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Stents farmacológicos no tratamento da doença arterial coronária: lições do registro DESIRE

Drug-eluting stents in the treatment of coronary artery disease

EDITORIAL

Stents farmacológicos no tratamento da doença arterial coronária. Lições do registro DESIRE

Drug-eluting stents in the treatment of coronary artery disease

Áurea J. Chaves

O Registro DESIRE (Drug-Eluting Stent in the Real World), criado em 2002 com a finalidade de avaliar a evolução clínica dos pacientes submetidos a intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos na prática clínica diária no Hospital do Coração - Associação do Sanatório Sírio (São Paulo, SP), completa dez anos em maio do próximo ano. Trata-se do primeiro e maior registro nacional, que, hoje, conta com mais de quatro mil pacientes, acompanhados sistematicamente para a detecção de eventos após a alta hospitalar. Desde 2007, com a publicação inicial da evolução de cinco anos dos resultados globais por Sousa et al.1, contribuiu com um total de 10 artigos originais publicados na Revista Brasileira de Cardiologia Invasiva (RBCI), que exploram os espectros clínico (diabetes, angina estável) e angiográfico (lesões on vs. off-label, vasos de fino calibre, lesões reestenóticas, enxertos de safena, bifurcações) de apresentação da doença arterial coronária. Adicionalmente, detectou preditores de revascularização do vaso-alvo e trouxe a nosso conhecimento a incidência e os preditores da trombose do stent dessa população brasileira tratada no dia a dia da prática clínica. Trata-se da maior contribuição individual de um registro nacional para a RBCI, no que se refere tanto ao número de artigos como ao volume de conhecimento, de um grupo pioneiro na utilização de stents farmacológicos em todo o mundo.

Nesta edição, Costa et al., do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital do Coração - Associação do Sanatório Sírio (São Paulo, SP), trazem análise adicional dos pacientes do DESIRE, desta vez comparando pacientes com e sem infarto agudo do miocárdio < 30 dias tratados com stents farmacológicos. Os autores traçam o perfil clínico-angiográfico dessa população de risco mais elevado, mostram quais eventos têm maior prevalência numa evolução de até sete anos e extraem os preditores independentes de trombose de stent. Kirtane, do Columbia University Medical Center/New York Presbiterian Hospital (Nova York, Estados Unidos), ressalta, em seu editorial, a vantagem das análises observacionais na compreensão da história natural da doença fora do domínio altamente seletivo dos estudos randomizados. Na avaliação dos resultados do Registro DESIRE, destaca a constatação tranquilizadora da eficácia a longo prazo dos stents farmacológicos nos cenários de complexidade variada e a ausência do fenômeno do catch-up, explica as causas da maior mortalidade e das taxas mais altas de trombose de stent nos pacientes com infarto agudo do miocárdio recente, e orienta quanto a estratégias potenciais para reduzir esses eventos, entre elas o uso periprocedimento de anticoagulantes e antiagregantes mais potentes.

Em outro estudo original, Oliveira et al., da Santa Casa de Misericórdia de Barra Mansa (Barra Mansa, RJ), avaliam o quanto a disponibilidade dos stents farmacológicos para utilização em pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) poderia, hipoteticamente, fazer com que o cardiologista intervencionista repensasse a indicação de revascularização miocárdica cirúrgica em uma população de pacientes operados no ano de 2010 naquela instituição. As coronariografias, classificadas pelo SYNTAX Score, foram analisadas por três intervencionistas que responderam a questionário com quatro itens. Estimaram o porcentual de pacientes que poderiam ser tratados alternativamente pela revascularização percutânea, o grau de revascularização completa que poderia ser obtido, e o número médio de stents necessários para o tratamento. Também apresentam o porcentual de pacientes que evitaria a cirurgia de revascularização, de acordo com a complexidade angiográfica, avaliada pelo SYNTAX Score. Feres, Costa Jr. e Costa, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (São Paulo, SP), em seu instigante editorial, avaliam, no cenário brasileiro, as limitações para a utilização sem restrições dos stents farmacológicos, em que o custo ainda desproporcionalmente alto em relação a outros países obrigaria ao uso seletivo em pacientes com maior risco de reestenose, para se alcançar melhor relação de custoefetividade do procedimento. Oferecem, ao final, solução para diminuir a desigualdade entre os pacientes tratados pelo sistema público e os tratados pela saúde suplementar.

A disseminação da técnica radial em nosso meio tem trazido artigos que exploram seu desempenho em diferentes cenários. Cardoso et al., do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/Fundação Universitária de Cardiologia (Porto Alegre, RS), avaliam, em estudo de coorte prospectivo, a influência da curva de aprendizado no perfil clínico-angiográfico e nos resultados de pacientes submetidos a cateterismo cardíaco por via radial. Esses autores comparam uma série de variáveis, entre elas a taxa de cross-over para a técnica femoral, o número de cateteres utilizados, os tempos de punção e de fluoroscopia, o tempo total do procedimento e as complicações vasculares, avaliadas pelo Doppler. Welter et al., também do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/Fundação Universitária de Cardiologia, comparam os resultados da intervenção coronária percutânea primária pelas vias radial e femoral em pacientes com infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST. Foram analisados, entre outros, o uso de inibidores da glicoproteína IIb/IIIa e de cateteres de tromboaspiração, o fluxo TIMI 3 final, o blush miocárdico, e os desfechos clínicos hospitalares, incluindo os sangramentos. Em outro centro, Godinho et al., do Hospital TotalCor (São Paulo, SP), apresentam a prevalência e os resultados do acesso radial comparado ao femoral em série de pacientes de seu registro, tratados por intervenção coronária percutânea. Mostram que a escolha de pacientes com perfil clínico-angiográfico mais favorável para a técnica radial é prudente durante a curva de aprendizado e caracterizam a população propensa a desenvolver complicações vasculares, próximo alvo para ampliação do espectro de pacientes que poderão se beneficiar com a utilização da técnica radial em seu centro. Andrade, Tebet e Labrunie, da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Marília (Marília, São Paulo) e do Hospital do Coração de Londrina (Londrina, PR), "radialistas" por excelência, comentam em seu editorial o momento atual de notoriedade da técnica, após a divulgação, no último congresso do American College of Cardiology, dos resultados do estudo RIVAL (The Radial vs. Femoral Access for Coronary Intervention), com redução de 40% do risco de óbito, infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral ou sangramento grave aos 30 dias em pacientes com infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST tratados pela via radial. Exaltam a difusão da técnica em nosso meio e a melhora de parâmetros do procedimento, que refletem o aprimoramento que advém da prática nesses centros.

Boa leitura a todos!

Áurea J. Chaves

Editora

  • 1. Sousa AGMR, Costa Jr. JR, Moreira A, Costa RA, Cano MN, Andrade GAM, et al. Evolução clínica tardia dos stents farmacológicos: segurança e eficácia até cinco anos do Registro DESIRE. Rev Bras Cardiol Invasiva. 2007;15(3):221-7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Ago 2012
  • Data do Fascículo
    Set 2011
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