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Comunicação política no ambiente digital: uma análise das campanhas eleitorais municipais de 2020 no Facebook1 1 Uma primeira versão deste artigo foi apresentada no GT Eleições e Práticas de Comunicação do 9° Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica), em 2021.

Political communication in the digital environment: an analysis of the 2020 municipal election campaigns on Facebook

La comunicación política en el contexto digital: un análisis de las campañas electorales municipales de 2020 en Facebook

La communication politique dans l'environnement numérique: une analyse des campagnes électorales municipales de 2020 sur Facebook

Neste artigo, analisamos as campanhas oficiais dos(as) candidatos(as) às prefeituras de todas as capitais brasileiras, em 2020, no Facebook. A partir de técnicas de estatística descritiva e da análise de enquadramentos, observamos os atores e narrativas com melhor desempenho na rede e suas principais características, como posicionamento no espectro político, enquadramentos, alinhamentos e recursos comunicacionais. Os resultados mostram a reação da esquerda na rede após as eleições de 2018, liderada por páginas de partidos pequenos, que usaram a plataforma principalmente para discutir conjuntura e questões identitárias. Contudo, mantiveram-se como tendência as práticas de campanha negativa e o agendamento de temas de apelo subjetivo, como família e religião, sobretudo entre as páginas apoiadoras de Bolsonaro, político mais referenciado durante o pleito.

campanhas digitais; eleições 2020; comunicação política; enquadramento; Facebook


Abstract

In this article, we analyze the official campaigns of the candidates for city halls of all Brazilian state capitals in 2020 on Facebook. Using descriptive statistical techniques and frame analysis, we observe the best performing actors and narratives on the network and their main characteristics, such as positioning on the political spectrum, frames, alignments, and communication resources. Our results show the reaction of leftists on the social network following the 2018 elections, analyzing the posts on the profiles of small parties, which used the platform mainly to discuss the wider political conjuncture and identity issues. However, negative campaign practices and giving priority to themes with subjective appeal, such as family and religion, remained a trend, especially among pages supporting Bolsonaro, the most referenced politician during the election.

digital campaigns; elections 2020; political communication; framing; Facebook

Resumen

En este artículo, analizamos las campañas oficiales de los candidatos a las alcaldías de las capitales de todos los estados brasileños en 2020 en Facebook. Utilizando técnicas de estadística descriptiva y análisis de marcos, observamos los actores y narrativas que mejor funcionan en la red y sus principales características, como el posicionamiento en el espectro político, los marcos, los alineamientos y los recursos de comunicación. Nuestros resultados muestran la reacción de la izquierda en la red tras las elecciones de 2018, liderada por páginas de partidos pequeños, que utilizaron la plataforma principalmente para debatir sobre la coyuntura y cuestiones identitarias. Sin embargo, las prácticas negativas de campaña y la programación de temas de apelación subjetiva, como la familia y la religión, se mantuvieron como tendencia, especialmente entre las páginas que apoyan a Bolsonaro, el político más referenciado durante las elecciones.

campañas digitales; elecciones 2020; comunicación política; marco; Facebook

Résumé

Dans cet article, nous analysons les campagnes officielles des candidats aux mairies des capitales de tous les états brésiliens en 2020 sur Facebook. En utilisant des techniques statistiques descriptives et une analyse des cadres, nous observons les acteurs et les récits les plus performants sur le réseau et leurs principales caractéristiques, telles que le positionnement dans le spectre politique, les cadres, les alignements et les ressources de communication. Nos résultats montrent la réaction de la gauche sur ce réseau après les élections de 2018, menée par des pages de petits partis qui ont utilisé la plateforme principalement pour discuter de la conjoncture et des questions identitaires. Cependant, les pratiques de campagne négatives et la programmation de thèmes d'appel subjectifs, tels que la famille et la religion, se sont poursuivies, en particulier parmi les pages soutenant Bolsonaro, le politicien le plus référencé pendant l'élection.

campagnes numériques; élections 2020; communication politique; cadre; Facebook

Introdução

A apropriação política das mídias sociais no Brasil e no mundo alcançou tamanha proporção que atualmente é quase impossível falar sobre política sem abordar a dinâmica conversacional da internet. Os espaços digitais ampliaram a esfera pública, tornando-se um campo de disputa incontornável para atores, organizações e instituições políticas.

No decorrer desse processo, o marketing político e as campanhas eleitorais se reconfiguraram, colocando a análise dos dados provenientes das plataformas virtuais e a criação de conteúdo para as mídias sociais no centro de suas estratégias. Além disso, tais mídias denotam características peculiares às competições políticas contemporâneas, como: a crescente demanda por transparência e propostas colaborativas, o monitoramento constante (de candidatos e eleitores), a militância virtual, mobilizações (de apoio e críticas) em larga escala organizadas pelas redes6 6 Plataformas como Facebook, Twitter e Instagram, cuja comunicação se baseia em rede, são denotadas em inglês a partir de termos como “social network” e “social media”, que foram traduzidos para o português como “redes sociais” e “mídias sociais”, respectivamente. Tendo em vista que não estamos propondo um debate conceitual e que tais expressões fazem referência a objetos da mesma natureza, decidimos tratá-las aqui como sinônimos. , discussões permeadas por “memes” e “lives”, a viralização de desinformações e o estabelecimento de identidades ciber-orientadas (Arnaudo, 2017Arnaudo, D. “Project on computational propaganda”. Computational Propaganda in Brazil: Social Bots during Elections. Working Paper 2017.8, p. 39, 2017.; Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.).

No Brasil, a internet é instrumentalizada pelos partidos políticos desde 2002, mas seus primeiros impactos sobre as disputas eleitorais verificaram-se somente a partir de 2010, com a popularização de seu acesso e a profissionalização das campanhas digitais. Nesse processo progressivo, as cibercampanhas atingiram seu auge nas eleições de 2018, quando desbancaram instrumentos até então fundamentais ao sucesso eleitoral, como elevada soma de recursos, tempo no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE) e forte estrutura partidária. Um dos candidatos à Presidência da República nesse pleito, Jair Bolsonaro (ex-filiado ao Partido Social Liberal - PSL, atualmente no Partido Liberal - PL), que não dispunha de nenhum desses elementos, elegeu-se presidente, e tal feito vem sendo associado, largamente, à sua eficiente campanha digital (Nicolau, 2020Nicolau, J. M. O Brasil dobrou à direita: uma radiografia da eleição de Bolsonaro em 2018. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2020.). Bolsonaro apresentava destacado desempenho nas mídias sociais desde, ao menos, 2015, assim como as páginas de extrema-direita que o apoiaram naquele pleito7 7 “Como exército de voluntários se organiza nas redes para bombar campanha de Bolsonaro a 2018”. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/salasocial-39837332>. Acesso em: 23 maio 2022. (Manchetômetro, 2017). Ao propor um enquadramento anti-institucional e tecer uma narrativa recheada de pautas morais, apelos emocionais e desinformações (Bachini; Menon, 2021Bachini, N.; Menon, G. “Fake News e o uso do Facebook na eleição presidencial brasileira de 2018: Ideologias, pós-verdade e aparelhos ideológicos de dominação”. Economic Analysis of Law Review, vol. 12, nº 1, p. 143-163, jan.-abr. 2021.), difundida principalmente pelas mídias sociais, Bolsonaro conseguiu catalisar o sentimento de mudança que pairava no país e conquistar a confiança da maioria dos eleitores que compareceram às urnas.

Além de Bolsonaro, uma série de candidatos ao Congresso Nacional, que se alinhavam a seu discurso conservador, organizaram suas candidaturas a partir de semelhante estratégia de comunicação digital8 8 “Saiba quem são os congressistas eleitos mais influentes nas redes sociais”. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/congresso/saiba-quem-sao-os-congressistas-eleitos-mais-influentes-nas-redes-sociais/>. Acesso em: 23 maio 2022. e foram eleitos pela primeira vez para um mandato legislativo, demonstrando assim o grande apoio a tal agenda política (Solano et al., 2018Solano, E., et al. (eds.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.) e a potencialidade das e-campanhas na decisão do voto.

A crescente relevância das campanhas digitais, o papel delas nas eleições de 2018 e a conjuntura pandêmica, que exigia distanciamento social e impedia (ou deveria impedir) a realização de campanha corpo-a-corpo - prática essencial às disputas municipais -, geraram grande expectativa com relação ao aumento do uso das redes no pleito de 2020 e às estratégias mais eficientes para a conquista de votos nesse novo contexto. Incrementaram ainda esse enredo a alteração do calendário eleitoral, que adiou as eleições para novembro, a minirreforma eleitoral, que eliminou a coligação para eleições proporcionais, e o endurecimento das regras de propaganda na internet pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que criou um mecanismo de fiscalização de fake news e proibiu a terceirização de conteúdo, disparos de mensagens em massa e o marketing negativo de guerrilha.

Nesse cenário, surgiam inquietações, como: as narrativas e estratégias de comunicação digital nesse pleito serão semelhantes àquelas utilizadas em 2018? A pandemia impõe novas agendas? Quais temas e recursos engajarão mais os eleitores? Serão os mesmos observados em outros pleitos? Há diferenças entre as campanhas por região e posicionamento no espectro político? O endurecimento da fiscalização por parte do TSE conseguirá, de fato, inibir a difusão de desinformações e os disparos massivos? As mídias sociais terão influência sobre o resultado das eleições de 2020? Ou, as campanhas para o executivo municipal possuem dinâmica própria e apresentam outras características?

Com o objetivo de contribuir para as respostas a essas perguntas, analisamos as páginas públicas de todos(as) os(as) candidatos(as) às prefeituras das capitais brasileiras no Facebook (N=284) durante o período oficial de campanha, entre 27 de setembro e 29 de novembro de 2020. A partir de uma metodologia que combina estatística descritiva à análise de enquadramentos, observamos os atores e narrativas com melhor desempenho na rede e suas principais características, como posicionamento no espectro político, abordagens, alinhamentos políticos e recursos comunicacionais mobilizados.

Nosso desenho de pesquisa, ao não se resumir à análise da disputa eleitoral em um único município, permitiu observar os aspectos gerais de realização de campanhas digitais no país, o estabelecimento de tendências entre as campanhas municipais no Facebook e verificar continuidades e arrefecimentos de práticas e discursos em relação aos pleitos anteriores.

O artigo está dividido em seis partes, além desta introdução. Na primeira, “E-campanhas: tendências gerais e peculiaridades brasileiras”, recuperamos brevemente alguns marcos e principais características das campanhas digitais e revisamos os resultados das principais pesquisas sobre campanhas em mídias sociais no Brasil. Em seguida, na seção “Campanhas municipais no Facebook”, dialogamos com a literatura especificamente relacionada ao nosso objeto, as campanhas municipais nessa rede social. Na terceira seção, “Motivação e questões da pesquisa”, apresentamos nossas inquietações e as perguntas que serviram de guia para esta investigação. Na sequência, apresentamos os “Dados e metodologia” que utilizamos para trabalhar as questões. Na quinta seção, discutimos os “Resultados” de nossa pesquisa, primeiramente a partir de uma análise geral dos dados e, depois, dividindo-a por turno. E, por fim, em “Considerações finais”, apresentamos as principais contribuições deste artigo ao campo.

E-campanhas: tendências gerais e peculiaridades brasileiras

A internet foi utilizada pela primeira vez em campanhas eleitorais no ano de 1992, quando Bill Clinton e George Bush disputaram a presidência dos Estados Unidos (Aggio, 2010Aggio, C. “Campanhas Online: o percurso de formação das questões, problemas e configurações a partir da literatura produzida entre 1992 e 2009”. Opinião Pública, vol. 16, nº 2, p. 426-445, dez. 2010.). Ao longo dos trinta anos que se seguiram, houve grandes mudanças e sofisticações na instrumentalização da internet, que deixou de reproduzir os conteúdos preparados prioritariamente para outras mídias para se tornar o principal veículo de marketing político, dando origem às e-campanhas, campanhas digitais, ou ainda, cibercampanhas.

As diferentes fases das campanhas e do marketing político digital foram tipificadas por alguns colegas do campo. De modo geral, essas tipologias apresentam mais pontos em comum do que divergências, sobretudo quando analisam o aprofundamento dessa tendência observada após a difusão das mídias sociais, como o Facebook e o Twitter, denominado como padrão de campanha pós-web (Gomes et al., 2009Gomes, W., et al. “Politics 2.0: a campanha online de Barack Obama em 2008”. Revista de Sociologia e Política, vol. 17, nº 34, p. 29-43, out. 2009.) ou marketing político colaborativo (Penteado, 2011Penteado, C. “Marketing político na era digital: perspectivas e possibilidades”. Revista USP – Marketing Político, USP, CCS, nº 90, p. 6-23, ago. 2011.).

Do ponto de vista empírico, dois casos substancialmente diferentes de campanhas pelas mídias sociais demarcam a literatura: a eleição de Obama, em 2008, e a eleição de Trump, em 2016. Enquanto a primeira campanha caracterizou-se pelo alargamento do debate e da participação política, a partir da criação da rede MyBO (“My Barack Obama”) e do engajamento orgânico (Gomes et al., 2009Gomes, W., et al. “Politics 2.0: a campanha online de Barack Obama em 2008”. Revista de Sociologia e Política, vol. 17, nº 34, p. 29-43, out. 2009.), a segunda campanha baseou-se em uma estratégia de comunicação mais centralizadora, que reunia análise de big data, microtargeting9 9 Microtargeting é um processo de direcionamento de propaganda digital ao usuário, baseado nas preferências que este manifesta na rede social. , chatterbots10 10 Os chatterbots, ou simplesmente bots, são robôs criados por inteligência artificial para conversar com as pessoas. Pensados inicialmente para o serviço de atendimento via chat, foram adquirindo características cada vez mais humanas. e propagação de desinformações (Kaiser et al., 2017Kaiser, J., et al. “What happened to the public sphere? The networked public sphere and public opinion formation”. In: Carayannis, E. G.; Campbell, D. F. J.; Efthymiopoulos, M. P. (eds.). Handbook of cyber-development, cyber-democracy, and cyber-defense. Cham: Springer International Publishing, p. 1-28, 2017.; Boczkowski; Papacharissi, 2018Boczkowski, P. J.; Papacharissi, Z. (eds.). Trump and the media. Cambridge, MA: The MIT Press, 2018.).

Esses casos emblemáticos resumem também as principais implicações das campanhas digitais para as democracias nas últimas décadas. As cibercampanhas contribuíram para a ampliação da esfera pública, estendendo o debate, o acesso às informações e o conhecimento sobre os programas dos candidatos para além das instituições políticas e organizações tradicionais (mainstream) de mídia. Ao mesmo tempo, o caráter personalista e imediatista das mídias sociais contribuiu para o aprofundamento da chamada “democracia de público” (Manin, 2013Manin, B. “A democracia do público reconsiderada”. Revista Novos Estudos: dossiê mobilizações, protestos e revoluções. CEBRAP, nº 97, p. 115-127, nov. 2013.), forjando uma proximidade inédita entre candidatos e eleitores, favorecendo, assim, a identificação entre eles sem a necessidade de mediação organizacional e propiciando a emergência da chamada militância digital (Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Penteado; Bachini; Fiacadori, 2016Penteado, C.; Bachini, N.; Fiacadori, G. “O Planalto em disputa no Facebook: um estudo dos perfis de Dilma Rousseff e Aécio Neves nas eleições de 2014”. In: Cervi, E. U.; Massuchin, M. G; Carvalho, F. C. (orgs.). Internet e eleições no Brasil. Curitiba: CPOP (grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública), 2016.; Penteado et al., 2018Penteado, C., et al. “An election of self-centered tweets: analysis of twitter usage in the 2016 São Paulo mayoral election”. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, vol. 10, nº 30, p. 180-199, 2018.). Contudo, essas dinâmicas vêm sendo cada vez mais permeadas por sistemas de inteligência artificial, que, ao centralizá-las, inflá-las e massificá-las, podem superestimar posicionamentos e manipular pessoas.

Embora essas interações não nos permitam estabelecer, por si só, uma relação causal entre campanha digital e voto, as pesquisas do campo mostram que essas redes digitais são muito potentes para mobilizar pessoas (Giansante, 2015Giansante, G. Online political communication: how to use the web to build consensus and boost participation. Cham, Switzerland: Springer, 2015.), sobretudo porque conferem protagonismo comunicacional aos indivíduos, levando-os para dentro das campanhas. Particularmente, o regime emocional das redes, incitado pelos recursos simbólicos que elas oferecem, como os avatares, stickers e memes, facilita a adesão e a solidariedade às candidaturas, devido a sua forma pouco custosa e elaborada. Essas práticas tendem a intensificar o processo de personalização da política, pois provocam, em geral, uma identificação mais baseada em apelos subjetivos do que em argumentos racionais, que se tornam mais fracos e raros. Observa-se também que o caráter lúdico das redes, associado à possibilidade de anonimato, muitas vezes é aproveitado para relativizar a perversidade de alguns conteúdos, sobretudo do discurso autoritário, colaborando para a impunidade de seus produtores e para a sua proliferação (Solano et al., 2018Solano, E., et al. (eds.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.).

A lógica algorítmica de comunicação na rede favorece mais processos de “reforço de opinião” (Ribeiro, 2016Ribeiro, S. S. M. Democracy after the Internet - Brazil between facts, norms, and code. Cham, Switzerland: Springer, 2016.) e de isolamento por bolhas de afinidades manifestas (Pariser, 2011Pariser, E. The filter bubble: what the internet is hiding from you. [S.l.]: Penguin UK, 2011.), do que o confronto de argumentos divergentes. Por essas razões, parece muito mais provável que a rede seja instrumentalizada para pregar para (Norris, 2003Norris, P. “Preaching to the converted? Pluralism, participation and party websites”. Party Politics, vol. 9, nº 1, p. 21-45, 2003.) ou através dos convertidos (Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.), do que consiga mudar o posicionamento político (e o voto) das pessoas. Assim, os conteúdos lá disseminados propendem a circular entre as pessoas que demonstram simpatia por tais ideias, e as redes acabam por reforçar as fronteiras entre projetos, narrativas11 11 Na linha do que propõe Motta (2013, p, p. 74), entendemos a narrativa como uma leitura que emprega significado à realidade, uma “atitude argumentativa” que tem por objetivo “produzir certos efeitos de sentido em quem ouve, lê ou vê uma história”. e grupos políticos.

No Brasil, a internet foi incorporada às campanhas pela primeira vez nas eleições de 2002, mas seus efeitos nas disputas eleitorais se fizeram nítidos somente a partir de 2010, por ocasião do início da popularização do acesso à internet no país12 12 De acordo com o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 71% da população tinha acesso à internet em 2019. Dados disponíveis em: <https://www.cetic.br/pt/publicacao/pesquisa-sobre-o-uso-das-tecnologias-de-informacao-e-comunicacao-nos-domicilios-brasileiros-tic-domicilios-2019/. Acesso em: 1 maio 2021. . Desde então, sua utilização para a construção de imagem política de candidatos cresceu vertiginosamente.

As pesquisas e estudos de caso nacionais observam, de 2010 em diante, a queda de uso de websites em decorrência do uso de mídias sociais, sobretudo entre os candidatos de partidos pequenos às prefeituras, governos estaduais e ao Senado; a predileção dos políticos pelo Facebook, a partir de 2012; e uma correlação moderada entre a presença nas redes e a votação dos candidatos, sendo a presença no Facebook a que apresenta maior associação com o desempenho eleitoral13 13 Contudo, as correlações tendem a ser diferentes para os distintos níveis de eleição: enquanto são altas para as eleições à Presidência da República, tendem a ser menores nas eleições estaduais e, em média, ainda menores para as prefeituras (Braga; Carlomagno, 2018). (Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.).

Esse enfoque das campanhas nas mídias sociais contribuiu para a redução da divisória digital no país, tanto entre os candidatos quanto entre os eleitores, visto que o acesso a essas plataformas é facilitado pelas operadoras telefônicas, devido aos acordos de tarifa zero, o que favorece a interação entre candidatos e cidadãos (embora a forma, o grau e sua eficiência variem muito). Braga e Carlomagno (2018)Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018., com base em uma extensa revisão da bibliografia, avaliam que o acesso às mídias digitais deu voz para atores que antes estavam excluídos do debate político, provocando uma ampliação da esfera pública e a inclusão de atores (candidatos e cidadãos, de maneira geral) anteriormente sem capacidade de manifestação no sistema político. Contudo, os estudos do campo registram poucos casos de mobilização espontânea em prol dos candidatos, sendo esta, em geral, orientada pelos partidos e seus militantes. Observa-se, nesses casos, o predomínio do agendamento das campanhas pelas páginas e perfis dos candidatos, registrando-se poucas experiências colaborativas mais aprofundadas.

Os candidatos usam essas plataformas, principalmente, para veicular propaganda (inclusive negativa), divulgar eventos e propostas (fazendo promessas para o futuro), associar-se a outras lideranças políticas, aludir a políticas passadas, mobilizar a militância e cativar o eleitorado por meio de apelos pessoais (Aggio, 2011Aggio, C. Internet, eleições e participação: questões-chave acerca da participação e do ativismo nos estudos em campanhas online. In: Gomes, W.; Marques, F. P. J. A.; Maia, R. C. M. (eds.). Internet e participação política no Brasil. Coleção Cibercultura. Porto Alegre, RS: Editora Sulina, p. 175-193, 2011.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Massuchin; Tavares, 2015Massuchin, M. G.; Tavares, C. Q. “Campanha eleitoral nas redes sociais: estratégias empregadas pelos candidatos à Presidência em 2014 no Facebook”. Compolítica, vol. 5, nº 2, p. 75-112, jan. 2015.; Penteado; Bachini; Fiacadori, 2016Penteado, C.; Bachini, N.; Fiacadori, G. “O Planalto em disputa no Facebook: um estudo dos perfis de Dilma Rousseff e Aécio Neves nas eleições de 2014”. In: Cervi, E. U.; Massuchin, M. G; Carvalho, F. C. (orgs.). Internet e eleições no Brasil. Curitiba: CPOP (grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública), 2016.; Penteado et al., 2018Penteado, C., et al. “An election of self-centered tweets: analysis of twitter usage in the 2016 São Paulo mayoral election”. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, vol. 10, nº 30, p. 180-199, 2018.).

Do ponto de vista metodológico, as investigações sobre campanhas digitais também não se diferenciam muito, independentemente do seu escopo. Utilizam-se, em sua maioria, da análise de conteúdo (feita de variadas formas) e da estatística descritiva para observar estratégias discursivas e mensurar o engajamento digital incitado pelos posts ou tweets dos candidatos (Cervi; Massuchin, 2011Cervi, E. U.; Massuchin, M. G. “O uso do Twitter nas eleições de 2010: o microblog nas campanhas dos principais candidatos ao governo do Paraná”. Contemporânea: comunicação e cultura, vol. 9, nº 2, p. 319-334, ago. 2011.; Marques; Sampaio, 2011Marques, F. P. J. A.; Sampaio, R. C. “Internet e eleições 2010 no Brasil: rupturas e continuidades nos padrões mediáticos das campanhas políticas online”. Revista Galáxia, nº 22, p. 208-221, 2011.; Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Miola; Carvalho, 2017Miola, E.; Carvalho, F. C. “Recursos persuasivos nas campanhas no Facebook: uma proposta metodológica a partir das eleições de 2016 em Curitiba”. Agenda Política, vol. 1, nº 2, p. 254-290, 1 dez. 2017.; Azevedo; Barros; Ortiz, 2021Azevedo, D.; Barros, S.; Ortiz, J. Curtir ou não curtir? A reação às publicações dos candidatos à presidência nas eleições brasileiras de 2018. In: Cervi, E. U.; Weber, M. H. (orgs.). Impactos político-comunicacionais nas eleições brasileiras de 2018. Curitiba: CPOP/Carvalho comunicação, p. 285-313, 2021.). Com o incremento e a popularização dos recursos simbólicos da rede digital, passaram a ser estudados também os memes e a prática de campanha negativa, muitas vezes baseada em desinformações (Carniel; Ruggi; Ruggi, 2018Carniel, F.; Ruggi, L.; Ruggi, J. O. “Gênero e humor nas redes sociais: a campanha contra Dilma Rousseff no Brasil”. Opinião Pública, Campinas, vol. 24, n° 3, p. 523-546, dez. 2018.; Santos, 2019Santos, A. “A circulação de memes eróticos da Dilma: vinculando públicos afetivos e fortalecendo fronteiras simbólicas no contexto do impeachment”. In: Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Recepção, Circulação e Usos Sociais das Mídias do XXVIII Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS), 11 a 14 jun. 2019.).

A partir de 2016, com a possibilidade de mineração e análise de big data, muitos artigos adotaram a técnica de análise de rede social (ARS) para observar os movimentos políticos que se formavam nas plataformas e a maneira como propagavam suas narrativas nesses espaços (Albuquerque et al., 2016Albuquerque, A., et. al. “Redes de campanha de pré-candidatos à prefeitura do Rio de Janeiro”. Em Debate, vol. 8, nº 6, p. 8-23, ago. 2016.; Santos Jr., 2017Santos Jr., M. A. “Mobilização da militância: redes de campanha na eleição do Rio de Janeiro de 2016”. Revista Compolítica, vol. 7, nº 2, p. 87-119, 2017.). Essas novas técnicas de pesquisa refletem, em boa medida, o aumento da profissionalização e da automatização das cibercampanhas no país, que mudaram, ao longo do tempo, sua dinâmica e sua potência.

Os efeitos desses processos se fizeram mais evidentes nas eleições de 2018, quando se observou a quebra do paradigma da comunicação política no Brasil. Nesse pleito, variáveis que até então eram consideradas fundamentais para a conquista da Presidência da República – forte estrutura partidária, tempo no HGPE e cobertura favorável da imprensa – foram desbancadas pela comunicação personalizada das mídias sociais.

Páginas de extrema-direita, que mostravam alta capilaridade e capacidade de mobilização nas redes digitais desde o impeachment de Dilma Rousseff (filiada ao Partido dos Trabalhadores - PT), dominaram a discussão política nas mídias sociais, pautando-a com temas de cunho moral, como os valores cristãos, a defesa da família tradicional e o combate à corrupção, além de propostas de liberalismo econômico e segurança pública (Ituassu et al., 2019Ituassu, A., et al. “De Donald Trump a Jair Bolsonaro: democracia e comunicação política digital nas eleições de 2016, nos Estados Unidos, e 2018, no Brasil”. Anais Compolítica 8, p. 1-25, 2019.; Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.), agendas de grande interesse das elites econômicas e da classe média.

Nessa esteira, o então deputado federal carioca, Jair Messias Bolsonaro, com atuação inexpressiva no Congresso Nacional, mas presente na internet desde os anos 2000 (Albuquerque et al., 2016Albuquerque, A., et. al. “Redes de campanha de pré-candidatos à prefeitura do Rio de Janeiro”. Em Debate, vol. 8, nº 6, p. 8-23, ago. 2016.), aproveitou-se da conjuntura de crise, composta de escândalos de corrupção, desaceleração econômica e aumento da violência, para construir por meio das mídias sociais uma candidatura que respondesse aos anseios da população frente a esses problemas. A partir de um enquadramento anti-institucional, moralista, de repertório patriótico e desinformações, Bolsonaro se tornou, gradualmente, o bastião do antipetismo revigorado na sociedade pela midiatização da Operação Lava Jato (Solano et al., 2018Solano, E., et al. (eds.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.; Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.), cativou muitos eleitores e venceu a disputa.

Embora essa estratégia e esse discurso precedam Bolsonaro, sendo compartilhados tanto por outros políticos brasileiros quanto por atores internacionais que se inseriram na então chamada nova onda conservadora (Castells, 2018Castells, M. Ruptura. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2018.; Nunes, 2020Nunes, R. “Todo lado tem dois lados”. Revista Serrote, Edição especial de quarentena, jun. 2020. Disponível em: <https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes. Acesso em: 1 jul. 2021.
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), eles foram encampados por sua candidatura no Brasil, que forjou uma ampla coalizão de direita - movimento que alguns autores denominam como bolsonarismo (Cesarino, 2019Cesarino, L. “Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal”. Revista de Antropologia, vol. 62, nº 3, p. 530-557, 19 dez. 2019.).

A narrativa bolsonarista é caracterizada pela tática de fronteirização. De um lado, responsabiliza a esquerda, o PT e as minorias por todos os problemas de ordem política, econômica e moral, identificando-os como inimigos da nação e, por outro, apresenta a “nova direita” como uma possibilidade de renovação institucional (Bachini; Menon, 2021Bachini, N.; Menon, G. “Fake News e o uso do Facebook na eleição presidencial brasileira de 2018: Ideologias, pós-verdade e aparelhos ideológicos de dominação”. Economic Analysis of Law Review, vol. 12, nº 1, p. 143-163, jan.-abr. 2021.). Tal enquadramento do estado de coisas, para alguns autores, é uma forma de reação aos avanços das políticas progressistas e conquistas de direitos das minorias no último decênio (Nunes, 2020Nunes, R. “Todo lado tem dois lados”. Revista Serrote, Edição especial de quarentena, jun. 2020. Disponível em: <https://www.revistaserrote.com.br/2020/06/todo-lado-tem-dois-lados-por-rodrigo-nunes. Acesso em: 1 jul. 2021.
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). Nesse contexto, enquanto muitos pesquisadores se voltaram a investigar a dinâmica do discurso dessa direita conservadora nas redes, após seu sucesso eleitoral, outros instituíram, a partir desse pleito, uma nova agenda de pesquisa na subárea das e-campanhas, que as analisa a partir de uma perspectiva de gênero, acompanhando a relevância do interesse sobre essa questão no debate público e as políticas públicas que incentivam candidaturas de mulheres e de LGBTQIA+.

Os primeiros trabalhos nessa linha mostram que as e-campanhas das mulheres vêm quebrando o paradigma de agendamento de temas relacionados ao cuidado doméstico e ao assistencialismo, e se inserem em discussões conjunturais e da macropolítica. Porém, a maioria dos posts das candidatas não faz referência a gênero. Ainda que não reivindiquem com frequência a imagem de mãe sensível ou dona de casa, reforçam, em geral, estereótipos, como o da mulher guerreira e trabalhadora (Tavares; Sousa, 2019Tavares, C. Q.; Sousa, N. N. “Qual a característica da campanha online de mulheres candidatas? Uma análise a partir das eleições brasileiras de 2018”. Revista Debates, vol. 13, nº 3, p. 106-131, 2019.), de modo que a interpelação a eles, a partir de uma perspectiva crítica e feminista, é feita por poucas candidatas da esquerda (Marques, 2020Marques, G. S. “Eleições e redes sociais: uma análise das postagens da candidata Manuela d’Ávila no Facebook”. CSOnline – Revista Eletrônica de Ciências Sociais, nº 31, p. 427-446, ago. 2020.; Bonoto; Silva, 2022Bonoto, C.; Silva, F. N. “Interseccionalidade e política no Instagram: os discursos de candidatas lésbicas, bissexuais e trans nas eleições municipais de 2020”. Fronteiras - estudos midiáticos, vol. 24, nº 1, p. 83-98, 2022.).

Seguindo a tendência de comunicação imagética das plataformas digitais, o pleito de 2018 foi marcado também pelo uso de lives e vídeos (Azevedo, 2019Azevedo, D. “Comunicação populista online: análise das estratégias de comunicação política dos principais candidatos à presidência do Brasil no Facebook durante as eleições de 2018”. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Mídia e Eleições do VIII Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (VIII COMPOLÍTICA), realizado na Universidade de Brasília (UnB), de 15 a 17 de maio de 2019.; Camargo, 2020Camargo, A. “Midiatização da política: estudo das narrativas de campanha de Fernando Haddad e Jair Bolsonaro no Facebook”. In: Anais do XIV Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas, Bauru/SP, de 18 a 21 de maio de 2020.) e pela disseminação de desinformação14 14 Entendemos que a desinformação consiste em “toda a informação comprovadamente falsa ou enganadora criada, apresentada e divulgada para obter vantagens econômicas ou para enganar deliberadamente o público, e que é suscetível de causar prejuízo público” (Pereira et al., 2019, p, p. 2). , de forma jamais vista nas mídias sociais brasileiras (Ruediger, 2019Ruediger, M. A. Desinformação nas eleições 2018: o debate sobre fake news no Brasil. DAAP-FGV/RJ, 2019. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/29093. Acesso em: 29 abr. 2021.
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; Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.). O boom das desinformações foi favorecido, em boa medida, pela ampla adesão das campanhas ao mensageiro WhatsApp, cuja comunicação, privada e criptografada, dificulta a fiscalização dessa prática. A difusão do WhatsApp incitou ainda maior volume de iniciativas de campanha extraoficial, sobretudo a partir de grupos que se apresentavam como apolíticos ou apartidários que fomentavam as narrativas dos candidatos (principalmente a conservadora) e, com a proximidade da data de votação, revelavam sua preferência política.

Esses acontecimentos motivaram uma guinada na seleção de objeto de estudo pelos pesquisadores de campanhas digitais que, a partir dessas eleições, passaram a se dedicar, especialmente, à análise desses grupos no mensageiro WhatsApp, em detrimento das campanhas oficiais no Facebook ou no Twitter (Oliveira et al., 2019Oliveira, G., et al. Informação, voto e WhatsApp na eleição presidencial brasileira de 2018. Trabalho apresentado no GT 25 “Mídia e Política”, 44º Encontro anual da Anpocs, 2019.; Piaia; Alves, 2020Piaia, V.; Alves, M. “Abrindo a caixa preta: análise exploratória da rede bolsonarista no WhatsApp”. Rev. Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação - Intercom, São Paulo, vol. 43, nº 3, set.-dez. 2020.). Assim, criou-se um hiato entre os estudos de conteúdo das campanhas nas mídias sociais.

Contudo, o Facebook não foi dispensado pelas campanhas. Ao contrário, o que se verifica é que ele se mantém como elemento importante do ecossistema informacional das campanhas digitais, oficiais e extraoficiais, ora reproduzindo conteúdos de outras mídias sociais, ora veiculando conteúdos produzidos especialmente para ele (Manchetômetro, 2017Manchetômetro. Relatórios semanais e quinzenais do M Facebook, de 2017 a 2020. Disponível em: <http://manchetometro.com.br/categoria/mFacebook/. Acesso em: 23 maio 2022.
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; Cesarino, 2019Cesarino, L. “Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal”. Revista de Antropologia, vol. 62, nº 3, p. 530-557, 19 dez. 2019.; Piaia; Alves, 2020Piaia, V.; Alves, M. “Abrindo a caixa preta: análise exploratória da rede bolsonarista no WhatsApp”. Rev. Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação - Intercom, São Paulo, vol. 43, nº 3, set.-dez. 2020.).

Por essa razão, entendemos que continua sendo oportuna a análise das campanhas oficiais a partir dessa plataforma, até mesmo para elucidar quais foram as reais inovações e rupturas trazidas pelo bolsonarismo nesse âmbito. Para facilitar o entendimento desse processo e viabilizar um debate mais profícuo com a literatura na exposição dos nossos resultados, recuperaremos na próxima seção os principais achados das pesquisas sobre o uso do Facebook em eleições municipais desde 2012, pleito no qual a plataforma começou a ter significância para as campanhas eleitorais (Braga; Nicolás; França, 2011Braga, S. S.; Nicolás, M. A.; França, A. S. “Uso da internet e oportunidades de participação política virtual nas eleições municipais de outubro de 2008 no Brasil”. Revista Debates, vol. 5, nº 2, p. 117-144, jul.-dez. 2011.; Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.).

Campanhas municipais no Facebook

O Facebook teve centralidade nas estratégias de e-campanha ao longo dos últimos pleitos eleitorais (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.). Tal fato decorre, principalmente, da larga popularidade dessa plataforma entre os brasileiros15 15 O Reuters Institute aplicou questionários, entre janeiro e fevereiro de 2020, e apresentou o seguinte resultado: 71% dos brasileiros têm acesso à internet; entre esses, o Facebook aparece como a plataforma preferida para 76% brasileiros e é usado como fonte de notícias por 54%. “For the first time since the survey started, social media overtook television in terms of media consumption for news” (Reuters Institute Digital News Report, 2020, p. 90). Disponível em: <https://www.digitalnewsreport.org/survey/2020/>. Acesso em: 15 jul. 2020). . Os políticos querem se fazer presentes onde a audiência é maior. Por isso, se em 2012 muitos deles entraram na rede para as eleições, em 2016, a maioria deles cuidou para que suas páginas fossem criadas na plataforma antes do período eleitoral, na tentativa de diminuir os custos de entrada na competição eleitoral e ampliar o alcance de suas publicações (Braga et al., 2017Braga, S. S., et al. “Eleições online em tempos de ‘big data’: Métodos e questões de pesquisa a partir das eleições municipais brasileiras de 2016”. Estudos em Comunicação, vol. 1, nº 25, p. 253-285, 2017.).

Dessa maneira, há considerável quantidade de análises sobre as campanhas no Facebook, ainda que nem todas tenham se revertido em publicações em periódicos. Em pesquisa no Portal de Periódicos da Capes e no Google Scholar, verificamos somente dois estudos brasileiros que comparam e-campanhas de diferentes municípios no Facebook, mas a partir de diferentes parâmetros (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.). Os demais encontrados são estudos de casos que se concentram em capitais e cidades das regiões Sudeste, Sul e Nordeste, e correspondem, em geral, às cidades nas quais atuam os principais pesquisadores e núcleos de pesquisa sobre e-campanhas (São Paulo-SP, Rio de Janeiro-RJ, Belo Horizonte-MG, Salvador-BA, Curitiba-PR). Essa lacuna dificulta, entre outras coisas, a observação de possíveis diferenças regionais entre as e-campanhas, assim como da atuação entre partidos políticos, posições no espectro político ou identificação por gênero.

Embora os critérios de seleção de amostras variem entre as pesquisas, há entre elas certa convergência metodológica, o que nos permite avaliar que os temas mais frequentes nos posts são semelhantes aos mobilizados em outras redes em contexto eleitoral, assim como nas disputas nacionais: agenda e material de campanha, propostas da candidatura, mobilização do eleitorado, demonstrações de apoio, avaliação da conjuntura, assuntos privados, campanha negativa e realizações pregressas. Com relação ao teor das propostas, embora na maioria das vezes elas não componham os posts, nas e-campanhas das grandes capitais, verifica-se o predomínio de proposições voltadas às áreas da saúde, da educação e do transporte público (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Ituassu et al., 2014Ituassu, A., et al. “Internet, eleições e democracia: o uso das redes sociais digitais por Marcelo Freixo na campanha de 2012 para a Prefeitura do Rio de Janeiro”. Revista Compolítica, vol. 2, nº 4, ago.-dez. 2014.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Fernandes et al., 2018Fernandes, C., et al. “A propaganda política no Facebook: O uso das fanpages pelos principais candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte”. Rizoma, Santa Cruz do Sul, vol. 6, nº 1, p. 74-88, ago. 2018.; Massuchin et al., 2018Massuchin, M. et al. “Campanha online em disputas locais: um estudo das apropriações do Facebook pelos candidatos nas eleições de 2016”. Revista Fronteiras – estudos midiáticos, vol. 20, nº 1, p. 27-40, jan.-abr. 2018.).

O crescente volume de “assuntos privados ou alheios à política”, que consolidou tal entrada como categoria de análise, aponta para uma estratégia de exaltação da personalidade individual dos candidatos, ao invés de relacioná-los aos projetos político-partidários, que vem sendo observada como tendência entre as e-campanhas e converge tanto à lógica comunicacional dessas plataformas quanto ao formato do nosso sistema político (Braga; Rocha; Vieira, 2015Braga, S. S.; Rocha, L.; Vieira, F. “‘Americanização’ da representação política virtual? Um estudo comparado das estratégias de comunicação digital por parlamentares de diferentes sistemas políticos”. In: 39º Encontro Nacional da Anpocs, Caxambu, 2015.). Ainda que o percentual dessas inserções tenha oscilado entre os pleitos, nota-se que as legendas partidárias são frequentemente colocadas em segundo plano pelas páginas dos políticos (Miola; Carvalho, 2017Miola, E.; Carvalho, F. C. “Recursos persuasivos nas campanhas no Facebook: uma proposta metodológica a partir das eleições de 2016 em Curitiba”. Agenda Política, vol. 1, nº 2, p. 254-290, 1 dez. 2017.), quando não são simplesmente ocultadas, conforme observado pelo estudo de Braga et al. (2017)Braga, S. S., et al. “Eleições online em tempos de ‘big data’: Métodos e questões de pesquisa a partir das eleições municipais brasileiras de 2016”. Estudos em Comunicação, vol. 1, nº 25, p. 253-285, 2017. sobre as campanhas municipais na rede em 2016.

Verifica-se também em ascensão a prática de campanha negativa no Facebook, que costuma ser adotada mais por candidatos de oposição, embora se observem comportamentos desviantes nesse sentido (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.). Nesse aspecto, enquanto foram mais volumosas as intervenções críticas por parte dos candidatos da esquerda, em 2012, em oposição aos então prefeitos da direita (Ituassu et al., 2014Ituassu, A., et al. “Internet, eleições e democracia: o uso das redes sociais digitais por Marcelo Freixo na campanha de 2012 para a Prefeitura do Rio de Janeiro”. Revista Compolítica, vol. 2, nº 4, ago.-dez. 2014.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.), o aumento de posts críticos no pleito de 2016 foi liderado por candidatos da direita e parece estar associado à conjuntura política nacional e ao clima anti-establishment que predominava no período, decorrentes da Operação Lava Jato e do processo de impeachment da presidente Dilma (Fernandes et al., 2018Fernandes, C., et al. “A propaganda política no Facebook: O uso das fanpages pelos principais candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte”. Rizoma, Santa Cruz do Sul, vol. 6, nº 1, p. 74-88, ago. 2018.; Belem et al., 2018). Os dados apontam estar relacionado a essa conjuntura também o crescente agendamento de questões ideológicas e morais, que em 2012 se resumiam a poucos posts de esquerda, mas cresceram significativamente no pleito de 2016, sobretudo entre as páginas de candidatos do centro e da direita (Miola; Carvalho, 2017Miola, E.; Carvalho, F. C. “Recursos persuasivos nas campanhas no Facebook: uma proposta metodológica a partir das eleições de 2016 em Curitiba”. Agenda Política, vol. 1, nº 2, p. 254-290, 1 dez. 2017.; Fernandes et al., 2018Fernandes, C., et al. “A propaganda política no Facebook: O uso das fanpages pelos principais candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte”. Rizoma, Santa Cruz do Sul, vol. 6, nº 1, p. 74-88, ago. 2018.; Massushin et al., 2018Massuchin, M. et al. “Campanha online em disputas locais: um estudo das apropriações do Facebook pelos candidatos nas eleições de 2016”. Revista Fronteiras – estudos midiáticos, vol. 20, nº 1, p. 27-40, jan.-abr. 2018.). Contudo, a partir dos estudos citados, observamos que, proporcionalmente, as críticas aos adversários políticos são menos frequentes nas campanhas digitais municipais do que nas nacionais, mesmo que o volume desse tipo de publicação venha crescendo nas disputas locais.

De certo modo, a interface do Facebook, baseada na comunicação por fotos e vídeos, favorece práticas de campanha negativa. Cientes de que esses conteúdos circulam mais na rede, as e-campanhas vêm se organizando na plataforma a partir de imagens (Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.). Tais recursos não somente facilitam a propagação de conteúdos mentirosos e ofensivos, a partir de edições e memes, como os suavizam, por meio do emprego do humor nas peças, e dificultam a responsabilização de seus criadores (Solano et al., 2018Solano, E., et al. (eds.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.)

Outras tendências apontadas pelos estudos de campanhas digitais no Facebok são o aumento do volume de postagens com a proximidade do dia das eleições (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Massuchin; Tavares, 2015Massuchin, M. G.; Tavares, C. Q. “Campanha eleitoral nas redes sociais: estratégias empregadas pelos candidatos à Presidência em 2014 no Facebook”. Compolítica, vol. 5, nº 2, p. 75-112, jan. 2015.) e o predomínio de uma interação monológica na plataforma, a despeito das possibilidades de comunicação dialógica que ela oferece (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.).

Motivações e questões da pesquisa

Todas essas inclinações observadas entre as e-campanhas no Brasil e no mundo, nos últimos anos, as reviravoltas conjunturais impostas pela pandemia de Covid-19 e a nova legislação de combate às desinformações imposta pelo TSE criaram uma série de expectativas com relação às eleições de 2020 e a como as mídias sociais seriam utilizadas nas disputas locais.

Em primeiro lugar, esperava-se que tais plataformas seriam largamente mobilizadas pelas candidaturas, diante da crescente adesão a elas por parte de políticos e eleitores, da sua notada eficiência em termos de comunicação política e do contexto de distanciamento social.

Em segundo lugar, o jogo político se reconfigurava. Com a queda da popularidade de Bolsonaro diante de seus posicionamentos autoritários, dos efeitos negativos de suas políticas ultraliberais, do seu comportamento irresponsável no enfrentamento à pandemia de Covid-19 e dos escândalos envolvendo sua família, houve rachas no campo do Bolsonarismo. Dessa forma, as eleições de 2020 se apresentavam como uma nova oportunidade política para os opositores ao governo se fortalecerem e alterarem a correlação de forças a partir da conquista das prefeituras. De um lado, os partidos da direita tradicional procuravam recuperar seu espaço político defendendo as pautas liberais, ao mesmo tempo que se distinguiam e rechaçavam as posições extremistas de Bolsonaro. Os grupos da chamada nova direita, como o Movimento Brasil Livre e o Vem Pra Rua Brasil, se movimentaram de modo semelhante, tentando ampliar sua força recém-adquirida. De outro, a esquerda, em suas múltiplas nuances, que variam desde o PT até movimentos sociais e coletivos pós-desenvolvimentistas, se recolocava no debate político ressaltando a importância do Estado, das políticas sociais e da defesa dos direitos dos minorizados no contexto de crise aprofundado pela pandemia, rearticulando-se em muitas cidades a partir de uma frente ampla contra o governo federal. A crescente expressividade dessas identidades coletivas no cenário político se fez notar nesse pleito sobretudo pelo aumento de candidaturas de negros/as, mulheres, LGBTQIA+s e dos mandatos coletivos16 16 Para números de candidaturas negras, femininas, LGBTI+ e mais, ver: <https://noticias.uol.com.br/amp-stories/candidaturas-negras-femininas-e-lgbti-eeicoes-2020-em-numeros/index.htm>. Acesso em: 2 dez. 2020. .

Nessas condições, observamos as e-campanhas no Facebook tendo no horizonte as seguintes questões: as narrativas e estratégias de comunicação digital nesse pleito foram semelhantes àquelas utilizadas em 2018? Continuaram em ascendência as práticas de campanha negativa, comunicação imagética, personalista e unidirecional? A pandemia impôs novas agendas? Quais temas e recursos mais engajaram os eleitores? São os mesmos observados em outros pleitos? Há diferenças entre as campanhas por região e posicionamento no espectro político? As mídias sociais tiveram influência sobre o resultado das eleições de 2020? Ou, as campanhas para o executivo municipal possuem dinâmica própria e apresentam outras características? Apresentamos abaixo a metodologia de análise adotada para responder a essas questões.

Dados e metodologia

Tendo em vista essas condições e questões, e com o objetivo de preencher algumas lacunas do campo com relação à comparação entre e-campanhas, por região e por posicionamento no espectro político no Brasil, analisamos as principais estratégias comunicacionais e narrativas mobilizadas pelos(as) candidatos(as) no pleito de 2020. Observamos as postagens de todas as páginas públicas dos(as) candidatos(as) às prefeituras das capitais brasileiras (N=284) no Facebook17 17 De acordo com o registro das candidaturas no TSE, as 26 capitais tiveram um total de 320 candidatos concorrendo no pleito para as respectivas prefeituras. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/eleicoes/estatisticas/estatisticas-eleitorais. Acesso em: 13 maio 2021. A partir desse universo, fizemos uma busca manual das páginas de todos os(as) candidatos(as) no Facebook, no entanto localizamos somente 284 delas. A busca foi feita tanto pelo nome do(a) candidato(a) quanto pelo nome a ser expresso na urna, ambos declarados no registro no TSE. , durante o período oficial de campanha, isto é, entre 27 de setembro e 29 de novembro de 2020.

A extração dos dados do Facebook que compõem nossa amostra foi realizada a cada semana (nove no total)18 18 Vale lembrar que, sendo as plataformas de redes sociais online um espaço de interações dinâmicas síncronas e assíncronas, dados coletados em períodos diferentes podem resultar em quantitativos díspares desta pesquisa. Além disso, já é sabido que a Application Programming Interfaces do Facebook (Grapf API) restringe a quantidade de dados coletados e, por isso, o resultado pode sofrer alterações pelo viés, quanto às interações, gerado pelo algoritmo de classificação do Graph API (Ho, 2020). , por meio do software Facepager19 19 Para saber mais sobre o software, o código-fonte e versões disponíveis, acesse <https://github.com/strohne/Facepager/. Acesso em: 9 out. 2022. . Coletamos 62.522 posts, que foram analisados de acordo com sua inserção nos dois turnos da competição eleitoral. A partir dessa base, calculamos a frequência semanal de postagens e verificamos os recursos mais empregados nos posts (vídeo, foto, link e texto). Segmentamos as páginas e os posts de acordo com as regiões do país (N, NE, CO, SE e S). As páginas dos candidatos que compõem a amostra se distribuem da seguinte forma:

  1. Região Norte, com 72 candidatos distribuídos em: Belém, 9; Boa Vista,10; Macapá, 9; Manaus, 11; Palmas, 11; Porto Velho, 15; e Rio Branco, 7;

  2. Região Centro-Oeste, com 34 candidatos distribuídos em: Campo Grande, 14; Cuiabá, 7; e Goiânia,13;

  3. Região Sul, com 37 candidatos, distribuídos em: Curitiba, 15; Florianópolis, 9; e Porto Alegre, 13;

  4. Região Sudeste, com 51 candidatos distribuídos em: Belo Horizonte, 14; Rio de Janeiro, 13; São Paulo, 14; e Vitória, 10;

  5. Região Nordeste, com 90 candidatos distribuídos em: Aracaju, 7; Fortaleza, 10; João Pessoa, 11; Maceió, 9; Natal, 13; Recife, 8; Salvador, 8; São Luís, 12; e Teresina, 12.

Com relação aos partidos políticos aos quais os(as) candidatos(as) estavam filiados, estes foram correlacionados ao posicionamento no espectro político, conforme apresentados na Figura 1:

Figura 1
: Partidos Políticos e quantidade de candidatos / espectro político

Para conseguirmos trabalhar com essa variável de modo a obter os posicionamentos de todos os partidos que participam de nossa amostra, recorremos aos estudos mais recentes dessa área até então, que contemplam maior número de siglas (Tarouco; Madeira, 2015Tarouco, G.; Madeira, R. “Os partidos brasileiros segundo seus estudiosos: análise de um expert survey”. Civitas - Revista de Ciências Sociais, vol. 15, nº 1, p. 24-39, 2015.; Bolognesi; Babireski; Maciel, 2019Bolognesi, B.; Babireski, F.; Maciel, A. “Conhecendo o vazio: congruência ideológica e partidos políticos no Brasil”. Política & Sociedade, vol. 18, nº 42, p. 86-116, 2019.; Jorge et al., 2020Jorge, V. L., et al. “Posicionamento dos partidos políticos brasileiros na escala esquerda-direita: dilemas metodológicos e revisão da literatura”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 33, p. 1-44, 2020.). Diante da impossibilidade de reunir estudos que adotassem a mesma metodologia para definir o posicionamento dos partidos no espectro político, priorizamos aqueles baseados na opinião dos especialistas, cuja rapidez de atualização tende a ser maior que a dos estatutos e, em seguida, incorporamos à análise estudos do segundo escopo. Mesmo mobilizando todas essas pesquisas, não conseguimos classificar todos os partidos, o que nos obrigou, enquanto especialistas, a realizar nossa própria classificação para alguns deles. Após essa ampla consulta a diferentes fontes secundárias e, a partir delas, efetuarmos a classificação dos partidos ausentes nessas pesquisas, chegamos à identificação dos partidos políticos, segundo seu posicionamento no espectro político, que norteia a figura acima e consta no Anexo 1.

Anexo 1
: Quadro com a classificação ideológica dos partidos

Exposto o caminho da constituição do nosso corpus, apresentamos na Tabela 1 um resumo quantitativo geral dos dados coletados na rede:

Tabela 1
: Resumo quantitativo do conteúdo mapeado

Inicialmente, descrevemos os dados levantados, mostrando o volume total de posts por semana, por posição no espectro político-ideológico e os recursos comunicacionais (vídeos, fotos, texto e status) empregados neles. Em seguida, dividimos a análise por turnos, discutindo volume de posts, engajamentos das páginas e posicionamento no espectro político, e analisando os enquadramentos dados aos temas e atores nos dez posts com melhor desempenho, por região. Neste estudo, entendemos por desempenho o engajamento digital obtido pelos posts, o que foi mensurado a partir da soma de interações (reações – gosto, adoro, riso, surpresa, tristeza e raiva –, compartilhamentos e comentários) geradas pelas publicações. Tais métricas indicam a influência da postagem na rede, assim como a sua disseminação (Ho, 2020).

Com relação aos quadros (frames), nos inspiramos na teoria de enquadramento de Goffman (1986)Goffman, E. Frame analysis: an essay on the organization of experience. Boston: Northeastern University Press, 1986., que os define como molduras interpretativas que norteiam a percepção da realidade dos indivíduos e grupos e organizam suas atenções para alguns fatos e aspectos em detrimento de outros, de modo a orientar suas ações e conferir-lhes sentido. A convergência dos atores com determinado enquadramento é denominada alinhamento de quadros (Snow et al., 1986Snow, D., et al. “Frame Alignment Processes, Micromobilization and Movement Participation”. American Sociological Review, vol. 51, nº 4, p. 456-81, ago. 1986.). O enquadramento e o alinhamento são fabricados e conduzidos na interação com outros sujeitos, de modo que a definição da situação ocorre, principalmente, a partir de processos comunicacionais e discursivos. Dessa forma, compreendemos os enquadramentos como uma tática fundamental à disputa política, posto que são um elemento central das identidades coletivas, envolvem uma convergência normativa a priori e fixam limites de pertencimento aos grupos e projetos políticos (Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.).

A técnica da análise de enquadramentos é uma das mais adotadas e vem se mostrando exitosa entre os estudos de comunicação política (Aldé; Mendes; Figueiredo, 2007Aldé, A.; Mendes, G.; Figueiredo, M. “Tomando partido: imprensa e eleições presidenciais em 2006”. Política e Sociedade, nº 10, p. 153-172, abr. 2007.; Scheufele; Yvengar, 2017Scheufele, D. A.; Iyengar, S. The state of framing research: a call for new directions. In: Kenski, K.; Jamieson, K. (orgs.). The Oxford Handbook of Political Communication. Oxford University Press, 2017.), mas suas aplicações sobre os conteúdos midiáticos variam consideravelmente. Com o objetivo de quantificá-los para observar continuidades e inovações nas práticas de e-campanha, adotamos a metodologia de análise de valências (ambivalente, positiva, negativa e neutra), na linha do que propõe Feres Junior (2016)Feres Junior, J. “Análise de valências, debate acadêmico e contenda política”. Revista Brasileira de Ciência Política, vol. 20, p. 313-322, 2016., mas com algumas adaptações.

Na tentativa de observar diferenças e inovações de instrumentalização da rede pelo nosso diverso corpus, não partimos de categorias prévias de análise. Deixamos o objeto falar por si em um primeiro momento, respeitando as categorias nativas. A partir do conteúdo que apresentavam, identificamos até quatro assuntos e atores principais tratados por post e a valência que lhes fora atribuída pelos candidatos nas mensagens. As codificações foram realizadas de forma manual por, pelo menos, dois codificadores e revisadas por outros dois. Após essa primeira análise, os resultados foram agregados e sistematizados.

O desenho de nossa pesquisa inova em dois aspectos. Primeiro, por seu recorte geográfico, que não se resume à disputa eleitoral de um único município, mas reúne dados de todos os candidatos e candidatas às prefeituras das capitais brasileiras com páginas públicas no Facebook, esforço inédito pelo que pudemos constatar. Assim, foi possível verificar tanto características gerais quanto peculiaridades locais das campanhas eleitorais na rede. Em segundo lugar, a incorporação da análise de enquadramentos e valências dos posts nos permitiu observar a construção e a difusão das narrativas em disputa no Facebook, durante as eleições de 2020.

Esperamos com essa metodologia não apenas caracterizar as e-campanhas que delinearam as eleições de 2020, mas também contribuir para a análise do processo político brasileiro, a partir da observação de continuidades e rupturas de práticas e discursos políticos na rede com relação aos pleitos anteriores.

Resultados

Iniciaremos a apresentação dos resultados com uma abordagem quantitativa dos dados, de modo a demonstrar a dimensão das interações ocorridas no Facebook durante o período de campanha. A Figura 2 traz o volume de conteúdo postado na rede por semana. Nela se sobressai a semana de 8 a 15/11, a última antes do primeiro turno, reforçando o que já indicava a literatura sobre a importância da reta final para as campanhas eleitorais (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Massuchin; Tavares, 2015Massuchin, M. G.; Tavares, C. Q. “Campanha eleitoral nas redes sociais: estratégias empregadas pelos candidatos à Presidência em 2014 no Facebook”. Compolítica, vol. 5, nº 2, p. 75-112, jan. 2015.). Ainda que se observe um aumento gradual no volume de publicações ao longo do período eleitoral, a semana que antecede o dia de votação apresenta um aumento de postagem de 75% em relação à primeira, e de 33% em relação à semana anterior. Já as duas últimas semanas do pleito aparecem como responsáveis por apenas 6% do total das publicações. Isso ocorre porque, no segundo turno, apenas 36 candidatos (13%) dos 284 analisados continuaram na disputa e, por consequência, em nosso acompanhamento. Nesse caso, o crescimento do número de publicações de uma semana para a outra foi de 50%.

Figura 2
: Posts publicados por semana, ao longo do período oficial de campanha eleitoral (N/%) – 2020

Na Figura 3, mostramos a quantidade de posts produzidos no período de campanha correlacionados ao posicionamento de seus respectivos autores/páginas no espectro político. Vemos, nesse caso, que os candidatos que concorreram por partidos de direita e de esquerda foram responsáveis pela maior parte das publicações (79%). Esse resultado era esperado, pois candidatos com esses posicionamentos foram também maioria entre os participantes do pleito. Somadas, páginas de esquerda e de direita compõem 71% da amostra, sendo que os representantes de partidos de direita representam 59% das candidaturas.

Figura 3
: Posts publicados ao longo do período oficial de campanha eleitoral, por posicionamento no espectro político (N/%) - 2020

Contudo, a despeito da desvantagem numérica, em termos comparativos, os candidatos de esquerda tiveram maior atividade na rede. Ao calcular a média de postagens por candidato, os de esquerda publicaram 3,6 vezes mais que os de direita. No entanto, quem mais se destacou, se considerarmos a média de produção de conteúdo por candidato, foram as páginas dos candidatos da extrema-direita, que produziram 1.010 posts cada, no período de campanha, enquanto os de direita produziram 165, e os de esquerda 602 posts, respectivamente. Os achados de pesquisas anteriores sobre campanhas municipais são inconclusivos a esse respeito, pelo fato de serem poucos e nem sempre trazerem dados sobre todos os candidatos da disputa, o que dificulta entendermos o significado desses dados. Mas, as pesquisas sobre e-campanhas de candidatos ao Executivo federal mostram que, em geral, os candidatos de esquerda publicam mais em períodos eleitorais. Entretanto, os posts da direita e sobretudo da extrema-direita engajam mais interações entre os seguidores (Bachini, 2013Bachini, N. “Sob o piado do Twitter: o novo tom das campanhas eleitorais com a difusão da internet no Brasil”. Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais, Programas de Estudos Pós-graduados em Ciências Sociais da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.; Massuchin; Tavares, 2015Massuchin, M. G.; Tavares, C. Q. “Campanha eleitoral nas redes sociais: estratégias empregadas pelos candidatos à Presidência em 2014 no Facebook”. Compolítica, vol. 5, nº 2, p. 75-112, jan. 2015.; Penteado et al., 2018Penteado, C., et al. “An election of self-centered tweets: analysis of twitter usage in the 2016 São Paulo mayoral election”. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, vol. 10, nº 30, p. 180-199, 2018.; Azevedo, 2019Azevedo, D. “Comunicação populista online: análise das estratégias de comunicação política dos principais candidatos à presidência do Brasil no Facebook durante as eleições de 2018”. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Mídia e Eleições do VIII Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (VIII COMPOLÍTICA), realizado na Universidade de Brasília (UnB), de 15 a 17 de maio de 2019.; Camargo, 2020Camargo, A. “Midiatização da política: estudo das narrativas de campanha de Fernando Haddad e Jair Bolsonaro no Facebook”. In: Anais do XIV Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas, Bauru/SP, de 18 a 21 de maio de 2020.), inclusive fora dos períodos eleitorais (Manchetômetro, 2017-2020Manchetômetro. Relatórios semanais e quinzenais do M Facebook, de 2017 a 2020. Disponível em: <http://manchetometro.com.br/categoria/mFacebook/. Acesso em: 23 maio 2022.
http://manchetometro.com.br/categoria/mF...
).

Na Figura 4, verificamos que os recursos que geraram mais engajamento dos usuários foram fotos, vídeos, links e texto/status, nessa ordem. Embora esse dado corrobore a constatação de uma comunicação predominantemente imagética nas e-campanhas do Facebook (Braga et al., 2017Braga, S. S., et al. “Eleições online em tempos de ‘big data’: Métodos e questões de pesquisa a partir das eleições municipais brasileiras de 2016”. Estudos em Comunicação, vol. 1, nº 25, p. 253-285, 2017.), indica também um retorno da predileção, entre os candidatos, por fotos para se comunicarem com os eleitores, visto que, em 2018, o emprego de vídeos e lives as tinha superado (Azevedo, 2019Azevedo, D. “Comunicação populista online: análise das estratégias de comunicação política dos principais candidatos à presidência do Brasil no Facebook durante as eleições de 2018”. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Mídia e Eleições do VIII Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (VIII COMPOLÍTICA), realizado na Universidade de Brasília (UnB), de 15 a 17 de maio de 2019.; Camargo, 2020Camargo, A. “Midiatização da política: estudo das narrativas de campanha de Fernando Haddad e Jair Bolsonaro no Facebook”. In: Anais do XIV Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas, Bauru/SP, de 18 a 21 de maio de 2020.; Azevedo; Barros; Ortiz, 2021Azevedo, D.; Barros, S.; Ortiz, J. Curtir ou não curtir? A reação às publicações dos candidatos à presidência nas eleições brasileiras de 2018. In: Cervi, E. U.; Weber, M. H. (orgs.). Impactos político-comunicacionais nas eleições brasileiras de 2018. Curitiba: CPOP/Carvalho comunicação, p. 285-313, 2021.).

Figura 4
: Posts publicados por tipo de recurso e o respectivo engajamento (%)

Análise do 1º Turno

Na Tabela 2, temos um quadro geral dos posts e engajamentos suscitados pelos candidatos(as) que compõem a nossa amostra, organizado a partir do posicionamento deles no espectro político. Esses dados revelam algumas características importantes das eleições de 2020.

Tabela 2
: Posts e engajamentos dos(as) candidatos(as), por posicionamento no espectro político (%) – 1º Turno (2020)

Considerando que nossa amostra engloba 89% dos participantes do pleito, verifica-se inicialmente que não houve candidatos de extrema-esquerda concorrendo nas capitais do Centro-Oeste e nem candidatos de centro-direita nas capitais da região Sudeste, com atuação na rede Facebook. Outro dado relevante, mas não novo, foi o predomínio de candidatos de direita em todas as regiões, sendo o Nordeste a única das cinco regiões em que eles não ultrapassam 50% da amostra. O levantamento mostra também que, juntos, esses atores difundiram maior quantidade de conteúdo na rede, exceto nas regiões Nordeste e Sudeste, onde prevaleceram os candidatos de esquerda, com destaque para os postulantes de Fortaleza e Salvador. Essas duas capitais juntas foram responsáveis por 37% dos posts publicados pelos candidatos de esquerda e 15% da amostra total da região.

Com relação ao engajamento despertado pelos posts, que pode ser visto como um elemento indicador da força das narrativas na rede, destacam-se, mais uma vez, as campanhas da direita, com exceção as da região Sul, onde os candidatos da esquerda alcançaram melhor desempenho nesse quesito. Os(As) candidatos(as) à prefeitura de Porto Alegre surgem com maior peso, representando 65% dos engajamentos, sendo que as candidatas Manuela d’Ávila (PCdoB-RS) e Fernanda Melchionna (PSOL-RS) promoveram 47% e 10% do total de engajamentos da região, respectivamente, o que converge ao histórico de experiências governamentais de esquerda nessa capital (Mendonça; Duarte, 2019Mendonça, C.; Duarte, J. “Eleitor e comunicação eleitoral em Porto Alegre: da ideologia partidária à eficiência midiática”. Revista Flamencos, Porto Alegre, vol. 26, nº 3, set.-dez. 2019.). No Nordeste, a situação se inverte. Embora a esquerda tenha postado mais, a direita incitou mais engajamentos. Ainda sobre essa variável, chama a atenção o desempenho dos candidatos de centro-direita que atuaram na região Centro-Oeste que, a despeito da baixa atividade na rede em comparação aos seus oponentes, obtiveram alto volume de engajamentos, representando 20,3% do total da região. Um dos responsáveis por esse resultado foi o candidato à prefeitura de Cuiabá, Abilio Brunini (Podemos-MT), que em cada post publicado angariou em média 4.656 interações, sendo sozinho responsável por 19% dos 20,3% de engajamentos da região.

Na Figura 5, trazemos as dez páginas que obtiveram maior engajamento durante o primeiro turno das eleições municipais de 2020. Prevalecem, conforme mostra a figura, os candidatos da região Sudeste, sobretudo os do eixo São Paulo-Rio de Janeiro, que representam metade do ranking, seguidos por três candidatos da região Sul (com Porto Alegre e Curitiba), e dois do Nordeste (com Fortaleza e Recife). No que concerne ao posicionamento no espectro político, metade do ranking compreende candidatos de esquerda, seguidos de quatro de direita e um de extrema-direita.

Figura 5
: Quantidade e formas de interação das páginas com maior soma de engajamentos (%) – 1º Turno (2020)

Embora não tenhamos dados semelhantes a respeito de outras disputas municipais para comparar, esses dados divergem do que foi observado nas eleições presidenciais de 2018, por exemplo, quando as páginas de políticos de direita e extrema-direita lideraram massivamente os engajamentos na rede (Bachini; Menon, 2021Bachini, N.; Menon, G. “Fake News e o uso do Facebook na eleição presidencial brasileira de 2018: Ideologias, pós-verdade e aparelhos ideológicos de dominação”. Economic Analysis of Law Review, vol. 12, nº 1, p. 143-163, jan.-abr. 2021.).

Dos candidatos presentes na Figura 5, um reelegeu-se no primeiro turno (Rafael Greca) e cinco foram para o segundo turno (Guilherme Boulos, Manuela d’Ávila, Marcelo Crivella, Capitão Wagner e Marília Arraes). Dentre esses, destacaram-se os desempenhos de Boulos e Manuela na rede e o fato em comum de terem longa trajetória política e sido candidatos nas eleições presidenciais de 2018, o que possivelmente ajudou na consolidação prévia do alcance de suas páginas. O segundo colocado, Arthur do Val, também já era uma figura popular na internet, especialmente por seu vínculo com o MBL e seu canal do YouTube, “Mamãefalei”, que possui mais de 2,5 milhões de seguidores. A destacada atuação do candidato na rede rendeu-lhe a segunda maior votação a deputado estadual por São Paulo, em 2018. Entretanto, em 2020, o candidato do Patriota ficou em 5º lugar na disputa pela capital paulista, com 9,78% dos votos.

Após esse primeiro levantamento quantitativo, observamos os enquadramentos apresentados pelos posts, na tentativa de compreender as narrativas com melhor desempenho entre as campanhas digitais. Selecionamos os dez posts que obtiveram maior engajamento, de cada região, totalizando 50 para o primeiro turno, e analisamos os principais temas abordados pelos candidatos nessas publicações. Das páginas que alcançaram maiores índices de engajamento, 16% são de centro-direita, 44% de direita e 40% de esquerda. Com relação aos partidos, destacam-se entre os que mais emplacaram posts nessa seleção o PCdoB (20%), o Podemos (16%), o PSOL (16%), o PROS (10%) e o Republicanos (10%). Os resultados dessa análise podem ser observados na Figura 6:

Figura 6
: Temas abordados pelos candidatos versus suas respectivas valências e representatividade na amostra analisada (%) – 1º Turno (2020)

Os temas mais frequentes nas publicações selecionadas foram campanha eleitoral, críticas à oposição, assuntos relacionados à família, questões identitárias e saúde. Ao comparar esses dados aos de pleitos anteriores, observamos que o predomínio de posts de “metacampanha” segue sendo uma tendência, assim como o crescimento da prática de campanha negativa e da abordagem de assuntos privados, sobretudo relacionados a pautas morais. Além disso, verifica-se uma sobreposição da macro conjuntura em relação a temas de interesse local a partir de temas como saúde, eleições, economia, auxílio emergencial e governo federal. O alto volume de posts relacionados a fatos contemporâneos é um dos grandes diferenciais desse pleito em relação aos anteriores. Contudo, o raso debate propositivo sobre questões locais não, pois também foi verificado em estudos pregressos (Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Massuchin et al., 2018Massuchin, M. et al. “Campanha online em disputas locais: um estudo das apropriações do Facebook pelos candidatos nas eleições de 2016”. Revista Fronteiras – estudos midiáticos, vol. 20, nº 1, p. 27-40, jan.-abr. 2018.)

Em relação à campanha eleitoral, a maioria dos posts tinha uma função informativa, ou seja, de divulgação de eventos/debates, propagandas e pesquisas eleitorais. Entretanto, foram abordadas nesse âmbito também questões mais contenciosas, como o embate político em si, trocas de acusações e posicionamentos defensivos dos candidatos.

A referência à família, que nunca ocorre de forma negativa, representa uma estratégia de estabelecer uma relação mais pessoal com os eleitores, uma vez que essas publicações, no geral, tratam da vida privada e mostram membros das famílias dos candidatos. Menções à família, sinalizações aos religiosos ou a Deus são costumeiras em campanhas eleitorais, contudo, os estudos mostram que a exaltação da concepção de família conservadora e cristã foi explorada com mais afinco nas campanhas das eleições de 2018 (Bachini; Menon, 2021Bachini, N.; Menon, G. “Fake News e o uso do Facebook na eleição presidencial brasileira de 2018: Ideologias, pós-verdade e aparelhos ideológicos de dominação”. Economic Analysis of Law Review, vol. 12, nº 1, p. 143-163, jan.-abr. 2021.) do que nas disputas anteriores (Aggio, 2011Aggio, C. Internet, eleições e participação: questões-chave acerca da participação e do ativismo nos estudos em campanhas online. In: Gomes, W.; Marques, F. P. J. A.; Maia, R. C. M. (eds.). Internet e participação política no Brasil. Coleção Cibercultura. Porto Alegre, RS: Editora Sulina, p. 175-193, 2011.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Massuchin; Tavares, 2015Massuchin, M. G.; Tavares, C. Q. “Campanha eleitoral nas redes sociais: estratégias empregadas pelos candidatos à Presidência em 2014 no Facebook”. Compolítica, vol. 5, nº 2, p. 75-112, jan. 2015.; Penteado; Bachini; Fiacadori, 2016Penteado, C.; Bachini, N.; Fiacadori, G. “O Planalto em disputa no Facebook: um estudo dos perfis de Dilma Rousseff e Aécio Neves nas eleições de 2014”. In: Cervi, E. U.; Massuchin, M. G; Carvalho, F. C. (orgs.). Internet e eleições no Brasil. Curitiba: CPOP (grupo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública), 2016.; Penteado et al., 2018Penteado, C., et al. “An election of self-centered tweets: analysis of twitter usage in the 2016 São Paulo mayoral election”. Aurora. Revista de Arte, Mídia e Política, vol. 10, nº 30, p. 180-199, 2018.).

Dado o contexto de pandemia de Covid-19, o tema saúde fez-se muito presente nos debates. Em geral, o assunto foi enquadrado de forma negativa e colaborou para práticas de campanha negativa. Os candidatos de esquerda lamentaram a crise sanitária e o alto número de mortos, culpando o governo federal e, principalmente, o presidente Jair Bolsonaro por essa situação, e defenderam maior volume de recursos para o SUS. Os candidatos de direita, que apoiam Jair Bolsonaro, todavia, criticaram as políticas de distanciamento social adotadas pelos governadores e prefeitos, sobretudo as restrições ao comércio e aos cultos religiosos, minimizaram os riscos da exposição ao vírus, acusaram seus opositores de desviar recursos para o enfrentamento da Covid-19 e responsabilizaram a esquerda e a imprensa pela crise econômica agravada pela pandemia.

Além disso, muitos candidatos denunciaram e reclamaram serem vítimas de desinformação e fake news, que aqui entrou como categoria nativa, visto que não tivemos condições de analisar todas as denúncias, por exigirem alto conhecimento das políticas locais. As publicações sobre esse tema acompanharam diversos recursos e intervenções dos TREs e do TSE durante o pleito, resultando na remoção de alguns posts e direito de resposta de candidatos.

Refletindo o alinhamento político e discursivo desses candidatos com a campanha do presidente em 2018, observou-se também grande proximidade entre os enquadramentos que deram a temas como segurança pública, corrupção e infraestrutura (Ituassu et al., 2019Ituassu, A., et al. “De Donald Trump a Jair Bolsonaro: democracia e comunicação política digital nas eleições de 2016, nos Estados Unidos, e 2018, no Brasil”. Anais Compolítica 8, p. 1-25, 2019.; Bachini, 2021Bachini, N. “Movimentos sociais e descentramento das identidades coletivas no Brasil contemporâneo: da pluralização às identidades ciber-orientadas”. Tese de Doutorado em Sociologia, Instituto de Estudos Sociais e Políticos, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021.), abordados, nas campanhas aqui analisadas, a partir de questões locais e, em geral, de forma negativa, consistindo em críticas dos candidatos às atuais gestões e acusações a seus opositores.

Outro tema que gerou significativo engajamento entre os posts dos candidatos foram as questões identitárias, com destaque para a defesa de pautas feministas mediante diversas denúncias de violência contra as candidatas mulheres durante a campanha, e, em particular, para a injustiça observada no julgamento de Mariana Ferrer, que aconteceu no decorrer da disputa e mobilizou diversos políticos de esquerda. Esse resultado foi emplacado principalmente por posts dos candidatos da esquerda, Manuela d’Ávila e Guilherme Boulos, o que endossa, por um lado, os apontamentos de pesquisas anteriores (Marques, 2020Marques, G. S. “Eleições e redes sociais: uma análise das postagens da candidata Manuela d’Ávila no Facebook”. CSOnline – Revista Eletrônica de Ciências Sociais, nº 31, p. 427-446, ago. 2020.; Bono; Silva, 2022), mas também sugere crescente adesão a posicionamentos feministas no debate das redes. Esse dado fica mais relevante se considerarmos que, entre as 284 páginas de nossa amostra, apenas 42 pertencem a candidatas mulheres, das quais cinco foram para o segundo turno e apenas uma mulher, Cinthia Ribeiro (PSDB-TO), foi eleita prefeita.

Ao observar os mesmos temas distribuídos a partir do posicionamento dos autores dos posts no espectro político, na Figura 7, verificamos algumas tendências. Os candidatos de esquerda focaram mais na divulgação de informações sobre a campanha eleitoral, em assuntos relativos às eleições estadunidenses, na relevância desse pleito para as eleições de 2022 (contemplados pela categoria eleições) e nas questões identitárias. Cabe assinalar que a sofisticação da campanha de Boulos no Sudeste gerou alto volume de engajamentos para a esquerda e o partido na região. Já os de direita concentraram-se em falar sobre religião, segurança pública, economia, a atuação do presidente e dos ministros (governo federal), o auxílio emergencial e a corrupção, embora também tenham tratado muito de família, saúde, ideologia, assim como tecido críticas à oposição. Cabe também destacar que direita e centro-direita, juntas, respondem por 83% das mensagens de campanha negativa analisadas.

Figura 7
: Temas abordados pelos candidatos versus posicionamento no espectro político dos seus respectivos autores e representatividade do tema na amostra analisada (%) – 1º Turno (2020)

Há dois temas que foram abordados em igual proporção entre direita e esquerda: fake news e ideologia. Como dissemos, candidatos de ambos os lados relataram ter sido vítimas de informações falsas e, no debate sobre ideologia, aparecem contrapontos acerca de questões como o liberalismo, a radicalidade política e o negacionismo. Nesse cenário polarizado, observamos ainda diversas publicações que indicavam apadrinhamento dos candidatos - prática também frequente em disputas anteriores (Aggio; Reis, 2013Aggio, C.; Reis, L. “Campanha eleitoral no Facebook: usos, configurações e o papel atribuído a esse site por três candidatos eleitos nas eleições municipais de 2012”. Revista Compolítica, vol. 3, nº 2, p. 155-188, 22 dez. 2013.; Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Massuchin et al., 2018Massuchin, M. et al. “Campanha online em disputas locais: um estudo das apropriações do Facebook pelos candidatos nas eleições de 2016”. Revista Fronteiras – estudos midiáticos, vol. 20, nº 1, p. 27-40, jan.-abr. 2018.). Entre os candidatos de direita e centro-direita, destacou-se o apoio de Jair Bolsonaro e, entre os de esquerda, o apoio de Lula e dos governadores estaduais.

Na Figura 8, observamos os personagens e instituições políticas mais mencionados nos posts, verificando as valências atribuídas a eles pelos candidatos.

Figura 8
: Personagens/instituições políticas citados pelos candidatos versus a valência e representatividade dentro da amostra analisada (%) – 1º Turno (2020)

O presidente Jair Bolsonaro foi o personagem político mais citado durante a campanha do primeiro turno, majoritariamente de forma positiva (73%), embora também tenha recebido críticas (27,3%). Uma vez que a temática da campanha foi a mais frequente, foram recorrentes as autorreferências dos candidatos, o que colocou essa categoria em segundo lugar. Verifica-se também na Figura 8 o alto volume de menções totalmente negativas sobre candidatos da disputa, como Sarto (PDT-CE) e Emanuel Pinheiro (MDB-MT), o que corrobora a hipótese de aumento de campanha negativa. Destaca-se a campanha negativa realizada por Capitão Wagner (PROS-CE), na rede, que alavancou os engajamentos da direita e do PROS na região Nordeste. Já as menções ao STF demonstram a disputa de narrativas entre direita e esquerda sobre essa instituição política. Além de presenças, nota-se a ausência de partidos políticos nessa lista, o que converge à hipótese sobre o personalismo das e-campanhas (Miola; Carvalho, 2017Miola, E.; Carvalho, F. C. “Recursos persuasivos nas campanhas no Facebook: uma proposta metodológica a partir das eleições de 2016 em Curitiba”. Agenda Política, vol. 1, nº 2, p. 254-290, 1 dez. 2017.).

Análise do 2º Turno

Assim como na seção anterior, trazemos aqui, na Tabela 3, os percentuais de posts e engajamentos produzidos pelos candidatos organizados por região e posicionamento no espectro político, no 2º turno das eleições de 2020.

Tabela 3
: Posts e engajamentos dos(as) candidatos(as), por posicionamento no espectro político (%) – 2º Turno (2020)

Sete das 26 capitais elegeram seus prefeitos já no primeiro turno. Além disso, Macapá teve as eleições adiadas por causa de um apagão na região20 20 “Sete capitais elegem prefeitos; outras 18 terão segundo turno”. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2020/eleicao-em-numeros/noticia/2020/11/15/sete-capitais-elegem-prefeitos-outras-18-terao-segundo-turno.ghtml>. Acesso em: 15 jul. 2021. . Dessa vez, não vemos uma distribuição equilibrada de todos os posicionamentos políticos. A disputa desse segundo turno foi alavancada pela direita (58%). Os candidatos da esquerda representaram apenas 28% das candidaturas. Candidatos de centro, centro-esquerda e centro-direita tiveram pouca expressão, e as candidaturas de extrema-esquerda e extrema-direita não chegaram a essa etapa, corroborando a hipótese de que o sistema brasileiro tende a repelir os extremos do jogo eleitoral (Nicolau, 2004Nicolau, J. M. Sistemas eleitorais. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.). Cabe assinalar ainda que a esquerda não teve representante no 2º turno na região Centro-Oeste.

Com relação à produção de conteúdo na rede, mais uma vez candidatos de direita foram, em percentual, os que mais postaram, sendo maioria nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Candidatos da esquerda aparecem mais ativos nas regiões Sudeste e Sul, nas quais ultrapassam a direita em 20 pontos e 36 pontos percentuais, respectivamente. Guilherme Boulos (PSOL-SP), que concorreu à prefeitura de São Paulo, foi o responsável por produzir 78% do conteúdo da esquerda na região Sudeste e 46% de todos os posts da região. Na região Sul, Porto Alegre foi a única capital em que a eleição municipal de 2020 teve segundo turno. Nesse caso, mais uma vez, Manuela d’Ávila se destacou com relação à quantidade de posts, sendo responsável por 68% da produção.

No que tange ao quesito engajamento, no segundo turno, a esquerda predominou em quase todos os cenários onde teve representantes, sendo ultrapassada pela direita por apenas 7 pontos percentuais na região Norte do país. Lá, o candidato de melhor desempenho foi David Almeida (Avante-AM), de Manaus que, principalmente com posts sobre a importância da família, foi responsável por 49% dos engajamentos da direita e 23% do total da região. Esses dados vão na contramão do que foi observado em 2018, quando as páginas da direita obtiveram maiores índices de engajamento (Bachini; Menon, 2021Bachini, N.; Menon, G. “Fake News e o uso do Facebook na eleição presidencial brasileira de 2018: Ideologias, pós-verdade e aparelhos ideológicos de dominação”. Economic Analysis of Law Review, vol. 12, nº 1, p. 143-163, jan.-abr. 2021.).

Do mesmo modo que ocorreu no primeiro turno, Manuela d’Ávila (PCdoB-RS) e Guilherme Boulos (PSOL-SP) lideraram o engajamento no Facebook entre os candidatos ao Executivo municipal, como mostra a Figura 9. Apesar desses aspirantes ao cargo de prefeito/a não terem sido eleitos, a soma das interações geradas por seus posts superou a de seus respectivos oponentes eleitos, ambos de partidos de direita - Sebastião Melo (MDB-RS) e Bruno Covas (PSDB-SP) -, em mais de 1000%. No caso da capital paulista, Bruno Covas aparece em 13º lugar, com 200.214 engajamentos; Melo, de Porto Alegre, figura no ranking em 10º lugar, com pouco mais de 220 mil engajamentos.

Figura 9
: Quantidade e formas de interação das páginas com maior soma de engajamentos – 2º Turno (2020)

Na capital carioca, o segundo turno foi disputado entre dois candidatos de direita: Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, e Eduardo Paes (DEM-RJ). Ambos constam entre as páginas que acumularam maior volume de interações no período, porém, ali, a diferença entre o engajamento incitado por seus posts foi de 169% em favor de Crivella. Contudo, novamente, quem obteve maior engajamento não venceu a disputa eleitoral.

Os candidatos à prefeitura de Recife também compõem o ranking, sendo ambos de esquerda. Marília Arraes (PT-PE), com o apoio do ex-presidente Lula, alcançou engajamento 71% superior ao de seu oponente, João Campos (PSB-PE), vencedor da disputa. Em outras capitais, Edmilson Rodrigues (PSOL-PA), Capitão Wagner (PROS-CE) e David Almeida (Avante-AM) também se destacaram em suas campanhas no Facebook frente aos outros candidatos e a praças bem maiores que as suas, no que tange ao número da população e de eleitores.

As Figuras 10 e 11 trazem os temas mais abordados nos 50 posts que obtiveram maior engajamento ao longo do segundo turno (10 por região). Nesse universo, 26% dos posts produzidos foram de páginas de candidatos de centro-direita, 26% de direita e 48% da esquerda. Páginas de candidatos das demais posições do espectro político não estão representadas por não terem alcançado engajamento suficiente para integrar nossa amostra. Com relação aos partidos que mais emplacaram posts nesse ranking, tivemos PCdoB (20%), Podemos (20%), PSOL (18%), Avante (12%) e PROS (8%).

Figura 10
: Temas abordados pelos candidatos versus suas respectivas valências e representatividade na amostra analisada (%) – 2º Turno (2020)

Figura 11
: Temas abordados pelos candidatos versus posicionamento no espectro político de seus respectivos autores e representatividade do tema na amostra analisada (%) – 2º Turno (2020)

Em geral, não se verificam grandes diferenças no âmbito discursivo entre o primeiro e o segundo turnos, mas observa-se a mudança de algumas estratégias, como maior frequência das práticas de apadrinhamento e de campanha negativa. Os dados dos estudos anteriores não nos permitem afirmar que esse comportamento seja uma tendência no segundo turno, mas, considerando que esse é o momento da decisão final dos eleitores, é esperado que os candidatos mobilizem essas estratégias.

Campanha eleitoral seguiu como tema mais pautado pelos posts. No decorrer do segundo turno, os candidatos de todas as posições concentraram-se em agradecer a votação recebida no primeiro turno, divulgar propaganda eleitoral, promover suas agendas de campanha e falar de seus desempenhos nas pesquisas de intenção de voto. Mantiveram-se também as estratégias de desmoralizar oponentes a partir de ataques discursivos e de pautar temas de apelo mais subjetivo, como família e religião, especialmente entre os candidatos da direita.

Contudo, alguns dados chamaram a atenção nas Figuras 10 e 11. Fake news foi tema somente dos posts de candidatos da esquerda e de centro-direita e abordadas sempre de maneira negativa. Esses políticos, em geral, se manifestaram contra as fake news a eles imputadas e atribuíram a autoria delas a seus adversários políticos. O mesmo comportamento foi observado quando o tema era corrupção, que predominou entre os posts dos políticos de centro-direita. Nesse enquadramento, sobressaíram-se os posts de Abilio Brunini, do Podemos, que foram predominantes na região Centro-Oeste.

Figura 12
: Personagens/instituições políticas citadas pelos candidatos versus a valência e a representatividade dentro da amostra analisada (%) – 2º Turno (2020)

Além da autorreferência nos posts, entre os personagens e instituições políticas mais citados, destacaram-se três candidatos, Emanuel Pinheiro (MDB-MT), Bruno Covas (PSDB-SP) e Sebastião Melo (MDB-RS) - todos eleitos nesse pleito. Pinheiro foi amplamente citado de forma negativa pelo seu adversário, Abilio Brunini (Podemos-MT), estratégia que não foi bem-sucedida. A narrativa, nesse caso, girou em torno do “escândalo do paletó”, uma denúncia até então em investigação, mas que foi utilizado por Brunini para atacar e acusar seu oponente. Já Covas recebeu críticas negativas à sua gestão diante da pandemia, mas foi cumprimentado por seu adversário, Boulos (PSOL/SP) pela vitória nas urnas. Sebastião Melo, em Porto Alegre, recebeu menção de sua adversária, Manuela d’Ávila, devido aos ataques que fez à candidata e em ocasião de divulgação de pesquisa de intenção de voto, na qual Melo se apresentava em queda. Outros personagens, como Camilo Santana (PT-CE), atual governador do Ceará, e Ciro Gomes (PDT-CE), ex-governador do estado, foram alvo das publicações do candidato à prefeitura de Fortaleza, Capitão Wagner (PROS-CE), que os acusava de criminosos e corruptos. O foco do candidato era atingir a campanha de Sarto (PDT-CE), adversário apoiado por essas lideranças políticas. Sarto, por sua vez, também fez menções a Camilo, agradecendo-lhe o apoio e se defendendo das acusações da oposição. Por fim, Felipe Neto, destacado youtuber, foi citado por declarar apoio a Boulos, de São Paulo, e por ser também vítima de fake news, assim como o candidato.

Considerações finais

Ao analisar as campanhas digitais dos(as) candidatos(as) às prefeituras de todas as capitais brasileiras nas eleições de 2020, verificamos a continuidade e a inovação de algumas práticas e enquadramentos adotados em pleitos anteriores.

Em primeiro lugar, nossos resultados convergem às pesquisas anteriores sobre a predileção dos candidatos por recursos imagéticos, mas com uma diferença importante: após, em 2018, terem sido superadas pelo vídeo, as fotos voltaram a ser o recurso preferido dos candidatos e o que mais engaja seus seguidores.

Com relação a atuação e desempenho por posicionamento no espectro político, as candidaturas às prefeituras das capitais pela direita predominaram na rede no primeiro turno. Os políticos de direita foram mais numerosos, mais ativos e aqueles que mais engajaram os usuários no Facebook, mesmo nas regiões Nordeste e Sudeste, onde as publicações de candidatos de esquerda foram mais volumosas. A única exceção nesses quesitos ocorreu na região Sul, onde os posts da esquerda obtiveram mais engajamentos que os das outras posições, ainda que fossem menos volumosos. Já no segundo turno, os candidatos de esquerda às capitais do Nordeste, do Sudeste e do Sul ultrapassaram (com larga vantagem nessas duas últimas regiões) a direita no quesito engajamento, o que mostra a reação da esquerda na rede após as eleições de 2018. Ainda, em uma análise baseada nos partidos dos candidatos, verifica-se que nesse pleito os posts que mais engajaram os usuários do Facebook pertencem a partidos pequenos, como PCdoB, Podemos, PSOL, Avante e PROS, o que corrobora achados anteriores (Braga; Carlomagno, 2018Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018.). Páginas de candidatos de partidos tradicionais e maiores como PT, PSDB e MDB e PP obtiveram menos engajamentos. Candidatos do PSL, partido que se destacou no pleito de 2018, não emplacaram posts entre os mais compartilhados por região.

No que concerne às estratégias discursivas adotadas nos posts que mais incitaram engajamentos, além da esperada veiculação de propaganda e divulgação de agenda de campanha, seguiram em ascendência as práticas de campanha negativa e a abordagem de assuntos privados, que foram mais frequentes, proporcionalmente, nesse pleito que nos anteriores, assim como a menção a fatos contemporâneos. Nesse sentido, verificou-se, principalmente, a sobreposição do debate conjuntural às questões municipais, para as quais quase não se observou propostas. Contudo, a ausência de propostas nas campanhas digitais e o pouco engajamento que elas incitam não é algo exatamente novo, pois foram assinaladas também em estudos pregressos (Bachini et al., 2015Bachini, N., et al. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: Aldé, A.; Marques, J. (orgs.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, vol. 1, p. 141-176, 2015.; Massuchin et al., 2018Massuchin, M. et al. “Campanha online em disputas locais: um estudo das apropriações do Facebook pelos candidatos nas eleições de 2016”. Revista Fronteiras – estudos midiáticos, vol. 20, nº 1, p. 27-40, jan.-abr. 2018.).

Além disso, nossos dados corroboram as hipóteses do personalismo e da espetacularização digital. Observou-se larga exposição individual dos candidatos em detrimento a seus partidos, raramente referenciados nos posts com maior engajamento. A discussão política nesse pleito, sem dúvida, foi mais baseada em pessoas e seus atributos particulares do que em projetos políticos.

Os candidatos de esquerda se concentraram na divulgação de informações sobre a campanha eleitoral, em assuntos relativos às eleições estadunidenses, na relevância desse pleito para as eleições de 2022 (contemplados pela categoria eleições) e nas questões identitárias. Essas duas pautas revelam a preocupação da esquerda com as ameaças à democracia feitas pela extrema-direita e o aumento da relevância das identidades no debate público. Já os de direita concentraram-se em dirigir críticas aos seus adversários, a partir de temas como corrupção, economia e segurança pública, com adaptações aos contextos locais, e a pautar questões morais, relacionadas à religiosidade e à família, reproduzindo, em boa medida, o enquadramento adotado por Jair Bolsonaro, nas eleições de 2018. O presidente Bolsonaro foi também o ator político mais referenciado pelas páginas e, em geral, de forma positiva. Todavia, observamos um aparente arrefecimento do antipetismo na rede ao longo desse pleito.

Notamos ainda que um tema vem se consolidando nas campanhas digitais e é abordado em igual proporção entre direita e esquerda, a partir de recorrentes denúncias dos candidatos de ambos os lados, que afirmam ser vítimas de informações falsas: as fake news. No segundo turno, elas deram um grande salto, acompanhando o aumento de frequência das práticas de apadrinhamento e de campanha negativa. Porém, esta última não parece ter sido muito bem-sucedida, visto que todos os candidatos com maior volume de citações negativas foram eleitos.

Esperamos com este artigo contribuir para o acúmulo da literatura sobre campanhas digitais no Brasil e a compreensão de suas principais tendências, assim como elucidar os enquadramentos que organizaram esse pleito e como tais elementos se inserem na disputa política contemporânea. Contudo, devido à falta de pesquisas anteriores sobre boa parte das capitais, não conseguimos avançar em uma análise mais robusta e comparativa das e-campanhas, por região. Monitoramentos sistemáticos que abarquem páginas de políticos de diferentes regiões e estudos qualitativos com amostras ampliadas que correlacionem e-campanhas ao desempenho eleitoral dos candidatos devem colaborar para esse processo e são, por nós, incentivados.

Anexos

Anexo 2
: Descrição dos temas analisados nos posts

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  • 1
    Uma primeira versão deste artigo foi apresentada no GT Eleições e Práticas de Comunicação do 9° Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica), em 2021.
  • 6
    Plataformas como Facebook, Twitter e Instagram, cuja comunicação se baseia em rede, são denotadas em inglês a partir de termos como “social network” e “social media”, que foram traduzidos para o português como “redes sociais” e “mídias sociais”, respectivamente. Tendo em vista que não estamos propondo um debate conceitual e que tais expressões fazem referência a objetos da mesma natureza, decidimos tratá-las aqui como sinônimos.
  • 7
    “Como exército de voluntários se organiza nas redes para bombar campanha de Bolsonaro a 2018”. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/salasocial-39837332>. Acesso em: 23 maio 2022.
  • 8
    “Saiba quem são os congressistas eleitos mais influentes nas redes sociais”. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/congresso/saiba-quem-sao-os-congressistas-eleitos-mais-influentes-nas-redes-sociais/>. Acesso em: 23 maio 2022.
  • 9
    Microtargeting é um processo de direcionamento de propaganda digital ao usuário, baseado nas preferências que este manifesta na rede social.
  • 10
    Os chatterbots, ou simplesmente bots, são robôs criados por inteligência artificial para conversar com as pessoas. Pensados inicialmente para o serviço de atendimento via chat, foram adquirindo características cada vez mais humanas.
  • 11
    Na linha do que propõe Motta (2013, pMotta, L. G. Análise crítica da narrativa. Brasília: Editora UnB, 2013., p. 74), entendemos a narrativa como uma leitura que emprega significado à realidade, uma “atitude argumentativa” que tem por objetivo “produzir certos efeitos de sentido em quem ouve, lê ou vê uma história”.
  • 12
    De acordo com o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 71% da população tinha acesso à internet em 2019. Dados disponíveis em: <https://www.cetic.br/pt/publicacao/pesquisa-sobre-o-uso-das-tecnologias-de-informacao-e-comunicacao-nos-domicilios-brasileiros-tic-domicilios-2019/. Acesso em: 1 maio 2021.
  • 13
    Contudo, as correlações tendem a ser diferentes para os distintos níveis de eleição: enquanto são altas para as eleições à Presidência da República, tendem a ser menores nas eleições estaduais e, em média, ainda menores para as prefeituras (Braga; Carlomagno, 2018)Braga, S. S.; Carlomagno, M. “Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016)”. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 26, p. 7-62, 2018..
  • 14
    Entendemos que a desinformação consiste em “toda a informação comprovadamente falsa ou enganadora criada, apresentada e divulgada para obter vantagens econômicas ou para enganar deliberadamente o público, e que é suscetível de causar prejuízo público” (Pereira et al., 2019, pPereira, E.; Puga, P.; Azevedo, F. A desinformação-contexto europeu e nacional. Lisboa: ERC- Entidade Reguladora para a Comunicação Social, 2019., p. 2).
  • 15
    O Reuters Institute aplicou questionários, entre janeiro e fevereiro de 2020, e apresentou o seguinte resultado: 71% dos brasileiros têm acesso à internet; entre esses, o Facebook aparece como a plataforma preferida para 76% brasileiros e é usado como fonte de notícias por 54%. “For the first time since the survey started, social media overtook television in terms of media consumption for news” (Reuters Institute Digital News Report, 2020, p. 90). Disponível em: <https://www.digitalnewsreport.org/survey/2020/>. Acesso em: 15 jul. 2020).
  • 16
    Para números de candidaturas negras, femininas, LGBTI+ e mais, ver: <https://noticias.uol.com.br/amp-stories/candidaturas-negras-femininas-e-lgbti-eeicoes-2020-em-numeros/index.htm>. Acesso em: 2 dez. 2020.
  • 17
    De acordo com o registro das candidaturas no TSE, as 26 capitais tiveram um total de 320 candidatos concorrendo no pleito para as respectivas prefeituras. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/eleicoes/estatisticas/estatisticas-eleitorais. Acesso em: 13 maio 2021. A partir desse universo, fizemos uma busca manual das páginas de todos os(as) candidatos(as) no Facebook, no entanto localizamos somente 284 delas. A busca foi feita tanto pelo nome do(a) candidato(a) quanto pelo nome a ser expresso na urna, ambos declarados no registro no TSE.
  • 18
    Vale lembrar que, sendo as plataformas de redes sociais online um espaço de interações dinâmicas síncronas e assíncronas, dados coletados em períodos diferentes podem resultar em quantitativos díspares desta pesquisa. Além disso, já é sabido que a Application Programming Interfaces do Facebook (Grapf API) restringe a quantidade de dados coletados e, por isso, o resultado pode sofrer alterações pelo viés, quanto às interações, gerado pelo algoritmo de classificação do Graph API (Ho, 2020)HO, J. C. T. “How biased is the sample? Reverse engineering the ranking algorithm of Facebook’s Graph application programming interface”. Big Data & Society, vol. 7, nº 1, p. 1-15, 1 jan. 2020..
  • 19
    Para saber mais sobre o software, o código-fonte e versões disponíveis, acesse <https://github.com/strohne/Facepager/. Acesso em: 9 out. 2022.
  • 20
    “Sete capitais elegem prefeitos; outras 18 terão segundo turno”. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2020/eleicao-em-numeros/noticia/2020/11/15/sete-capitais-elegem-prefeitos-outras-18-terao-segundo-turno.ghtml>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Jul 2021
  • Aceito
    11 Ago 2022
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