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Efeito de ação educativa sobre o conhecimento de familiares a respeito de queimaduras infantis em ambiente doméstico

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito de ação educativa sobre o conhecimento de familiares de crianças a respeito de queimaduras em ambiente doméstico. Participaram 40 familiares de crianças menores de quatro anos, divididos igualmente em grupos intervenção e controle. Foram realizadas entrevista inicial, ação educativa com folder de queimaduras e entrevista após uma semana. As respostas foram comparadas, utilizando-se teste estatístico de Fisher. Na primeira entrevista, registrou-se 60 respostas de situações de risco no grupo controle e 62 no grupo intervenção; na segunda, aumentou para 61 e 80 indicações, respectivamente. Na primeira entrevista, 90% dos participantes do grupo controle e 80% do grupo intervenção verbalizaram acreditar que a queimadura infantil pode ser evitada; na segunda, a indicação diminuiu para 84% e aumentou para 100%, respectivamente. Este estudo mostrou a importância da orientação com folder de queimaduras em ambiente doméstico.

queimaduras; educação em saúde; orientação; família


This article aimed to evaluate the effect of an educative action on the knowledge of children's relatives about burns at home. Participants were 40 relatives of children under four years of age, equally divided between an intervention and control group. An initial interview was held, the educative action involved a folder about burns and, after one week, another interview took place. The answers were compared using Fisher's statistical test. In the first interview, 60 answers on risk situations were registered in the control group and 62 in the intervention group; in the second, the results increased to 61 and 80, respectively. In the first interview, 90% of the control group and 80% of the intervention group expressed the belief that childhood burns can be avoided; in the second, this indication decreased to 84% and increased to 100%, respectively. This study showed the importance of the advisory folder on burns at home.

burns; health education; orientation; family


El objetivo de esta investigación fue evaluar el efecto de una acción educativa sobre los conocimientos de los familiares de niños en lo que se refiere a quemaduras en el ambiente doméstico. Participaron 40 familiares de niños con menos de cuatro años de edad, divididos equitativamente entre un grupo control y otro de intervención. Fueron realizadas: una entrevista inicial, una acción educativa con un impreso propagandístico sobre quemaduras y una nueva entrevista después de una semana. Las respuestas fueron comparadas con la prueba estadística de Fisher. En la primera entrevista, fueron registradas 60 respuestas de situaciones de riesgo en el grupo de control y 62 en el grupo de intervención; en la segunda, aumentó para 61 y 80 indicaciones, respectivamente. En la primera entrevista, 90% de los participantes del grupo de control y 80% del de intervención dijeron creer que la quemadura puede ser evitada. En la segunda, la indicación disminuyó para 84% y aumentó para 100%, respectivamente. Este estudio muestra la importancia de la orientación usando impresos propagandísticos sobre quemaduras en el hogar.

quemaduras; educación en salud; orientación; família


ARTIGO ORIGINAL

Efeito de ação educativa sobre o conhecimento de familiares a respeito de queimaduras infantis em ambiente doméstico1

Sandra Regina Gimeniz-PaschoalI; Débora Morais PereiraII; Edinalva Neves NascimentoIII

IUniversidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Campus Marília, Brasil: Psicóloga, Doutor em Psicologia, Docente, e-mail: srgp@terra.com.br

IIUniversidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Campus Marília, Brasil: Terapeuta Ocupacional, Pesquisadora, Grupo de Pesquisa Educação e Acidentes, e-mail: debora_terapi@yahoo.com.br

IIIUniversidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Campus Marília, Brasil: Fonoaudióloga, Doutoranda, e-mail: ediquata@gmail.com

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito de ação educativa sobre o conhecimento de familiares de crianças a respeito de queimaduras em ambiente doméstico. Participaram 40 familiares de crianças menores de quatro anos, divididos igualmente em grupos intervenção e controle. Foram realizadas entrevista inicial, ação educativa com folder de queimaduras e entrevista após uma semana. As respostas foram comparadas, utilizando-se teste estatístico de Fisher. Na primeira entrevista, registrou-se 60 respostas de situações de risco no grupo controle e 62 no grupo intervenção; na segunda, aumentou para 61 e 80 indicações, respectivamente. Na primeira entrevista, 90% dos participantes do grupo controle e 80% do grupo intervenção verbalizaram acreditar que a queimadura infantil pode ser evitada; na segunda, a indicação diminuiu para 84% e aumentou para 100%, respectivamente. Este estudo mostrou a importância da orientação com folder de queimaduras em ambiente doméstico.

Descritores: queimaduras; educação em saúde; orientação; família

INTRODUÇÃO

As queimaduras ocorrem frequentemente entre a população infantil. Em um período de 10 anos (1995-2005), causaram graves morbidades e/ou óbitos em mais de 8 000 crianças menores de cinco anos e em mais de 3 000 em faixas etárias superiores(1). As crianças menores de três anos apresentam maior risco, devido à curiosidade, impulsividade e falta de experiência em avaliar os perigos(2). O desconhecimento das fases características do crescimento e desenvolvimento das crianças é um dos fatores reconhecidos como favoráveis para a ocorrência dos acidentes(3). As queimaduras infantis ocorrem predominantemente no ambiente doméstico, especialmente na cozinha(4). A escaldadura e a queimadura térmica são os tipos mais frequentes de queimadura, e estão mais associadas à preparação das refeições(2). Os agentes agressores mais comuns são os alimentos, as bebidas, o óleo e outros produtos quentes os quais atingem, na maioria das vezes, o tronco, ombro, braço e antebraço(5).

A recuperação física da pessoa queimada é desafiadora e duradoura. Requer cuidados agudos e procedimentos cirúrgicos (o que a torna susceptível às infecções e outras complicações); causa dores intensas que, segundo depoimentos de pacientes, não melhoram com a administração de medicamentos(6). Além disso, quase sempre resultam em transtornos psicológicos para o acidentado e sua família, além de gerar enormes gastos financeiros(7-8).

Estudos mostram que a maioria dos acidentes pode ser prevenida, no entanto, os programas de prevenção de acidentes, em específico de queimaduras, são escassos no Brasil(9). A educação para a prevenção pode reduzir o risco de acidentes na infância, mas, para isso, requer mobilização de vários segmentos da população(10). O aconselhamento na atenção primária à saúde, voltado para o aumento do conhecimento sobre segurança e à adoção de comportamentos mais seguros devem ser os pilares para a redução da incidência das injúrias físicas(11). A utilização de material impresso pode facilitar o processo de aquisição, aproveitamento e aprofundamento desses conhecimentos, além de reforçar as informações e discussões orais realizadas entre os educadores e a população(12).

Estudo realizado anteriormente em ambiente hospitalar mostrou aumento significativo do aprendizado de familiares sobre esse tema. Foram aplicadas entrevistas estruturadas, antes e imediatamente após ação educativa com folheto e intervenção verbal, em 37 responsáveis por crianças e adolescentes internados no Setor Público de Pediatria de dois hospitais de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Os resultados mostraram que houve aumento em todas as respostas das questões que foram abordadas no roteiro, o que mostrou bom potencial da ação educativa no contexto hospitalar, sendo sugestiva também para outros locais como, por exemplo, unidades de atenção primária à saúde(13).

Como os acidentes domésticos em crianças são potencializados pela inobservância, ausência de comportamento preventivo por parte das famílias e falha na vigilância do adulto responsável(14), justifica-se a ação educativa voltada para a prevenção desse tipo de acidente, envolvendo os pais e/ou outros responsáveis nesse processo. Assim, diante da magnitude do problema das queimaduras infantis, da possibilidade de prevenção por meio de orientações e modificações ambientais, dos resultados e sugestões de pesquisas anteriores e da escassez de estudos dessa natureza em nosso meio, este trabalho avaliou o efeito de uma ação educativa sobre o conhecimento de familiares de crianças a respeito de queimaduras infantis em ambiente doméstico.

MÉTODO

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Protocolo 1337/2006-A). Faz parte de um conjunto de diferentes ações do projeto temático Ações educativas para prevenção de acidentes infantis: coleta de subsídios, elaboração de estratégias, aplicação e avaliação, aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Trata-se de um delineamento quase-experimental(15) de natureza quali-quantitativa(16).

Ambiente

Este estudo foi realizado no ambiente domiciliar de usuários de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e de uma Unidade de Saúde da Família (USF). As Unidades estão circunscritas em uma região (dentre cinco existentes) de um município de médio porte do interior do Estado de São Paulo. Essa região foi selecionada em razão de apresentar, nos últimos três anos, o maior índice de morbidade por causas externas do município, dado esse obtido junto ao Núcleo de Informações da Secretaria Municipal de Higiene e Saúde.

Apenas três unidades de saúde da respectiva região tinham o predomínio de usuários menores de quatro anos de idade, as quais foram destinadas a este trabalho. Assim, por meio de sorteio, uma ficou para o estudo piloto, outra para o grupo controle e outra para a intervenção. As demais unidades de saúde da região foram designadas para estudos com outros temas de prevenção de acidentes, pertencentes à pesquisa mais ampla.

Materiais

Utilizou-se carta de apresentação, termo de consentimento livre e esclarecido, roteiro de entrevista estruturado (com solicitação dos dados pessoais do participante, situações favorecedoras da queimadura infantil, ocorrência e prevenção do acidente, assim como recebimento de informação sobre o tema) e folder educativo sobre prevenção de queimaduras infantis (tratando sobre o momento de preparo e realização das refeições, do banho das crianças e dos cuidados com tomadas, fios elétricos e produtos inflamáveis). Esse folder foi o mesmo utilizado em pesquisa no ambiente hospitalar(13), porém, houve diferença durante a ação educativa, uma vez que nesse trabalho foram priorizados os aspectos preventivos e, naquele, os aspectos epidemiológicos.

Participantes

As três unidades de saúde listaram todas as famílias que apresentavam crianças menores de quatro anos na sua área de abrangência, sendo essa faixa etária selecionada em razão de a literatura indicar a maior prevalência de queimaduras infantis.

Após várias visitas realizadas nas residências dos usuários, no tempo que havia para a conclusão do projeto junto ao CNPq, 40 participantes aceitaram participar do estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram distribuídos 20 para o grupo controle e 20 para o grupo intervenção, conforme as duas Unidades de Saúde às quais pertenciam.

Procedimentos de elaboração dos materiais

A elaboração dos roteiros de entrevista estruturada e do material educativo baseou-se na literatura sobre o tema e na experiência em pesquisa obtida junto ao Grupo de Pesquisa Educação e Acidentes (EDACI). Esses materiais foram avaliados previamente por juízes (pesquisadores mestres e doutores) para adequação da estrutura e da linguagem.

Foi realizado estudo piloto com 20 familiares de crianças menores de quatro anos, usuárias de duas unidades primárias de saúde da mesma região. Os resultados foram novamente avaliados pelos juízes e permitiram realizar modificações no roteiro de coleta de dados de forma a adequá-lo à população estudada. Após modificações no instrumento de pesquisa foi realizada a coleta de dados definitiva.

Procedimentos de coleta dos dados

A coleta de dados consistiu na realização de duas entrevistas domiciliares, uma antes e outra após a ação educativa.

Todos participaram da primeira entrevista. Sequencialmente, foi realizada uma ação educativa dialogada com o grupo intervenção com duração aproximada de 30 minutos, oferecendo-lhe informações sobre o conteúdo do folder de queimaduras infantis, bem como deixando uma cópia do material educativo a todos os integrantes desse grupo. Com o grupo controle foi adotado o mesmo procedimento, no entanto, foi utilizado um folder sobre hipertensão arterial, sendo que o formato do material era semelhante, mas as informações diferentes. A duração dessa ação foi semelhante à do grupo intervenção.

A segunda entrevista foi realizada uma semana após a primeira, com o objetivo de verificar se as informações trabalhadas durante a ação educativa permaneceriam de forma clara durante esse intervalo de tempo. Três pessoas não puderam participar (um do grupo controle e dois do grupo intervenção), porque não foram encontrados em casa durante as visitas domiciliares ou não se interessaram em participar dessa fase da pesquisa. Sendo assim, o total foi de 77 entrevistas.

Ressalta-se que, com o grupo controle, aquele que havia recebido somente informação sobre hipertensão arterial, foi realizada explicação sobre queimaduras infantis após a segunda entrevista, com a finalidade de informá-lo também a respeito da prevenção desse acidente.

Procedimentos de análise dos dados

As respostas dos entrevistados foram agrupadas de acordo com cada questão, sob a forma de frequência absoluta e relativa. Ressalta-se que, na maioria das questões, foi permitida a apresentação de mais de uma resposta, entretanto, a frequência de cada categoria foi calculada de acordo com o número total de participantes de cada grupo (controle e intervenção).

As frequências das categorias dos dois grupos foram submetidas ao teste estatístico exato de Fisher, com nível de significância de 5%, para verificar se houve aumento significativo nas declarações dos participantes antes e após a ação educativa.

RESULTADOS

Referente às situações favorecedoras da queimadura infantil, na primeira entrevista, foram registradas 60 respostas corretas de situações de risco no grupo controle e 62 no grupo intervenção, enquanto que, na segunda, esse número aumentou para 61 e 80 indicações, respectivamente, mostrando estabilidade nas respostas do grupo controle e aumento naquelas do grupo que participou da ação educativa sobre queimaduras infantis, conforme apresentado na Tabela 1.

De forma geral, foram observadas flutuações na frequência da maioria das categorias de ambos os grupos, porém, essa variação foi um pouco mais acentuada no grupo em que ocorreu a intervenção.

As situações de risco identificadas pelos participantes estavam, em sua maioria, relacionadas à cozinha (fogão, panela e alimentos quentes, fósforo e isqueiro, fogo) e durante o preparo das refeições, principalmente com panelas e fogão.

A análise estatística dos resultados do grupo intervenção indicou aumento significativo na maioria das respostas obtidas na segunda entrevista: muito significativo para "cabo de panela virado para fora do fogão" (p=0,0067); significativa para "substâncias químicas e inflamáveis próximas ao fogo" (p=0,0415) e "fio de aparelho elétrico ao alcance de criança" (p=0,0415) e parcialmente significativo para "tomada ao alcance de criança" (p=0,0869) e "água do banho muito quente" (p=0,0967). Por outro lado, a análise do grupo controle não identificou aumento significativo nas respostas, somente uma redução na subcategoria "criança puxar cabo de panela" (p=0,0471).

Na primeira entrevista do grupo intervenção, antes da ação educativa, 16 entrevistados disseram acreditar na possibilidade de prevenção de queimadura infantil, dois disseram que nem sempre as queimaduras poderiam ser evitadas, um disse que não sabia e outro que não acreditava nessa possibilidade. Na segunda entrevista, após ação educativa, todos os entrevistados relataram acreditar na possibilidade de prevenção de queimaduras infantis.

No grupo controle, inicialmente, 18 entrevistados disseram acreditar nessa possibilidade e dois disseram não acreditar. Na segunda entrevista, diferentemente do grupo intervenção, não houve similaridade de respostas dos participantes. Dos dezenove participantes, dezoito mantiveram suas respostas e um mudou de opinião.

Antes da ação educativa, os participantes do grupo intervenção forneceram o total de 47 relatos de medidas preventivas. Após a mesma, esse número aumentou para 67 respostas. Já no grupo controle, houve praticamente manutenção da frequência de respostas. Na primeira fase, apresentaram 50 respostas de medidas preventivas e na segunda 47 indicações.

Em relação às possíveis medidas preventivas para se evitar queimaduras infantis no ambiente doméstico, as mais indicadas estiveram relacionadas às atitudes dos cuidadores frente à criança, ao cuidado com fogão, panela e alimentos quentes, produtos químicos e inflamáveis, fósforo e isqueiro, tomadas e ferro de passar roupa.

A aplicação do teste estatístico mostrou no grupo intervenção aumento muito significativo para a subcategoria "manter cabo de panela virado para dentro do fogão" (p=0,0067) e significativo para "manter panela quente fora do alcance de criança" (p=0,0415) e "proteger as tomadas" (p=0,0424). No grupo controle não houve variação significativa.

Quanto à ocorrência de queimaduras infantis e recebimento de informação sobre o tema, na primeira entrevista do grupo intervenção os participantes referiram a ocorrência de cinco queimaduras infantis. Também foram cinco os entrevistados que relataram já ter recebido informação sobre queimadura infantil. Todos afirmaram achar importante receber informações para prevenção desses acidentes.

No grupo controle também se identificou, a partir de relatos dos participantes na primeira entrevista, a ocorrência de cinco queimaduras infantis. Nove entrevistados relataram já ter recebido informações sobre queimadura infantil e todos consideraram importante receber informações sobre medidas preventivas de queimaduras infantis.

Dentre os 14 entrevistados que relataram ter recebido informação de queimadura, quatro afirmaram que as informações eram de caráter preventivo e dez disseram ser de caráter remediador. Daqueles que relataram ter recebido informações preventivas, todos afirmaram tê-las recebido por meio de profissionais de Unidades Primárias de Saúde. As informações remediadoras eram provenientes de curso para obtenção de carteira de habilitação, cartazes em UBS, USF e hospital, bombeiro, TV, internet e em USF, após a ocorrência de queimadura.

Na segunda entrevista, nenhum entrevistado relatou a ocorrência de queimaduras ou o recebimento de novas informações no período decorrido entre as entrevistas. Novamente todos os participantes consideraram importante receber informações sobre o assunto.

DISCUSSÃO

Os participantes relataram corretamente grande variedade de situações de risco e de possíveis medidas preventivas para queimaduras infantis no ambiente doméstico, no entanto, a maioria dessas situações foi citada por poucos participantes, o que reforça a importância de realizar periodicamente atividades de educação em saúde junto à população, no sentido de maximizar a lembrança e a identificação dos riscos e de providências de proteção em relação aos acidentes com queimaduras. No dia-a-dia, muitos comportamentos e situações acabam colocando em risco a integridade física de adultos e crianças, assim, tal como preconiza a literatura, é preciso que as famílias conheçam os riscos que podem ser encontrados no ambiente doméstico para ampliar as possibilidades de se adotar comportamento preventivo, pois o desconhecimento colabora para a ocorrência desses eventos(14).

Houve a percepção da possibilidade de prevenção desse tipo de acidente pela maioria dos entrevistados, dado importante que pode indicar que esses estão mais susceptíveis a aceitar modificações de comportamento e do ambiente domiciliar para evitar as queimaduras infantis.

Os resultados desse estudo mostraram que o grupo que recebeu orientações por meio da ação educativa com o folheto educativo de queimaduras relatou mais riscos e medidas preventivas, durante a segunda entrevista, em relação ao grupo controle. O não recebimento de novas informações durante o período entre as entrevistas pode indicar que não houve outras fontes de informação interferindo na avaliação da ação educativa desse estudo.

Verificou-se que as situações de risco percebidas pelos participantes estavam em sua maioria relacionadas à cozinha (fogão, panela e alimentos quentes, fósforo e isqueiro, fogo) e durante o preparo das refeições, principalmente com panelas e fogão. Esses dados coincidem com a literatura científica, uma vez que estudos mostram a cozinha como principal local de ocorrência, assim como o fogo e os líquidos quentes como os principais agentes agressores(5).

Em relação às medidas preventivas foi dada ênfase, além de modificações ambientais e de hábitos, às atitudes do cuidador para com a criança. A importância da supervisão adequada da criança e orientação da mesma foi bastante relatada. Quanto às medidas ambientais e aos hábitos, foram focalizados os cuidados com fogão, panela e alimentos quentes, produtos químicos e inflamáveis, fósforo e isqueiro, tomadas e ferro de passar roupa. Assim, tal como os riscos identificados, as atitudes preventivas foram bastante focadas na cozinha. Esse dado deve ser levado em consideração, pois "qualquer medida preventiva, para ser eficaz, necessita sempre levar em consideração a percepção da sociedade. Frequentemente, a comunidade percebe os riscos de modo diferente aos determinados cientificamente"(17).

Diversos estudos apontam para a urgência de medidas de controle e de prevenção(7). O Ministério da Saúde se compromete em participar, juntamente com a sociedade civil e outros setores, na discussão e resolução do problema, propondo diretrizes para a promoção da saúde e prevenção de acidentes(18).

Esforços por parte de políticas públicas vêm sendo realizados, no entanto, se faz necessário um esforço conjunto de profissionais de saúde no intuito de conscientizar as pessoas de que a maior parte dos acidentes é passível de prevenção mediante educação, modificações ambientais e supervisão adequada. Para se manter a consciência a respeito de medidas para uma casa segura se faz necessário constante processo de educação(19).

CONCLUSÃO

Conclui-se que a intervenção realizada neste estudo teve efeito favorável no aumento de informações corretas declaradas sobre o assunto.

O material educativo utilizado despertou discussões importantes sobre o tema com os participantes, sugerindo utilização posterior em outras pesquisas, por exemplo, que avaliem o material educativo após diferentes intervalos de tempo a fim verificar se os conhecimentos aprendidos são mantidos. Também são necessárias novas pesquisas no intuito de produzir outros materiais educativos nessa área (vídeos, cartazes, panfletos etc.), e aprimorar os já existentes (folders). Além disso, é importante capacitar os diversos profissionais da área da saúde e da educação para trabalhar com informações dessa natureza junto à população e verificar se houve impacto não só nos conhecimentos, mas também na mudança de comportamentos e nos arranjos ambientais.

A comunicação em saúde tem se tornado ferramenta bastante útil nos programas de educação em saúde. Sua eficácia resulta da correta comunicação da mensagem, sua base científica e uso de canais adequados para atingir o público-alvo(12).

Em se tratando dos acidentes, em especial a queimadura, os escassos trabalhos divulgados, em sua maioria, trazem dados sobre levantamentos epidemiológicos(10), consequências dos acidentes(6) e alguns relatos de pacientes e familiares de acidentados(3-9). Pouco se produz sobre medidas de prevenção que estão sendo colocadas em prática. Os resultados deste estudo reforçam a importância da realização de programas educativos visando a prevenção dos acidentes infantis.

Este estudo apresentou limitações, por isso sugere-se a realização de novas pesquisas, incluindo maior número de participantes, a mediação da ação com diferentes materiais educativos, a integração de informações fornecidas em ambiente domiciliar com aquelas que seriam oferecidas em instituições de saúde e educacionais, o acompanhamento da utilização posterior do material educativo e da disseminação das informações, o impacto em mudanças de estilo de cuidado com as ações rotineiras dos familiares com as crianças e com o ambiente, a avaliação da generalização de resultados em diferentes ambientes e no decorrer do tempo e o aprimoramento dos instrumentos e da avaliação de todo o processo. Além disso, é sugestiva a participação de profissionais de diferentes áreas, em formação e atuantes, com ações intersetoriais que envolvam o maior número possível de segmentos da comunidade.

Por meio da educação em saúde é possível mudar conhecimentos e facilitar a adoção de comportamentos mais seguros e de arranjos ambientais e situacionais protetores, que são indispensáveis para a redução do índice de acidentes infantis por queimaduras.

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  • 1
    This research was supported byo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, and Ministério da Saúde, DECIT
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Ago 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      10 Fev 2009
    • Recebido
      19 Abr 2008
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