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Qualidade do sono em pacientes submetidos à cirurgia oncológica

Resumos

O objetivo do estudo foi avaliar a qualidade do sono em pacientes cirúrgicos oncológicos, utilizando o questionário Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI), para mensurar a qualidade subjetiva do sono e a ocorrência de seus distúrbios. Consistiu em pesquisa com delineamento observacional-transversal, envolvendo 46 pacientes com diagnóstico de câncer, submetidos a procedimentos cirúrgicos das especialidades Cabeça e Pescoço e Urologia. Seis componentes do PSQI foram estatisticamente significantes e 73,9% dos entrevistados apresentaram comprometimento da qualidade do sono. Entre as causas dos distúrbios do sono destaca-se: demorar para dormir, acordar no meio da noite, levantar para ir ao banheiro e cochilar durante o dia. Espera-se que este estudo sensibilize a equipe de enfermagem quanto à necessidade de investigar a qualidade e as causas de distúrbios do sono em sobreviventes do câncer, para que haja intervenção efetiva.

transtornos do sono; neoplasias; cirurgia; assistência de enfermagem


This study aimed to evaluate surgical-oncologic patients' quality of sleep through the Pittsburgh Sleep Quality Index (PSQI) questionnaire. It is an exploratory study with transversal-observational design, in 46 postoperative head & neck and urology cancer patients. The PSQI questionnaire was used to evaluate the subjective quality of sleep and the occurrence of sleep disorders. Six PSQI components were statistically significant and 78.3% of the interviewees had impaired subjective quality of sleep. Among factors leading to sleep disorders we point out: taking too long to fall asleep; waking up in the middle of the night; getting up to go to the bathroom and napping during the day. This study is expected to sensitize the nursing team regarding the need to investigate quality of sleep and causes of its disorders in cancer survivors for an effective course of action.

sleep disorders; neoplasms; surgery; nursing care


El objetivo del estudio fue evaluar la calidad del sueño en pacientes quirúrgicos oncológicos, utilizando el cuestionario Índice de Calidad del Sueño de Pittsburgh (PSQI), para mensurar la calidad subjetiva del sueño y la ocurrencia de disturbios. Consistió en una investigación con delineamiento observacional transversal, envolviendo 46 pacientes con diagnóstico de cáncer, sometidos a procedimientos quirúrgicos de las especialidades Cabeza Cuello y Urología. Seis componentes del PSQI fueron estadísticamente significativos y 73,9% de los entrevistados presentaron comprometimiento de la calidad del sueño. Entre las causas de los disturbios del sueño se destaca: demorar para dormir, despertar en el medio de la noche, levantarse para ir al baño y dormitar durante el día. Se espera que este estudio sensibilice al equipo de enfermería sobre la necesidad de investigar la calidad y las causas de los disturbios del sueño en sobrevivientes de cáncer, para que haya una intervención efectiva.

trastornos del sueño; neoplasias; cirugía; atención de enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade do sono em pacientes submetidos à cirurgia oncológica

Elizabeth BarichelloI; Namie Okino SawadaII; Helena Megumi SonobeII; Márcia Maria Fontão ZagoII

IDoutoranda em Enfermagem, Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil, e-mail: lizarp@bol.com.br

IIProfessor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil, e-mail: sawada@eerp.usp.br, megumi@eerp.usp.br, mmfzago@eerp.usp.br

RESUMO

O objetivo do estudo foi avaliar a qualidade do sono em pacientes cirúrgicos oncológicos, utilizando o questionário Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI), para mensurar a qualidade subjetiva do sono e a ocorrência de seus distúrbios. Consistiu em pesquisa com delineamento observacional-transversal, envolvendo 46 pacientes com diagnóstico de câncer, submetidos a procedimentos cirúrgicos das especialidades Cabeça e Pescoço e Urologia. Seis componentes do PSQI foram estatisticamente significantes e 73,9% dos entrevistados apresentaram comprometimento da qualidade do sono. Entre as causas dos distúrbios do sono destaca-se: demorar para dormir, acordar no meio da noite, levantar para ir ao banheiro e cochilar durante o dia. Espera-se que este estudo sensibilize a equipe de enfermagem quanto à necessidade de investigar a qualidade e as causas de distúrbios do sono em sobreviventes do câncer, para que haja intervenção efetiva.

Descritores: transtornos do sono; neoplasias; cirurgia; assistência de enfermagem

INTRODUÇÃO

Segundo o Instituto Nacional do Câncer, no Brasil, a incidência do câncer cresce no mesmo ritmo que o envelhecimento populacional, decorrente do aumento da expectativa de vida. De acordo com o Instituto, a cirurgia ainda é uma das principais terapêuticas para 60% dos pacientes. Muitos tumores podem ser tratados com cirurgia exclusiva, outros com a combinação de cirurgia com radioterapia e/ou quimioterapia(1).

Os distúrbios do sono, vivenciados pelos pacientes com câncer, podem ocorrer em diferentes períodos de atendimento do paciente: no diagnóstico, durante e após o tratamento e na fase terminal. A incidência desse distúrbio para esses pacientes é expressiva, pois gira em torno de 30 a 50%, quando comparado aos 15% na população em geral. Além disso, de 23 a 44% dos pacientes oncológicos apresentam esse sintoma após dois a cinco anos de tratamento(2).

O sono está bem organizado e estruturado em ciclos NREM-REM, que ocorrem por volta de quatro ou cinco vezes no decorrer da noite. Um adulto jovem saudável entra no sono através dos estágios ou fases NREM. O estágio 1 é um breve período transicional entre estar acordado e dormindo, com duração de cinco minutos, considerado sono leve. O estágio 2, que dura de 10 a 20 minutos, durante o ciclo inicial, é considerado o verdadeiro sono fisiológico. Os estágios 3 e 4, também chamados delta ou ondas lentas, são os mais profundos e podem durar entre 20 e 40 minutos, no primeiro ciclo de sono. A sequência inicial é seguida por um retorno aos estágios 4, 3 e 2, seguidos de um episódio REM. O primeiro período REM ocorre de 70 a 90 minutos após o início do sono, normalmente tem breve duração, de cinco a quinze minutos. Em geral, os quatro ou cinco episódios REM têm a duração aumentada durante a noite(3).

Nos pacientes com câncer, todo o mecanismo regulador do sono acima descrito fica alterado por várias razões, podendo ocasionar insônia, dificuldade para iniciar o sono, sonolência, pesadelos, interrupção no meio da noite, ficar acordado por período longo, dificuldade para voltar a dormir, acordar muito cedo e cochilar durante o dia(4).

A preocupação da autoria deste estudo com a temática originou-se após a análise das Agendas de Prioridades de Pesquisa da Oncology Nursing Society (ONS)(5), publicadas de 2005 a 2009, que destacaram as consequências dos distúrbios do sono para a qualidade de vida dos sobreviventes do câncer como temática pouco estudada e, consequentemente, compreendida. Com isso, a ONS lançou o desafio para as enfermeiras que atuam em oncologia, para que esses distúrbios sejam detectados e suas consequências para a vida do paciente sejam avaliadas, elaborando-se uma base de conhecimento para intervenção de enfermagem segura.

Por outro lado, ao se revisar a literatura nacional de enfermagem, constatou-se que a temática do sono é recente, com poucos estudos publicados. Destacam-se três que contribuem para a compreensão da questão: com os diabéticos(6), com mulheres submetidas às cirurgias ginecológicas eletivas(7) e de mulheres com cânceres ginecológico e de mama(8).

Como docentes e pesquisadoras da área de Enfermagem Cirúrgica Oncológica, as autoras foram motivadas por essa área de conhecimento, desenvolvendo esta pesquisa, que teve o objetivo de avaliar a qualidade do sono em pacientes cirúrgicos oncológicos, das especialidades de Cabeça e Pescoço e Urologia, por meio do questionário de Índice de Qualidade do Sono de Pittsburg (PSQI). Acredita-se que os resultados contribuem para o avanço do conhecimento nessa área, pois fornecem um caminho para o planejamento da assistência ao paciente oncológico com distúrbio do sono.

Os pacientes das especialidades de Cabeça e Pescoço e Urologia foram selecionados devido ao grande número de cirurgias oncológicas, de médio e grande porte, realizadas anualmente, na instituição em que o estudo foi realizado, além de representar locais nos quais a pesquisadora principal exerce atividades de ensino e extensão, o que facilitou a concordância dos cirurgiões responsáveis pela realização do estudo.

MÉTODO

Este estudo consiste numa pesquisa exploratória, com delineamento observacional-transversal, onde os sujeitos da pesquisa são avaliados uma única vez(9).

A população do estudo foi composta por todos os pacientes cirúrgicos oncológicos das especialidades Cabeça e Pescoço e Urologia, de uma instituição hospitalar, que preenchiam os critérios de inclusão, descritos a seguir: pacientes com diagnóstico de câncer e que foram submetidos a procedimento cirúrgico de Cabeça e Pescoço e Urologia, no período de um até o sexto mês de pós-operatório, aqueles que vieram para retorno ambulatorial de outubro de 2007 a março de 2008, de ambos os sexos, maiores de 18 anos, que podiam se comunicar e que aceitaram participar do estudo por meio de assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Os dados foram coletados na Associação de Combate ao Câncer do Brasil Central, localizada em Uberaba, no Estado de Minas Gerais. A amostra foi de conveniência. A coleta de dados ocorreu no retorno pós-operatório dos pacientes ao ambulatório que concordaram em participar do estudo. Preencheram os requisitos 46 pacientes, sendo 30,4% (14) da especialidade Cabeça e Pescoço e 69,6% (32), Urologia.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e autorizado pelo Diretor Clínico do referido hospital, sob Protocolo nº 984.

Para a obtenção dos dados foram utilizados o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburg - PSQI e um instrumento para identificar as características sociais e clínicas dos sujeitos, elaborado para esta pesquisa. O PSQI foi validado para a cultura brasileira(10). Esse instrumento é utilizado para avaliar a qualidade subjetiva do sono e ocorrência de seus distúrbios. Contém dez questões, sendo que as questões de números um, dois, três e quatro são abertas e as questões cinco, seis, sete, oito, nove e dez são semiabertas. Para todas as dez questões há um espaço para registro de comentários do entrevistado, se houver necessidade.

O PSQI é constituído de sete componentes: o primeiro refere-se à qualidade subjetiva do sono, ou seja, à percepção individual a respeito da qualidade do sono; o segundo, à latência do sono; o terceiro, à duração do sono, obtida através da relação entre o número de horas dormidas e o número de horas em permanência no leito, não necessariamente dormindo; o quarto, à eficiência habitual do sono; o quinto, aos distúrbios do sono, ou seja, presença de situações que comprometam as horas de sono; o sexto, ao uso de medicações, isto é, se o paciente utilizou ou não medicamentos para dormir; e o sétimo, à sonolência diurna e distúrbios durante o dia, referindo-se à alteração na disposição e entusiasmo para execução das atividades rotineiras(6).

Na sua aplicação, o paciente foi orientado para responder as questões considerando os hábitos de sono apenas durante o mês anterior, na maioria dos dias e noites.

A pontuação global é determinada pela soma dos sete componentes e cada um recebeu uma pontuação entre zero e três pontos. A pontuação máxima do instrumento é de 21. Os escores superiores a cinco pontos indicam qualidade ruim no padrão do sono.

Para a organização dos dados foi criada uma base de dados no programa Excel®; após, os mesmos foram transportados para o programa Statistical Package for the Social Sciences - SPSS, que possibilitou a análise estatística dos dados.

A consistência interna do PSQI foi verificada pelo coeficiente alfa de Cronbach. Esse cálculo é obtido após uma única aplicação do instrumento de medição, produzindo valores entre 0 e 1 ou entre 0 e 100%. Quando maior que 70%, diz-se que há confiabilidade das medidas. São calculadas todas as correlações (p) entre o escore de cada item e o escore total dos demais itens(11). Para este estudo, adotou-se valor de p inferior a 0,05 como estatisticamente significante.

As variáveis das 10 questões são apresentadas pela análise estatística descritiva, por frequência e porcentagem. Ainda foram calculados a média, o desvio padrão e a significância estatística (ANOVA) dos componentes do PSQI, em relação ao escore global. Esse teste paramétrico da análise de variância é utilizado para estimar o valor médio real das variáveis quantitativas e porcentagens reais de alguns eventos de interesse do estudo.

RESULTADOS

Dos 46 sujeitos do estudo, 35 (76,1%) eram do sexo masculino. Quanto à faixa etária em anos, cinco (10,9%) tinham de 30 50, 30 (65,2%) de 50 70 e 11 (23,9%) de 70 90.

A renda mensal dos entrevistados com até um salário mínimo (SM) correspondeu a 14 (30,4%), de um a dois SM 19 (41,3%), de dois a três 12 (26,1%) e com mais de quatro SM 1 (2,2%). A escolaridade apresentou a seguinte frequência: um (2,2%) era analfabeto, 23 (50%) com o primeiro grau incompleto, 13 (28,3%) com o primeiro grau completo, três (6,5%) com o segundo grau incompleto, quatro (8,7%) com o segundo grau completo e dois (4,3%) com o superior completo.

Em relação ao tempo de pós-operatório, quatro (8,7%) tinham até dois meses, 12 (26%) de dois a três meses, nove (19,6%) de três a quatro meses, nove (19,6%) de quatro a cinco meses e 12 (26,1%) de cinco a seis meses. Quanto aos tratamentos adjuvantes e neoadjuvantes, 45 (97,8%) não foram submetidos a nenhum tipo de tratamento no pré-operatório e 34 (73,9%) não tiveram outro tratamento no pós-operatório.

Quanto ao diagnóstico, 14 (30,4%) dos sujeitos apresentaram câncer de cabeça e pescoço e 32 (69,6%) câncer do sistema urinário. Com relação à localização do tumor, dez (21%) apresentaram na tireóide, dois (4,3%) na laringe, dois (4,3%) no assoalho da língua, 28 (60,9%) na próstata, dois (4,3%) no pênis, um (2,2%) na bexiga e um (2,2%) no rim.

O PSQI foi submetido ao teste alfa de Cronbach, sendo o resultado 0,79 superior a 0,70, indicando elevada consistência interna e homogeneidade dos itens(11).

Em relação ao escore global do Índice de Qualidade do Sono (PSQI), 34 (73,9%) apresentaram pontuação superior a cinco, indicando comprometimento na qualidade subjetiva do sono.

A Tabela 1 apresenta as respostas das primeiras quatro perguntas abertas do questionário PSQI e as Tabelas 2 e 3 referem-se às questões semiabertas de cinco a dez, com a frequência e porcentagem dos itens.

Verifica-se que a maior frequência do horário para se deitar ocorreu entre 21 e 23 horas em 80,4% dos sujeitos, 37% levam até 15 minutos para pegar no sono, 54,3% acordam após 6 a 7 horas de sono e 26,1% dormem média de 6 a 7 horas por noite.

Dentre os resultados, salientam-se alguns itens que chamam a atenção, como os 19 pacientes (41,3%) que levam mais de trinta minutos para dormir, 32 (69,5%) que acordam no meio da noite ou muito cedo, e 33 (71,7%) que levantam para ir ao banheiro.

Na Tabela 3 são apresentados os resultados referentes à questão de número 10 do PSQI, que diz respeito ao significado do sono e aos hábitos de cochilar ou não. As respostas para essas questões não são somadas, ou seja, não são computadas em nenhum dos sete componentes; portanto, não entram no escore global do PSQI. No entanto, as respostas dos pacientes que possuem o hábito de cochilar ajudam a compreender a qualidade subjetiva do sono.

Conforme os dados da Tabela 3, 41(89,1%) pacientes consideram o sono como necessidade.

A Tabela 4 relaciona média, desvio padrão e nível de significância estatística dos componentes do PSQI, em relação ao escore global do PSQI, obtidos pelo teste paramétrico de análise da variância (ANOVA) para os 46 entrevistados.

Somente o componente 5 não foi estatisticamente significante, não tendo sido, por esse motivo, incluído na Tabela 4.

A Tabela 5 apresenta os resultados do teste paramétrico ANOVA, com os valores que foram estatisticamente significantes em relação aos itens do instrumento, referentes às características sociais e clínicas dos entrevistados.

O teste ANOVA trouxe três escores estatisticamente significantes: a renda econômica, a escolaridade e o local do câncer.

DISCUSSÃO

Dentre a amostra estudada, 41 (89,1%) pacientes encontravam-se na faixa etária superior a 50 anos, o que está de acordo com a literatura, pois, assim como ocorre para outros tipos de câncer, a idade é fator de risco importante, uma vez que tanto a incidência como a mortalidade aumentam exponencialmente após 50 anos de idade(1).

Os resultados, aqui, não mostraram significância estatística em relação à qualidade do sono com a idade e o sexo.

A renda de até dois salários mínimos (com 71,7%) e a escolaridade até o primeiro grau completo (com 80,5%) são indicativos de que os pacientes nessa faixa da amostragem vivem em condições precárias, decorrentes da reduzida qualificação ocupacional e baixa escolaridade de seus integrantes, tendo acesso limitado aos serviços públicos como educação e saúde, que interferem nos comportamentos preventivos da doença e na sua detecção precoce(12). Essas características sociais também podem ser impeditivas para o conhecimento desses pacientes quanto aos tratamentos complementares que minimizam os distúrbios do sono. Ainda, as dificuldades financeiras podem gerar preocupações que interferem no padrão do sono. Revisão sistemática(13), que avaliou o uso das medicinas alternativas e complementares entre pacientes com câncer, mostrou que o perfil dos pacientes que utilizam essas terapias são aqueles com elevado grau de escolaridade e de renda familiar alta.

Essa colocação é compatível com os resultados deste estudo, quando se detectou, aqui, que a renda e a escolaridade foram estatisticamente significantes em relação ao escore global do PSQI, confirmando a importância desses aspectos para a qualidade de sono dos pacientes.

O estudo(8) entretanto, que avaliou a qualidade do sono entre mulheres com cânceres, mostrou que os resultados foram diferentes, pois a escolaridade foi semelhante entre sujeitos com boa e má qualidade de sono habitual (mediana de 4,5 e 5 anos, respectivamente), bem como a renda familiar, predominando a faixa de um a cinco salários mínimos (em 91,7% dos entrevistados com boa qualidade de sono habitual e em 84,6% daqueles com má qualidade de sono habitual).

O local do câncer também foi variável estatisticamente significante (p=0,023). Sabe-se que o local e o estadiamento da doença são determinantes para a indicação dos tipos de tratamentos, podendo influenciar a reabilitação e a qualidade de vida dos sobreviventes(14). Nos pacientes submetidos à prostatectomia, a média de qualidade do sono, segundo o escore global do PSQI, foi de 8,25. Nesse grupo, uma causa para o distúrbio foi o fato de terem que levantar durante a noite para urinar, o que geralmente ocasionava a perda posterior do sono; outro fator era a preocupação de não conseguirem manter relação sexual ativa com a esposa ou companheira.

Embora a frequência dos pacientes submetidos à quimioterapia e radioterapia tenha sido pequena, não se pode deixar de mencionar a importância dessas terapêuticas para a qualidade do sono. Pacientes oncológicos que foram submetidos a tratamentos específicos nos últimos seis meses estiveram mais sujeitos a apresentar problemas de sonolência excessiva(8).

Nesta amostra, 24 (52,2%) pacientes apresentaram média de sono inferior a 6 horas. Esse resultado é distinto do estudo(15) com 123 pacientes oncológicos, em que 95% dos sujeitos apresentaram média de 6,58 horas dormidas. Porém, a literatura(16) também destaca que, quando o distúrbio do sono já existia anteriormente à doença, os sintomas são agravados em 58% dos pacientes, após o diagnóstico.

No estudo que mostrou a má qualidade do sono entre pacientes oncológicos(8), destacaram-se como problemas: o despertar precoce (92%) e a necessidade de ir ao banheiro (92%), seguidos pelos episódios de dor (69,3%) e pela sensação de calor durante a noite (46,2%). Percebe-se similaridades nos fatores acima com os deste estudo em que 27 (58,7%) dos pacientes relataram ter tido sono ruim ou muito ruim.

Quanto ao hábito de cochilar, isto é, ter períodos de sono durante o dia, no que se referente às respostas da questão de número 10 do PSQI, Tabela 3, 34 (73,9%) dos sujeitos referem realizá-lo intencionalmente. Observa-se, ainda, que 21 (45,6%) consideram o ato de cochilar um prazer e 13 (28,3%) como necessidade. O ato de cochilar durante a manhã ou à tarde também foi detectado em 39% dos respondentes de outro estudo e 60% deles cochilavam durante o dia pelo menos 3 vezes por semana(16). Assim, considera-se que os episódios de cochilos diurnos podem estar associados à interrupção do sono noturno, contribuindo para a má qualidade do sono durante a noite.

Dessa forma, quando os componentes do PSQI, em relação ao escore global, são avaliados de forma conjunta, pode-se entender o relacionamento entre os mesmos, pois, uma pessoa que tenha dormido menos de cinco horas por noite e levado mais de trinta minutos para dormir é considerada como tendo qualidade de sono ruim e, consequentemente, pode ter sonolência durante o dia e sentir necessidade de cochilar.

Os distúrbios no padrão do sono indicam um nível no qual o sono está sendo prejudicado por fatores ambientais e/ou pessoais. Deve-se notar que, em oncologia, os estudos dos múltiplos sintomas são complexos, devido às diferenças na origem da doença e dos sintomas específicos. Alguns sintomas estão relacionados à doença, outros com o tratamento (exemplo: náusea e vômito podem ser resultado de obstrução intestinal ou da quimioterapia); ou os sintomas podem estar relacionados à doença e ao tratamento (a fadiga, como exemplo); e ainda há a possibilidade de um ou mais sintomas desencadearem a ocorrência de outro (distúrbio do sono, que pode levar à fadiga)(14).

Para avaliar se a qualidade do sono é adequada deve-se determinar o seu padrão. Para tal, os profissionais da área de saúde devem investigar a rotina dos pacientes, a fim de determinar o horário em que vão dormir, o tempo que levam para adormecer, a duração do sono, o número de vezes que acordam durante a noite, quanto tempo levam para voltar a dormir e o horário em que levantam. Esses dados vão ajudar a determinar o padrão do sono dos pacientes e perceber se houve alguma mudança após o diagnóstico de câncer e/ou tratamento(17).

Frente aos resultados, as ações de intervenção para aquisição do hábito de sono saudável entre pacientes oncológicos incluem: manter um horário regular para dormir e acordar (mesmo nos finais de semana); deitar somente quando estiver sonolento; levantar da cama quando não conseguir adormecer entre 15-20 minutos e ir para outro cômodo, permanecendo em atividade não estimulante até sentir sonolência; dormir apenas o necessário; realizar exercícios físicos regulares que estimulem o sono, o que deve ser feito 4-6 horas antes de deitar; fazer um lanche leve antes de deitar; evitar alimentos pesados; reduzir o nível de ruído e de luz; evitar estimulantes, como nicotina, alimentos e bebidas que contêm cafeína, 4 a 6 horas antes de deitar (exemplos: chocolate, café e refrigerantes); evitar ingestão de bebidas alcoólicas, pois provocam despertares noturnos; evitar cochilar durante o dia, ou então limitar o tempo para 20 minutos e evitar isso após as 15 horas(17).

CONCLUSÕES

O estudo teve o objetivo de avaliar a qualidade do sono entre 46 pacientes cirúrgicos oncológicos das especialidades Cabeça e Pescoço e Urologia, por meio do questionário de Índice de Qualidade do Sono de Pittsburg (PSQI) e um instrumento específico para se identificar as características sociais e clínicas dos sujeitos.

Os resultados mostram que todos os sujeitos dão importância ao sono; apresentam como principais distúrbios a demora para dormir e a descontinuidade do sono noturno.

A renda econômica, a escolaridade e o local do câncer foram fatores estatisticamente significantes para a qualidade do sono.

Os sujeitos, como decorrência, apontaram para a necessidade de cochilos durante o período diurno que pode ser necessidade para alguns, mas, ao mesmo tempo, pode ocasionar os distúrbios no sono noturno.

Comparando-se os resultados deste estudo com outros estudos, conclui-se que há diferenças na qualidade do sono entre grupos de pacientes oncológicos, o que leva a se considerar que o focar no local da doença e nos tratamentos específicos pode levar a resultados mais acurados.

Algumas limitações do presente estudo podem ser apontadas, como a amostra heterogênea, pois as consequências das cirurgias de cabeça e pescoço e as de urologia são distintas, quando comparadas entre si. O tamanho da amostra, composta por 46 pacientes, pode ser considerado um número reduzido quando comparado à expectativa do número de pacientes com câncer, atendidos no ano, na instituição. Outra limitação deve-se ao delineamento transversal. O delineamento longitudinal poderá complementar a avaliação da qualidade do sono nas diferentes etapas da trajetória da doença. Tais limitações podem ser superadas em novas investigações.

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    Article extracted Doctoral Dissertation. Research developed from the Grupo de Estudos sobre a Reabilitação do Paciente Oncológico (GARPO)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Out 2009
    • Data do Fascículo
      Ago 2009

    Histórico

    • Recebido
      20 Ago 2008
    • Aceito
      23 Jun 2009
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