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Neoliberalismo e distribuição de renda na América Latina* * Nós gostaríamos de agradecer a Donald Coes, Gustavo Borges Rangel e a Ralf Weber pelos vários comentários e sugestões úteis. Tradução: Paulo Frederico Bastos Soares, economista formado pela Universidade Federal de Pernambuco.

Neoliberalism and income distribution in Latin America

RESUMO

Este artigo analisa as principais medidas de política neoliberal instituídas na América Latina na última década e seu impacto sobre a equidade. Ele primeiro enfatiza a dificuldade de separar o impacto das medidas de liberalização dos ajustes fiscais necessários da década de 1980, e seus efeitos de transição versus longo prazo, e então coloca os movimentos observados na distribuição em um contexto global e histórico. A segunda parte coloca várias inovações dos regimes neoliberais em perspectiva histórica e argumenta que seu impacto geral provavelmente não será regressivo e que os regimes anteriores provavelmente não foram especialmente progressivos. A longo prazo, a evolução dos mercados de fatores provavelmente será de importância primordial - o lado da demanda, impulsionado pelo crescimento industrial reorientado e a crescente importância do setor de serviços, interagindo com a oferta relativa de mão de obra qualificada e não qualificada - provavelmente será de importância primordial na determinação da evolução da distribuição do rendimento.

PALAVRAS-CHAVE:
Neoliberalismo; liberalização; globalização; distribuição de renda

ABSTRACT

This paper reviews the principal neo-liberal policy measures instituted in Latin America in the last decade and their impact on equity. It first emphasizes the difficulty of separating the impact of liberalization measures from the necessary fiscal adjustments of the 1980s, and their transitional vs long run effects, and then places the observed movements in distribution in global and historical context. The second part places several innovations of neo-liberal regimes in historical perspective and argues that their overall impact is unlikely to be regressive, and that previous regimes were probably not especially progressive. Over the long run, developments in factor markets are likely to be of overriding importance - the demand side, driven by reoriented industrial growth and the increasing importance of the service sector, interacting with the relative supplies of skilled and unskilled labor - are likely to be of overriding importance in determining the evolution of the distribution of income.

KEYWORDS:
Neoliberalism; liberalization; globalization; income distribution

1. INTRODUÇÃO

O conjunto de medidas econômicas geralmente classificadas sob o termo “neoliberalismo” foi pioneiramente implementado no Chile na década de 70 e, desde então, tem se espalhado pela maioria dos países latino-americanos. Enfatizando um maior papel para o mercado na alocação dos recursos, um menor papel do Estado e um incremento na integração com a economia mundial, seus proponentes têm mantido a perspectiva de um crescimento rápido, eficiente e sem o padrão irregular produzido pelos modelos anteriores.

O Chile foi o primeiro a adotar, como reação às políticas socialistas do governo do presidente Salvador Allende, um modelo econômico em que o mercado dirige a alocação de recursos. O governo militar adotou, ao longo de alguns anos de tentativas e erros, um conjunto de medidas que transformaram o Chile em uma economia de mercado aberta. A maioria dos outros países latino-americanos começou a adotar medidas neoliberais como resultado da “crise da dívida” da década de 80, usualmente como resultado de condições impostas nos acordos de renegociação das dívidas. Contudo, depois de uma década de estagnação, altas taxas de inflação e da saída líquida de capital, tornou-se claro para quase todos os governos da região que só seria possível restaurar o crescimento de longo prazo com a implementação de um programa de reformas estruturais de longo prazo, que poderiam atrair capitais privados domésticos e externos. Ao mesmo tempo, após alguns equívocos, as reformas no Chile começaram a gerar resultados, tais como taxas de crescimento excedendo 6%, níveis de taxas de poupança próximos aos dos Tigres Asiáticos, exportações mais diversificadas e grande entrada de capitais, refletindo a confiança da comunidade internacional no seu futuro. Medidas neoliberais foram inteiramente adotadas nos países sem que elas tivessem sido forçadas. Como a Tabela 1 demonstra, substanciais medidas de liberalização foram iniciadas no México em 1986, Argentina em 1988, Brasil em 1990, Peru em 1990 e Venezuela em 1989.

Tabela 1
Indicadores Selecionados

Em razão do abandono de políticas ostensivamente nomeadas como de melhoria da distribuição de renda e também por causa das concomitantes restrições impostas à demanda, os pacotes baseados em princípios neoliberais têm sido criticados por serem socialmente regressivos. Em geral, essas críticas têm se baseado no comportamento adverso dos índices de pobreza ou nos coeficientes Gini durante o período de implementação das medidas. Este artigo enfatiza, em primeiro lugar, a dificuldade de separar o impacto das medidas de liberalização do ajuste fiscal dos anos 80, além da necessidade de diferenciar seus efeitos transitórios e de longo prazo, para, dessa forma, colocar os movimentos observados na distribuição de renda em um contexto global e histórico. A segunda parte coloca algumas inovações do regime neoliberal em uma perspectiva histórica e argumenta que seu impacto total não é regressivo e que os regimes anteriores foram, provavelmente, não-progressivos. Por último, são discutidos os fatores e políticas que, provavelmente, devem ser o principal foco no debate sobre distribuição.

2. O CONTEÚDO DAS POLÍTICAS NEOLIBERAIS

Muitas políticas econômicas são rotuladas de “neoliberais”, contudo, argumentar-se-á que uma mais detalhada distinção entre ajustamento e liberalização é importante.

  1. Ajuste Fiscal. A maioria dos governos tomou medidas para eliminar os respectivos déficits fiscais. No início da década de 90, os grandes déficits tinham sido eliminados na maioria dos países da América Latina e alguns deles estavam conseguindo superávits (ver Tabela 1). Isso foi alcançado, em parte, pela diminuição nos subsídios e pela reforma tributária. De forma geral, o neoliberalismo enfatiza um papel dominante para o mercado e um papel reduzido para o Estado na alocação de recursos.

  2. Privatização. Desde a grande depressão dos anos 30, os governos latino-americanos têm aumentado sua participação na economia, por meio da fundação de empresas estatais nos setores de indústria pesada, exploração de petróleo e outros recursos minerais, utilidades públicas, bancos e em algumas indústrias de bens de consumo. Mesmo que essa participação possa ter contribuído para a industrialização e o crescimento de algumas economias da região, por volta dos anos 70 e 80, muitas empresas estatais tornaram-se deficitárias devido tanto ao se uso como ferramenta de política econômica como ao crescimento de sua ineficiência. No final dos anos 80, a maioria dos governos da região foram convencidos ou persuadidos pelos seus credores de que, para alcançar um ajuste fiscal e para aumentar a eficiência da economia, uma substancial porção do setor público deveria ser privatizada.1 1 Ver Baer (1994), Baer e Birch (1994) e Baer e Conroy (1993, 1994). Por motivos econômicos e filosóficos, privatizações têm sido frequentemente acompanhadas por uma ênfase à inviolabilidade da propriedade privada.

  3. Liberando e/ou Ajustando Preços. Por muitas décadas, os governos latino-americanos controlaram muitos tipos de preços (tais como utilidades públicas, produtos da cesta básica e alguns produtos industriais) como instrumentos de distribuição de renda ou de controle inflacionário. O efeito líquido desses controles foi a distorção na alocação de recursos, o que fez com que muitas firmas, nos setores atingidos, se tornassem deficitárias e dependentes de subsídios governamentais, provocando ainda, em outros setores, um declínio dos investimentos. A agenda liberal foi dirigida para: ou liberar totalmente os preços ou reajustar preços nos setores controlados, de forma a possibilitar a obtenção, por parte das firmas, de taxas de retorno positivas. Com a mesma concepção, as grandes sobrevalorizações das taxas de câmbio teriam sido evitadas em favor de taxas que poderiam encorajar a integração com a economia mundial. Sob o tradicional regime de industrialização com substituição de importações (ISI), taxas de câmbio eram frequentemente fixadas enquanto a inflação crescente, usualmente, induzia a sobrevalorização, impedindo o desenvolvimento de urna base de exportação mais diversificada e deixando as economias expostas a frequentes crises de balanço de pagamentos.

  4. Desregulamentação do Setor Financeiro. Taxas de juros controladas, geralmente a taxas reais negativas, cotas alocativas para os empréstimos bancários e obrigatoriedade, por parte dos bancos, em manter títulos do governo, desencorajaram a poupança e distorceram a alocação dos escassos recursos de capital. O final da “repressão financeira” implicou uma maior alocação dos recursos para investimento pelo mercado e, frequentemente, liberalizou o fluxo de capital externo.

  5. Liberalização do Comércio. A maioria dos países da América Latina tinha mantido altos níveis de proteção, que foram instituídos como parte dos Programas de Substituição de Importações dos anos 50 e 60. Além das ineficiências que surgem dos sistemas de tarifas e cotas, esses regimes levaram os países para longe de um desenvolvimento que seguisse de acordo com as vantagens comparativas naturais, protegendo as indústrias locais da salutar competição externa e deram crescimento a um comportamento de rent seeking.2 2 A proteção nominal total em 1960 foi de 168% no Brasil, 131% na Argentina e 138% no Chile. O Chile abriu sua economia logo após o golpe militar de 1973, eliminando todas as cotas de importações em 1976 e implementando uma tarifa uniforme de 10% para a maioria dos produtos. As tarifas argentinas foram reduzidas a partir de outubro de 1988 e as mais importantes foram abolidas, e, em 1991, um sistema de tarifas de três níveis foi implantado (0%, 11% e 22%). O Brasil começou a liberalizar o seu comércio no início de 1990, quando as tarifas médias caíram de 25% em 1990 para 14% em 1994. O México eliminou muitas de suas cotas na segunda metade da década de 80 e, em 1988, as tarifas foram reduzidas para uma média de 11%.

  6. Incentivos ao Investimento Externo. No decorrer da crise da dívida, a maioria dos países da região experimentou um drástico declínio no investimento privado, uma diminuição dos recursos fiscais para a expansão das empresas estatais e uma crescente desatualização da tecnologia industrial. Seguindo a liderança chilena, muitos países abriram a economia para o investimento externo, incluindo setores até então fechados como telecomunicações, exploração de petróleo, geração e distribuição de energia etc., frequentemente por meio de conversão da dívida (ver Baer e Conroy, 1993BAER, Werner & E. CONROY, Michael (orgs.) (1993, 1994) “Latin America: Privatization, Property Rights, and Deregulation”, The Quarterly Review of Economics and Finance. Special Issues, vols. 33-34.).

  7. Reforma no Sistema de Seguridade Social. Os tradicionais sistemas “pays as you go” de seguridade social da América Latina foram geralmente constituídos sem fundos apropriados e constituíram-se no mais importante, embora camuflado, componente da dívida dos governos como proporção do PIB. Novamente, nos anos 80, o Chile liderou o movimento de estabelecimento de fundos de pensão privados competitivos, em que os trabalhadores mantêm contas individuais que refletem suas contribuições acumuladas. A Argentina tem seguido o exemplo chileno e o México está planejando segui-lo em breve.

  8. Reforma no Mercado de Trabalho. O sistema de proteção do trabalho incorporado na Constituição da maioria dos países latino-americanos os tem conduzido a possuir um mercado de trabalho excessivamente rígido, mal adaptado à competição da economia de mercado globalizada. O governo militar do Chile foi particularmente violento, desmantelando sindicatos e eliminando proteções há muito estabelecidas, tais como o salário mínimo. Contudo, algum tipo de reforma no mercado de trabalho tem sido considerado, cada vez mais, um essencial complemento às reformas de mercado (World Bank, 1995WORLD BANK World Development Report, (vários anos).).

3. O IMPACTO DISTRIBUCIONAL DAS POLÍTICAS NEOLIBERAIS

Alguma permutação dessas políticas tem sido adotada pela maioria dos países latino-americanos nos últimos vinte anos. Contudo, três problemas substanciais dificultam uma avaliação do impacto do deslocamento para uma economia mais baseada nas forcas de mercado.

3.1 Ajustamento vs. Liberalização

Em primeiro lugar, a combinação de liberalização com ajustamento tem sido um padrão comum nos anos 80 e a coexistência desses dois processos tem confundido o debate sobre seus respectivos papéis distributivos. Não existe razão teórica para que estes sejam considerados em conjunto. Estabilização implica que a situação prévia, que se originou ou de políticas econômicas malsucedidas ou de desenvolvimentos adversos no setor externo,3 3 Onde o ajustamento é devido a alguns choques externos - o rápido aumento na taxa de juros internacional ou movimentos adversos nas relações de troca -, a questão de quem paga o custo do ajustamento é complicada e é um outro importante tópico. Mas, novamente, não há necessariamente uma relação entre os ajustes necessários e a liberalização. era instável e insustentável e requeria uma mudança radical na política econômica para que se alcançasse uma posição de balanço fiscal equilibrado, baixa inflação e equilíbrio no balanço de pagamentos. Isso é uma questão de balanço macroeconômico que não é afetada pelo modelo macroeconômico adotado. Embora muitos estudos venham documentando os impactos distributivos adversos dos programas de ajustamento,4 4 Ver de Janvry e Sadoulet (1995), Psacharopoloulos et al. (1995), Altimir (1994). estes não têm enfocado a questão da distribuição nos casos em que o governo financia os programas sociais e os aumentos de salários via criação de um déficit orçamentário de 25% do PIB, como no caso do governo de Allende. O país está endividando-se para o futuro ou está criando inflação que, eventualmente, irá requerer esforços substanciais para ser eliminada. Idealmente, comparações devem ser baseadas em termos de transferências distributivas sustentáveis, isto é, estas transferências seriam financiáveis no longo prazo pelos impostos gerados e não teriam consequências inflacionárias.

Os casos de estabilização sem liberalização prevalecem historicamente, prejudicando o estudo dos impactos distributivos da liberalização na América Latina. A Tabela 1 mostra que a maioria dos países tomaram medidas em favor da estabilização no decorrer dos anos 80, mas somente Chile e México adotaram a maioria das medidas de liberalização antes de 1989.5 5 A Colômbia oferece um caso de liberalização em um ambiente macroeconômico razoavelmente estável. Dessa forma, a evolução adversa ao longo da década de 80 de quatro variáveis críticas para a distribuição de renda e pobreza, atribuídas às políticas “neoliberais”, foi primariamente ligada à estabilização e não à liberalização.

Os ajustes fiscais foram a culminação de tendências político-econômicas de longa duração na América Latina, trazidas à tona pela crise da dívida e poderiam ter sido necessárias independentemente do fato de reformas adicionais serem adotadas. Cominetti (1994COMlNETTI, Rossella (1994) “Fiscal adjustment and social spending”. CEPAL Review, nº 54, dez., pp. 4I-60.) argumenta que em toda a América Latina os cortes nos gastos governamentais caíram de forma desproporcional e acentuada nos setores sociais: o gasto social per capita caiu 18% e o gasto social como fração do gasto governamental caiu 16%. Contudo, como a Tabela 1 demonstra, isso também não parece ter relação com as medidas liberalizantes tomadas.

O declínio acentuado dos salários reais na região também teve fortes efeitos regressivos. Muitos autores têm notado que, depois de qualquer crise, a fonte de renda das classes ricas, o capital, migra para áreas de maior retorno global, enquanto o trabalho, imóvel, suporta a sobrecarga do ajuste internamente.6 6 Ver, entre outros, Lustig (1992), p. 94., Dornbusch (1982) Como a Tabela 1 demonstra, o salário mínimo real e o salário médio caíram dramaticamente na maioria dos países na década de 80 (exceto no Chile), e no início dos anos 90 ainda não tinham reconstituído-se aos níveis de 1980. Esses movimentos são de importância crítica para o entendimento das tendências da desigualdade observada. Marcel e Solimano (1993MARCEL, Mario & SOLIMANO, Andres (1993) “Developmentalism, Socialism and Free Market Reform: Three Decades of Income Distribution in Chile”. Presented at the Brookings conference on “The Chilean Economy: Public Lessons and Challenges”, Washington D.C., April.), que provavelmente produziram o mais cuidadoso trabalho sobre a questão, atribuem os movimentos adversos e de recuperação, como o que ocorreu no final da década de 80, à fragilidade do mercado de trabalho. Contudo, novamente, o declínio nos salários reais espalha-se entre liberalizantes e não-liberalizantes, sugerindo, da mesma maneira, que os movimentos nos salários reais foram determinados pela performance econômica pobre, que não estava relacionada com o movimento de liberalização. Um fato relacionado é que o investimento doméstico também declinou drasticamente, fazendo os ganhos de competitividade aparecerem somente como resultado do declínio dos salários reais. Mas, novamente, não existe uma diferença óbvia entre reformadores e não-reformadores.

Uma inquietação final, que se tornou uma característica crescentemente comum da macroeconomia latino-americana, tem sido a sobrevalorização da taxa de câmbio fixa, apesar da crescente ênfase em getting prices right e na promoção das exportações, que tem deixado taxas de juros e desemprego maiores e taxas de crescimento menores. Contudo, a “sobrevalorização”, testemunhada no Chile e na Argentina na década de 70, presentemente no Brasil e na Argentina e até recentemente no México, reflete a necessidade de controlar as crescentes expectativas inflacionárias de malsucedidas administrações econômicas anteriores, mais do que um elemento intrínseco de uma estratégia de mercado orientada. De fato, após a crise de 1982, o Chile manteve uma taxa de câmbio estável e levemente subvalorizada, o que foi essencial para a expansão das exportações não-tradicionais.

3.2 Efeitos Transitórios vs. Efeitos de Longo Prazo

Os custos da transição ao mover-se para qualquer novo regime dificultam a identificação das verdadeiras implicações distributivas de dirigir-se para uma economia na qual as forças de mercado têm um papel mais importante na alocação dos recursos. Os ganhos de eficiência, derivados das reformas, poderiam fazer com que todos estivessem indubitavelmente melhor do que antes: isso se os prejudicados são completamente compensados e, ainda assim, existirem ganhos para os beneficiados. Contudo, a realidade das políticas, frequentemente, demonstra que existirão perdedores não-compensados e na transição trabalhadores serão demitidos em um setor e apenas eventualmente serão empregados em outros, frequentemente a um grande custo pessoal. Outros, no entanto, podem possuir ativos ou informações privilegiadas que podem resultar em súbita valorização dos ativos que serão lentamente dissipados. Apesar disso, é discutível que, dada a estagnação na América Latina na última década, um período de cinco anos de piora na distribuição da renda ou aumento na pobreza conduza a benefícios a longo prazo. Infelizmente esse cálculo requer, para ser confirmado, uma série temporal mais longa do que essa correntemente disponível. Somente no caso do Chile, temos mais de vinte anos de dados, desde o início das reformas que geraram a estabilização da economia, após a experiência socialista de Allende, ajustando-se a choques adversos externos e erros de política (após 1982) e liberalizando a economia.

É difícil saber quais são os custos reais da transição. No caso do Chile de 1974 a 1982, e discutivelmente na recente experiência mexicana, a transição foi fracamente executada e extremamente custosa em termos humanos. Contudo, não existe razão para supor que esses custos tenham algo de intrínseco ao programa neoliberal. A maioria dos economistas concorda que o colapso chileno de 1982 é atribuível a uma fraca política cambial, à má supervisão do setor financeiro e, embora seja algo mais controverso, ao baixo nível de credibilidade das medidas da reforma.7 7 Edwards e Edwards (1991) e Conley e Maloney (1995). Se o Chile pudesse alcançar as altas taxas de crescimento do presente, o crescimento nos salários reais, o dinâmico setor exportador e a estabilidade macroeconômica de 1996, sem atravessar o colapso de 1982, os custos sociais da transição, atribuídos normalmente às próprias políticas, poderiam ser muito menores. Similarmente, pouco pode ser discutido sobre o fato de a queda de 7% no PIB e a compressão dos salários serem atribuídos à transição do México para uma economia de mercado ou à má conduta das políticas cambiais e monetária.

O desafio distribucional durante a transição é como liberalizar sem incorrer em recessão, desemprego em massa e declínio nos salários reais. A maior parte da vasta literatura sobre liberalização tem se concentrado em como suavizar a transição para o novo regime, recuperar o crescimento, reduzir o desemprego e ainda evitar políticas ou sequências de erros que causem colapsos.8 8 Ver Choksi e Papagiorgiou (1986) Edwards (1984) e Conley e Maloney (1995). Dada a correlação entre equidade e emprego, estes, provavelmente, devem ser enfatizados na literatura sobre transição, até mesmo se equidade for o objetivo principal. Contudo, alguns países sob tensão fiscal têm experimentado programas que tornam melhores os deslocamentos que inevitavelmente ocorrem quando se reestrutura uma economia com impactos mensuráveis.9 9 O governo chileno gastou, após o colapso de 1982, 1,4% do PIB empregando cerca de 13% da força de trabalho. Outros esquemas adotados na região foram o Solidariedad no México, o fundo social de emergência da Bolívia, o programa temporário de suporte da renda do Peru ou os comparáveis programas em Gana e Madagáscar. World Bank (1990), pp. 118-9.

3.3 Medindo o Impacto Distribucional de Políticas Neoliberais

Dada a dificuldade em se avaliar o impacto das políticas neoliberais, os dados contidos nos estudos sobre renda não podem captar nem o impacto da taxação e das reduções nos gastos sociais, discutidos acima, nem o realinhamento dos preços relativos, fruto da desregulamentação, cortes nos subsídios e reforma no comércio exterior. Ainda assim, são as informações desses modelos, captadas por Gini ou outras medidas distribucionais, que são discutidas nos debates e serão igualmente tratadas aqui.10 10 Embora nossa análise aqui se concentre nas questões distribucionais, também deve ser dito que estudos recentes têm mostrado que, ao longo dos anos 80 e no início dos anos 90, muitos países latino-americanos presenciaram um crescimento na proporção de suas populações que vivem abaixo da linha de pobreza. De acordo com o Banco Mundial, a porcentagem da população da América Latina abaixo do nível de pobreza cresceu de 22,4% em 1985 para 25,5% em 1990 e para 35% em 1992; para a Argentina, a proporção cresceu de J 6,2% no início dos anos 80, para J 7,6% no início dos anos 90; para o Brasil, de 39% para 43%. As exceções foram Chile e Colômbia, onde a proporção dos pobres declinou de 28% para 24% e de 33,8% para 32,7% respectivamente. Ver Banco Mundial (1990, 1992); e Finance and Development, março de 1995, p. 8.

Nós nos baseamos em duas fontes de dados. Primeiro, a Tabela 2a-b, que apresenta os resultados estimados obtidos principalmente de Bulmer Thomas (1994BULMER-THOMAS, Victor (1994) The Economic History of Latin America Since Independence. Cambridge University Press.) e Morley (1994MORLEY, Samuel A. (1994) Poverty and Inequality in Latin America: Past Evidence and Future Prospects. Washington, D.C., Overseas Development Council.), que, por sua vez, obtiveram os dados de vários outros estudos. A principal desvantagem é que não podemos estar certos da consistência dos estudos ou dos mecanismos usados para gerar os coeficientes Gini. Segundo, a Tabela 2c, que elimina o problema anterior, calculando os coeficientes Gini diretamente dos dados proporcionais de renda em quintis e usa as aproximações padrões que reduzem algebricamente o cálculo do coeficiente Gini para:

G i n i = 1,2 0,4 ( 5 X 1 + 4 X 2 + 3 X 3 + 2 X 4 + X 5 ) (1)

Onde X1 é a porção da renda indo para o menor quintil e X 5 é a porção da renda indo para o mais alto quintil.11 11 Para uma derivação mais completa e geral, ver Lambert (1993). Isto, obviamente, não elimina o problema, salvo nos casos do Chile e do México da não-uniformidade nas coletas de dados.

Tabela 2
Distribuição da Renda
2b
Coeficientes Gini, Várias Estimativas
2c
Porção da Renda por Ouintil e Coeficientes Gini (Cálculos dos Autores)

Embora existam tendências e diferenças mensuráveis, a tomada de uma visão mais geral mostra que a ausência de movimento entre quintis é destacadamente o fato mais marcante do processo de liberalização desses dois países. Ao se considerar as séries chilenas para cada período presidencial desde 1959 até 1993, demonstra-se que: o coeficiente Gini caiu de 0,49 para 0,47 durante a experiência socialista e então cresceu novamente para 0,52 sob o regime militar, com o quintil superior absorvendo recursos de todos os outros. Em 1990-93, um período de livre ajustamento e, questionavelmente, de pós-transição, as estatísticas relativas à equidade estão melhorando, embora não seja possível saber se estas constituem-se em uma tendência. Nossas séries de 1986-92 para o México, um período que inclui políticas anti-inflacionárias recessivas assim como medidas liberalizantes, indicam que o Gini subiu de 0,43 para 0,48, novamente com o quintil superior absorvendo mais 5% do PIB. Embora os indicadores aparentem mover-se adversamente, esses movimentos, se colocados em um contexto histórico e global, não se constituem em um caso extremo contra a liberalização, ao menos a médio prazo.

Primeiro compare a variação no Gini na Costa Rica de 1981-1989 (0,38-0,42), México de 1963-77 (0,47-0,50), Argentina de 1980-89 (0,36-0,42), Brasil de 1980 - 89 (0,52-0,56), países onde ocorreram muito menos reformas. As radicais inovações de políticas do Chile e do México não puderam evitar que participassem do movimento geral dos coeficientes Gini na América Latina.

Segundo, comparada com a mais desigual das nações desenvolvidas, o Reino Unido, com um Gini de 0,37, os movimentos do Gini que seriam necessários para o Chile alcançar os países da OECD excedem em muito os movimentos observados até então. É imediatamente claro pela equação (1) que o maior impacto sobre o Gini é alcançado com a transferência de renda do quintil mais alto para o mais baixo. Para o Chile se parecer com o Reino Unido, a transferência mínima necessária seria de 8 pontos percentuais; porém, distribuições menos extremas, que são mais plausíveis, poderiam requerer transferências da ordem de 20%. Isso não é surpreendente. A porção de renda absorvida pelo quintil superior - historicamente no Chile é de cerca de 60% - cai para 44,3% no Reino Unido. Esse é um padrão regional que marca a América Latina como caso único no mundo: a renda recebida pelo quintil superior geralmente varia de 50%-67%, comparados com 40% nos países da OECD, 37%-56% na Ásia, 39%-59% na África e 35%-43% no Leste Europeu. Os 4% de incremento na porção da renda absorvida pelo quintil superior no Chile (agora diminuindo) não são significativos dadas essas magnitudes.

Terceiro, os cálculos de Kuznets (1966KUZNETS, Simon (1966) Modern Economic Growth: Rate, Structure, and Spread. New Haven, Yale University Press.) para os países industrializados mostram grandes variações históricas na participação da renda bruta para os quintis superiores no período correspondente ao corrente nível de desenvolvimento da América Latina:12 12 A América Latina tem hoje a estrutura de produto ou de emprego equivalente à dos EUA entre 1900 e 1940. de 59% para talvez 42% no Reino Unido, de 54% para 45% nos Estados Unidos, de 56% para 43% na Suécia, de 56% para 39% na Holanda e de 55% para 44% na Dinamarca. Estes são substancialmente maiores que qualquer movimento não-cíclico visto na América Latina até esta data.

Em resumo, somente para México e Chile se tem substancial tempo transcorrido desde a implementação da maioria das políticas liberalizantes e somente no último caso podemos agora abstrair a análise dos efeitos do ajustamento e talvez da transição. Quando colocados em um contexto global e histórico, os movimentos distribucionais observados, para qualquer um dos dois países, são relativamente pequenos, mesmo que os dados de renda bruta não capturem claramente alguns efeitos-chave. No presente, é importante frisar que as evidências empíricas não permitem conclusões sobre os impactos de longo prazo de políticas neoliberais. Na próxima seção, argumentaremos que uma abordagem histórica pode oferecer resultados adicionais neste tópico.

4. O CONTEXTO HISTÓRICO

Em relação ao modelo anterior, três características do neoliberalismo poderiam ter plausíveis efeitos regressivos sobre o longo prazo: a ênfase em assegurar o direito de propriedade e o abandono da distribuição de riqueza física como um objetivo; o fim do papel distributivo do Estado; e a redução da proteção às indústrias de altos salários, que esteve implícita no modelo de substituição de importações. A história sugere que esses três efeitos não possuem o sinal e a magnitude que frequentemente se supõe.

O alto grau de concentração de renda e da propriedade, herdado da era colonial, iniciou uma estrutura socioeconômica desigual que persiste até hoje.13 13 Esta concentração foi conseqüência de “ ... the fortuitous occurrence of rich mining strikes, the extent of monopolization in cornmercial intercourse, and the latifundian land ternure system (which) served to concentrate the remaining wealth and income among a relatively reduced number of units in the private sector.” E “ ... the aristocratic landowners, by the custom of maintaining permanent residences in the central cities ... not only appropriated almost the entire amount of the disposable money income generated in agriculture, but also funneled its flow into the major cities” (Glade, 1969, p.135). Esses padrões só se intensificaram no primeiro centenário após a independência na terceira década do século XIX. O sistema de latifúndio expandiu-se às custas das comunidades nativas, e assim os benefícios do boom nas exportações de bens primários, na segunda metade do século, foram em sua maioria concentrados em um pequeno grupo de proprietários de latifúndios e investidores estrangeiros, nas áreas de minas, utilidades públicas e agricultura. A maior parte da população vivia em um setor de semi-subsistência que” ... supplied labor power and modest amount of agricutural produce and craft items ... in exchange for the use of land and a very small return flow of consumer manufactures.” (Glade, 1969GLADE, William P. (1969) The Latin American Economies: A Study of their Institutional Evolution. New York, American Book, Van Nostrand, Reinhold., p.20)

O setores modernos da América Latina no século XIX constituíam as minas, plantações, ranchos comerciais, ferrovias, empresas financeiras e de marketing, que basicamente serviam ao processo de comércio com o exterior. Este setor “ ... functioned essentially as an appendage of the international market, an enclave which had a little to do with the local milieu in which it was geographically situated.” Os ganhos advindos da maior produtividade “ ... accrued to foreigners, either to overseas consumers of the products (in the form of lower prices) or to the capital-and-ownership elements of the producer as rising net income”.14 14 Glade (1969), p. 250; ver também Bulmer-Thomas (1994), pp. 92-6.

Todavia, é essencial enfatizar que, embora tenham sido altamente desiguais, essas condições iniciais não foram historicamente sem precedentes. Os dados de Kuznets são claros ao mostrar que o Chile em 1980 tinha a porção de renda indo para o primeiro quintil equivalente à observada nos EUA (59%), a Suécia e a Holanda (56%), a Dinamarca (55%) ou o Reino Unido (59%) nas primeiras décadas do século. Ainda que os dados iniciais para a piora inicial da distribuição na Europa sejam menos confiáveis, Williamson (1991WILLIAMSON, Jeffrey (1991) Inequality, Poverty and History. Basil Blackwell.) apresenta estimativas de 42% em 1688, 44,4% em 1759 e 45% em 1801-3, para a porção da renda absorvida pelos 10% mais ricos na Inglaterra e em Gales. Estes não estão longe do pior caso do presente, o Brasil com 46%, e são substancialmente superiores aos relativos a Argentina, Colômbia e Venezuela (ver Tabela 2c). O problema não é o fato de a América Latina ser um caso qualitativamente diferente, mas, sim, o fato de as mudanças cruciais que ocorreram na Europa não terem ocorrido na América Latina. A história recente oferece pouco suporte à Lei de Kuznets.15 15 Ver Fields, Gary e Jakuson (1994), Ranis (1995). Contudo, é notável que os dados mostrem que, a partir dos anos 50, apesar das reformas agrárias dos Estados populistas e da rápida industrialização, a distribuição de renda na América Latina é ainda muito desigual e tem apresentado poucas mudanças. Entender as forças por trás dessa estabilidade ajuda a prever que tipo de impacto as políticas neoliberais provavelmente terão.

4.1 Esforços para Distribuir Riqueza no Século XX

Dada a importância histórica da terra como provedora de renda, foi natural o foco sobre a redistribuição desse ativo. A evidência da experiência asiática sugere que a reforma agrária pode ser efetiva.16 16 A destruição da riqueza na Segunda Guerra Mundial e na Guerra da Coréia é responsável pela manutenção dos coeficientes Gini em torno de 0,35 nestes países no período pós-guerra. A queda nos coeficientes Gini de Taiwan de 0,56 em 1953 para 0,36 em 1964 é devida à significativa reforma agrária do período 1952-1960 (Haggard, 1990; Fishlow, 1995). Contudo, na América Latina, as reformas foram ou incompletas ou executadas sem entusiasmo. As reformas do presidente Cardenas no México, nos anos 30, transferiu títulos de mais de 50% das terras cultiváveis para a massa de camponeses sem terras. Porém, o tamanho inadequado dos lotes, ambiguidade nos direitos de propriedade e a priorização por parte do governo em apoiar projetos de irrigação de médias e grandes propriedades privadas conduziram à estagnação dos “éjidos” comunitários e limitaram ganhos distribucionais de longo prazo.17 17 Ver Reynolds (1970), pp. 141-2. Aspe e Sigmund (1984) argumentam em seus detalhados estudos sobre a distribuição de renda no México que “ ... Cardenas’s successors continued to appeal to the revolutionary tradition of social justice, but they gave more attention to government promotion of economic growth ... The social question was resolved by periodically distributing more land and announcing a new increase in the minimum wage, but more fundamental distributive questions were not faced - often because they were no recognized or documented” (p. 6). A grande reforma agrária de 1974 no Peru tomou uma forma dualista com um terço da terra sendo distribuída para a terça parte dos trabalhadores em melhor situação, deixando os demais excluídos dos benefícios das reformas.18 18 Novamente, sem investimentos complementares, o impacto foi pequeno. Os cálculos de Figueroa para o Peru mostram que, devido à baixíssima produtividade do setor e à ausência de transferências dentro deste setor, a redistribuição de 50% do total das terras agrícolas implica a redistribuição de não mais de l% da renda nacional para os pobres da área rural. Limitada pela impossibilidade de burlar os desafios legais, a reforma colombiana, a mais ambiciosa dentre todas, realizada no final da década de 60 sob o governo de Lleras Restrepo, teve como resultado a distribuição de menos de 1% da terra (Kalmonovitz, 1982KALMONOVITZ, Salomon (1982) El Desarrollo de la Agricultura en Colombia. Bogota, Carlos Valencia.). As reformas no Chile sob os governos de Frei e Allende, embora parcialmente revertidas, tiveram sucesso em eliminar boa parte dos latifúndios. Contudo, a concentração após a redistribuição manteve-se, como no caso do Peru, nas mãos de trabalhadores rurais que já eram relativamente privilegiados e a “generosidade” das indenizações pode obscurecer os efeitos totais (ver Scully, 1992SCULLY, Timothy (1992) Rethinking the Center, Party Politics in Nineteenth and Twentieth Century Chile. Stanford University Press.). Novamente, os resultados, a julgar pela Tabela 2c, não foram significativos. O Brasil fez esforços apenas limitados a favor da distribuição. Na época em que a reforma agrária poderia ter tido um impacto efetivo sobre a distribuição de renda, ela teve um alcance limitado.

Nesse ponto, o processo de industrialização e urbanização tem mudado a estrutura socioeconômica da maioria dos países da América Latina, fazendo a reforma agrária ser provavelmente um método relativamente limitado de redistribuir. Devido à rápida migração, a proporção da população vivendo na área urbana cresceu de 30% em 1940 para cerca de 75% na década de 90. Ao mesmo tempo, a contribuição da agricultura para o PIB declinou continuamente, respondendo por 10% do PIB (Argentina, 6%; México, 8%; Brasil, 11 %). Embora a redistribuição de terra pudesse compensar as desigualdades em certas áreas rurais, isso poderia não ter muita influência na grande equidade global.

O padrão de riqueza não tem mostrado grandes mudanças na medida em que o capital físico substitui a terra como importante fonte de riqueza. A indústria não alterou fundamentalmente a estrutura de poder dentro dos países nem gerou novas classes que poderiam alargar a base dos que se apropriam de parte substancial da riqueza. Como Zeitlin e Ratcliff (1988ZEITLIN, M., & RATCLIFF, R.E. (1988) Landlords and Capitalists: The Dominant Class of Chile. Princeton University Press.) concluíram depois de traçar as relações familiares entre proprietários de terras e as classes industriais do Chile, os dois grupos eram fundamentalmente os mesmos.

Em adição, como Malloy (1972) argumenta, os movimentos populistas foram “never revolutionary in the sense of advocating a radical break with the past anda total overhaul of existing structures” (p. l O). Diaz Alejandro (1970DIAZ ALEJANDRO, Carlos F. (1970) Essays on the Economic History of the Argentine Republic. New Haven, Yale University Press.) oferece o exemplo da Argentina, onde “although property rights were curtailed under Peron, no significant attempts were made to redistribute wealth” (p.125). Igualmente, as reformas revolucionárias do Peru na década de 70 “between them had the combined effect oftransferring not more than two percent of national income to a stratum of modem-sector workers comprising only eight percent of national labor force, and situated in the top quartile of the national income distribution. Somewhat paradoxically, it has been argued that the establishment of public enterprises that would grow to account for Jarge percentages of GDP created a labor elite with its own culture and perquisites that, if anything, had regressive consequences” (ver Baer e Figueroa, 1981BAER, Werner & FIGEROA, Adolfo (1981) “State Enterprise and the Distribution of Income: Brazil and Peru”. ln Bruneau, Thomas C. & Faucher, Philippe (orgs.), Authoritarian Capitalism, Boulder, CO, Westview Press.). Contudo, padrões envolvendo riqueza física são difíceis de mapear e, dado que a distribuição da renda na maior parte deste século reflete a distribuição dos ativos físicos, a Tabela 2 não sugere uma tendência de equalização.

A privatização das grandes empresas estatais tinha o potencial de distribuir o patrimônio do Estado sem “perdedores” óbvios. Em alguns dos mais dinâmicos segmentos do setor urbano industrial, frequentemente se acha um substancial montante da propriedade, em torno de 70% ou mais da porção do mercado, nas mãos de poucas firmas (entre 3 e 6), sendo estas grandes grupos empresariais locais ou corporações multinacionais.19 19 Ver Evans (1979) para uma discussão detalhada da concentração da propriedade na indústria brasileira. Embora argumente-se frequentemente que o processo de privatização trabalha no sentido de difundir a propriedade na América Latina, este tem resultado principalmente na transferência da propriedade das grandes empresas estatais para os grupos oligopolistas domésticos e para firmas multinacionais. Frequentemente existem fundamentos legítimos para isto, tais como: a necessidade de financiar o déficit fiscal com as receitas das privatizações na Argentina, no México e no Chile; para agir rapidamente enquanto a situação política permitia; para dar um forte sinal sobre as intenções das reformas aos investidores locais e internacionais; ou para reduzir a dívida externa através de debt/equity swaps (ver, por exemplo, Petrecolla et al., 1993PETRECOLLA, Alberto; PORTO, Alberto & GERCHUNOFF, Pablo (1993) “Privatization in Argentina”. In Baer, Werner & Conroy, Michael E. (1993) Latin America: Privatization, Property Rights, and Deregulation I. Special Issue of Quarterly Review of Economics and Finance, pp. 67-93.). Existiram apenas poucas tentativas, primordialmente no Brasil e no Chile, em que os trabalhadores participaram da privatização, seja diretamente, por meio da aquisição de ações de empresas em processo de privatização, seja indiretamente, por meio dos fundos de pensão em programas de “capitalismo popular”. O impacto na igualdade foi pequeno devido aos pequenos montantes de riqueza transferidos e devido ao fato de os grupos de trabalhadores que participaram deste processo serem parte de uma porção já privilegiada da força de trabalho20 20 Ver Baer (1994, 1995) e Maloney (1994). .

A ênfase do neoliberalismo na inviolabilidade da propriedade privada como meio de fomentar os investimentos implica que as oportunidades para a redistribuição de ativos físicos são mínimas. Em adição, somente em raros casos do passado a opção oposta gerou resultado contrários.

4.2 Programas de Salários e Bem-Estar Social

Muitas críticas ao neoliberalismo concentram-se no desmantelamento de programas estatais de “promoção do bem-estar” instalados na era populista. A presunção é de que estes tinham um caráter equalizante e o seu enfraquecimento poderia ter o efeito contrário. Nós argumentamos que, apesar da dificuldade de mensuração, existem três razões para acreditar que estas instituições tinham poucos efeitos distributivos e que o seu enfraquecimento está, pelo contrário, na iminência de ter uma importante influência na outra direção.

Primeiro, como Malloy (1977MALLOY, James M. (1977) “Authoritarianism and Corporatism in Latin America: The Modal Pattern”. In Malloy, J. M. (org.) Authoritarianism and Corporatism in Latin America. University of Pittsburgh Press.) argumenta, o populismo foi um movimento de classe média cujas políticas foram estritamente direcionadas rumo ao controle de grupos essenciais ao seu poder de base, frequentemente uma classe de trabalhadores relativamente elitizada. Transferências tendiam a ser das pontas da distribuição para o meio. No México, as medidas adotadas pelo PRI, por meio dos sucessores de Cardenas, para aumentar os salários urbanos permanecem como um exemplo clássico do controle corporativista. Na Argentina, sob o regime de Perón, foi oferecido às massas urbanas: aumento salarial; estabilidade de emprego; amplo sistema de seguridade social; novas oportunidades de educação, recreação e de saúde; e em particular um sentimento de auto respeito e poder político. Todavia, como Diaz Alejandro (1970DIAZ ALEJANDRO, Carlos F. (1970) Essays on the Economic History of the Argentine Republic. New Haven, Yale University Press., p.125, n. 60) observa, “ ... these gains were often obtained at the expense not only of other social classes, but also of economic efficiency and future growth”.21 21 Nos anos subsequentes ao peronismo, tentativas de simular o crescimento econômico por meio de preços relativos favoreceram o setor agrícola exportador e as indústrias não-tradicionais (por exemplo, em termos de crédito, preços, taxa de câmbio e políticas salariais). Ao longo das três décadas após a queda do primeiro governo peronista, as políticas econômicas da Argentina flutuaram entre a estimulação da agricultura e da indústria e o favorecimento do setor assalariado. Dessa forma, os salários, em proporção do PIB, que tinham crescido de 40,9% em 1945 para uma média de 51% no período 1948-1955, gradualmente declinaram para menos de 38,8% em 1959 e, então, cresceram para mais de 40% nos anos do neoperonismo da década de 70. No final dos anos 70, durante o regime militar, esse número caiu para cerca de 30% (Di Tella e Dornbusch, 1989, p. 329). No Brasil, sob o regime autoritário de Getúlio Vargas, o Estado “ ... recognized for the first time a public obligation to care for and protect the poor and underprivileged ... (and) ... designed the institutional framework for Brazil social welfare system”. Mas, aqui novamente, oferecer um lugar privilegiado ao salário dentro do corporativismo organizacional foi feito em nome das indústrias e dos donos de terras, desde que isso “ ... ofered ... ( them) ... the hope of modernizing and industrializing the national economy without losing control to restive workers”.22 22 Erickson e Middlebrook (1982), p. 217. Vargas criou o Ministério do Trabalho, da Indústria e do Comércio com o objetivo de este ser o principal mecanismo de conciliação das disputas entre capital e trabalho. Um sistema de sindicatos patronais foi criado paralelamente aos sindicatos dos trabalhadores. Os contatos entre os dois tomavam lugar nas agências administrativas governamentais e pessoas ligadas ao governo estabeleciam que em vez de” ... resolving conflicts through strikes and trials of strength ... disputes should be adjudicated administratively so as to better serve the national interest” (p. 218). A intenção não foi equidade e os resultados refletem isso.

O impacto na distribuição de políticas salariais populistas deve ser visível nos números relativos à renda bruta. Contudo, nos dois casos em que temos dados comparáveis de maneira geral, a evidência é de que a elite trabalhista foi mais beneficiada. Para o México, a sobreposição das séries de Reynolds de 1950-63 e Aspe de 1963-77 permite alguma confiança de que estas duas séries são comparáveis. Nesse período, os coeficientes Gini permaneceram constantes de maneira geral devido à histórica redistribuição tanto do mais rico quanto do mais pobre quintil (este caindo de 6,1 % para 2,9%) para os quintis intermediários. Nos períodos de mais alta mobilização de Frei e Allende no Chile, em que a sindicalização cresceu em número e intensidade (Scully, 1992SCULLY, Timothy (1992) Rethinking the Center, Party Politics in Nineteenth and Twentieth Century Chile. Stanford University Press.), a Tabela 2c mostra algum movimento no coeficiente Gini. Contudo, o período de Allende é esclarecedor de que, novamente, toda queda na participação dos mais ricos 20%, e em alguma magnitude do mais pobre quintil, foram absorvidas pelos terceiro e quarto quintis.

Segundo, a extensão e impactos dos programas estatais de bem-estar foram severamente restringidos pela escassez de recursos fiscais. Sob o governo de Vargas, agências de bem-estar social foram criadas para dar assistência médica, prover moradia e administrar pensões trabalhistas. Todavia, os formuladores de políticas não consideraram as expectativas de falta de fundos. Em toda a América Latina, sistemas de seguridade social foram criados sem o devido suporte de recursos e hoje estes dirigem implicitamente os déficits que somam altas percentagens dos PIB. Novamente muitos desses programas não se estendiam para os grandes setores informais rurais e urbanos e, da mesma maneira que a política salarial, conduziam as transferências de renda para o terceiro e o quarto quintis.

O frequente retorno ao processo de financiamento inflacionário tinha grandes impactos distribucionais devido ao fato de implicitamente se taxar o setor mais pobre da economia (que mantém uma maior porção dos ativos em moeda) e devido ao efeito Oliveira-Tanzi, reduzindo a coleta real de impostos. Ahumada et al. (1993AHUMADA, Hildegart; CANAVESE, Alfredo; SANGUINETTI, Pablo & ESCUDERO, Walter Sosa (1993) “Efectos Distributivos de Impuesto Inflacionario”. Anafes de La Asociacion Argentina de Economia-Política, Universidad Nacional de Tucuman, t. II.) calcularam para a Argentina que o quintil mais pobre paga, em média, três vezes mais o imposto inflacionário que o quintil mais rico: para uma taxa inflacionária de 100% ao ano, cerca de 2% e 0,7% do PIB, respectivamente, e para episódios hiperinflacionários, acima de 3% e l% respectivamente. Estimativas do efeito Oliveira-Tanzi variam de 2% a 6,1% em contextos hiperinflacionários, reduzindo drasticamente impostos no topo da distribuição. Para feito comparativo, gastos em saúde e educação no México, que representam mais de 85% de todos os gastos sociais, caíram 1,7 pontos percentuais do PIB (de 7,3% para 5,6%) durante o ajustamento (de 1982 para 1990), que reduziu as taxas de inflação de mais de 100% para níveis de apenas um dígito (Lustig, l992LUSTIG, Nora (1992) Mexico: the Remaking of an Economy. Washington, D.C., The Brookings Institution.). Até mesmo se esses cortes caíssem inteiramente em serviços para os muito pobres, não seria esperado que eles compensassem a redução da ação do imposto inflacionário sobre estes grupos. Como uma consideração final, a inflação também mina o impacto de leis de salário mínimo que poderiam frequentemente deixar para trás a inflação.23 23 Skidmore (1968) oferece uma breve descrição de como a legislação trabalhista brasileira manteve os trabalhadores sob o controle governamental e tornou possível a compressão dos salários reais nos tempos dos programas de austeridade; ver pp. 33-5. Isso pode ser visto claramente na experiência socialista de Allende, em que, apesar da decretação de maiores salários e programas sociais, os salários reais caíram 40% em 1973, isto é, antes do golpe, devido a uma indexação imperfeita.

Embora os números disponíveis relativos à renda bruta não permitam a estimação dos impactos totais sobre a renda desses benefícios e programas de subsídios, uma estratégia alternativa pode ser adotada: perguntar “se as transferências fossem financiadas de modo transparente, com impostos e com poucas distorções, por meio de subsídios, qual seria uma transferência sustentável, e qual seria a magnitude do imposto na distribuição da renda?”. Os números americanos oferecem uma ideia da ordem e magnitude que podemos esperar. Em 1980, antes das mudanças nos impostos regressivos e dos déficits fiscais persistentes, o impacto total dos impostos e das transferências foram reduzir o Gini em aproximadamente 0,08 e reduzir o tamanho do quintil superior em 5,8 pontos percentuais (Gramlich, Kasten e Sammartino, 1993GRAMLICH, Edward M.; KASTEN, Richard & SAMMARTINO, Frank (1993) “Growing Inequality in the 1980’s: The Role of Federal Taxes and Cash Transfers”. In Danziger, Sheldon & Gottshalk, Peter (orgs.) Uneven Tides: Rising Inequality in America. New York, Russell Sage Foundation.). Mesmo que não insignificantes, eles não são grandes o suficiente para poderem ser a solução dos profundos problemas de distribuição da América Latina. Direcionar para baixo os níveis de renda líquida do quintil superior, de forma que este alcance os níveis americanos, poderia requerer transferências três ou quatro vezes maiores. Se essas magnitudes fossem plausíveis os governos latino-americanos poderiam não ter recorrido aos altos níveis de endividamento, inflação e distorção de preços em que incorreram.24 24 A tradicional fraqueza do Estado latino-americano tinha tido uma habilidade limitada em reforçar a transição progressiva e, como Fishlow (1972) frisou, a possibilidade de as políticas governamentais convencionais fazerem grandes evoluções em termos de equidade é pequena. O Chile fez um esforço substancial para direcionar, após a transição para a democracia, o “débito social” de cerca de 3% do PIB dentro do contexto de política macroeconômica sólida.

Isso nos conduz ao terceiro fator explicativo do fato de a redução no antigo papel do Estado como redistribuidor de renda não dever ser muito enfatizado como um atraso para a igualdade. A história sugere que os programas governamentais convencionais, como os da era populista, poderiam ter uma importância secundária na condução dos movimentos da oferta e demanda de fatores. Os grandes movimentos nos coeficientes Gini europeus foram observados (pre-tax) e, como Williamson e Lindert (1985LINDERT, Peter H. & WILLIAMSON, Jeffrey G. (1985) “Growth, Equality, and History”. Explorations in Economic History, 22, pp. 341-377.) argumentam, os incrementas na Inglaterra no final do século XIX e nos Estados Unidos na década de 20 ocorreram antes do estabelecimento de fortes sindicatos e das políticas do New Deal. A transferência americana total, discutida acima, equivale a uma década (por exemplo, 1935-1950) da evolução na distribuição (pre-tax) na Europa e nos Estados Unidos.

Em particular, Lindert e Williamson colocam que os movimentos nos níveis de salários relativos entre trabalhadores qualificados e não-qualificados são as forças motoras por trás dos movimentos na igualdade nos dois países. Seus argumentos enfatizam a particularidade da tecnologia dirigindo a alocação dos fatores, o que pode incrementar a demanda por trabalhadores mais qualificados, enquanto as indústrias que empregam trabalhadores com baixa qualificação, como a agricultura, crescem muito mais vagarosamente. No lado da oferta, entra a oferta de trabalhadores não-qualificados, influenciada principalmente pela imigração, e de trabalho qualificado crescente (skill deepening). Como exemplo destes modelos,25 25 Ver Fishlow (1996) para discussão e Anand e Kanbur (1993) como um exemplo. Ver também Adelman e Morris (1973). histórias críveis podem ser contadas para os EUA, para o Reino Unido e para o Japão, onde as curvas de Kuznets não apareceram, e para Hong Kong e Cingapura, onde o padrão é revertido.26 26 Oshima (1991), p.120, e Haggard (1990) argumentam que a impossibilidade de fluxo dos trabalhadores desqualificados da China mantém baixos os seus salários. O ponto não é escolher um modelo particular, mas somente estabelecer que esses parecem ser os mais importantes em uma perspectiva histórica e provavelmente devem ser o principal foco de uma comparação entre neoliberalismo e as prévias estruturas da América Latina. Não é óbvio que aquele irá oferecer menos espaço para otimismo.

5. DETERMINANTES ESTRUTURAIS DA EQuIDADE

5.1 Políticas de Industrialização e Equidade

A maioria dos países da América Latina busca modelos de substituição de importações como principal estratégia de desenvolvimento. As políticas seguintes foram heterodoxas e interferiram diretamente no mercado. Estas incluíram: proteções de vários tipos; incentivos especiais para os capitais externo e local que investiram nas indústrias protegidas; estabelecimento de empresas estatais nos setores de exploração de recursos naturais, utilidades públicas, indústrias em geral (tais como aço e petroquímica); estabelecimento de bancos governamentais de desenvolvimento e comerciais; financiamento dos déficits governamentais pelo Banco Central, causando o aumento da inflação; sobrevalorização da taxa de câmbio com o objetivo de taxar as exportações de produtos primários, além de subsidiar as novas indústrias que precisavam de insumos importados baratos; e manutenção das taxas de empréstimos abaixo do valor de mercado, com o objetivo de financiar a acumulação de capital.27 27 Para um maior detalhamento do MSI na América Latina, ver: Baer (1995); Berry (1983); Diaz Alejandro (1970); Reynolds (1970).

Embora a industrialização sob o modelo de substituição de importações tenha produzido períodos de altas taxas de crescimento e substanciais mudanças estruturais (isto é, a porção do PIB relativa ao setor industrial cresceu de menos de 20% para mais de 35%, enquanto o setor agrícola diminuiu sua participação de mais de 25% para algo em torno de 10%), seus críticos chamam atenção às suas ineficiências e à possibilidade de, frequentemente, estas terem consequências distribucionais negativas (Haggard, 1990HAGGARD, Stephan (1990) Pathways from the Periphery. Ithaca, N.Y, Cornell University Press.; Baer, 1995BAER, Werner (1995) The Brazilian Economy: Growth and Development. Westport, Connecticut, Praeger, 4’ ed.). A maioria das estratégias do MSI foram conduzidas indiscriminadamente, isto é, sem considerar os setores em que os países poderiam ter vantagens comparativas potenciais. Isso resultou no estabelecimento de muitas indústrias ineficientes, oferecendo ganhos de monopólio para os proprietários do capital e gerando um viés para o estabelecimento de firmas capital-intensivas no processo de industrialização. Um viés que também conduz a uma demanda por mão-de-obra qualificada artificialmente elevada. Taxas de câmbio sobrevalorizadas prejudicaram os setores exportadores tradicionais, impediram o crescimento das exportações não-tradicionais e conduziram à estagnação do setor agrícola, uma fonte de empregos para trabalhadores não-qualificados. Tomadas em conjunto, essas medidas tinham o efeito de ampliar o diferencial entre os salários dos trabalhadores qualificados e não-qualificados. Embora a partir da segunda metade dos anos 60 algumas medidas corretivas tenham sido adotadas em alguns países, é improvável que essas tendências tenham sido alteradas.

A teoria neoclássica do comércio internacional oferece fundamentos para imaginar-se que uma economia mais aberta, orientada para o mercado, deve ser mais justa no que se refere à distribuição de renda: países em desenvolvimento irão se especializar na produção de bens menos intensivos em conhecimento, cujos preços devem crescer com o comércio, e darão menos atenção aos bens intensivos em capital/conhecimento, cujos preços relativos devem cair. O retorno do capital/trabalho qualificado deve cair em relação ao trabalho desqualificado. Se isso é verdade, o livre-comércio tem conduzido ao aumento da desigualdade nos EUA devido ao crescimento da competição dos bens intensivos em trabalho desqualificado, diminuindo o salário dos trabalhadores desqualificados nos EUA. Então, o efeito contrário deve ser verdade para os países subdesenvolvidos. De fato, os efeitos no equilíbrio geral podem ser muito mais complicados (ver Richardson, 1995RICHARDSON, J. David (1995) “Income Inequality and Trade: How to Think, What to Conclude”. Journal of Economic Perspectives, nº 9, vol. 3, Summer.), e os impactos das transferências tecnológicas ou do crescimento endógeno, que está recebendo uma atenção crescente na literatura, são difíceis de antecipar. O que podemos dizer, contudo, é que, no longo prazo, maiores impactos sobre a distribuição aparecem, resultados desses efeitos, e eles provavelmente merecem mais atenção do que os tópicos relacionados à estabilização no curto prazo.

5.2 Considerações sobre a Oferta de Trabalho: Crescimento Populacional, Educação e o Setor de Serviços

As fontes dos diferenciais de salários estão, em grande parte, relacionadas às ofertas relativas da mão-de-obra qualificada e desqualificada. Duas características da região são provavelmente importantes, mas estas não são intrinsecamente relacionadas a qualquer estratégia de industrialização particular. Primeiro, como o modelo de Lewis antecipa, salários de trabalhadores desqualificados permanecerão em baixa quando as altas taxas de crescimento populacional oferecerem uma oferta de trabalho desqualificado suficiente.

O segundo tem relação com skill deepening e o acesso à educação em geral. Nos países industrializados, a parte mais volumosa do estoque de capital está agora em capital humano, mais do que em terra ou em ativos físicos, e esse é o único ativo cuja distribuição pode ser equalizada por meios relativamente contínuos. O retorno para esse ativo é representado por maiores salários. No mercado de trabalho como um todo, níveis crescentes de educação aumentam a oferta de trabalho qualificado, reduzem a oferta de desqualificados, e assim comprime o diferencial dos salários dos trabalhadores qualificados/desqualificados.

O crescimento do estoque de capital humano é especialmente importante para a produtividade no setor de serviços, em que a terra e o capital físico são relativamente sem importância. Na maioria dos países da região, o setor de serviços responde por mais de 50% do PIB e emprega entre 45% e 55% da população economicamente ativa (78% nos EUA). Esses percentuais estão crescendo ao longo do tempo (ver Baer e Samuelson, 1981BAER, Werner & FIGEROA, Adolfo (1981) “State Enterprise and the Distribution of Income: Brazil and Peru”. ln Bruneau, Thomas C. & Faucher, Philippe (orgs.), Authoritarian Capitalism, Boulder, CO, Westview Press.). As tendências dos salários nesse setor será um importante fator na evolução da distribuição de renda na América Latina.

Até hoje, a distribuição do capital humano também tem sido desigual na América Latina. Enquanto as matrículas nas escolas secundárias nos países desenvolvidos, em 1990, estiveram entre 75% e 100%, 94% na Coréia (1985), 72% em Cingapura (1981), na América Latina foi somente entre 30% e 50%; enquanto as matrículas nas universidades dos países industrializados foram entre 35% e 75% (o último nos EUA) e 32% na Coréia, foi de em média 14% na América Latina. Enquanto o número médio de anos de escolaridade na América Latina foi de 5,8 anos em 1987, foi perto dos 10 anos nos países industrializados. Tais medidas quantitativas dizem pouco sobre a qualidade da educação. No caso do Brasil, por exemplo, um estudo achou que “ ... estimated private rate of return for years of schooling in the labor market falls from 20,5% to 11% if school quality is controlled ... (and) ... the social rate of return for quality is as high as or even higher than the social rate of return for years of schooling ... “. Outra qualificação da efetividade do sistema educacional é o fato de a América Latina ter taxas de repetência extremamente altas nas escolas primárias: 42% para o primeiro ano e 29% para todo o primário (1990).28 28 Inter-American Development Bank (1993), p. 198-218.

A importância do capital humano parece ser confirmada pelos recentes estudos econométricos que consideram a educação a principal variável explicativa da desigualdade de renda. Como um recente exemplo, Fiszbein e Psacharopoloulos (1995FISZBEIN, Ariel & PSACHAROPOULOS, George (1995) “Income Inequality in Latin American in the l980s”. ln Lustig, Nora (org.) (1995) Coping With Austerity: Poverty and Inequality in Latin America. Washington, D.C., The Brookings Institution, pp. 71-100.) acharam uma” ... overwhelming preeminence of education as a contributing factor ... one-fourth of total inequality can be explained as inequality between individuals with different levels of schooling” (pp. 71-100). Como Berry e Urrutia mencionaram, tais resultados devem ser interpretados com cuidado uma vez que é muito difícil separar os impactos da educação dos associados a fatores sociais tais como família e riqueza física. Talvez as evidências mais convincentes surjam da coincidência dos skills deepening e da equalização observada nas séries temporais dos EUA e do Reino Unido29 29 Williamson e Lindert afirmam, por exemplo, que “The rate of skill deepening reached impressive levels in the era following the educational reforms of the l870’s coinciding with the first drop down Britain’s Kuznets Curve. The American correlation looks similar, though the turning points come later, well into the 20th century both for the rate of skills deepening and the leveling of incomes” (p. 356). ou das regressões setoriais dos coeficientes Gini nos níveis educacionais (ver, como exemplo, Fishlow, 1995FISHLOW, Albert (1995) “Inequality, Poverty, and Growth: Where do We Stand?” Annual World Bank Conference on Development Economics, The World Bank.).

O fato de esta evidência não ser importante no caso chileno pode dever-se às extraordinárias mudanças ocorridas durante esse período, em particular os frequentemente negligenciados impactos do crescimento da competição e da reforma na educação30 30 Embora Morely (1994) refira-se ao tremendo incremento no nível de educação no Chile como tendo um forte impacto sobre a distribuição e a pobreza, os dados não são claros. Se nós assumirmos algum intervalo de tempo no impacto da educação, então a expansão das oportunidades de educação ocorrida no Chile entre 1950-70 deve ser perceptível nos números sobre distribuição de renda. A estimativa é de que as matrículas em escolas primárias cresceram de 65% para 96% e nas secundárias de 13% para 33% ao longo desse período (ver Raczinski, 1994). Contudo, novamente, as diferenças nos coeficientes Gini ao longo do período são insignificantes. . Embora os modelos de Heckscher-Ohlin e de Samuelson previssem a compressão dos salários relativos, à medida que o preço relativo dos bens intensivos em trabalho desqualificado aumentasse relativamente aos outros bens, o efeito reverso tem sido achado no Chile e no México: um crescimento dramático no diferencial do salário relativo entre trabalhadores desqualificados e qualificados parece acompanhar as reformas.31 31 No Chile, Robbins (1994) achou que existiram substanciais mudanças na distribuição dos empregos, com a porção dos empregos na produção e nos serviços caindo e a porção dos empregos para profissionais liberais e para gerentes crescendo a grandes proporções, com salários relativos crescendo na mesma direção. Cragg e Epelbaum (1995) acharam que no México de 1987 a 1993 os salários relativos de universitários formados mais que duplicou, enquanto aqueles com menos educação tiveram progressivas perdas no crescimento salarial. Isso pode refletir o fato de que agora são os maiores retornos de mercado que definem as rendas mais altas, isto é, não são as conexões que as definem. É discutível que o capital humano seja o principal meio de distribuir renda, uma economia aberta e dirigida para o mercado pode garantir seu efeito total, embora com efeitos regressivos durante a transição.

6. CONCLUSÃO

Deve ser enfatizado que não estamos argumentando que a distribuição de renda na América Latina não piorou nas últimas duas décadas. Os dados são claros neste ponto. Argumentamos, contudo, que somente com mais tempo o impacto de longo prazo das próprias políticas de liberalização, sem os efeitos das políticas de estabilização ou dos impactos transicionais, serão mensuráveis, quando então os movimentos observados serão menores tanto no padrão histórico quanto no global. Não podem ser creditados às políticas neoliberais nem os efeitos regressivos sobre a renda nem, mais fundamentalmente, o nível de desigualdade da América Latina: como temos argumentado, estes têm uma longa tradição. Na direção oposta, conforme argumentamos, estão os dados que sugerem que a ênfase no direito de propriedade, a redução da participação governamental ou a redução na proteção às indústrias de altos salários têm efeitos reversos sobre as tendências iniciais que apontam para a desigualdade.

A demanda e oferta de trabalho qualificado serão de grande importância. Em economias crescentemente urbano-industriais, especialmente aquelas com um grande setor de serviços, os ativos tradicionais (principalmente a terra) perdem importância enquanto a distribuição do capital humano assume uma fundamental importância. Esse processo, que atribui ao Estado o papel de criar capital humano, oferece a possibilidade de uma sociedade mais equitativa. Há argumentos a favor de que a racionalização da economia por meio de políticas neoliberais proverá um melhor cenário em que isto possa ter lugar.

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  • ZEITLIN, M., & RATCLIFF, R.E. (1988) Landlords and Capitalists: The Dominant Class of Chile. Princeton University Press.
  • 1
    Ver Baer (1994BAER, Werner (1994) “Privatization in Latin America”. The World Economy, nº 17, vol. 4, jul, pp. 509-28.), Baer e Birch (1994BAER, Werner & H. BIRCH, Melissa (orgs.) (1994) Privatization in Latin America: New Roles for the Public and Private Sectors. Westport, CT, Praeger.) e Baer e Conroy (1993, 1994BAER, Werner & E. CONROY, Michael (orgs.) (1993, 1994) “Latin America: Privatization, Property Rights, and Deregulation”, The Quarterly Review of Economics and Finance. Special Issues, vols. 33-34.).
  • 2
    A proteção nominal total em 1960 foi de 168% no Brasil, 131% na Argentina e 138% no Chile. O Chile abriu sua economia logo após o golpe militar de 1973, eliminando todas as cotas de importações em 1976 e implementando uma tarifa uniforme de 10% para a maioria dos produtos. As tarifas argentinas foram reduzidas a partir de outubro de 1988 e as mais importantes foram abolidas, e, em 1991, um sistema de tarifas de três níveis foi implantado (0%, 11% e 22%). O Brasil começou a liberalizar o seu comércio no início de 1990, quando as tarifas médias caíram de 25% em 1990 para 14% em 1994. O México eliminou muitas de suas cotas na segunda metade da década de 80 e, em 1988, as tarifas foram reduzidas para uma média de 11%.
  • 3
    Onde o ajustamento é devido a alguns choques externos - o rápido aumento na taxa de juros internacional ou movimentos adversos nas relações de troca -, a questão de quem paga o custo do ajustamento é complicada e é um outro importante tópico. Mas, novamente, não há necessariamente uma relação entre os ajustes necessários e a liberalização.
  • 4
    Ver de Janvry e Sadoulet (1995DE JANVRY, Alain & SADOULET, Elisabeth (1995) “Growth Poverty and Inequality in Latin America: A Causal Analysis, 1970-94”. U.C. Berkeley, mimeo.), Psacharopoloulos et al. (1995PSACHAROPOLOULOS, George; MORLEY, Samuel; FISZBEIN, Ariel; LEE, Haeduck & WOOD, William “Poverty and Income Inequality in Latin America during the l 980’s”. Review of Income and Wealth, Series 41, nº 3, September.), Altimir (1994ALTIMIR, Oscar (1994) “Income Distribution and Poverty through Crisis and Adjustment”. Cepal Review 52, abr., pp. 7-32.).
  • 5
    A Colômbia oferece um caso de liberalização em um ambiente macroeconômico razoavelmente estável.
  • 6
    Ver, entre outros, Lustig (1992LUSTIG, Nora (1992) Mexico: the Remaking of an Economy. Washington, D.C., The Brookings Institution.), p. 94., Dornbusch (1982DORNBUSCH, Rudiger (1983) “Comments”. In Williamson, John (org.), IMF Conditionality, Washington, Institute for International Economics, pp. 223-7.)
  • 7
    Edwards e Edwards (1991EDWARDS, Sebastian & EDWARDS, Alejandra Cox (1991) Monetarism and Liberalization: The Chilean Experiment. The University of Chicago Press.) e Conley e Maloney (1995CONLEY, John P. & MALONEY, William F. (1995) “Optimal Sequencing of Credible Reforms with Uncertain Outcomes”. Journal of Development Economics, vol. 48.).
  • 8
    Ver Choksi e Papagiorgiou (1986CHOKSl, A., & PAPAGIORGIOU, D. (orgs.) (1986) Economic Liberalization in Developing Countries. Oxford, Basil Blackwell.) Edwards (1984EDWARDS, Sebastian (1984) “The Order of Liberalization of the External Sector in Developing Countries”. Princeton Essays in International Finance, nº 156.) e Conley e Maloney (1995CONLEY, John P. & MALONEY, William F. (1995) “Optimal Sequencing of Credible Reforms with Uncertain Outcomes”. Journal of Development Economics, vol. 48.).
  • 9
    O governo chileno gastou, após o colapso de 1982, 1,4% do PIB empregando cerca de 13% da força de trabalho. Outros esquemas adotados na região foram o Solidariedad no México, o fundo social de emergência da Bolívia, o programa temporário de suporte da renda do Peru ou os comparáveis programas em Gana e Madagáscar. World Bank (1990WORLD BANK World Development Report, (vários anos).), pp. 118-9.
  • 10
    Embora nossa análise aqui se concentre nas questões distribucionais, também deve ser dito que estudos recentes têm mostrado que, ao longo dos anos 80 e no início dos anos 90, muitos países latino-americanos presenciaram um crescimento na proporção de suas populações que vivem abaixo da linha de pobreza. De acordo com o Banco Mundial, a porcentagem da população da América Latina abaixo do nível de pobreza cresceu de 22,4% em 1985 para 25,5% em 1990 e para 35% em 1992; para a Argentina, a proporção cresceu de J 6,2% no início dos anos 80, para J 7,6% no início dos anos 90; para o Brasil, de 39% para 43%. As exceções foram Chile e Colômbia, onde a proporção dos pobres declinou de 28% para 24% e de 33,8% para 32,7% respectivamente. Ver Banco Mundial (1990, 1992); e Finance and Development, março de 1995, p. 8.
  • 11
    Para uma derivação mais completa e geral, ver Lambert (1993LAMBERT, Peter J. (1993) The Distribution and Redistribution of Income, A Mathematical Analysis. New York, Manchester University Press.).
  • 12
    A América Latina tem hoje a estrutura de produto ou de emprego equivalente à dos EUA entre 1900 e 1940.
  • 13
    Esta concentração foi conseqüência de “ ... the fortuitous occurrence of rich mining strikes, the extent of monopolization in cornmercial intercourse, and the latifundian land ternure system (which) served to concentrate the remaining wealth and income among a relatively reduced number of units in the private sector.” E “ ... the aristocratic landowners, by the custom of maintaining permanent residences in the central cities ... not only appropriated almost the entire amount of the disposable money income generated in agriculture, but also funneled its flow into the major cities” (Glade, 1969GLADE, William P. (1969) The Latin American Economies: A Study of their Institutional Evolution. New York, American Book, Van Nostrand, Reinhold., p.135).
  • 14
    Glade (1969GLADE, William P. (1969) The Latin American Economies: A Study of their Institutional Evolution. New York, American Book, Van Nostrand, Reinhold.), p. 250; ver também Bulmer-Thomas (1994BULMER-THOMAS, Victor (1994) The Economic History of Latin America Since Independence. Cambridge University Press.), pp. 92-6.
  • 15
    Ver Fields, Gary e Jakuson (1994FIELDS, Gary & JAKUSON, George (1994) “New Evidence on the Kuznets Curve”. Ithaca, N.Y., mimeo.), Ranis (1995RANIS, Gustav (1995) “Comments on A. Fishlow”. In Annual World Bank Conference on Development Economics, The World Bank.).
  • 16
    A destruição da riqueza na Segunda Guerra Mundial e na Guerra da Coréia é responsável pela manutenção dos coeficientes Gini em torno de 0,35 nestes países no período pós-guerra. A queda nos coeficientes Gini de Taiwan de 0,56 em 1953 para 0,36 em 1964 é devida à significativa reforma agrária do período 1952-1960 (Haggard, 1990HAGGARD, Stephan (1990) Pathways from the Periphery. Ithaca, N.Y, Cornell University Press.; Fishlow, 1995FISHLOW, Albert (1995) “Inequality, Poverty, and Growth: Where do We Stand?” Annual World Bank Conference on Development Economics, The World Bank.).
  • 17
    Ver Reynolds (1970REYNOLDS, Clark W. (1970) The Mexican Economy: Twentieth Century Structure and Growth. New Haven, Yale University Press.), pp. 141-2. Aspe e Sigmund (1984ASPE, Pedro & SIGMUND, Paul E. (orgs.) (1984) The Political Economy of Income Distribution in Mexico. New York, Holmes & Meier Publishers, Inc.) argumentam em seus detalhados estudos sobre a distribuição de renda no México que “ ... Cardenas’s successors continued to appeal to the revolutionary tradition of social justice, but they gave more attention to government promotion of economic growth ... The social question was resolved by periodically distributing more land and announcing a new increase in the minimum wage, but more fundamental distributive questions were not faced - often because they were no recognized or documented” (p. 6).
  • 18
    Novamente, sem investimentos complementares, o impacto foi pequeno. Os cálculos de Figueroa para o Peru mostram que, devido à baixíssima produtividade do setor e à ausência de transferências dentro deste setor, a redistribuição de 50% do total das terras agrícolas implica a redistribuição de não mais de l% da renda nacional para os pobres da área rural.
  • 19
    Ver Evans (1979EVANS, Peter (1979) Dependent Development: The Alliance of the Multinational State and Local Capital in Brazil. Princeton University Press.) para uma discussão detalhada da concentração da propriedade na indústria brasileira.
  • 20
    Ver Baer (1994BAER, Werner (1994) “Privatization in Latin America”. The World Economy, nº 17, vol. 4, jul, pp. 509-28., 1995BAER, Werner (1995) The Brazilian Economy: Growth and Development. Westport, Connecticut, Praeger, 4’ ed.) e Maloney (1994MALONEY, William (1994) “Privatization with Share Diffusion: Popular Capitalism in Chile, 1985-1988”. ln Baer, Werner & Birch, Melissa (orgs.) Privatization in Latin America, Westport, CT, Praeger.).
  • 21
    Nos anos subsequentes ao peronismo, tentativas de simular o crescimento econômico por meio de preços relativos favoreceram o setor agrícola exportador e as indústrias não-tradicionais (por exemplo, em termos de crédito, preços, taxa de câmbio e políticas salariais). Ao longo das três décadas após a queda do primeiro governo peronista, as políticas econômicas da Argentina flutuaram entre a estimulação da agricultura e da indústria e o favorecimento do setor assalariado. Dessa forma, os salários, em proporção do PIB, que tinham crescido de 40,9% em 1945 para uma média de 51% no período 1948-1955, gradualmente declinaram para menos de 38,8% em 1959 e, então, cresceram para mais de 40% nos anos do neoperonismo da década de 70. No final dos anos 70, durante o regime militar, esse número caiu para cerca de 30% (Di Tella e Dornbusch, 1989DI TELLA, Guido & DORNBUSCH, Rudiger (orgs.) (1989) The Political Economy of Argentina, 1946-83. University of Pittsburgh Press., p. 329).
  • 22
    Erickson e Middlebrook (1982ERICKSON, Kenneth Paul & MIDDLEBROOK, Kevin J. “The State and Organized Labor in Brazil and Mexico”. In Hewlett, Sylvia Ann & Weinert, Richard S. (orgs.) (1982) Brazil and Mexico: Patterns in Late Development. Philadelphia: Institute for the Study of Human Issues.), p. 217. Vargas criou o Ministério do Trabalho, da Indústria e do Comércio com o objetivo de este ser o principal mecanismo de conciliação das disputas entre capital e trabalho. Um sistema de sindicatos patronais foi criado paralelamente aos sindicatos dos trabalhadores. Os contatos entre os dois tomavam lugar nas agências administrativas governamentais e pessoas ligadas ao governo estabeleciam que em vez de” ... resolving conflicts through strikes and trials of strength ... disputes should be adjudicated administratively so as to better serve the national interest” (p. 218).
  • 23
    Skidmore (1968SKIDMORE, Thomas E. (1988) The Politics of Military Rule in Brazil, 1964-85. New York, Oxford University Press.) oferece uma breve descrição de como a legislação trabalhista brasileira manteve os trabalhadores sob o controle governamental e tornou possível a compressão dos salários reais nos tempos dos programas de austeridade; ver pp. 33-5.
  • 24
    A tradicional fraqueza do Estado latino-americano tinha tido uma habilidade limitada em reforçar a transição progressiva e, como Fishlow (1972FISHLOW, Albert (1972) “Brazilian Size Distribution of Income”. American Economic Review, Papers and Proceedings, maio.) frisou, a possibilidade de as políticas governamentais convencionais fazerem grandes evoluções em termos de equidade é pequena. O Chile fez um esforço substancial para direcionar, após a transição para a democracia, o “débito social” de cerca de 3% do PIB dentro do contexto de política macroeconômica sólida.
  • 25
    Ver Fishlow (1996) para discussão e Anand e Kanbur (1993ANAND, S. & KANBUR, S.M.R. (1993) “The Kuznets Process and the Inequality-Development Relationship”. Journal of Development Economics, nº 40, pp. 25-52.) como um exemplo. Ver também Adelman e Morris (1973ADELMAN, Irma & MORRIS, Cynthia Taft (1973) Economic Growth & Social Equity in Developing Countries. Stanford University Press.).
  • 26
    Oshima (1991OSHIMA, Harry T. (1991) “Kuznet’s Curve and Asian Income Distribution”, In Mizoguchyi, Toshiyuki (org.) Making Economies More Efficient and More Equitable: Factors Determining income Distribution. Tokyo, Kinokuniya Company LTC and Oxford University Press.), p.120, e Haggard (1990HAGGARD, Stephan (1990) Pathways from the Periphery. Ithaca, N.Y, Cornell University Press.) argumentam que a impossibilidade de fluxo dos trabalhadores desqualificados da China mantém baixos os seus salários.
  • 27
    Para um maior detalhamento do MSI na América Latina, ver: Baer (1995BAER, Werner (1995) The Brazilian Economy: Growth and Development. Westport, Connecticut, Praeger, 4’ ed.); Berry (1983BERRY, Albert & SOLIGO, Roland (1980) “The distribution of income in Colombia: an overview”. In Berry, Albert & Soligo, Ronald (orgs.) Economic Policy and Income Distribution in Colombia. Boulder, Westview Press, pp.1-48.); Diaz Alejandro (1970DIAZ ALEJANDRO, Carlos F. (1970) Essays on the Economic History of the Argentine Republic. New Haven, Yale University Press.); Reynolds (1970REYNOLDS, Clark W. (1970) The Mexican Economy: Twentieth Century Structure and Growth. New Haven, Yale University Press.).
  • 28
    Inter-American Development Bank (1993INTER-AMERICAN DEVELOPMENT BANK (1993) Economic and Social Progress in Latin America: 1993 Report. Special Section: Human Resources, pp. 187-255.), p. 198-218.
  • 29
    Williamson e Lindert afirmam, por exemplo, que “The rate of skill deepening reached impressive levels in the era following the educational reforms of the l870’s coinciding with the first drop down Britain’s Kuznets Curve. The American correlation looks similar, though the turning points come later, well into the 20th century both for the rate of skills deepening and the leveling of incomes” (p. 356).
  • 30
    Embora Morely (1994) refira-se ao tremendo incremento no nível de educação no Chile como tendo um forte impacto sobre a distribuição e a pobreza, os dados não são claros. Se nós assumirmos algum intervalo de tempo no impacto da educação, então a expansão das oportunidades de educação ocorrida no Chile entre 1950-70 deve ser perceptível nos números sobre distribuição de renda. A estimativa é de que as matrículas em escolas primárias cresceram de 65% para 96% e nas secundárias de 13% para 33% ao longo desse período (ver Raczinski, 1994RACZYNSKI, Dagmar (1994) “Social Policies in Chile”. In Democracy and Social Policy Series, Kellogg Institute, Working Paper nº 4, Fali.). Contudo, novamente, as diferenças nos coeficientes Gini ao longo do período são insignificantes.
  • 31
    No Chile, Robbins (1994ROBBINS, Donald (1994) “Earnings Dispersion in Chile after Trade Liberalization”. Harvard University, mimeo.) achou que existiram substanciais mudanças na distribuição dos empregos, com a porção dos empregos na produção e nos serviços caindo e a porção dos empregos para profissionais liberais e para gerentes crescendo a grandes proporções, com salários relativos crescendo na mesma direção. Cragg e Epelbaum (1995CRAGG, Michael & EPELBAUM, Mario (1995) “Wage and Employment Dynamics in Mexico”. Columbia University, mimeo.) acharam que no México de 1987 a 1993 os salários relativos de universitários formados mais que duplicou, enquanto aqueles com menos educação tiveram progressivas perdas no crescimento salarial.
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    Nós gostaríamos de agradecer a Donald Coes, Gustavo Borges Rangel e a Ralf Weber pelos vários comentários e sugestões úteis. Tradução: Paulo Frederico Bastos Soares, economista formado pela Universidade Federal de Pernambuco.
  • 33
    JEL Classification: F62; F66; O11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 1997
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