? (disse, com a voz embargada). Ele abaixou a cabeça. Nunca mais, nunca mais... (Zerbini, 2006ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos. Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.).

A resistência e tentativa de contraposição de dona Therezinha, possivelmente, mostravam o entendimento do desprestígio de sua memória e posições no momento da realização da entrevista, quando uma versão hegemônica dos grupos de esquerda procurava distribuir narrativas de acordo com os interesses políticos, invisibilizando trajetórias consideradas desnecessárias ou incômodas. Reis Filho (2004REIS F FILHO, Daniel Aarão. Ditadura e sociedade: as reconstruções da memória. In: REIS, Daniel Aarão; RIDENTI, Marcelo; MOTTA, Rodrigo Patto Sá. O golpe militar e a ditadura 40 anos depois (1964-2004). Bauru: Edusc, 2004.) aponta as reconstruções de memória operadas a partir da luta pela anistia, por boa parte dos grupos e partidos de esquerda. A luta armada ofensiva à ditadura militar, em contraposição ao capitalismo e pela instituição de uma ditadura revolucionária, transforma-se em resistência democrática contra o regime.

Os guerrilheiros foram reconstruídos em operações de memória como “desesperados de nobre causa” ou “equivocados de uma luta justa” que afinal haviam vencido, uma vez que a redemocratização havia sido alcançada. A conquista da ampliação dos processos de anistia em governos como os dos presidentes Fernando Henrique (PSDB), Lula e Dilma Roussef (PT) que instituíram, respectivamente, leis de reparações e indenizações, ampliação do acesso a arquivos e instituição da Comissão Nacional da Verdade, ajudou a fortalecer essas versões, não necessariamente popularizando-as.

Em 2006, quando realizei a entrevista com dona Therezinha, os processos de julgamento e indenizações de atingidos pela ditadura eram realizados por todo o país, uma vez que comissões de anistia foram criadas também a partir de leis estaduais. Ex-líderes estudantis, ex-presos políticos tinham suas trajetórias reconhecidas, recebiam pedidos públicos de perdão do Estado, eram convidados a ser reintegrados em universidades ou recebiam suas indenizações em cerimônias marcadas pela emoção (Gonçalves, 2006GONÇALVES, Danyelle Nilin. O preço do passado: anistia e reparação de perseguidos políticos no Brasil. Tese (Doutorado em Sociologia), Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006.).

A vida da estilista Zuzu Angel, morta em emboscada pelo regime militar por denunciar o assassinato do filho Stuart Edgart Angel Jones, era retratada em filme, dirigido por Sérgio Rezende e protagonizado pela atriz Patrícia Pilar. É importante pensar, nesse contexto, nas dificuldades de ser compreendida por ter apoiado uma opção pela anistia com exclusão dos guerrilheiros ou pela aceitação de anistia parcial, limitada e restrita que implicasse perdão aos torturadores, uma vez que as posições carregavam valores negativos e condenados por muitos setores.

Há ainda outro elemento a considerar. Nas narrativas sobre a anistia, tanto memorialísticas como acadêmicas, há uma tendência em identificar o CBA como catalisador mais importante da campanha da anistia, em detrimento do MFPA, considerado mais restrito e de abordagem pouco política, embora precursor. A luta do MFPA é dita importante na medida em que abriu caminho para o CBA, em 1978, como percebemos em alguns relatos: “Mas foi com a fundação do Comitê Brasileiro pela Anistia no Rio de Janeiro que a campanha começou a tomar vulto”.21 21 Depoimento de Ana Guedes, ex-militante do MFPA, e, em seguida, do CBA, na Bahia (Maués, 2006, p. 218). “Só os CBAs têm como princípio de ação programa de conteúdo eminentemente estrutural e político cujo eixo principal é o resgate da memória pela perspectiva dos que sofreram a opressão do regime e a combateram” (Greco, 2003GRECO, Heloísa Amélia. Dimensões fundacionais da luta pela anistia. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2003., p. 79). Para Ramos (2002RAMOS, Andressa Maria Vilar. A liberdade permitida. Contradições, limites e conquistas do movimento pela anistia: 1975-1980. Dissertação (Mestrado em História), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2002.), embora o MFPA tenha sido o primeiro grupo organizado na luta pela anistia, com repercussão, seu caráter “limitado” fê-lo perder a liderança e o poder de agregar pontos de vista plurais. As mulheres são lembradas como pioneiras, portanto, mas suas ações políticas diferenciadas e contraditórias, em pontos diversos do país, são deixadas de lado.

Considerações finais

Alberti (2004ALBERTI, Verena. Ouvir contar: textos em história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.) foi muito precisa ao dizer que o período ditatorial, pós-1964, é ainda intensamente disputado na sociedade brasileira, não se podendo falar em vitória de uma memória específica. Não obstante, algumas construções conseguiram se estabelecer por longo tempo, como a ideia de que mais resistimos que nos opusemos ao autoritarismo, a de que os que se insurgiram em armas contra os ditadores estavam apenas reagindo em defesa da democracia. Pensamentos a meio caminho, seja por via da discordância ou autocrítica, para muitos no campo das esquerdas, soaram como arrependimento, traição ou opiniões “pequeno-burguesas”.

O último caso foi o mais atribuído à dona Therezinha Zerbini. Fundadora do MFPA, em 1975, ela é uma das figuras mais controversas da luta pela redemocratização no Brasil. Esposa de general que resistiu ao golpe de 1964 e que por isso foi cassado, tornou-se ela também presa política após intermediar empréstimo de sítio para congresso clandestino da UNE, em Ibiúna, em 1968. Fundou o primeiro movimento organizado na luta pela anistia, formado apenas por mulheres, estimulando a fundação de núcleos por todo o Brasil, com centenas de participantes. Fez tudo registrado em cartório, o que não a impediu de ser vigiada pelos órgãos de repressão e de sofrer atentado. Inspirou o estatuto da instituição que presidia no das mulheres marchadeiras que apoiaram o golpe de 1964.

Ao mesmo tempo, denunciava a tortura e prisões arbitrárias. Uniu-se às feministas para produzir jornal conjunto. Rompeu com elas. Viajou o Brasil inteiro, sozinha, para palestrar sobre a anistia, irritando o marido, vinte anos mais velho, com tamanha autonomia para uma mulher casada, naquele período. Brigou com a esquerda, muitas vezes, antes e depois da lei aprovada em 28 de agosto de 1979. O principal motivo, sua defesa do processo de anistia como esquecimento e a aceitação de que os acusados de crimes de sangue podiam não ser anistiados naquele momento como propunha o projeto de lei apresentado pelo governo Figueiredo. A maior parte dos movimentos de anistia defendia a anistia ampla, geral e irrestrita, com desmantelamento do aparato de repressão, investigação e punição de torturadores, libertação de todos os presos políticos.

Seu posicionamento, reafirmado algumas vezes depois em entrevistas jornalísticas, valeu-lhe a acusação de “retrógrada”, “ultrapassada”, “folclórica”. Foi excluída das mais importantes coletâneas memorialísticas de personagens na luta pela anistia, publicadas a posteriori. Entre as mulheres convidadas a narrar sua experiência, lideranças regionais do MFPA e CBA que lhe faziam oposição, como a mineira Helena Greco.

A opinião desprestigiada sobre os caminhos da anistia pode ter feito Therezinha decidir por não escrever sua própria narrativa sobre a experiência no MFPA. Essa opção, mesmo quando se lutou e arriscou a vida entre os anos 1960 e 1980, nas ditaduras militares, é comum a outras mulheres e militantes dos países do Cone Sul, mas, no caso de Zerbini, discordar da maioria pode ter pesado um pouco mais em decidir não fazê-lo.

Outro aspecto importante diz respeito à naturalização de sua ação política como uma quase extensão do esperado para seu gênero, o que acabou abarcando a maior parte da memorialística em torno do MFPA, incluindo a construção das cerimônias de reunião de anistiados em que as militantes são homenageadas por seu amor, coragem, afeto, cuidado e maternidade ampliada (Greco, 2003GRECO, Heloísa Amélia. Dimensões fundacionais da luta pela anistia. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2003.). Não se levam em consideração os usos desse mesmo gênero como instrumento de ação política em meio a um cenário de autoritarismo e interdição. As mulheres do MFPA são lembradas em seu sofrimento, dor, resignação e luta pela família como na reportagem de Leite (2012LEITE, Paulo Moreira. A mulher que era o general da casa. Porto Alegre: Arquipélago, 2012.). Os posicionamentos de crítica ao feminismo de Zerbini são narrados como acertos de alguém que já viveu o suficiente para entender “como seriam as coisas” e não a partir de conflitos concretos desenrolados entre ela e grupos femininos, num momento de transformação profunda para a situação das mulheres que também a atingiu e modificou.

Essa naturalização e ausência de complexidade no trato da ação política do MFPA aparece também em trabalhos de história que ainda enxergam no movimento um abre-alas para a ação do CBA, considerado o responsável pela luta mais legítima. A pluralidade de vozes e embates é resumida à ação familiar ou ao que seria o posicionamento de setores mais ligados a Zerbini. Pesquisas mais recentes sobre a ação política de grupos do MFPA pelo Brasil e suas articulações com movimentos sociais, partidos políticos e organizações clandestinas mostram que a experiência do movimento está longe de ser homogênea e que o controle absoluto pretendido por Therezinha sobre a condução do MFPA, não aconteceu (Greco, 2003GRECO, Heloísa Amélia. Dimensões fundacionais da luta pela anistia. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2003.).

A partir desse conjunto de discursos construídos sobre o processo de anistia é possível compreender os sentidos da entrevista da fundadora do MFPA, naquele agosto de 2006, em sua casa em São Paulo. Ansart (2004ANSART, Pierre. História e memória dos ressentimentos. In: BRESCIANI, Stella; NAXARA, Márcia. Memória e (res)sentimento. Indagações sobre uma questão sensível. Campinas: Editora Unicamp, 2004, p. 15-30.) diz que cabe ao historiador refletir sobre os ressentimentos na elaboração memorialística, interpretando rancores, invejas, desejos de vingança e os fantasmas da morte. A narrativa de Therezinha Zerbini, produzida em diálogo comigo, foi realizada a partir do signo da contraposição e da resistência. Suas memórias da atuação do MFPA foram construídas prioritariamente a partir das disputas realizadas com alguns grupos, ou mesmo indivíduos, encarados como personagens que tentaram, de formas variadas, apropriar-se da ação política organizada por ela e outras apoiadoras. Nessa memória, aliados são reconhecidos, exaltados, enquanto os adversários são denunciados e encarados como perdedores diante de suas estratégias e coragem.

Dona Therezinha mostrou em sua entrevista, com sua raiva e ressentimento, que ela tinha existido. E, mesmo sem concordar com os entendimentos hegemônicos sobre a anistia e o fazer político de seus adversários, estava longe de constituir-se em figura “folclórica”.

Referências

  • ALBERTI, Verena. Ouvir contar: textos em história oral Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.
  • ANJO DA GUARDA. 2005. Disponível em: <Disponível em: http://carosamigos.terra.com.br/da_revista/edicoes/ed53/marina_amaral.asp >. Acesso em: 12 maio 2005.
    » http://carosamigos.terra.com.br/da_revista/edicoes/ed53/marina_amaral.asp
  • ANSART, Pierre. História e memória dos ressentimentos. In: BRESCIANI, Stella; NAXARA, Márcia. Memória e (res)sentimento. Indagações sobre uma questão sensível Campinas: Editora Unicamp, 2004, p. 15-30.
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  • CANDAU, Joel. Anthropologie de la mémoire Paris: Presses Universitaires de France, 1996.
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  • DUARTE, Ana Rita Fonteles. Jogos da Memória: o Movimento Feminino pela Anistia no Ceará (1976-1979) Fortaleza: Inesp, UFC, 2012.
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  • ZERBINI, Therezinha Godoy. Anistia - semente da liberdade São Paulo: Salesianas, 1979.
  • ZERBINI, Therezinha Godoy de. 78 anos Depoimento feito a Ana Rita Fonteles Duarte, em agosto de 2006, São Paulo. Acervo da autora, 2006.
  • 1
    ACE 1031733/76, Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica. Fundo SNI. Arquivo Nacional. Coordenação Regional do Distrito Federal (An-Coreg), p. 2, 1976.
  • 2
    ACE 84588/75, Serviço Nacional de Informações. Fundo SNI. Arquivo Nacional. Coordenação Regional do Distrito Federal (An-Coreg), p. 1, 1975.
  • 3
    O termo é utilizado por Valter Pomar, diretor nacional do Partido dos Trabalhadores, em entrevista com Helena Greco, realizada por ele para a revista Teoria e Debate, do PT. Ver Pomar (1995POMAR, Valter. Memória: Helena Greco. Entrevista concedida a Valter Pomar, 1995. Disponível em: <Disponível em: http://www.teoria edebate.org.br/materias/nacional/helena-greco? page=full >. Acesso em: 18 out. 2017.
    http://www.teoria edebate.org.br/materia...
    ).
  • 4
    Ver Duarte (2012).
  • 5
    O núcleo mineiro é um dos mais numerosos do Brasil. Chegou a congregar cerca de trezentas mulheres, segundo Lanna (1996LANNA, Ana Flávia Arruda. Movimento Feminino pela Anistia. A esperança do retorno à democracia. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1996., p. 118).
  • 6
    A primeira é membro do Grupo Tortura Nunca Mais, na Bahia e militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). A última foi eleita primeira prefeita de capital, pelo PT, em Fortaleza, em 1985 (Maués; Abramo 2006MAUÉS, Flamarion; ABRAMO, Zilah Wendel. Pela democracia, contra o arbítrio. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2006.).
  • 7
    Termos encontrados em diferentes textos sobre Therezinha Zerbini e ironizados por ela durante a entrevista (Zerbini, 2006)
  • 8
    Frei Tito é considerado símbolo da encarnação dos horrores da ditadura brasileira (Betto, 2006BETTO, Frei. Batismo de sangue. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.).
  • 9
    Operação repressiva piloto montada em São Paulo, em 1969, não formalmente vinculada ao II Exército, mas chefiada por seu comandante Canavarro Pereira. Foi composta por efetivos do Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Estadual, Federal, Civil, Força Pública, Guarda Civil e até civis paralimitares (Direito ..., 2007, p. 23)
  • 10
    Trabalhou em diversos jornais e revistas da grande imprensa brasileira como Veja, Época, Gazeta Mercantil e O Estado de S. Paulo. Atualmente dirige o jornal digital 247, de linha editorial considerada de esquerda, onde mantém coluna.
  • 11
    A categoria gênero usada nas análises históricas permite aos pesquisadores focalizar as relações entre homens e mulheres, mas também entre homens e entre mulheres, verificando como, em diversos momentos do passado, alguns eventos ou acontecimentos foram produtores de gênero (Pedro, 2005PEDRO, Joana Maria. Traduzindo o debate: o uso da categoria gênero na pesquisa histórica. História(São Paulo). v. 24, n. 1, p. 77-98, 2005.).
  • 12
    Feminista norte-americana, morta em 2006. Tornou-se conhecida a partir da publicação do best-seller Mística feminina, em 1963, onde analisa a insatisfação das donas de casa americanas com suas vidas e casamentos. Em 1966, realizou em Washington uma Conferência Nacional onde se constituiu a Organização Nacional de Mulheres, conhecida como NOW — National Organization for Women.
  • 13
    O Pasquim, de 08 a 14 de jul. 1977 (Zerbini, 1979, p. 22).
  • 14
    O texto propõe a reintegração do pacto social por meio de sujeitos políticos naturalizados como promotores de sentimentos de solidariedade, justiça e paz. As mulheres colocam-se em cena no MFPA, com ação política nova, não transgressora em termos discursivos, o que não implicou embates e ações divergentes no cotidiano dos núcleos, como afirma Duarte (2012).
  • 15
    Alguns poucos trabalhos acadêmicos, biografias e livros jornalísticos trazem relatos de mulheres que foram à luta armada, atuando direta ou indiretamente na guerrilha. Duas dissertações já publicadas estão entre as mais citadas: A resistência da mulher à ditadura militar no Brasil, de Ana Maria Colling (Rio de Janeiro: Record: Rosa dos Tempos, 1997) e Mulheres, militância e memória, de Elizabeth Ferreira (Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996). Dentre as biografias podem-se citar As moças de Minas, de Luiz Manfredini (São Paulo: Editora Alfa Ômega, 1995), que narra a história de cinco militantes da Ação Popular; Iara: reportagem biográfica, de Judith Lieblich Patarra (Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992), que narra a trajetória da militante Iara Iavelberg, militante da Vanguarda Popular Revolucionária e do Movimento 8 de Outubro, última companheira do líder guerrilheiro Carlos Lamarca, morta em Salvador. Dentre os relatos jornalísticos, pode-se citar Mulheres que foram à luta armada, de Luiz Maklouf Carvalho (São Paulo: Editora Globo, 1998). Entre as militantes do MFPA, os escritos biográficos são ainda mais escassos. Destaco o livro Glória, mãe de preso político, da militante do MFPA em Minas, escrito por seu filho Gilney Amorim Viana, publicado em 2000 pela Paz e Terra, a partir de entrevistas com a mãe. Outro filho que escreve a trajetória da mãe na luta contra a ditadura é Marcelo Rubens Paiva em Ainda estou aqui, um relato sobre a resistência da advogada Eunice Paiva, publicado em 2015 pela Alfaguara. Destaco ainda o livro de Maria Rosa Leite Monteiro, mãe de Honestino Guimarães, líder estudantil desaparecido em 1973 e declarado assassinado na prisão em decorrência de violência, apenas em 1996. Em Honestino, o bom da amizade é a não cobrança, publicado pela Da Anta Casa Editora, em 1998, ela dedica-se a narrar a trajetória do filho e as buscas da família por seu paradeiro.
  • 16
    Para Wolff (2007WOLFF, Cristina Scheib. Jogos de gênero na luta da esquerda armada no Brasil: 1968-1974. In: WOLFF, Cristina Scheib; FÁVERI, Marlene de; RAMOS, Tânia Regina Oliveira (Orgs.). Leituras em rede - gênero, preconceito. Florianópolis; Editora Mulheres, 2007.), a figura do militante ainda é ligada a valores como valentia, virilidade, coragem, firmeza, sentimentos que não se ajustavam com o discurso afetivo de esposas, mães e irmãs pela libertação dos parentes.
  • 17
    Entre as publicações de maior repercussão sobre a atuação de líderes dos movimentos da resistência brasileira durante a ditadura podemos citar as autobiografias O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira, lançada em 1979, que já vendeu mais de 250 mil exemplares em quarenta edições e Os Carbonários: memórias da guerrilha perdida, de Alfredo Sirkis, lançado em 1980, já na 14ª edição. Entre as biografias destaca-se Mariguella, o guerrilheiro que incendiou o mundo, de autoria do jornalista Mário Magalhães, publicada em 2012, pela Companhia das Letras e em fase de adaptação para o cinema. Outro livro adaptado para o cinema, em 1994, foi Lamarca, o capitão da guerrilha, de Emiliano José e Miranda Oldack. O texto foi lançado pela primeira vez em 1980.
  • 18
    Tabloide fundado pela jornalista Joana Lopes, no Paraná. Existiu entre os anos de 1975 e 1980.
  • 19
    O Comitê Regional da Bahia e o Comitê Regional Estrutura 1 de São Paulo, do PCdoB, eram os principais protagonistas dos debates e enfrentamentos com o Comitê Central do Partido. Os embates na agremiação aconteciam nacionalmente, a partir de versões divergentes sobre o fracasso da Guerrilha do Araguaia. Posteriormente, a divergência com o PCdoB dá origem, no início dos anos 1980 ao Partido Revolucionário Comunista (PCR) [Sales, 2007SALES, Jean Rodrigues. Entre o fechamento e a abertura: a trajetória do PC do B da Guerrilha do Araguaia à Nova República (1974-1985). História, São Paulo, v. 26, n. 2, p. 304-365, 2007.].
  • 20
    Ver mais em <http://acervo.oglobo.globo.com/em-destaque/severino-cavalcanti-acusado-de-corrupto-preside-camara-por-217-dias-ate-renuncia-17260847>. Acesso em: 19 out. 2017.
  • 21
    Depoimento de Ana Guedes, ex-militante do MFPA, e, em seguida, do CBA, na Bahia (Maués, 2006, p. 218).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2018
  • Aceito
    28 Mar 2019
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