Acessibilidade / Reportar erro

Inquisição, pacto com o demônio e "magia" africana em Lisboa no século XVIII

Resumos

No início do século XVIII a escravidão chegou ao seu apogeu em Portugal, especialmente em Lisboa. Até 1761, um milhar de cativos africanos, ou mais talvez, por ano, desembarca no cais da capital. Vêm diretamente da África ou do Brasil onde residiram alguns anos. Começa para eles um longo processo de adaptação, de reconstrução da identidade e do imaginário. Por detrás da fachada das sete confrarias negras, entre as quais duas eram de nações, que apresenta a versão oficial e enquadrada no catolicismo barroco e procura produzir e apresentar negros à alma branca, se esconde uma outra realidade: a persistência das crenças africanas tradicionais, articuladas ou misturadas às tradições populares portuguesas, às quais, respondendo à sua procura de poderes mágicos diferenciais e cumulativos, as populações brancas mostram-se sensíveis. Os processos da Inquisição revelam assim que feiticeiros, mágicos, mandingueiros e curandeiros negros inserem-se, cada um à sua maneira, na cadeia complexa dos agentes legítimos e ilegítimos do sagrado.

Lisboa século XVIII; Magia; Calundu


At the beginning of century XVIII, the slavery arrived at its apogee in the Portuguese Metropolis, especially in Lisbon. Until 1761, a thousand captive Africans, or more perhaps, per year, disembarks in the wharfs of the capital. They come directly of Africa or Brazil where some years had inhabited. A long process of adaptation, reconstruction of the identity and of the imaginary one starts for them. Behind frontage of seven black brotherhoods, between which two were of nations, which presents the official and framed version of baroque Catholicism and seek to produce and to present blacks with a white soul, appears another reality: the persistence of the traditional African beliefs, articulated or mixed to the Portuguese popular traditions, to which, answering to its search of magical cumulative and differentials powers, the white populations reveal sensible. Thus, the Inquisition trials disclose that, mandingueiros, soothsayers, wizards, and black magical folk healers insert themselves, each one with its manner, in the complex chain of legitimated and illegitimated agents of the sacred.

Lisbon; slavery; black magicals.


Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

  • AUGÉ, Marc. Le Génie du paganisme. Paris: Gallimard, 1982.
  • AUGÉ, Marc. Le dieu objet. Paris: Flammarion, 1988.
  • BAROJA, Julio Caro.Les sorcières et leur monde. Paris: Gallimard, 1972.
  • BENESCH, Otto. La peinture allemande, de Dürer à Holbein. Genève: Skira, 1966.
  • BENISTE, José. Òrun Àiyé, o encontro de dois mundos. O sistema de relacionamento nagô-yorubá entre o céu e a terra. Rio de Janeiro: Bertrand-Brasil, 1997.
  • BERNAND, C. Negros esclavos y libres en las ciudades americanas. CD-rom Colección Proyectos Históricos Tavera (I) DIGIBIS: Madrid, 2000.
  • BETHENCOURT, Francisco. O imaginário da magia, feiticeiras, saludadores e nigromantes no séc. XVI. Lisboa: Universidade Aberta, 1987.
  • BOURDIEU, P. Une interprétation de la théorie de la religion selon Max Weber. In: Archives Européennes de Sociologie, XII, 1, 1971.
  • CALAINHO, Daniela Buono. Metrópole das mandingas. Religiosidade negra e inquisição portuguesa no antigo regime. Tese de doutoramento. Niterói, 2000.
  • CALAINHO, Daniela Buono. Jambacousse e gangazambes: feiticeiros negros em Portugal. Afro-Ásia, 26-26 (2001).
  • CALAINHO, Daniela Buono. Negros hereges, agentes do diabo. Religiosidade negra e inquisição em Portugal - séculos XVI-XVIII. In: FLORENTINO, Manolo & MACHADO, Cacilda (Orgs.). Ensaios sobre a escravidão (I). Minas Gerais: UFMG, 2003.
  • CAPONE, Stefania. La quête de l'Afrique dans le candomblé, pouvoir et tradition au Brésil. Paris: Karthala, 1999.
  • CHEVALIER J. & GHEERBRANT A. Dicionário dos símbolos. Lisboa: Ed. Teorema, 1994.
  • DESCH OBI, T. J. Combat and the crossing of the kalunga. In: HEYWOOD, Linda M. Central Africans and cultural transformation in the american diaspora. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
  • DURKHEIM, E. Les formes élémentaires de la vie religieuse. Paris: PUF., 1968.
  • FONSECA, Jorge. Escravos no sul de Portugal. Séculos XVI-XVII. Lisboa: Ed. Vulgata, 2002.
  • FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Paris: Gallimard, 1976; Lisboa: Relógio D'Água Editores, 1994.
  • FRAGINALS, Manuel Moreno. Aportes culturales y deculturación. In: La Historia como arma y otros estudios sobre esclavos, ingenios e plantaciones. Barcelona, 1983.
  • GIL, José. Les métamorphoses du corps. Paris: La Différence, s.d.
  • GINZBURG, Carlo. Les batailles nocturnes. Paris: Flammarion, 1984.
  • Glossário Glossário de magia e esoterismo. São Paulo: NETRA, 2001.
  • ISERT, Paul Erdman. Voyages en guinée et dans les îles caraïbes en amérique. Paris: Karthala, 1989.
  • KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro, 1808-1850. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
  • LAHON, Didier; NETO, Maria Cristina & et al. Catálogo da exposição Os negros em Portugal - Sécs. XV a XIX. Mosteiro dos Jerónimos de Belém, Lisboa, 239-1999/24-1-2000, Lisboa: C.N.C.D.P., 1999.
  • LAHON, Didier. Violência do estado, violência privada. O verbo e o gesto no caso Português. In: FLORENTINO, Manolo & MACHADO, Cacilda. Ensaios sobre a escravidão (I). Minas Gerais: UFMG, 2003.
  • Le Le dictionnaire des inquisiteurs. Valence, 1494. Revisitado por Louis Sala-Molins, Ed. Galilée, 1981.
  • LEBRUN, F. Médecins, saints et sorciers aux 17e et 18e siècles. Paris: Messidor, 1983.
  • MANDROUX, R. Magistrats et sorciers en France au XVIIe siècle. Paris: Seuil, 1980.
  • Manuel Manuel des inquisiteurs d'Eymerich. Paris: Mouton-EHSS, 1973.
  • MAUPOIL, Bernard. La Géomancie à l'ancienne côte des esclaves. Paris: Institut d'Ethnologie, 3ª ed., 1998.
  • MAUSS, M. Sociologie et Anthropologie. Paris: PUF, 1980.
  • METRAUX, A. Le vaudou haitien. Paris: Gallimard, 1958.
  • MOTT, Luís. Etnodemonologia: a vida sexual do Diabo no mundo íbero-americano. In: Religião e Sociedade, n.122, 1985.
  • MUCHEMBLED, R. Sorcières, justice et société aux 16e et 17e siècles. Rio de Janeiro: Imago, 1987.
  • MUCHEMBLED, R. La sorcière au village, XV-XVIIIe siècle. Folio: Gallimard, 1991.
  • PAIVA, J. P. Bruxaria e superstição num pais "sem caça às bruxas", 1600-1774. Lisboa: Notícias editorial, 1997.
  • PAIVA, J. P. Práticas e crenças mágicas, o medo e a necessidade dos mágicos na diocese de Coimbra (1650-1740). Coimbra: Minerva, 1992.
  • LOUREIRO, Rui M. & GRUZINSKI, Serge (Coord.). Passar as fronteiras - Actas do II Colóquio Internacional sobre Mediadores Culturais - Séculos XV a XVIII. Lagos: Centro de Estudos Gil Eanes, 1999.
  • SALLMANN, Jean-Michel. Naples et ses saints á l'âge baroque (1540-1750). Paris: PUF, 1994.
  • SANTANA, Francisco. Bruxas e curandeiros na Lisboa Joanina. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1996.
  • SANTOS, Maria Helena Carvalho dos. A abolição da inquisição em Portugal- um acto de poder. Inquisição. In: Actas do 1º congresso luso-brasileiro sobre inquisição, Lisboa, 1987. Lisboa: Universitária Editora, 1989, v. III.
  • SCHUTZENBERGER, Anne Ancelin. Forme européenne inconsciente du chamanisme: la réalisation automatique des prédictions.Transe, chamanisme, possession, Actes des IIe rencontres Internationales de Nice. Avril: 1985, Nice: Editions Serre, 1986.
  • SLENES, Robert W. Malungu, Ngoma vem! África encoberta e descoberta no Brasil. Luanda: Museu Nacional da Escravatura, INPC, 1995.
  • SLENES, Robert W. The great porpoise-skullstrike: central african water spirits and slave identity in early-nineteenth-century Rio de Janeiro. In: HEYWOOD, Linda M. (ed.). Central africans and cultural transformation in the american diaspora. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
  • SILVA, M. B. Nizza da. Culinária colonial. Oceanos, n. 42, C.N.C.D.P., abril/junho 2000. Lisboa: C.N.C.D.P.
  • SOUZA, Laura de Mello e. Inferno atlântico. demonologia e colonização. séculos XVI-XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
  • SOUZA, Laura de Mello e. Curas mágicas y sexualidad en el siglo XVIII luso-brasileño. In: QUEIJA, Berta Ares & GRUZINSKI, Serge (Coord.). Entre dos mundos - fronteiras culturales y agentes mediadores. Sevilla: E.E.H.A, 1997, pp. 441-450.
  • SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a terra de santa cruz, feitiçaria e religiosidade popular no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1986.
  • STELLA, Alessandro. Histoires d'esclaves dans la péninsule ibérique. Paris: EHESS, 2000.
  • WALKER, Timothy Dale. Doctors, folk medecine and the inquisition: the repression of popular healing in Portugal during the enlightenment era. Tese de doutoramento. Boston University, 2001.
  • THIERS, Jean Baptiste. Traité des superstitions. Paris: Le Sycomore, 1984.
  • VASCONCELOS, José Leite de. Signum Salomonis a figa - a barba em Portugal. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1996.
  • VERGER, P. Fatumbi, Les dieux yoruba en afrique et au nouveau monde. Paris: Métailié, 1982.
  • 1
    BECKFORD, W. Diário de William Beckford em Portugal e Espanha. Lisboa: BN, 1988, p. 50.
  • 2
    SANTOS, Maria Helena Carvalho dos. A abolição da Inquisição em Portugal - Umacto de Poder. Inquisição. Actas do 1º Congresso Luso-Brasileiro sobre Inquisição, Lisboa, 1987. Lisboa: Universitária Editora, 1989, v. III, p. 1382.
  • 3
    "a importância primordial deste facto que marca as atitudes religiosas medievais e mo-dernas no nosso país: o cristianismo afirma-se contra o maometanismo e contra o judaísmo, não se destriçando, no primeiro caso, o confronto religioso do confronto militar, político, social e cultural (...)" - BETHENCOURT, Francisco. O imaginário da magia, feiticeiras, saludadores e nigromantes no séc. XVI. Lisboa: Universidade Aberta, 1987, p. 246
  • 4
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo-Denuncia, nº 14.105, 1 fl. (1796).
  • 5
    PAIVA, José Pedro. Bruxaria e superstição num país "sem caça às bruxas", 1600-1774. Lisboa: Notícias editorial, 1997, p. 150
  • 6
    "Ora, a confissão é um ritual de discurso em que o sujeito que fala coincide com o sujeito do enunciado; é igualmente um ritual que se desdobra numa relação de poder, porque não se confessa sem a presença, pelo menos virtual, de um parceiro, que não é simplesmente o interlocutor, mas a instância que requer a confissão, a impõe, a aprecia e intervém para julgar, punir, perdoar, consolar, reconciliar; um ritual em que a verdade se autentifica pelo obstáculo e pelas resistências que teve de vencer para se formular; por fim, um ritual em que a simples enunciação, independentemente das suas consequências externas, produz, em quem a articula, modificações intrínsecas: ela inocenta-o, redime-o purifica-o, descarrega-o das suas faltas, liberta-o, promete-lhe a salvação." FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Paris: Gallimard, 1976 / Lisboa: Relógio D'Água Editores, 1994, p. 66.
  • 7
    PAIVA, J.P., op. cit., p. 356.
  • 8
    Gracia Luzia IANTT, Inq. Lisboa, nº 433 (1736); Antónia da Cruz, Inq. Lisboa, nº11.177 (1745).
  • 9
    Francisco José Pedroso, natural da Costa da Mina; IANTT, Inq. Lisboa, nº 11.774 (1731).Detentor de uma bolsa de mandinga, ele afirma que sempre pensou que ela não tinha sido feita com a ajuda do demônio, "que era coisa de Deos", ao contrário de uma outra, cuja existência conhecia mas que se recusava a usar.
  • 10
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 6.286, (1733).
  • 11
    PAIVA, J. P., op. cit., p. 129. Sobre a violência dos senhores: LAHON, Didier. Violência do Estado, violência privada. O verbo e o gesto no caso português. In: FLORENTINO, Manolo & MACHADO Cacilda (Orgs.). Ensaios sobre a Escravidão (I). Ed. UGMG, 2003, pp. 87-120.
  • 12
    FRAGINALS, Manuel Moreno. Aportes culturales y deculturación. La Historia como arma y otros estudios sobre esclavos, ingenios e plantaciones. Barcelona, 1983, pp. 29-31, citado por SLENES, Robert W. Malungu, Ngoma vem! África encoberta e descoberta no Brasil. Luanda: Museu Nacional da Escravatura, INPC, 1995, 24 p. 15.
  • 13
    IANTT, Inq. Lisboa, Processos nº 437, Florinda Maria de São José, (1736); SANTANA,Francisco. Bruxas e curandeiros na Lisboa Joanina. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1996, pp.125-126.
  • 14
    "e seu Pay se chamava Catumbeque e sua Mai Máve.(...) Que ella tinha (...) duas irmaõs huma chamada Quiloma e outra chamada Capaco e outra que morreo não lhe lembra o nome."
  • 15
    FRANÇOIS, Medeiros. L'Occident et l'Afrique (XIIIe-XVe siècle). Paris: Karthala-C.R.A, 1985.
  • 16
    SLENES, Robert W., op. cit., p. 10 e The Great Porpoise-SkullStrike: Central african water spirits and slave identity in early-nineteenth-century Rio de Janeiro. In: HEYWOOD, Linda M. (ed.).Central africans and cultural transformation in the American diaspora. Cambridge: Cambridge University Press, 2001, pp. 183-208 e, na mesma obra; DESCH OBI, T. J. Combat and the crossing of the Kalunga. pp. 353-370.
  • 17
    KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro, 1808-1850. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, pp. 418-419. Para Portugal; FONSECA, Jorge. Escravos no sul de Portugal. Séculos XVI-XVII. Ed. Vulgata, 2002, pp. 237-238; ALMADA, André Álvares d'. Tratato Breve dos Rios de Guiné do Cabo Verde, (1594). In: Monumenta Missionaria Africana, 2ª Série, v. III, doc. 92, p. 339.
  • 18
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo 348, Joana Antónia (1746).
  • 19
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo 2.279, Maria de Jesus (1735).
  • 20
    SOUZA, Laura de Mello e. Inferno atlântico. Demonologia e colonização. Séculos XVIXVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 170.
  • 21
    Idem, 172.
  • 22
    WALKER, Timothy Dale. Doctors, folk medecine and the Inquisition: the repression of popular healing in Portugal during the enlightenment era. Tese de doutoramento. Boston University, 2001.
  • 23
    CHEVALIER J. & GHEERBRANT, A. Dicionário dos símbolos. Lisboa: Teorema, 1994, p. 149. No entanto o Levitico (9,4) considerava-o como um animal impuro.
  • 24
    Não encontramos qualquer referência ao transporte por via aquática nas obras seguin-tes: Le Dictionnaire des inquisiteurs. Valence, 1494, "revisitado" por Louis Sala-Molins, Ed. Galilée, 1981; Le Marteau des sorcières. Grenoble: Ed. J. Millon, 1990, Cap. III; Manuel des Inquisiteurs d'Eymerich. Paris: Mouton-EHSS, 1973; MANDROUX, R. Magistrats et sorciers en France au XVIIe siècle.Seuil: 1980;
  • 25
    MUCHEMBLED, R. Sorcières, justice et société aux 16e et 17e siècles. Imago, 1987; Idem, La Sorcière au village, XV-XVIIIe siècle. Gallimard: Folio, 1991; CARO, Baroja, Julio. Les Sorcières et leur monde. Gallimard, 1972;
  • 26
    ESCAMILLA-COLIN, M. Crimes et châtiments dans l'Espagne Inquisitoriale. T. 2, Berg International, 1992; GINZBURG, Carlo. Les Batailles nocturnes. Paris: Flammarion, 1984.
  • 27
    PAIVA, J. P., op. cit., pp.41e 47.
  • 28
    BETHENCOURT, F., op. cit.; PAIVA, J. P. Práticas e crenças mágicas, o medo e a necessidade dos mágicos na Diocese de Coimbra (1650-1740). Coimbra: Minerva, 1992 e idem, pp. 208-209.
  • 29
    1761: proibição de importação de novos escravos na metrópole. 1773: Lei do ventre livre e libertação dos escravos de quarta geração. "Dois alvarás, um de 1756 e o outro de 1788, permitiam aos oficiais, mestres, marinheiros e mais homens do mar que navegassem para o Brasil dedicar-se por sua conta e risco a um pequeno comércio alimentar" de produtos da metrópole. SILVA, M. B. Nizza da. Culinária colonial. Oceanos,C.N.C.D.P., nº 42, abril/junho 2000, p. 27. SOUZA, Laura de Mello e. Curas mágicas y sexualidad en el siglo XVIII Luso-Brasileño. In: QUEIJA, Berta Ares & GRUZINSKI, Serge (Orgs.). Entre dos mundos - Fronteiras culturales y agentes mediadores. Servilla: E.E.H.A, 1997, pp. 441-450. Neste artigo ela trata, entre outros, do caso de Domingos Alvares (IANTT, Inq. Évora, nº 7.759), negro natural da Costa da Mina, batizado no Brasil, curandeiro e saludador, sentenciado em 1742 e degredado na cidade de Castro-Marim, fronteiriça a Espanha, no extremo sul do país. Novamente preso em 1747 por ter reincidido na mesma culpa, associando a esta o mito tipicamente ibérico da busca de tesouros e do desencanto de mouras, foi desterrado em 1749 para Braga, no extremo Norte do país. As suas práticas correspondem às descritas para o século XVI por BETHENCOURT, F., op. cit., p. 53. Sobre o tema dos Mediadores Culturais ver LOUREIRO, Rui M. & GRUZINSKI, Serge (Orgs.). Passar as fronteiras, Actas do II Colóquio Internacional sobre Mediadores Culturais - Séculos XV à XVIII. Lagos: Centro de Estudos Gil Eanes, 1999.
  • 30
    "Sans doute, sans les dieux, les hommes ne pourraient vivre. Mais, d'un autre coté, lesdieux mourraient si le culte ne leur était pas rendu. Celui-ci n'a donc pas uniquement pour objet de faire communier les sujets profanes avec les êtres sacrés, mais aussi d'entretenir ces derniers en vie, de les refaire et de les régénérer perpétuellement.(...) La raison d'être des cultes,{...}, ne doit pas être recherchée dans les gestes qu'ils prescrivent, mais dans le renouvellement intérieur et moral que ces gestes contribuent à déterminer. Ce que le fidèle donne réellement à son dieu, ce ne sont pas les aliments qu'il dépose sur l'autel, ni le sang qu'il fait couler de ses veines: c'est sa pensée". DURKEIM, E. Les formes élémentaires de la vie religieuse. Paris: PUF, 1968, pp. 494-495. Livro III, cap. II: O culto positivo, parte V, no parágrafo começando com: "Il faut donc se garder de croire avec Smith..."
  • 31
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 11.179 (1744). Francisco Antônio, preto forro, natu-ral da Costa da Mina.
  • 32
    "Sont aussi destinés à être magiciens certains personnages que signalent à l'attention, à la crainte et à la malveillance publique, des particularités physiques ou une dextérité extraordinaire, comme les ventriloques, les jongleurs les bateleurs; une infirmité suffit, comme pour les bossus, les borgnes, les aveugles, etc. {...}. Ce qui leur donne des vertus magiques, ce n'est pas tant leur caractère physique individuel que l'attitude prise à l'égard de tout leur genre". Mauss, M. Sociologie et Anthropologie. Paris: PUF, 1980, pp. 19-20.
  • 33
    Uma situação nada excepcional, PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 173.
  • 34
    De acordo com PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 173: "não pode ficar-se com a idéia de que este universo era marginal, e se confinava a uma espécie de submundo de segregados sociais que apenas funcionava ocultamente e com o concurso de pouca gente". Assim, alguns curadores e feiticeiros deslocavam-se pelas feiras anunciando os seus serviços, mostrando o extraordinário poder de proteção de alguns dos seus amuletos. Outros, mais discretos, realizavam as suas demonstrações nas tabernas. pp. 168-169. O caso Francisco Antônio inscreve-se entre os 207 processos para curas mágicas instruídos pela Inquisição entre 1700 e 1774, sendo os anos 1740-44 o período mais repressivo. pp. 207-225.
  • 35
    Todas as classes sociais, médicos, boticários, nobreza, clero e mesmo os membros daInquisição recorriam aos curandeiros e feiticeiros. Ibidem.
  • 36
    BOURDIEU, P. Une interprétation de la théorie de la religion selon Max Weber. Archives Européennes de Sociologie. XII, 1, 1971, p. 20.
  • 37
    IANTT, Inq. Lisboa, nº 11.179, (4-9-1744).
  • 38
    Denúncia de Bárbara Mana, 4 de setembro de 1744.
  • 39
    "começaram a fazer sons com os dedos na mesma banca dois dos ditos pretos e o masgordo cantava na sua língua coisas que ele testemunha não percebeu e o ajudavam a cantar os companheiros, o que repetirão por várias vezes". Depoimento do marido, José Gomes, do 11 de setembro de 744.
  • 40
    Se há especificação das formas da magia de acordo com as sociedades, há, dentro decada magia, ou, de um outro ponto de vista, dentro de cada um dos grandes grupos de ritos {...} variedades dominantes. A seleção dos tipos é, em parte, a obra de mágicos especializados que aplicam só um rito ou um pequeno número de ritos ao conjunto dos casos pelos quais são qualificados. Cada mágico é o homem de uma receita, dum instrumento, dum saco medicina, que ele utiliza fatalmente à qualquer propósito. É mais freqüentemente de acordo com os ritos que praticam que de acordo com os poderes que possuem, que os mágicos são especializados. Acrescentemos que aqueles que chamamos os mágicos ocasionais conhecem ainda menos ritos que os mágicos como tais e são tentados de reproduzi-los sem fim {...} Vemos assim {...} quanto a forma tende a predominar sobre o fundo. MAUSS, M. Sociologie et Anthropologie. Paris: PUF, 1980, p. 53.
  • 41
    PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 110.
  • 42
    A cruz é um dos quatro símbolos fundamentais que se encontram na maior parte das culturas do mundo desde a mais alta antiguidade. Na África, tem em primeiro lugar um sentido cósmico. Simboliza igualmente os caminhos da vida e da morte, uma imagem do destino do homem. CHEVALIER J. & GHEERBRANT, A, op. cit., pp. 245-251.
  • 43
    "O sacerdote de opera muito raramente só: mais é respeitado, mais tem discípulos. Assistem às consultas com o objectivo de instruir-se e substituir o vidente no caso onde o cansaço, a febre, a apreensão, ou tal outra causa de perturbação mental prejudicaria o bom andamento da consulta". MAUPOIL, Bernard. La Géomancie à l'ancienne Côte des Esclaves. Paris: Institut d'Ethnologie, {1943}, 1998, 3ª ed. pp. 420-421. O material dessa obra foi recolhido em Abome e Porto Novo entre 1934 e 1936.
  • 44
    Idem, p. 143 e seguintes.
  • 45
    AUGÉ, Marc. Le Génie du paganisme. Paris: Gallimard, 1982, p. 219. Sublinha que as descrições da "bruxaria" africana que pôde fazer "ao vivo" (através das confissões dos acusados, o rumor público ou os especialistas locais da cura e da contra feitiçaria) evocam de maneira bastante notável aquelas que puderam recolher no seu tempo os inquisidores e os juízes; os temas do desdobramento, a metamorfose e a ambigüidade da relação feiticeiro/ contra feiticeiro, nomeadamente, apresentam sobre os dois continentes, em uma e a outra história, numerosas analogias.
  • 46
    Para a França: THIERS, Jean Baptiste. Traité des superstitions. Paris: Le Sycomore, 1984, oferece para o fim do século XVII várias formulas já antigas: pp. 148, 158-167.
  • 47
    Assim que declara José, 18 ou 19 anos, natural da Bahia, preso por estar de posse deuma mandinga: IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 4.260, (1730).
  • 48
    PAIVA, J. P. Op. cit., 1997, p. 114 e ANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 6.005, demonstrações em espaços públicos.
  • 49
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 3.670, (1690).
  • 50
    Ver igualmente, CALAINHO, Daniela Buono. Metrópole das mandingas. Religiosidade negra e Inquisição Portuguesa no Antigo Regime. Tese de doutoramento. Niterói, 2000, pp. 90 e 165; "Jambacousse e gangazambes: feiticeiros negros em Portugal", Afro-Ásia, 26-26 (2001), 141-146; Negros hereges, agentes do Diabo. Religiosidade negra e Inquisição em Portugal - Séculos XVI-XVIII. In: FLORENTINO, Manolo & MACHADO, Cacilda (Orgs.), op. cit., pp. 65-83.
  • 51
    PAIVA, J. P. Op. cit., p. 114; IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 3.670, (1690).
  • 52
    "As armas com que cobrem os corpos são uns camizões que lhe fazem os feiticeiros, queentre elles não he defeso este crime, antes quantos maiores os são mais temidos e respeitados se fazem. Estes camizões lhe cobrem todos os corpos the os pes e estão cheyos de bolcinhas de couro, que elles chamão nominas, em que poem papeis com caracteres, e dizem que isto defende das armas de seus inimigos". COELHO, Francisco de Lemos. Duas descrições seiscentistas da Guiné (1669 e1684). Lisboa: Academia Portuguesa da História, MCMXC, p. 108.
  • 53
    PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 114.
  • 54
    Ibidem.
  • 55
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 11.767 (1731).
  • 56
    MOTT, Luís. Etno-demonologia: aspectos da vida sexual do diabo no mundo ibero-americano (séculos XVI ao XVIII), citado por SOUZA, Laura de Mello e. O Diabo e a terra de Santa Cruz, Feitiçaria e religiosidade popular no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras,1986, p. 318, no qual analisa os dois processos pp. 299, 316-321 assim como em Inferno atlântico... pp. 170-172.
  • 57
    PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 156.
  • 58
    SOUZA, Laura de Mello e. Op. cit., 1986, p. 316.
  • 59
    Será necessário perto de um ano para Francisco José Pedroso confessar as suas culpas. É condenado a uma pesada penalidade de 5 anos na galé, ao porto perpétuo do sambenito, após ter saído em auto-de-fé público e de ter sido açoitado extra sanguinis effusionem.
  • 60
    MOTT, L., "Ethno-demonologia", citado in:SOUZA, Laura de Mello e. Op. cit., 1986, pp. 317-318.
  • 61
    Esta banalidade surge de uma dúzia de processos compreendidos entre 1704 e 1771dos quais a quase totalidade data do primeiro terço do XVIII. Banal, porque fabricantes, intermediários e utilizadores parecem não tomar muitas cautelas, o que as denúncias provam. Banais igualmente porque alguns donos nem denunciam o facto, enquanto outros as obtinham eles mesmos para as oferecer aos seus escravos. Dois casos deste tipo dizem respeito respectivamente a um cavaleiro da Ordem do Cristo dos arredores de Lisboa e a uma mulher oriunda do Brasil recolhida num convento na fronteira norte de Portugal. IANTT, Inq. Lisboa, Processo nº 16.566 (1729) e 16.684 (1735). José Francisco Pedroso usa este fato como argumentação da sua defesa: "Disse que elle entendia que a mandinga era cousa de Deos, porque lhe chamava o oração, e como muita gente a trazia nao lhe parecia ser couza do Demônio."
  • 62
    Provavelmente a erva de Guiné, conhecida no Brasil como amansa-senhor. Envenenalentamente, provoca a indiferença até a imbecilidade, fraqueza cerebral, pequenas convulsões tetaniformes, paralisia da laringe e, dependendo da dose, a morte ao fim de um ano.
  • 63
    Durante a sua confissão Francisco Pedroso evoca em várias ocasiões o medo do castigo bem como o feitiço que o protegia das represálias do seu dono. Processo nº 11.774: fls. 66-68 e 89-93.
  • 64
    1° Exame. (fol. 32-36) 11 de julho de 1730; 2º. Exame. (fol. 37-42) 14 de julho de 1730.
  • 65
    IANTT, Inq. Lisboa, Processo 2.355 (1704). Jacques Viegas, guarda-costas, 20 anos. Não faz referência aos dois tipos de bolsas mas insiste na proibição de aproximar-se de uma igreja para os que possuem aquela que ele usa. Mesmo tipo de ambivalência dos acusados: IANTT, Inq. Lisboa, Processo 4.260, (1730); Joseph, escravo de 18 anos; Inq.
  • 66
    Lisboa, Processo 1.672, (1731). Miguel Vieira, 16-17 anos.
  • 67
    "sob a aparência do bem o demónio engana mais os simples que, tendo realizado de santas práticas, pensam ter obtido algum dom consagrado de Deus, enquanto que apenas cometeram pecados maiores". Malleus Maleficarum, p. 306.
  • 68
    2º. Exame, fls. 37-42, 14 de julho de 1731.
  • 69
    Para o século XVI ver BETHENCOURT, F. Op. cit., p. 76, aponta as virtudes erótico sentimentais da pedra de ara esmagada e ingerida. É querendo recuperar orações, escondidas sob a pedra de altar da capela privada do seu dono, que Damião de Almeida faz-se surpreender em 1771. IANTT, Inq. Lisboa, Processo 724, (1771).
  • 70
    Uma das características do pacto com o demónio.
  • 71
    VASCONCELOS, José Leite de. SALOMONIS, Signum. A Figa - A Barba em Portugal. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1996, pp. 49-162. Este ensaio publicado em 1918 apresenta 240 grafismos diferentes deste símbolo conhecido como sino-saimão.
  • 72
    Uma parte das orações e dos desenhos deste processo foi publicada, em preto e branco, na obra de Laura de Mello e Souza, op. cit., 1986, na parte "Documentos", e, a cor, pp. 162-163 In: DIDIER, Lahon; NETO, Maria Cristina et alii. Catálogo da Exposição Os Negros em Portugal - Sécs. XV a XIX. Lisboa: Mosteiro dos Jerónimos de Belém, 23-91999/24-1-2000, C.N.C.D.P., Lisboa, 1999.
  • 73
    "† vos † salve asucena deres plandesente esempre mil Trindade \\ eos † vos calve † rosaflorida eterna primavera Deos vos \\ {1palavra} exsellentisima † rainha † dos seos cheya † de inumera \\ † estina foy esorro gastucas o virgem † santisima † dapen{.} \\ ? † Bendita † sois emtre as mulheres pois † devos † quis † naser \\ {chris}to † Jhs † Rey † dos seos † eresplandor † dagloria eser alimenta \\ vosos † perto dovoso † \\ purisimo alimento † vos †a gloria \\ Cem vosos † amo vosos † brasos † otrouxestes † e ainda † o {1 palavra} † \\ desua † Divina † magde † meal † cansastes † os perdo † am inha \\ ..."
  • 74
    BETHENCOURT, F., op. cit., p. 112.
  • 75
    O processo do mulato Manoel Matheus, O Saramago de alcunha, suspeito de usar uma mandinga, revela até onde conduzia a credulidade compartilhada pelos representantes da ordem religiosa e civil sobre os poderes de tais bolsas. Em 1711, acusado de assassinatos, ele resiste com a espada no punho a sua detenção por vários representantes da justiça e nem fica ferido com três tiros de pistolas à queima-roupa. Uma vez dominado recebe uma sova de golpes de espadas no curso da qual uma espada e um pau de madeira são-lhes quebrados sobre o corpo. No entanto uma vez na prisão, para a maior admiração dos testemunhos, não revela nenhuma ferida sangrenta. O Juiz de fora considerou "que pella experiencia que tem de outras prisoes que tem feito lhe parecia em possivel deixar de lançar sangue, que so tendo mendigas ou pacto com o demonio poderia o não ser ferido". Inquietos, os actores da detenção voltaram a mesma noite à prisão para sujeitar o prisioneiro à uma experiência: "fora elle ditto juiz de fora e lhe metera huma faca de ponta num braço para fazer a experiência se tinha ou não mendiga do qual experiência metendo lhe duas vezes a faca com bem força não tirou sangue algum, e só amolgara a carne". Manoel não confessou usar uma mandinga mas admitiu invocar o diabo quando agarrava a sua espada. Após a audição dos oito testemunhos da cena, que asseguraram ter-lhe levado golpes de espadas e pistolas mortais ao estômago ou ao pescoço, o tribunal considerou os testemunhos dignos de fé. IANTT, Inq. Lisboa, Processo 11.801.
  • 76
    "A cotovia, pela sua maneira de se elevar muito rapidamente no céu, ou, ao contrário,de se deixar bruscamente cair, pode simbolizar a evolução e involução da Manifestação. As suas passagens sucessivas da terra ao Céu e do Céu à Terra ligam os dois pólos da existência: ela é uma espécie de mediador. {...} Ave sagrada para os Gauleses, permanece ao longo da história do folclore e das crenças populares francesas uma ave de bom agouro, entrando por vezes mesmo na composição dos talismãs{...}" tornando vitoriosos tanto os homens como os elementos. CHEVALIER J. & GHEERBRANT, A., op. cit., p. 236. Não encontramos um equivalente português a esta crença mas não se pode ignorar esta coincidência. Não temos encontrado uma lenda africana equivalente à da cotovia. Na região da Costa dos Escravos, de acordo com as lendas referida por MAUPOIL, B. op. cit., p. 508, a cotovia não faz parte das "aves feiticeiras".
  • 77
    BETHENCOURT, F., op. cit., p. 167. É igualmente ao Vale de Cavalinho que ia Marcelina Maria durante as suas deslocações nocturnas, IANTT, Inq. Lisboa, Processos nº 631 (1734) e que, em 1771, Damião de Almeda enterrava suas mandingas cujas orações continham igualmente o sino-saimão, claramente identificado por vários testemunhos. IANTT, Inq. Lisboa, Processos nº 724.
  • 78
    Conhecido hoje como o bairro da Madragoa. Era o equivalente ocidental do bairro de Alfama ao leste de Lisboa. Ambos muito populares, situados perto das beiras do Tejo, povoados de numerosos pescadores.
  • 79
    Confissão (fol. 89 à 93), 11 de maio de 1730.
  • 80
    SOUZA, Laura de Mello e. Op. cit., 1986, pp. 320 e 261
  • 81
    MAUPOIL, B., op. cit., p. 363.
  • 82
    Idem, 2ª parte, cap. II, os símbolos mais importantes e suas mensagens, pp. 430-676 e pp. 534-36; e pp. 604-605, para as lendas relativas ao bode.
  • 83
    METRAUX, A., salienta a importância na escolha da vítima: "O animal é agradável ao Deus apenas se responde aos seus gostos e apresenta alguns dos seus atributos". Le Vaudou Haitien. Paris: Gallimard, 1958, p. 151.
  • 84
    MAUPOIL, B., op. cit., p. 76, e p. 84 para o culto das encruzilhadas.
  • 85
    VERGER, P. Fatumbi. Les Dieux Yoruba en Afrique et au Nouveau Monde. Paris: Ed. Métailié, 1982, pp. 74 e 76. Pruneau de Pommegorge, comandante da fortaleza francesa em Ajuda entre 1743 e 1765, descreve uma representação do tamanho de um homem de "um Deus Priape, grosseiramente feito em terra com o seu principal atributo, enorme e exagerado, à proporção do resto do corpo". POMMEGORGE, Pruneau de. Description de la Nigritie. Amsterdam-Paris, 1789, p. 201.
  • 86
    MAUPOIL, B., op. cit., p. 677.
  • 87
    Idem, p. 80.
  • 88
    Ibidem.
  • 89
    VERGER, P. Fatumbi. Op. cit., p. 74.
  • 90
    MAUPOIL, B., op. cit., p. 81.
  • 91
    Idem, p. 82.
  • 92
    Esta moça (ogo), teria a virtude, preciosa para um mensageiro, de transporta-lo em algumas horas a centesnas de quilômetros. VERGER, P. Fatumbi. Dieux d'Afrique. Ed. Revue Noire, 1995 (1ª Ed.1954), p. 258. Tem por conseguinte a mesma função, entre outras, que a "vassoura" tradicional e popular da bruxa que permite transportar-se ao sabá.
  • 93
    Idem, pp. 162-165 e VERGER, P. F., op. cit., 1982, pp. 132-138.
  • 94
    Para os Fons e Ayizos do Benim, Hèviosso, a divindade do trovão é representada igualmente por uma pedra de raio e um machado, mas de um gume só. VERGER, P. Fatumbi. Op. cit., 1995, pp. 180-182. Em Verger e Maupoil, Héviosso é acompanhado de um Panteão de uma dúzia de divindades, cada uma com a sua atribuição. MAUPOIL, B., op. cit., p. 73, das quais Avrékété, de carácter malicioso, indiscreto e escabroso.
  • 95
    VERGER, P. F., op. cit., 1995, pp. 162-163. Sobre a significação de ara; BENISTE, José. Òrun Àiyé, o encontro de dois mundos. O sistema de relacionamento nagô-yorubá entre o céu e a terra. Rio de Janeiro: Bertrand-Brasil, 1997, p. 124.
  • 96
    CHEVALIER, J. & GHEEBRANT A., op. cit., pp. 347-348.
  • 97
    MAUPOIL, B., op. cit., p. 104. Na divinação de Fá, o gato é relacionado com o signo de Sa-Meji, que manda o sangue. O que corresponde a uma das virtudes atribuídas à bolsa.
  • 98
    "Armes des Nègres de la Côte d'Or tirées de Barbot", Abbé Prevot, Histoire générale des voyages. Paris: Didot, 1746, T. IV, pl. VI, p. 100, reproduzida por ISERT, Paul Erdman, Voyages en Guinée et dans les îles Caraïbes en Amérique. Paris: Karthala, 1989, gravura 7.
  • 99
    MÉTRAUX, A. Op. cit., pp. 66-67. Poteau-Mitan: não há tradução em Português. E a coluna central num templo vodu, ao redor do qual os rituais são realizados. In: Glossário de Magia e Esoterismo, São Paulo: NETRA, 1ª edição, 2001, p. 105.
  • 100
    Figura 1: capa da obra de AUGÉ, Marc. Le Dieu Objet. Paris: Flammarion, 1988; Figura 3: capa da obra de CAPONE, Stefania. La quête de l'Afrique dans le candomblé, Pouvoir et tradition au Brésil. Paris: Karthala, 1999; Figura 4, foto 1, "Assento de l'Exu du portal, em barro, com os traços antropomorfos", entre as páginas 224 e 225 da mesma obra.
  • 101
    MÉTRAUX, A. Op. cit., p. 98.
  • 102
    Idem, p. 26.
  • 103
    MAUPOIL, B. Op. cit., p. 66.
  • 104
    Os Estados Unidos importaram 650.000 escravos africanos. Consideramos que não foram menos de 400.000 os que entraram em Portugal entre 1441 e 1761. Estimativa que corresponde à de 800.000 para a Péninsula Ibérica inteira feita por STELLA, Alessandro. Histoires d'esclaves dans la Péninsule Ibérique. Paris: EHESS, 2000.
  • 105
    Adotamos a definição de SALLMANN, Jean-Michel. Naples et ses saints á l'âge baroque (1540-1750). Paris: PUF, 1994: "Situar-se do único ponto de vista da instituição que julga conduz a privilegiar critérios de classificação demasiado restritivos. É uma posição que proíbe qualquer abordagem de tipo antropológica na medida em que esta santidade oficial constitui apenas uma fraca porção de um fenômeno social muito mais largo (...). É santo qualquer indivíduo que foi tido como tal pelo grupo no qual evoluiu" p. 123. Para nosso propósito ver: Breve compendio da vida, e acções virtuosas do veneravel servo de Deos, Fr. António da Conceição, vulgarmente chamado Fr. Antonio do Lumiar, (...). Dado a luz por Apollinario de Freitas Cardozo. Lisboa, Off. de Francisco Borges de Sousa, anno de 1763. Com todas as licenças necessárias.
  • 106
    PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 174. Pelo povo o recurso aos curandeiros e feiticeiros era provavelmente mais imediato e constante em razão duma maior proximidade social. As pessoas de maior prestígio apenas recorriam aos curandeiros depois de terem esgotado as possibilidades junto dos médicos e da Igreja.
  • 107
    THIERS, J. B., op. cit., p. 265; a impotência por causa de feitiçaria que "é um mal tão sensível à maior parte dos que sofrem dele, que não há nada que não façam para ser curados. Que seja Deus, ou o Diabo que os livra, é de qual ficam pouco afligidos, desde que forem libertados". Para LEBRUN, François. Médecins, saints et sorciers aux 17e et 18e siècles. Paris: Messidor, 1983, p. 127, nota 48, esta observação vale para todas as doenças.
  • 108
    Todas as categorias sociais, inclusive os escravos, são representadas, com excepção danobreza.
  • 109
    As sangraduras realizavam-se perto da sede do mal. LEBRUN, F., op. cit., p. 63
  • 110
    O caso aparenta-se a um processo de profecia negativa em relação ao desejo formulado por um casal que não consegue ter filhos. Pede ao Provincial do convento da Arrábida de fazer-lhes chegar um cinto de corda utilizada pelo santo homem. Este último entregando o cinto ao portador recomenda-lhe que transmita a mensagem seguinte: "previne que aquilo não fará nada". O que se confirmou mais tarde.
  • 111
    LEBRUN, F., op. cit., p. 122.
  • 112
    Ordem Hospitalar fundada pelos devotos de Stº Antão, anacoreta egípcio, c. 251 - 356.
  • 113
    Santo Antônio, São Sebastião, João Baptista e João o Evangelista.
  • 114
    GIL, José. Métamorphoses du Corps. Paris: La Différence, 1985, p. 202.
  • 115
    BENESCH, Otto. La peinture allemande, de Dürer à Holbein. Genève: Skira, 1966, p. 87; GIL, J., op. cit., p. 202
  • 116
    GIL, J., idem, pp. 202-203.
  • 117
    Sobre a relação santidade- medicina ver: SALLMANN, J. M., op. cit., p. 375.
  • 118
    Idem, pp. 357 e 356.
  • 119
    Sobre a criminalização dos actos de bruxaria ver: PAIVA, J. P., op. cit., 1997, pp. 192197; BETHENCOURT, F., op. cit., pp. 230-231.
  • 120
    PAIVA, J. P. op. cit., 1997, pp. 103 e 173.
  • 121
    Idem, p. 174. Confissão feita entre 1754-58.
  • 122
    "Il n'y a donc pas de raison pour mettre en doute l'efficacité de certaines pratiquesmagiques", LEVI-STRAUSS, C., Anthropologie Structurale, Chap. "Magie et Religion", pp. 184-185.
  • 123
    p. 218. Sendo muita conhecida a sua análise comparativa entre cura xamanista e curapsicanalítica apenas citaremos a sua conclusão: "En fait, la cure chamanique semble être un exact équivalent de la cure psychanalytique, mais avec une inversion de tous les termes. Toutes deux visent à provoquer une expérience; et toutes deux y parviennent en reconstituant un mythe que le malade doit vivre, ou revivre. Mais dans un cas c'est un mythe individuel que le malade construit à l'aide d'éléments tirés de son passé; dans l'autre, c'est un mythe social, que le malade reçoit de l'extérieur, et qui ne correspond pas à un état personnel ancien. Pour préparer l'abréaction qui devient alors une "adréaction", le psychanalyste écoute, tandis que le chaman parle. Mieux encore: quand les transferts s'organisent, le malade fait parler le psychanalyste en lui prêtant des sentiments et des intentions supposées; au contraire, dans l'incantation, le chaman parle pour (le) malade. Il l'interroge, et met dans sa bouche des répliques correspondant à l'interprétation de son état dont (il) doit se pénétrer". p. 220.
  • 124
    LEVI-STRAUSS, C. Anthropologie Structurale, op. cit., cap. IX, "Le sorcier et sa Magie", pp. 184-185.
  • 125
    "Compreende-se nestas condições, a importância da fé, a esperança colocada pelo paciente e seus familiares na intercessão do santo e a ajuda sobrenatural (...) constitui verdadeiramente a cavilha operária da cura miraculosa, um verdadeiro condicionamento psicológico em redor do qual o paciente reorganiza as suas defesas. Pelo contrário, é fácil imaginar que, quando o santo prediz a morte próxima do paciente, acelera o seu desmoronamento e o conduz inevitavelmente ao túmulo." SALLMANN, J. M., op. cit., p. 361.
  • 126
    Idem, p. 366. Sobre "o lugar específico do santo cristão e o milagre na nebulosa cultural dos xamanismos" ver pp. 235-236; 356-367; 372-374. Sobre o efeito de predição: SCHUTZENBERGER, Anne Ancelin. Forme Européenne inconsciente du Chamanisme: La réalisation automatique des prédictions. Transe, chamanisme, possession. Actes des IIe rencontres Internationales de Nice, Avril, 1985, Nice: Editions Serre, 1986, pp. 81-87.
  • 127
    PAIVA, J. P., op. cit., 1997, p. 172.
  • 128
    Idem, pp. 104 e 169.
  • 129
    "Assim funcione (...) um sistema mágico que cristalize os medos humanos sobre a bru-xa local e que evacua estes mesmos medos pelo recurso aos curandeiros externos". O estrangeiro que quebra o malefício, vindo do mundo exterior, "possui a força desconhecida e desconcertante". MUCHEMBLED, R., op. cit., pp. 101-102.
  • 130
    Joaquim, escravo da Costa da Mina, pretende ter o poder de fazer adoecer as pessoas enumerosos testemunhos confirmam as suas alegações. Ameaça matar uma mulher branca se ela não lhe escrever uma oração num pedacinho de papel. Aterrorizada, ela executa-se. Alguns meses depois o dono de Joaquim "o faça embarcar" - o que significa que o vende, provavelmente para o Brasil - porque suspeita que ele seja responsável pela morte das suas duas filhas. Sendo culpada pelos seus familiares e a vizinhança de cumplicidade com o escravo, a mulher que tinha copiado o bilhete sob ameaça vai reclamar justiça e protecção à Inquisição. IANTT, Inq. Lxa, Denúncias, Liv. 313, (30-3-1759), fls. 41 e 94.
  • 131
    Maria da Conceição, natural da Costa da Mina, escrava de um marinheiro, denuncia um forro que a enganou fazendo-lhe praticar, contra o seus donos, desastrosos sortilégios teoricamente destinados a melhorar a sua situação na casa. De facto o dono vem a falecer e a sua esposa adoece gravemente. Maria da Conceição protesta da sua boa fé, dizendo que foi enganada pelo "preto que é Ladino enquanto ela chegou desde pouco tempo". IANTT, Inq. Lxa, Denúncias, Liv. 313, (21 de junho de 1756), fl. 71.
  • 132
    Aludimos à aplicação da cláusula de limpeza de sangue aos negros e mulatos a partir do início do século XVII até o início do século XIX - apesar da lei de 1773 -, objeto de nossa pesquisa actual.
  • 133
    "Se buscaban curanderos dentro de los grupos raciales diferentes al del paciente, y esa diversidad fortalecio las redes terapéuticas hasta nuestros dias: en el Ecuador, por ejemplo, un indigena de la sierra ecuatoriana buscará de preferencia a un negro de la costa, un moreno, a un mestizo o a un blanco, un blanco, a un indio... El éxito de las curaciones depende de esta complementaridade. En todo caso fue en torno de la aflicción que se tejieron vínculos entre los tres grupos en presencia, españoles, indios y africanos". pp.1819; "En la Nueva España, Solange Albero ha puesto en evidencia un esquema muy frecuente del funcionamento de estas redes: la india es quien proporciona las sustancias - hierbas, pociones, piedras - y las españolas lo recibe por medio de la negra o de la mulata. El campo marginal y clandestino de la magia es el que permite a las castas la función social de intermediario (...)". BERNAND, Carmen. Negros esclavos y libres en las ciudades americana. In: CD-Rom Colección Proyectos Históricos Tavera (I). Madrid: DIGIBIS, 2000, pp. 18-19 e p. 20.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2004
Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro Largo de São Francisco de Paula, n. 1., CEP 20051-070, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21) 2252-8033 R.202, Fax: (55 21) 2221-0341 R.202 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: topoi@revistatopoi.org