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Duração do período de molhamento foliar: medição e estimativa em feijão sob diferentes tratamentos hídricos

Leaf wetness duration: measurements and estimation in a bean crop under different water treatments

Resumos

A variável duração do período de molhamento foliar desempenha papel importante em sistemas de alerta fitossanitários e em estudos de trocas gasosas das plantas. Objetivou-se, neste estudo, estimar essa variável por modelos em um dossel de feijão (Phaseolus vulgaris L.) sob irrigação plena e deficitária e comparar tais estimativas com medidas feitas no dossel. Foram utilizados quatro modelos: (1) o do número de horas com umidade relativa superior a um limiar; (2) o da depressão do ponto de orvalho; (3) o da árvore de classificação e regressão e (4) o modelo físico de Penman-Monteith. Os dois primeiros modelos apresentaram os menores erros quando os limiares empíricos foram iguais a 83-84% e 2,6-2,7 ºC; os erros para o terceiro modelo foram da mesma ordem de grandeza dos obtidos pelos demais modelos uma vez que o mesmo utiliza limiares empíricos de três variáveis. Os erros para o modelo de Penman-Monteith foram reduzidos quando as entradas foram a temperatura e a umidade relativa do ar medidas no tratamento sob irrigação deficitária. Para as simulações com os dados do tratamento com irrigação plena os erros deste modelo se mantiveram próximos aos obtidos para as simulações feitas com os dados medidos da estação meteorológica.

orvalho; modelos empíricos; modelo físico


Leaf wetness duration variable plays an important role in crop protection warning systems and in studies of gas exchange in plants. The main objective of this study was to estimate the leaf wetness duration in a bean crop (Phaseolus vulgaris L.) by modeling under full and deficit irrigation and to compare it with field measurements. Four models were tested: (1) the model of the number of hours with relative humidity above a threshold; (2) the model of dew point depression; (3) the model of classification and regression tree, and (4) the model of Penman-Monteith. The first two models presented the lowest statistical errors when the empirical thresholds were equal to 83-84% and 2.6-2.7 ºC. The statistical errors of the third model were nearly the same as those obtained for the other models since it uses three empirical thresholds. The errors for the Penman-Monteith model were reduced when the air temperature and humidity input data were measured in the deficit irrigation treatment. For the Penman-Monteith model simulations with the fully irrigated treatment data, the errors remained close to those observed for the simulations with the weather station data.

dew; empirical models; physical model


METEOROLOGIA E CLIMATOLOGIA AGRÍCOLA

Duração do período de molhamento foliar: medição e estimativa em feijão sob diferentes tratamentos hídricos

Leaf wetness duration: measurements and estimation in a bean crop under different water treatments

Angelica DurigonI; Quirijn de J. van LierII

IUniversidade de São Paulo, CP 9, CEP 13418-900, Piracicaba, SP. Fone: (19) 3429-4123. E-mail: angelica.durigon@usp.br; qdjvlier@usp.br

RESUMO

A variável duração do período de molhamento foliar desempenha papel importante em sistemas de alerta fitossanitários e em estudos de trocas gasosas das plantas. Objetivou-se, neste estudo, estimar essa variável por modelos em um dossel de feijão (Phaseolus vulgaris L.) sob irrigação plena e deficitária e comparar tais estimativas com medidas feitas no dossel. Foram utilizados quatro modelos: (1) o do número de horas com umidade relativa superior a um limiar; (2) o da depressão do ponto de orvalho; (3) o da árvore de classificação e regressão e (4) o modelo físico de Penman-Monteith. Os dois primeiros modelos apresentaram os menores erros quando os limiares empíricos foram iguais a 83-84% e 2,6-2,7 ºC; os erros para o terceiro modelo foram da mesma ordem de grandeza dos obtidos pelos demais modelos uma vez que o mesmo utiliza limiares empíricos de três variáveis. Os erros para o modelo de Penman-Monteith foram reduzidos quando as entradas foram a temperatura e a umidade relativa do ar medidas no tratamento sob irrigação deficitária. Para as simulações com os dados do tratamento com irrigação plena os erros deste modelo se mantiveram próximos aos obtidos para as simulações feitas com os dados medidos da estação meteorológica.

Palavras-chave: orvalho, modelos empíricos, modelo físico

ABSTRACT

Leaf wetness duration variable plays an important role in crop protection warning systems and in studies of gas exchange in plants. The main objective of this study was to estimate the leaf wetness duration in a bean crop (Phaseolus vulgaris L.) by modeling under full and deficit irrigation and to compare it with field measurements. Four models were tested: (1) the model of the number of hours with relative humidity above a threshold; (2) the model of dew point depression; (3) the model of classification and regression tree, and (4) the model of Penman-Monteith. The first two models presented the lowest statistical errors when the empirical thresholds were equal to 83-84% and 2.6-2.7 ºC. The statistical errors of the third model were nearly the same as those obtained for the other models since it uses three empirical thresholds. The errors for the Penman-Monteith model were reduced when the air temperature and humidity input data were measured in the deficit irrigation treatment. For the Penman-Monteith model simulations with the fully irrigated treatment data, the errors remained close to those observed for the simulations with the weather station data.

Key words: dew, empirical models, physical model

Introdução

No ambiente natural a superfície das folhas das plantas é frequentemente coberta por água na forma líquida. O termo "molhamento foliar" abrange todas as formas de água líquida na superfície das folhas das plantas, com origem na formação de orvalho, na precipitação ou na irrigação. Do molhamento foliar derivou-se a variável agrometeorológica Duração do Período de Molhamento foliar (DPM), parâmetro importante em sistemas de alerta fitossanitários (Kim et al., 2006; Lulu, 2008; Marcuzzo et al., 2009) e em estudos de redução das trocas gasosas da fotossíntese e da transpiração (Ishibashi & Terashima, 1995; Hanba et al., 2004; Letts & Mulligan, 2005).

A DPM provocada pela deposição de orvalho é uma variável de difícil medida ou estimativa em virtude de não estar relacionada somente às variáveis meteorológicas mas também ao microclima e às propriedades ópticas da superfície na qual ocorre o molhamento. Não há um padrão para a observação da DPM, tanto em termos de sensores como da sua própria instalação, inviabilizando estudos comparativos dessa variável entre locais de diferentes climas, por exemplo (Sentelhas, 2004). Os sensores mais atuais para a medida do molhamento foliar são eletrônicos, nos quais a formação de água líquida sobre uma placa promove a mudança na resistência ou impedância elétrica do elemento sensor.

A estimativa da DPM por modelos empíricos (Gleason et al., 1994; Kim et al., 2005) ou físicos (Sentelhas et al., 2006; Sentelhas & Gillespie, 2008; Bregaglio et al., 2011) é, por outro lado, uma alternativa viável embora em muitos casos sejam necessárias, para seus cálculos, variáveis meteorológicas que não são normalmente medidas, como é o caso do saldo de radiação ou, ainda, carecerem de ajustes e calibrações para diferentes climas locais e culturas (Weiss et al., 1989; Huber & Itier, 1990; Papastamati et al., 2004).

Dos modelos empíricos de estimativa da DPM, destaca-se o modelo do número de horas com umidade relativa acima de determinado limiar (NHUR) (Sentelhas, 2004; Lulu, 2008). Geralmente se adota este limiar como sendo 90%, embora possa variar com condição meteorológica do local. O modelo empírico da depressão da temperatura do ponto de orvalho (DPO) dado pela diferença entre a temperatura do ar e a temperatura do ponto de orvalho, estima a DPM pelo período em que a DPO permanece abaixo do limiar de 2 ºC, tradicionalmente adotado mas que também pode variar de acordo com a condição meteorológica do local. O modelo empírico CART (modelo de árvore de classificação e regressão) sugerido por Gleason et al. (1994), estima a DPM a partir de uma combinação de limiares da DPO, da umidade relativa do ar e da intensidade do vento a 10 m através de uma árvore de classificação binária que apresenta categorias e ramos para distinguir se um intervalo de tempo apresenta ou não molhamento.

O modelo físico de Penman-Monteith (Sentelhas et al., 2006) ou de resistência aerodinâmica, tem aplicação universal, ao contrário dos modelos empíricos. Este modelo presume que a temperatura do ar medida entre 1,5 e 2 m sobre o gramado em uma estação meteorológica, representa a temperatura do ar na mesma altura sobre uma cultura. Para tanto, uma resistência aerodinâmica, função da altura da cultura e descrita por Monteith & Unsworth (1990) é adicionada ao modelo.

Objetivou-se, no estudo, estimar a DPM em um dossel de feijão (Phaseolus vulgaris L.) sob duas condições hídricas utilizando-se quatro modelos (três empíricos e um físico) e comparar tais estimativas com medidas da DPM feitas no dossel. O efeito da condição meteorológica local em cada tratamento de irrigação na formação do orvalho também foi avaliado.

Material e Métodos

A área experimental utilizada para o experimento de campo localiza-se no Campus da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP (22º 42' 30" S, 47º 38' 00" O, altitude de 546 m) cujo solo é do tipo Nitossolo vermelho. A semeadura de feijão, cultivar Pérola, foi feita em 11 de junho/2010 e a colheita realizada em 23 de setembro/2010. A área, de aproximadamente 990 m2 (22 x 45 m), foi dividida em duas parcelas (22 x 22,5 m) em que uma foi irrigada durante todo ciclo da cultura (tratamento de irrigação plena - IP) enquanto a outra foi mantida sob déficit hídrico a partir da fase reprodutiva (tratamento de irrigação deficitária - ID); para tanto, um sistema de irrigação por aspersão foi montado na área experimental.

A estação meteorológica automatizada da ESALQ/USP está localizada a 20 m da área experimental e forneceu os dados de temperatura (Tar, ºC) e umidade relativa do ar (UR, %), precipitação (P, mm), saldo de radiação (Rn, W m-2) e intensidade do vento a 2 m de altura (U, m s-1) durante o experimento. As medidas de temperatura e umidade relativa do ar, embora disponíveis na estação meteorológica, foram também realizadas no centro de cada tratamento, a uma altura de 2 m. Os dois sensores utilizados para essas medidas, da marca Campbell, modelo CS215-L9®, foram conectados a um armazenador de dados, modelo CR1000®, da mesma marca. As medidas de umidade relativa foram realizadas instantaneamente a cada 30 min enquanto as medidas de temperatura do ar são o resultado da média obtida durante o mesmo período. Os dados de temperatura e a umidade relativa do ar obtidos sobre o dossel foram utilizados como entrada nos modelos de estimativa da DPM.

A presença de água líquida proveniente da formação de orvalho nas folhas das plantas foi medida por dois Leaf Wetness Sensors da marca Decagon Devices, modelo LWS-L®, instalados um em cada tratamento. Tais sensores foram conectados ao armazenador de dados CR1000® e as medidas, registradas a cada 30 min, foram dadas em períodos de minutos em que a placa, simulando a folha, estava seca ou molhada. Os LWS-L® foram instalados a 0,45 m do solo com ângulo de 0 º em relação à superfície e mantidos nesta posição por todo o ciclo da cultura.

Durante os 104 dias do experimento de campo ocorreu precipitação nos dias 13, 14 e 15 de julho (62,9 mm) em 7 de setembro (12,8 mm) e em 21 de setembro (38,0 mm) como mostrado na Figura 1. Durante mais de 50 dias, entre 16 de julho e 6 de setembro, não houve precipitação fazendo com que o solo atingisse condições secas. A aplicação de irrigação foi mantida nos dois tratamentos até o início do período reprodutivo e encerrada no dia 3 de setembro. Nos períodos entre 2 e 24 de agosto e entre 27 de agosto e 2 de setembro, somente o tratamento IP recebeu irrigação; no dia 24 de agosto foi realizada uma última irrigação no tratamento ID para garantir a sobrevivência das plantas; o período entre 3 de agosto e 2 de setembro foi definido como o período de estudo.


A altura média das plantas do tratamento IP durante o período de estudo foi igual a 0,6 m enquanto no tratamento ID foi igual a 0,5 m. Esses valores foram obtidos através da média de três medidas feitas em 10 plantas por tratamento, nos dias 4 e 19 de agosto e no dia 2 de setembro.

Dentre os diferentes modelos de estimativa da DPM três modelos empíricos e um modelo físico foram selecionados para o presente estudo.

Dos modelos empíricos o modelo do número de horas com umidade relativa acima de determinado limiar (NHUR)se destaca pela aplicabilidade uma vez que utiliza o limiar de uma única variável meteorológica (umidade relativa do ar) para estimar a DPM. O número de horas com a umidade relativa do ar acima de 90% (NHUR > 90%) é tradicionalmente adotado embora a calibração desse limiar empírico para o clima do local no qual a DPM está sendo estimada e para a cultura na qual ocorre o molhamento seja recomendada (Sentelhas, 2004). A soma dos minutos com umidade relativa do ar acima de 90% dividida por 60 foi considerada como a DPM expressa em horas.

O modelo empírico da depressão da temperatura do ponto de orvalho (DPO) foi sugerido por Gillespie et al. (1993). Trata-se do número de horas em que a diferença entre a temperatura do ar e a temperatura do ponto de orvalho, conhecida como a depressão da temperatura do ponto de orvalho, permaneceu entre dois limiares específicos, tradicionalmente adotados como sendo 2 ºC para a deposição do orvalho e 3,8 ºC para sua secagem; para o modelo DPO também se recomenda que os limiares empíricos sejam calibrados localmente.

O modelo empírico de árvore de classificação e regressão (CART) foi desenvolvido para estimar a DPM a partir da DPO, da intensidade do vento a 10 m e da umidade relativa do ar (Gleason et al., 1994). A árvore de classificação binária utilizada pelo modelo CART, que apresenta categorias e ramos para determinar se uma combinação das variáveis de entrada com determinados limiares é capaz de formar o orvalho, é apresentada detalhadamente em Sentelhas (2004). Para a utilização do modelo CART o vento medido na altura de 2 m na estação meteorológica foi convertido para a altura de 10 m através da relação logarítmica, descrita em Allen et al. (1998).

Além dos três modelos empíricos acima descritos o modelo físico de Penman-Monteith também foi utilizado neste estudo. O fluxo de calor latente (LE, kJ m-2 s-1) para uma folha artificial pode ser estimado, portanto, para cada intervalo de tempo (30 min, neste caso) pela equação de Penman-Monteith:

em que: Δ é a tangente à curva de pressão de vapor do ar saturado (kPa K-1) no ponto correspondente à temperatura do ar, Rn (kJ m-2 s-1) é a radiação líquida, ρa é a densidade do ar seco (kg m-3), cp é o calor específico isobárico do ar (kJ kg-1 K-1), es (kPa) e ea (kPa) são, respectivamente, a pressão de saturação na temperatura do ar da estação e real do vapor d'água, γ é a constante psicrométrica, assumida constante e igual a 0,64 kPa K-1 para períodos com orvalho, ra (s m-1) é a resistência aerodinâmica, e rb (s m-1) é a resistência da cultura para o transporte de calor. Para a estimativa de rb, é necessário conhecer a dimensão efetiva da folha artificial adotando-se o valor igual a 0,06 m. Por este modelo a DPM é dada pelo intervalo de tempo em que LE > 0 e, visto que não ocorreu precipitação durante o período de estudo e os horários de irrigação foram excluídos da análise, todos os intervalos de tempo com LE > 0 são decorrentes da formação de orvalho. O coeficiente de molhamento geral Wg, descrito em Lulu (2008), foi utilizado para converter a DPM estimada sobre o gramado pelo modelo de Penman-Monteith, em DPM na cultura. As estimativas da DPM com o modelo de Penman-Monteith também foram feitas com as medidas de temperatura e umidade relativa do ar sobre o dossel, em cada um dos tratamentos hídricos. Os erros nas estimativas da DPM com os dados da estação meteorológica e com os dados obtidos sobre o dossel foram analisados.

A DPM foi computada considerando-se o número de intervalos de 30 min entre as 12 h e 30 min do dia n e às 12 h do dia n + 1 nos quais os modelos estimaram a presença de orvalho. Os períodos diários se iniciaram às 12 h e 30 min, ao invés da meia-noite, para evitar a separação temporal de um mesmo evento (noturno) de formação de orvalho.

Para avaliar o desempenho das estimativas feitas pelos modelos em comparação às observações, calcularam-se os seguintes índices estatísticos:

1. Erro médio (EM, h):

2. Erro médio absoluto (EMA, h):

3. Erro máximo absoluto (EMax, h):

4. Raiz quadrada do erro quadrático médio das previsões (REQMp, h):

5. Coeficiente de eficiência das previsões (E, -) (Nash & Sutcliffe, 1970):

em que:

DPMo,i e DPMe,i - i-ésimo valor da Duração do Período de Molhamento foliar medida no campo e estimada por um modelo, respectivamente; e

º - média da DPM medida, ambas as variáveis dadas em horas.

O índice adimensional E fornece uma medida relativa do desempenho do modelo variando de -∞ a 1, sendo que valores próximos a 1 indicam que o modelo tem melhor desempenho na representação dos dados observados do que a média das próprias observações. Os índices EM, EMA, EMax e REQMp, por sua vez, fornecem uma análise do erro na unidade de medida da variável analisada. A raiz quadrada do erro quadrático médio das observações (REQM, h) também foi calculada para fins de comparação:

Resultados e Discussão

Apesar da proximidade entre os tratamentos o efeito microclimático da diferença da transpiração das plantas irrigadas e das plantas sob déficit hídrico pode ser observado na diferença entre as variáveis meteorológicas medidas em ambos os tratamentos. Na Figura 2 são apresentadas as diferenças de temperatura e umidade relativa do ar e a depressão do ponto de orvalho entre os tratamentos de irrigação plena (IP) e deficitária (ID). No início do período de estudo (início do mês de agosto) a temperatura do ar no tratamento ID era aproximadamente 0,3 ºC superior à do tratamento IP, mesmo que esta diferença tenha aumentado até o final do mês, conforme o efeito do déficit hídrico nas plantas do tratamento ID tenha se acentuado. A temperatura média do ar, tanto nos dois tratamentos do dossel quanto na estação meteorológica, foi aproximadamente igual a 19 ºC durante o período de estudo. A umidade relativa do ar no tratamento ID estava ligeiramente maior do que no tratamento IP (~ 1%) no início do período de estudo reduzindo no decorrer do período inversamente à temperatura do ar, conforme mostra a linha de tendência. A umidade relativa do ar média foi igual a 59% em ambos os tratamentos durante o período e 5% mais elevada (64%) nas medições feitas na estação meteorológica da ESALQ/USP. No início do mês de agosto, quando as condições hídricas nos dois tratamentos ainda eram semelhantes, a depressão da temperatura do ponto de orvalho foi levemente maior no tratamento IP do que no tratamento ID, ou seja, havia a maior chance de formação de orvalho no tratamento ID; entretanto, com o decorrer do mês e conforme o teor de água no solo do tratamento ID foi reduzido e a DPO tornou-se maior neste tratamento em comparação com o tratamento IP desfavorecendo, assim, a formação de orvalho.


Dentre as variáveis meteorológicas o vento é o principal responsável pelo secamento da água condensada nas folhas (Magareyet al., 2005). Por esta razão, além da temperatura e umidade relativa do ar e da depressão da temperatura do ponto de orvalho, o vento também é uma das variáveis de entrada nos modelos de estimativa da DPM. As medidas de vento feitas na estação meteorológica da ESALQ/USP utilizadas neste estudo são apresentadas na Figura 3. Na primeira metade do mês foram observadas rajadas de vento de até 4,9 m s-1 e a partir do dia 19 de agosto, período em que não houve ocorrência de fenômenos meteorológicos mais intensos, a intensidade do vento permaneceu praticamente constante, com intensidade máxima de 2,1 m s-1 até o dia 31 de agosto, quando uma frente fria se aproximou da região de Piracicaba.


Na Figura 4 são apresentadas as medidas de duração do período de molhamento foliar feitas no tratamento IP e no tratamento ID. Como se observa nesta figura, os dados de DPM nos dias em que ocorreu a aplicação de irrigação foram excluídos da análise a fim de garantir que não haveria contaminação do sensor por água que não fosse proveniente da formação de orvalho, uma vez que não ocorreu precipitação no período. Nos dias em que há medidas em ambos os tratamentos observa-se que a DPM foi, em grande parte dos casos, maior no tratamento IP, como em 7 de agosto, quando a DPM no tratamento IP foi igual a 12,3 h e no tratamento ID, a 6,7 h; na segunda metade do mês a DPM foi reduzida em ambos os tratamentos. Como apresentado na figura anterior, neste período o vento apresentou-se pouco intenso e estável, o que não contribuiu para a redução da DPM por secagem.


As relações entre as estimativas da DPM pelos modelos NHUR, DPO, CART e de P-M e as medidas feitas nos tratamentos de irrigação plena e deficitária, são apresentadas nas Figuras 5 e 6, respectivamente tal como, também, as simulações do modelo NHUR com o limiar de 90%, do modelo DPO com o limiar de 2 ºC e do modelo de P-M com a temperatura e umidade do ar medidas na estação meteorológica. Seja para o tratamento ID (Figura 5) ou para o tratamento IP (Figura 6) todos os modelos subestimaram a duração do período de molhamento foliar. No tratamento ID as subestimativas foram de 53% com o modelo NHUR, 36% com o modelo DPO, 28% com o modelo CART e 5% com o modelo de P-M; no tratamento IP, por sua vez, as subestimativas foram de 64% com o modelo NHUR, 46% com o modelo DPO, 37% com o modelo CART e 6% com o modelo de P-M. Um estudo feito por Lulu (2008) em vinhedo da cultivar 'Niagara Rosada' em Jundiaí, São Paulo, também resultou em subestimativas da DPM pelos modelos NHUR com o limiar de 90%, DPO com o limiar de 2 ºC e CART, enquanto que o modelo de P-M superestimou a DPM. Santos (2006) estimou a DPM em um gramado com os modelos DPO e CART para a estação seca em Piracicaba, São Paulo, e também observou subestimativas em relação às observações.



Os limiares empíricos de formação do orvalho dos modelos NHUR e DPO (90% e 2 ºC, respectivamente) foram calibrados para o clima local e para a cultura de feijão, conforme sugerido por Sentelhas (2004). Após a calibração os limiares que apresentaram os menores erros (Tabelas 1 e 2) no modelo NHUR foram 84 e 83% para o tratamento ID e IP, respectivamente; para o modelo DPO os limiares com menores erros foram iguais a 2,6 e 2,7 ºC para o tratamento ID e IP, respectivamente; no tratamento ID as subestimativas com os novos limiares foram reduzidas sendo iguais a 18% para ambos os modelos NHUR e DPO. No tratamento IP, por sua vez, as subestimativas foram de 19% com o modelo NHUR e 22% com o modelo DPO. As simulações com o modelo de P-M foram feitas de duas formas: com os dados de temperatura e umidade relativa do ar medidas na estação meteorológica da ESALQ/USP e com os dados dessas variáveis medidas no centro do tratamento sobre o dossel. A utilização dos dados obtidos sobre o dossel aumentou as subestimativas em ambos os tratamentos: o modelo subestimou as medidas de DPM em 16% no tratamento ID e em 37% no tratamento IP.

Os índices estatísticos calculados para as simulações são apresentados na Tabela 1 para o tratamento ID e na Tabela 2 para o tratamento IP, respectivamente. Para o tratamento ID (Tabela 1) o modelo NHUR melhorou seu desempenho com o limiar reduzido de 84% ao invés de 90%, tradicionalmente utilizado. Os erros EM, EAM e REQMp foram reduzidos com NHUR > 84% e somente o EMax aumentou em 1,5 h com esse novo limiar. A eficiência do modelo também aumentou significativamente com o coeficiente E indo de 0,03 para 0,56. Kruit et al. (2008) calibraram o limiar do modelo NHUR para o gramado de uma estação meteorológica localizada em Haarweg, Holanda, na primavera, condições em que o limiar do modelo NHUR foi reduzido de 90% para 71%. O modelo DPO teve seu desempenho aprimorado com o novo limiar de 2,6 ºC ao invés de 2 ºC sendo que os erros EM e REQMp foram reduzidos e EAM e EMax aumentaram 0,3 e 1,4 h, respectivamente. A eficiência do modelo DPO aumentou 0,13, indo de 0,45 para 0,58. Os limiares empíricos do modelo CART não foram calibrados mas os erros das estimativas com esse modelo foram da mesma ordem de grandeza dos modelos NHUR e DPO com os limiares calibrados (84% e 2,6 ºC). O coeficiente E, por exemplo, foi igual ao do modelo DPO com o limiar de 2,6 ºC (E = 0,58). De maneira geral e segundo Kim et al. (2010) o modelo CART apresenta uma acurácia na previsão da DPM foliar maior do que o modelo NHUR > 90% e que um modelo de redes neurais artificiais. Kim et al. (2002) comentam que a acurácia do modelo CART aumenta quando as medidas de intensidade do vento são corrigidas para a altura do sensor de molhamento. O desempenho do modelo de P-M melhorou para as simulações feitas com os dados coletados sobre dossel; todos os erros foram reduzidos e a eficiência do modelo em simular os dados observados aumentou de 0,10 para 0,38.

Todos os erros das simulações feitas pelo modelo NHUR para os dados do tratamento IP (Tabela 2) foram reduzidos quando o limiar de 83% foi utilizado ao invés de 90%. A eficiência do modelo melhorou significativamente com o novo limiar indo de -0,29, valor negativo indicando que a média das observações representava melhor os dados observados do que as próprias simulações, para 0,62. Da mesma forma que para o modelo NHUR, os erros das simulações com o modelo DPO foram reduzidos quando o limiar de 2,7 ºC foi adotado ao invés de 2 ºC e a eficiência do modelo, embora positiva (0,29) aumentou para 0,63 com o novo limiar. Nenhuma modificação foi feita nos limiares empíricos do modelo CART mas como para o tratamento ID os erros são comparáveis aos erros dos modelos NHUR e DP com os limiares de 83% e 2,7 ºC e o coeficiente E das simulações foi positivo (E = 0,44) demonstrando que o modelo foi eficiente em simular os dados de DPM observados. Apesar de ser um modelo empírico o modelo CART utiliza limiares empíricos de três variáveis (DPO, umidade relativa do ar e intensidade do vento) explicação provável para que a duração do período de molhamento foliar estimada por este modelo apresente melhores resultados do que os modelos empíricos que utilizam o limiar de uma única variável. Diferente das simulações feitas para o tratamento ID, as simulações feitas com o modelo de P-M, tanto com os dados da estação meteorológica da ESALQ/USP quanto com os dados observados sobre o dossel, não apresentaram diferenças significativas. Em ambos os casos os erros foram próximos e a eficiência do modelo diminuiu levemente de 0,57 para 0,54, quando os dados obtidos sobre o dossel foram utilizados como entrada do modelo.

A raiz quadrada do erro quadrático médio das observações de DPM (REQMº) foi igual a 3,92 h para o tratamento ID e 3,96 h para o tratamento IP. De acordo com as Tabelas 1 e 2, apenas as simulações feitas com o modelo NHUR > 90% apresentaram um erro (REQMp) superior ao erro das próprias observações de DPM, em ambos os tratamentos (3,86 h para o tratamento ID e 4,50 h para o tratamento IP).

Conclusões

1. O efeito microclimático da diferença da transpiração das plantas irrigadas e das plantas sob déficit hídrico resultou, em grande parte dos casos, em maior duração do período de molhamento foliar no tratamento com irrigação plena.

2. A calibração dos limiares dos parâmetros empíricos dos modelos NHUR e DPO para o clima local e para a cultura do feijão reduziu o erro entre as simulações e as observações da duração do período de molhamento foliar.

3. Os erros das simulações feitas com o modelo CART com limiares não calibrados localmente foram da mesma ordem de grandeza dos obtidos pelos demais modelos.

4. Os erros das simulações com o modelo físico de P-M feitas com os dados medidos numa estação meteorológica foram pequenos quando o dossel apresentou condições microclimáticas similares às reinantes na estação meteorológica.

5. Para um dossel sob condições hídricas limitantes com o microclima modificado, o modelo de P-M teve seu desempenho melhorado pela utilização de dados obtidos sobre o dossel.

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio financeiro do Projeto de Cooperação Internacional à CAPES-Wageningen Univeristy and Research Centre (Processo 019/06) e da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (Processo 2009/02117-7).

Literatura Citada

Protocolo 014.12 - 01/02/2012

Aprovado em 16/11/2012

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2013
  • Data do Fascículo
    Fev 2013

Histórico

  • Recebido
    16 Nov 2012
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