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Mortes por homicídios: série histórica1 1 Artigo extraído da tese de Doutorado "Padrões espaciais dos homicídios associados ao Indicador Adaptado de Condição de Vida no município de Itabuna - Bahia", apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Resumos

OBJETIVO:

descrever a mortalidade por homicídios em Itabuna, Bahia.

MÉTODO:

estudo com delineamento híbrido, ecológico e de tendência temporal. Foram calculados os coeficientes de mortalidade por 1.000 habitantes, ajustados pela técnica direta, mortalidade proporcional segundo sexo e faixa etária e anos potenciais de vida perdidos.

RESULTADOS:

desde 2005 as causas externas passaram de terceira para segunda causa de morte, sendo os homicídios responsáveis pelo incremento. Nos 13 anos analisados, os homicídios ascenderam 203%, com 94% desses óbitos incidindo na população masculina. Entre essa, o crescimento se deu principalmente na faixa etária de 15 a 29 anos de idade. Apurou-se que 83% das mortes foram por arma de fogo, 57,2% ocorreram em via pública e 98,4% na zona urbana. Em 2012, os 173 homicídios ocasionaram 7.837 anos potenciais de vida perdidos, com cada óbito provocando, em média, a perda de 45,3 anos.

CONCLUSÕES:

a mortalidade por homicídios em uma cidade de médio porte, na Bahia, atinge índices observados nas grandes metrópoles do país na década 1980, evidenciando que o fenômeno da criminalidade violenta - antes predominante apenas nos grandes centros urbanos - avança para o interior, provocando mudanças no mapa da violência homicida do país.

Homicídio; Mortalidade; Violência


OBJECTIVE:

to describe mortality from homicides in Itabuna, in the State of Bahia.

METHOD:

study with hybrid, ecological and time-trend design. The mortality coefficients per 1,000 inhabitants, adjusted by the direct technique, proportional mortality by sex and age range, and Potential Years of Life Lost were all calculated.

RESULTS:

since 2005, the external causes have moved from third to second most-common cause of death, with homicides being responsible for the increase. In the 13 years analyzed, homicides have risen 203%, with 94% of these deaths occurring among the male population. Within this group, the growth occurred mainly in the age range from 15 to 29 years of age. It was ascertained that 83% of the deaths were caused by firearms; 57.2% occurred in public thoroughfares; and 98.4% in the urban zone. In 2012, the 173 homicides resulted in 7,837 potential years of life lost, with each death causing, on average, the loss of 45.3 years.

CONCLUSIONS:

mortality by homicide in a medium-sized city in Bahia reaches levels observed in the big cities of Brazil in the 1980s, evidencing that the phenomenon of criminality - formerly predominant only in the big urban centers - is advancing into the rural area of Brazil, causing changes in the map of violent homicide in Brazil.

Homicide; Mortality; Violence


OBJETIVO:

describir la mortalidad por homicidios en Itabuna-Bahía.

MÉTODO:

estudio con delineamiento híbrido, ecológico y de tendencia temporal. Fueron calculados los coeficientes de mortalidad por 1.000 habitantes ajustados por la técnica directa, la mortalidad proporcional según sexo e intervalo de edad y los Años Potenciales de Vida Perdidos.

RESULTADOS:

desde 2005 las causas externas pasaron de la tercera para la segunda causa de muerte, siendo los homicidios responsables por el incremento. En los 13 años analizados, los homicidios ascendieron 203%, con 94% de esas muertes ocurriendo en la población masculina. Entre esta, el crecimiento sucedió principalmente en el intervalo de edad de 15 a 29 años de edad. Se encontró que 83% de las muertes fueron por arma de fuego; 57,2% ocurrieron en la vía pública; y 98,4% en la zona urbana. En 2012, los 173 homicidios ocasionaron 7.837 años potenciales de vida perdidos, con cada muerte provocando, en promedio, la pérdida de 45,3 años.

CONCLUSIONES:

la mortalidad por homicidios en una ciudad de porte medio en Bahía alcanza índices observados en las grandes metrópolis del país en la década de 1980, evidenciando que el fenómeno de la criminalidad violenta - antes predominante apenas en los grandes centros urbanos - avanza para el interior provocando cambios en el mapa de la violencia homicida del país.

Homicidio; Mortalidad; Violencia


Introdução

Caracterizada como fenômeno de causalidade complexa e multifatorial, pode-se definir a violência como ações realizadas por um ou mais indivíduos e que ocasionam danos físicos ou psicológicos a si próprio ou a outros( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 ). Nesse sentido, apresenta profundos enraizamentos nas estruturas sociais, econômicas e políticas, representando risco para o processo de desenvolvimento humano, com potenciais ameaças à vida e à saúde e consequente possibilidade de morte( 22. Oliveira WF. Violência e saúde coletiva: contribuições teóricas das ciências sociais à discussão sobre o desvio. Saúde Soc. 2008;17(3):42-53. ).

Entre as várias formas de expressão da violência, o homicídio é o ato mais hediondo, pois "priva a vítima de todos os seus direitos de forma definitiva", tornando-se um indicador da incapacidade da sociedade para o desenvolvimento e manutenção de mecanismos não letais de resolução de conflitos. A mortalidade por homicídios chama a atenção, fundamentalmente, porque, além de ocorrer em grande número, atinge, na sua maioria, uma população jovem. Ela se constitui na principal causa de morte no grupo etário de 15 a 44 anos de idade, subvertendo o padrão ocorrido nos países do primeiro mundo, que é dos óbitos ocorrerem em idades mais avançadas, sendo a causa principal de anos potenciais de vida perdidos nessa população( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75

2. Oliveira WF. Violência e saúde coletiva: contribuições teóricas das ciências sociais à discussão sobre o desvio. Saúde Soc. 2008;17(3):42-53.
- 33. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violências no período de 2000 a 2009. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010. 249 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2010.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

No Brasil, desde a última década, a concentração dos homicídios que antes estava presente nas grandes metrópoles, espalha-se para o interior, à medida que o crime organizado busca novos espaços. Além das dificuldades das instituições de segurança pública em conter o processo de interiorização da violência, a degradação urbana contribui decisivamente para ele, já que a pobreza, a desigualdade social, o baixo acesso popular a bens e serviços básicos não são mais problemas exclusivos das grandes metrópoles( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 ).

Pesquisa realizada pelo Ministério da Justiça (MJ) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública, envolvendo 266 municípios com mais de 100 mil habitantes, no ano 2009, confirma que, embora esteja espalhada por todo o País, a violência vem crescendo no Norte e Nordeste. Esse é um reflexo de indicadores sociais baixos, poucos recursos para aplicação em sistemas de segurança pública e poucas políticas preventivas( 44. Ministério da Justiça (BR). Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência IVJ-Violência. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Justiça; 2010. 31 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://downloads/relatorio_pjpv_2009.pdf
http://downloads/relatorio_pjpv_2009.pdf...
).

Na Bahia, estão cinco dos quinze municípios, apontados pela referida pesquisa realizada pelo MJ, onde os jovens brasileiros estão mais expostos à criminalidade, segundo o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência, (IVJ-Violência) que leva em conta dados socioeconômicos como número de agressões, escolaridade, acesso ao mercado de trabalho, renda e moradia( 44. Ministério da Justiça (BR). Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência IVJ-Violência. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Justiça; 2010. 31 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://downloads/relatorio_pjpv_2009.pdf
http://downloads/relatorio_pjpv_2009.pdf...
).

A situação mais grave é do município de Itabuna, que ocupa o primeiro lugar do ranking geral da pesquisa, evidenciando jovens do sexo masculino cada vez mais envolvidos como vítimas e autores das mortes por homicídios. Essas mortes, nos espaços urbanos, estão vinculadas à impunidade das infrações e delinquências, ao consumo exagerado de bebidas alcoólicas, ao uso e tráfico de drogas, ao amplo acesso e à disponibilidade de armas de fogo, à ausência de um projeto político de maior inclusão que seja capaz de reduzir a exclusão social a que estão submetidos diversos segmentos da sua sociedade( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 ).

Este estudo teve como objetivo descrever a mortalidade por homicídios em Itabuna, Bahia, no período de 2000-2012. Acredita-se que o conhecimento da magnitude, caracterização e tendências da mortalidade por causas violentas, em especial por homicídios, em Itabuna, com ênfase na sua distribuição segundo sexo, idade, causas e tendências temporais, no período de 2000 a 2012, além dos Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP) para o ano 2012, poderá subsidiar o planejamento e implantação de ações voltadas para as particularidades locais que sejam eficazes na redução e prevenção desses eventos, visando maior impacto positivo nos níveis de saúde e nas condições de vida da população.

Método

Realizou-se um estudo com delineamento híbrido, ecológico e de tendência temporal (retrospectivo e longitudinal), da mortalidade por homicídio no período de 2000 a 2012, no município de Itabuna, localizado na região sul da Bahia, na Microrregião Cacaueira. Esse município que, durante muito tempo, teve como base econômica a cultura do cacau, desde o final da década de 1980 vem enfrentando grave crise com o aparecimento da praga "vassoura-de-bruxa" que causou queda acentuada da produção. Atualmente, a cidade tem buscado alternativas econômicas, com a ajuda do comércio, da indústria e da diversificação de lavouras, sendo um importante entreposto comercial do Estado, situada às margens da BR-101 e BR-415( 55. Andrade MP, Rocha LB. De tabocas a Itabuna - um estudo histórico-geográfico. Ihéus (BA): Editus; 2005. 161 p. ).

A cidade de Itabuna possui população recenseada no ano 2010, de 204.667 habitantes, dos quais 47,36% são homens e 52,64% são mulheres; 97,54% residindo em zona urbana( 66. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2010. 2012. [acesso 30 abr 2013]. Disponível em: http://downloads.ibge.gov.br/downloads_estatisticas.htm
http://downloads.ibge.gov.br/downloads_e...
). O município possui a 5ª maior densidade demográfica do Estado da Bahia, 464,54 hab/km², e é formado por 59 bairros, apresentados de forma heterogênea quanto à densidade demográfica e marcados por desigualdades sociais.

A população do estudo compreendeu a totalidade dos homicídios de pessoas que residiam em Itabuna e cuja agressão ocorreu no mesmo município, no período de 2000 a 2012, obtidos do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), gerenciado pelo Ministério da Saúde. As informações foram analisadas em termos de coeficientes de mortalidade (/1.000 habitantes) e mortalidade proporcional (/100)( 77. Costa AJL, Kale PL, Vermelho L. Indicadores de Saúde. In: Medronho, RA. Epidemiologia. 2ª ed. São Paulo: Atheneu; 2009. p. 31-82. ), segundo sexo e faixa etária.A proporção de óbitos por homicídios foi calculada sobre o total de óbitos por causas externas. Foram utilizados também os dados censitários, fornecidos pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir dos censos realizados em 2000 e 2010 e as projeções intercensitárias disponibilizadas pelo DATASUS.

Para possibilitar a comparação dos coeficientes de mortalidade específicos por causa de morte ao longo do período em estudo, foi empregada a padronização de idades pela técnica direta, com o objetivo de controlar os efeitos das mudanças na estrutura etária da população, ao longo do tempo. Neste estudo, foi utilizada como população-padrão a do Censo de 2010 do município de Itabuna, BA( 77. Costa AJL, Kale PL, Vermelho L. Indicadores de Saúde. In: Medronho, RA. Epidemiologia. 2ª ed. São Paulo: Atheneu; 2009. p. 31-82. ).

Os coeficientes de mortalidade específicos por faixa etária foram aplicados sobre os respectivos contingentes populacionais da população-padrão. Obteve-se o número de óbitos esperados que poderiam ocorrer em cada faixa etária, caso a população-padrão estivesse exposta aos coeficientes de mortalidade específicos que, dividido pela população-padrão, resultou no Coeficiente de Mortalidade por Causa Padronizada( 77. Costa AJL, Kale PL, Vermelho L. Indicadores de Saúde. In: Medronho, RA. Epidemiologia. 2ª ed. São Paulo: Atheneu; 2009. p. 31-82. ).

Considerando que, para os Coeficientes de Mortalidade específicos por idade, não cabe a padronização para efeito de comparação, eles foram confrontados em seu estado bruto.

Para a realização dos cálculos dos APVP, foi utilizada a técnica proposta por Romeder e McWhinnie( 88. Romeder JM, McWhinnie JR. Le développement des années potentielles de vie perdues comme indicateur de mortalité prématurée. Revue d'Epidémiologie et de Santé Publique. 1978;26(1):97-115. ).- APVP entre 1 e 70 anos. No seu cálculo, consideraram-se somente os óbitos ocorridos entre 1 e 69 anos de idade, completos.

A fórmula para o cálculo dos APVP foi realizada segundo a expressão:

L=limite do tempo de vida (somente os óbitos com idades inferiores a L serão consideradas); xi=idade em que o óbito ocorreu, sendo xi <L; di =representa o número de óbitos com a idade xi, 1 ≤K ≤L-1 em uma população e num dado intervalo de tempo.

Para o cálculo do APVP por todas as causas externas (CID-10), de indivíduos com idade de 1 a 69 anos (L=70), no município de Itabuna, 2012, optou-se por utilizar a idade exata em que cada óbito ocorreu, subtraindo-a de L. A somatória desses produtos fornece o total de APVP, valor que representa o número estimado de perdas para uma causa específica de morte ou para todas as causas.

Consideraram-se homicídios as lesões provocadas intencionalmente, classificadas pela Décima Classificação Internacional de Doenças (CID-10), como "Agressões" (X85 a Y09) e ainda as "Intervenções Legais" (Y35 a Y36): incluem agressões por arma de fogo (X93-X95), agressões por instrumento perfurocortante (X99) e outras violências. Em intervenções legais (Y35) são incluídos traumatismos infligidos pela polícia ou outros agentes da lei, incluindo militares em serviço, durante a prisão ou tentativa de prisão de transgressores da lei, ao reprimir tumultos, ao manter a ordem ou outra ação legal( 99. Organização Mundial da Saúde (OMS). CID 10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. 10ª rev. São Paulo (SP): Edusp; 2000. 1200 p. ).

Este estudo faz parte da pesquisa denominada "Padrões espaciais dos homicídios associados ao Indicador Adaptado de Condição de Vida no município de Itabuna - Bahia", aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade São Paulo, sob Protocolo CAAE: 10176413.0.0000.5393.

Resultados

No período de 2000 a 2012 foram registrados no SIM 18.922 óbitos em Itabuna, desses, cerca de 10% (1.916 óbitos) eram por "sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos não classificados em outra parte" e expressam as mortes em que não houve definição de causa básica.

Das mortes por causas definidas, a partir do ano 2005, no município de Itabuna, as causas externas (acidentes e violência), que ocupavam a 3ª posição, passaram para a 2ª posição, conforme a Figura 1, que exibe os coeficientes de mortalidade por causa específica, padronizados por idade, pela técnica direta, segundo as faixas etárias: menor que 1 ano; 1 a 4 anos; 5 a 9 anos; 10 a 14 anos; 15 a 19 anos; 20 a 29 anos; 30 a 39 anos; 40 a 49 anos; 50 a 59 anos, 60 a 69 anos; 70 a 79 anos e 80 anos e mais. Assim, no período estudado, o menor coeficiente de óbitos por causas externas foi de 0,88/1.000 habitantes no ano 2000 e o maior 1,39/1.000 habitantes em 2010, o que representa crescimento de cerca de 37% dos óbitos por esse conjunto de causas. Para a padronização desses coeficientes pela técnica direta, foram descartados os óbitos cuja idade é ignorada: 5 óbitos por doenças do aparelho circulatório, 2 óbitos por óbitos por doenças do aparelho respiratório, 1 óbito por neoplasia e 36 óbitos por causas externas.

Figura 1 -
Distribuição dos Coeficientes de Mortalidade (por 1.000 habitantes) padronizados por idade, pela técnica direta, segundo cinco principais causas específicas de óbito e ano. Itabuna, BA, Brasil, 2000-2012

Quando se examina a distribuição do total de 2.973 óbitos por causas externas, ocorridos no período de 2000-2012, por tipos específicos, verifica-se que 237 mortes (8%) foram registradas como "eventos cuja intenção é indeterminada", ou seja, a informação disponível não foi suficiente para permitir a distinção entre tratar-se de um acidente, de um suicídio ou de um homicídio.

Em relação à mortalidade proporcional, no ano 2012, os homicídios foram responsáveis por 82,5% dos óbitos por causas externas com intenção definida, apresentando crescimento considerável desde o ano 2000, quando então correspondiam a 38,6% dos óbitos por essas causas.

A Figura 2 permite observar o crescimento dos coeficientes de mortalidade por homicídios que, do início da série até o ano 2012, passaram de 0,28/1.000 hab para 0,85/1.000 hab. As demais causas externas (acidentes de transporte, suicídios, outras causas acidentais e demais causas externas que envolvem complicações médicas e cirúrgicas) mantiveram coeficientes estáveis até o ano 2011, apresentando queda em 2012, o que pode significar falhas nos registros das informações.

Figura 2 -
Distribuição dos Coeficientes de Mortalidade (por 1.000 habitantes) por todas as idades, segundo conjunto de causas externas e ano. Itabuna, BA, Brasil, 2000-2012

Observando-se a tendência desse conjunto de causas por sexo, constatam-se diferenças nítidas, quando, aproximadamente, 95% dos óbitos por homicídio incidiram na população masculina. O aumento dos coeficientes de mortalidade por causas externas para os homens deveu-se, basicamente, ao aumento dos homicídios que, desde o ano 2000, se tornaram mais de três vezes maiores, elevando-se de 0,56 para 1,74 óbitos por 1.000 habitantes, em 2012. Para as mulheres, os coeficientes variaram de 0,03/1.000 hab, no ano 2000, a 0,14/1.000 hab, em 2011, declinando para 0,05 em 2012.

Chama a atenção a magnitude da mortalidade proporcional por homicídio entre os homens, quando comparado à das mulheres: a mortalidade proporcional dos homicídios entre os homens é equivalente a, em média, 15,3 vezes aquele entre as mulheres, para o período.

Em Itabuna, no período estudado, em média oito (8), a cada 100 óbitos de homens, foram em consequência dos homicídios, enquanto para as mulheres apenas 0,5 foram causados por homicídios.

A comparação, ao longo dos anos estudados, dos dados relativos aos coeficientes de mortalidade por homicídios mostrou que, no sexo masculino, o aumento se deu em todas as faixas etárias, com destaque para a de 15 a 29 anos de idade, cujos coeficientes passaram de 1,0 para 6,2 óbitos por 1.000 habitantes (Figura 3). No sexo feminino, os maiores coeficientes também foram registrados nessa faixa etária, variando de 0,08, no ano 2000, para 0,11 em 2012. Nas demais faixas etárias, entre as mulheres, os coeficientes de mortalidade decresceram. O percentual de morte por homicídio entre os homens de 15 a 29 anos de idade foi 56 vezes maior que aquele registrado entre as mulheres, no mesmo grupo de idade, em 2012.

Figura 3 -
Distribuição dos Coeficientes de Mortalidade por homicídios, sexo masculino, segundo grupos etários e ano. Itabuna, BA, Brasil, 2000-2012

Calcularam-se os anos potenciais de vida perdidos da população de Itabuna para o ano 2012, pois foi o que apresentou mais elevados coeficientes de mortalidade por homicídio na população de 15 a 19 anos (coeficientes de 3,1 para população geral e de 6,2 para o sexo masculino). Os homicídios responderam por 173 óbitos, ocasionando 7.837 anos potenciais de vida perdidos, com cada óbito provocando, em média, a perda de 45,3 anos (APVP). Considerando-se o limite de vida igual a 70 anos, estimou-se que, em média, os óbitos ocorreram na idade de 24,7 anos (70,0-45,3=24,7). Os homicídios ocupam a primeira posição quer em número de casos quer em APVP, revelando, então, a mortalidade precoce como parâmetro importante na medida das condições de saúde de uma população.

A arma de fogo constituiu o instrumento mais utilizado nos homicídios, no período estudado: 83% (1354/1634). Em homens, ela foi usada na proporção de 83,6% (1288/1540) das agressões; e em 70,2% (66/94) das mulheres atingidas. A arma branca vitimou 24,5% (23/94) das mulheres e 8,9% (137/1540) dos homens. O uso de arma de fogo nos homicídios cresceu 13% desde o início da década de 2000, passando a ser responsável por 95% dos óbitos em 2012.

Do total de mortes de intenção indeterminada, isto é, sem especificação (suicídio, homicídio ou acidente), 50,6% (78/154) foram provocadas por armas de fogo. Entretanto, nesse grupo de mortes, esse instrumento teve significativa queda ao longo do período estudado: entre os anos 2000 e 2006, correspondia, em média, a 60%; passando, entre 2007 e 2012, a corresponder a 7,3% das mortes de intenção indeterminada.

Verificou-se que 3,7% (60/1634) das mortes por homicídio ocorreram em local ignorado. Nos casos em que o local de ocorrência foi identificado, apurou-se que 57,2% (901/1574) dos homicídios ocorreram em via pública; 20,5% (322/1574) em hospital; 11,9% (187/1574) em outro local e 10,4% (164/1574) em domicílio. Os homicídios na zona urbana corresponderam a 98,4% (1548/1574) e na zona rural a 1,6% (26/1574). Aconteceram mortes por homicídio em todos os 59 bairros da cidade de Itabuna, sendo que 12 deles concentraram mais da metade dos crimes que ocorreram em domicílios e via pública: 52,6% (560/1065).

Tabela 1 -
Distribuição dos óbitos, numérica, percentual e indicadores, segundo causa básica. Itabuna, BA, Brasil, 2012

Discussão

Ao se cotejar os resultados referentes à estrutura das causas de morte, chama a atenção o fato das causas externas, em Itabuna, a partir do ano 2005, alcançarem a 2ª posição, atingindo patamares compatíveis com aqueles vistos nas regiões mais desenvolvidas do país, nas décadas de 1980 e 1990, quando, então, os coeficientes começaram a declinar( 1010. Peres MFT, Feliciano JA, Vicentin D, Ruotti C, Batista MN, Cerda M, et al. Evolução dos homicídios e indicadores de segurança pública no Município de São Paulo entre 1996 a 2008: um estudo ecológico de séries temporais. Ci Saúde Coletiva. 2012;17(12):3249-57. ). Estudos apontam que, no ano 2009, as causas externas representaram a terceira causa mais frequente de morte no Brasil. No entanto, essa posição não se apresentou uniformemente distribuída: as causas externas foram a segunda mais frequente causa de morte nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a quarta, na Região Sudeste, e a terceira, na Região Sul.

Esses resultados, de certa forma, podem refletir, por um lado, um início de maior controle da violência nas regiões que já haviam alcançado patamares elevados de sua incidência, como é o caso do Sudeste, e, por outro lado, um indicativo de um processo de sua generalização para outras áreas. Os dados deste estudo coincidem com o padrão de distribuição observado por outros autores no Brasil( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 , 33. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violências no período de 2000 a 2009. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010. 249 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2010.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
), indicando que esses agravos não afetam a população de maneira uniforme, existem grupos populacionais mais vulneráveis, o que pode ser percebido pela distribuição desigual das mortes por causas externas, que constituem a 1ª causa de morte nas pessoas de 10 a 39 anos, do sexo masculino. Essa distribuição torna o problema mais preocupante pelo fato de ser a população de adolescentes e jovens a maior vítima da violência, pondo em risco os ganhos obtidos na esperança de vida brasileira nos últimos tempos.

Os dados de mortalidade por homicídios de Itabuna, nos últimos anos, encontram paralelo com dados de pesquisa realizada no ano 1999, em São Paulo, maior metrópole do Brasil, com população estimada de 9.968.485 habitantes( 1111. Gawryszewski VP, Mello Jorge MHP. Mortalidade violenta no município de São Paulo nos últimos 40 anos. Rev Bras Epidemiol. 2000;3(1-3):50-69. ), o que corrobora o processo de interiorização da violência e evidencia que as deficiências e insuficiências do aparelho estatal e da Segurança Pública contribuem para a atração da criminalidade.

O predomínio da mortalidade por homicídio entre os homens jovens, encontrado neste estudo, também foi observado em várias localidades do país. Alguns estudos( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 , 1212. Souza ER. Masculinidade e violência no Brasil. Contribuições para a reflexão no campo da saúde. Ci Saúde Coletiva. 2005;10(1):59-70. ) relacionam a sobremortalidade masculina à maior probabilidade de exposição à violência. Nessa população, o crescimento dos números ocorreu em todas as faixas etárias, entretanto, os resultados de Itabuna apontam a disseminação da violência entre uma população cada vez mais jovem: 647% entre os homens de 15 a19 anos no período de 2000 a 2012. Dados de publicação do Ministério da Saúde para o ano 2010 apontam a faixa de 20 a 29 anos como a de maior risco de morte por homicídio no Brasil. Em estudo sobre mortalidade por armas de fogo, foi constatado, no período de 1980-2010, aumento dos homicídios de 502,8% na população total e de 591,5% entre os mais jovens (15 a 29 anos)( 1313. Waiselfisz JJ. Mapa da Violência 2013: mortes matadas por armas de fogo. [Internet]. São Paulo (SP): Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos; 2013. 55p. [acesso 29 jul 2013] Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/MapaViolencia2013_armas.pdf
http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf201...
).

Autores( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 , 1111. Gawryszewski VP, Mello Jorge MHP. Mortalidade violenta no município de São Paulo nos últimos 40 anos. Rev Bras Epidemiol. 2000;3(1-3):50-69. ) afirmam que o homicídio de jovens relaciona-se à escassez de fatores de proteção e com áreas onde há grande concentração de pessoas nessa faixa etária. A vitimização de pessoas mais novas articula-se com a criminalidade juvenil, o recrutamento de jovens pelo narcotráfico, o abandono da escola e o banditismo, tudo isso mediado pela incapacidade dos órgãos públicos de assistência social e do aparelho jurídico e policial, dentro de um contexto de desagregação social, institucional e familiar.

Essas perdas precoces de vida não trazem danos somente ao indivíduo e ao grupo que convive diretamente com ele, mas à coletividade como um todo, que é privada do seu potencial econômico e intelectual. Os países considerados mais desenvolvidos (Inglaterra, Canadá, Japão, por exemplo), de um modo geral têm a sua estrutura de mortes violentas composta principalmente por elementos não intencionais, acidentes de trânsito e quedas, exatamente o contrário do observado para o Brasil, de modo geral, e em especial no município de Itabuna. Mas, mesmo entre os elementos intencionais, são os suicídios que lideram essa mortalidade nesses países( 33. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violências no período de 2000 a 2009. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010. 249 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2010.pdf
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).

Considerando o indicador anos potenciais de vida perdidos, a mortalidade por homicídios, no ano 2012, manifestou-se de forma preocupante ao atingir principalmente os adultos jovens: 45,3 APVP por óbito, ocorrendo, em média, na idade de 24,7 anos. As perdas em produtividade, devido à morte prematura ou possíveis sequelas decorrentes da violência, são consideráveis. Estudo realizado em Salvador, entre 1998 e 2003, demonstra que o indicador correspondeu a 42,4 APVP por homicídio, ocorrendo, em média, na idade de 27,6 anos( 1414. Araújo EM, Costa MCN, Hogan VK, Mota ELA, Araújo TM, Oliveira NF. Diferenciais de Raça / cor da Pele em anos potenciais de Vida Perdidos por causas externas. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):405-12. ).

Em que pese o volume crescente de estudos que focalizam a incidência de óbitos por causas violentas no Brasil, ainda são escassos aqueles que traduzem esse fenômeno em termos de estimativas dos anos de vida perdidos em decorrência desses óbitos. Trata-se, entretanto, de informação importante para sensibilizar os formuladores de políticas públicas para a necessidade de direcionar ações visando a redução dos óbitos por homicídios.

Em Itabuna, observou-se que a razão masculino/feminina nos adolescentes e adultos jovens (56/01) é maior do que a encontrada para o país em 2009, que foi de 13/01( 33. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violências no período de 2000 a 2009. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010. 249 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2010.pdf
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). A arma de fogo constituiu o instrumento mais utilizado nos eventos violentos ocorridos no município, em ambos os sexos, fato observado também por diversos autores( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 , 33. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia das causas externas no Brasil: mortalidade por acidentes e violências no período de 2000 a 2009. [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010. 249 p. [acesso 5 set 2013]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2010.pdf
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). Estudo recente demonstrou que Alagoas, Bahia, Ceará, Pará e Paraíba foram os Estados que apresentaram as maiores taxas de homicídio por arma de fogo no ano 2010( 1313. Waiselfisz JJ. Mapa da Violência 2013: mortes matadas por armas de fogo. [Internet]. São Paulo (SP): Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos; 2013. 55p. [acesso 29 jul 2013] Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/MapaViolencia2013_armas.pdf
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).

O crescimento de 13% do número de homicídios por armas de fogo é ligeiramente superior ao crescimento global no Brasil que foi de 11,2% na década 2000-2010( 1313. Waiselfisz JJ. Mapa da Violência 2013: mortes matadas por armas de fogo. [Internet]. São Paulo (SP): Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos; 2013. 55p. [acesso 29 jul 2013] Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/MapaViolencia2013_armas.pdf
http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf201...
). Esses dados contrastam com aqueles divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada( 1414. Araújo EM, Costa MCN, Hogan VK, Mota ELA, Araújo TM, Oliveira NF. Diferenciais de Raça / cor da Pele em anos potenciais de Vida Perdidos por causas externas. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):405-12. ), nos quais houve queda de 12,6% na taxa de homicídios do País, desde o ano 2003, com a criação do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03 que autoriza o porte de armas por guardas municipais, bombeiros, colecionadores e seguranças privados e o proíbe aos civis).

A despeito de a referida Lei estar em vigor desde o ano 2004, estima-se que no Brasil, atualmente, há vasto arsenal de armas de fogo em mãos da população: 15,2 milhões, sendo 6,8 registradas e 8,5 não registradas. Dentre elas, 3,8 milhões encontram-se em mãos criminosas( 1515. Dreyfus P, Nascimento MS. Posse de armas de fogo no Brasil: mapeamento das armas e seus proprietários. In: Fernandes R, ed. Brasil: as armas e as vítimas. Rio de Janeiro: 7 Letras/Viva Rio/ISER, 2005. p. 125-96. ). Essa questão da larga utilização e facilidade de aquisição de armas de fogo inquieta toda a sociedade. Os noticiários das redes de comunicação falam a respeito de armamentos pesados utilizados pela rede de criminalidade, assustando os cidadãos que assistem a eles.

A ocorrência de, aproximadamente, 80% dos homicídios no local onde a vítima foi agredida (via pública, domicílio e outros locais públicos como bares, penitenciária, lixão) pode indicar a intencionalidade da agressão, não permitindo à vítima possibilidade de sobrevivência. Ressalte-se que o incremento do uso de arma de fogo verificado contribui para o aumento da "eficiência" da prática da violência.

Quanto à característica geográfica, vale destacar que os eventos violentos seguiram a distribuição populacional do município, com maior concentração na área urbana. As aglomerações urbanas são referidas por alguns autores como fator predisponente ou facilitador para a ocorrência desse fenômeno( 11. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MH, Silva CM, Minayo MCS. Violência e lesões no Brasil: o efeito, os progressos realizados e os desafios à frente. Lancet. 2011;377:1962-75 , 1616. Lima MLC, Ximenes RAA, Souza ER, Luna CF, Albuquerque MFPM. Análise espacial dos determinantes socioeconômicos dos homicídios no Estado de Pernambuco. Rev Saúde Pública. 2005;39(2):176-82. ). Os 12 bairros onde se verificaram os maiores valores de ocorrência de atos violentos encontram-se na área periférica da cidade, localidades geralmente menos servidas de equipamentos sociais. As altas taxas de homicídio, principalmente da população jovem de baixa renda, estão relacionadas com o processo de urbanização não planejado, desigualdades socioeconômicas e pobreza( 1717. Viana LAC, Costa MCN, Paim JS, Vieira SLM. As desigualdades sociais e o aumento no número de mortes violentas em Salvador, Bahia, Brasil: 2000-2006. Cad Saúde Pública. 2011;27(Suppl 2):​​S298-S308. ).

É possível que a elevada ocorrência de homicídios em Itabuna tenha sido propiciada pela crise cacaueira que gerou intenso fluxo migratório dos trabalhadores rurais e suas famílias das lavouras cacaueiras da região para a cidade de Itabuna, principalmente para a periferia da área urbana. Esse fenômeno concorreu para a urbanização não planejada, com aumento populacional desordenado e oferta de bens e serviços coletivos inadequados a esse crescimento. Autores( 55. Andrade MP, Rocha LB. De tabocas a Itabuna - um estudo histórico-geográfico. Ihéus (BA): Editus; 2005. 161 p. , 1616. Lima MLC, Ximenes RAA, Souza ER, Luna CF, Albuquerque MFPM. Análise espacial dos determinantes socioeconômicos dos homicídios no Estado de Pernambuco. Rev Saúde Pública. 2005;39(2):176-82. ) apontam os expressivos impactos da crise da lavoura cacaueira na geração de renda, no setor comercial, no desemprego e em consequente processo migratório. A crise eminentemente rural teve influências diretas na zona urbana. O crescimento populacional e urbano em convergência com a crise econômica acarretou elevado desemprego e proliferação da pobreza, marginalidade e criminalidade na cidade( 55. Andrade MP, Rocha LB. De tabocas a Itabuna - um estudo histórico-geográfico. Ihéus (BA): Editus; 2005. 161 p. , 1818. Trevizan SDP, Marques M. Impacto Socioeconômico da Crise do Cacau: um estudo de comunidade-caso. Agrotrópica. 2003;14(3):81-92. ).

Conclusão

O aumento da criminalidade violenta em localidades do interior, como em Itabuna, fez com que as imagens e descrições da violência urbana invadissem o cotidiano das pessoas em suas casas, escolas, locais de trabalho e em ambientes de lazer. Perdeu-se o sentido de vizinhança que caracterizava os territórios de moradia e que sempre foi um dos pontos fortes da sociabilidade no interior - a autonomia, a liberdade e a espontaneidade que caracterizavam o reconhecimento mútuo, o sentimento de proximidade - que ficaram profundamente prejudicados.

O combate a esse flagelo onipresente que destroça o tecido social e ameaça a vida, a saúde e a felicidade de todos requer medidas multifocais e intersetoriais, exige ações que envolvam o indivíduo, a família, os grupos sociais, o poder público e o setor privado, enfim, todos os componentes da sociedade. Entretanto, é necessário que a abordagem da violência direcione sua atenção para a prevenção primária: mais do que simplesmente cuidar das consequências dos atos violentos é necessário instituir uma vigilância epidemiológica da violência que permita observar seus padrões, fatores de risco e causas, possibilitando o planejamento, implementação e avaliação de intervenções efetivas.

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    Artigo extraído da tese de Doutorado "Padrões espaciais dos homicídios associados ao Indicador Adaptado de Condição de Vida no município de Itabuna - Bahia", apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2014

Histórico

  • Recebido
    28 Nov 2013
  • Aceito
    26 Ago 2014
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