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ANÁLISE DA PAISAGEM NA CRIAÇÃO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO INTEGRAL ZONA COSTEIRA SUL DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Landscape analysis in the creation of integral Conservation Unitin South Coastal area of the state of Santa Catarina

RESUMO

Os ambientes costeiros comportam alguns dos ecossistemas mais produtivos, diversamente povoados e perturbados do planeta. Diante da complexidade inserida na atual crise socioambiental, surge a necessidade da efetivação de medidas de preservação dos recursos naturais costeiros. No Brasil, a criação de Unidades de Conservação (UC) é instrumento consolidado e regulamentado de proteção dos recursos naturais e socioambientais. O presente estudo tem por objetivo subsidiar a sustentabilidade local por meio da proposição de unidade de conservação integral na zona costeira sul do Estado de Santa Catarina, utilizando mapeamento e análise dos elementos relevantes da paisagem local. A metodologia contou com o uso da ferramenta de SIG (Sistema de Informação Geográfico) para realizar o mapeamento dos elementos da paisagem. A integração e análise dos elementos da paisagem mapeados resultaram em uma área de 12,23km2 com potencial para a criação de unidade de conservação integral que possa promover melhores condições de equilíbrio socioecológico local.

Palavras chave:
Sustentabilidade; Sistema de Informação Geográfico; Áreas protegidas

ABSTRACT

Coastal environments comprise some of the most productive ecosystems and densely populated in the world.Given the complexity inserted into the current environmental crisis, is there need for effective conservation measures of the coastal natural resources.In Brazil, the creation of Conservation Units (UC) is consolidated instrument in protection of natural and environmental resources.The study aims to support local sustainability through the creation of integral conservation unit in the southern coastal area of the state of Santa Catarina, using mapping and analysis of the relevant elements of the local landscape.The methodology made use of the GIS tool (Geographic Information System) to perform the mapping of landscape elements.The integration and analysis of landscape elements mapped resulted in 12.23km² area with potential for the creation of integral conservation unit that can promote local sustainability.

Keywords:
Sustainability; Geographic Information System; Protected areas

INTRODUÇÃO

Os ambientes costeiros comportam alguns dos ecossistemas mais produtivos, diversamente povoados e perturbados do planeta. No Estado de Santa Catarina, cerca de 2,5 milhões de pessoas habita a Zona Costeira, o que corresponde a 40% da população do Estado (IBGE, 2012). Tal cenário remete a situações de conflitos a partir desse uso das faixas terrestres e marinhas de forma desordenada. O cenário apresentado é o resultado multifatorial de um desenvolvimento pouco ou quase nada planejado, que tende a gerar panoramas futuros preocupantes (SANTA CATARINA, 2010SANTA CATARINA, Governo do Estado. Programação da implantação dos demais instrumentos do plano estadual de gerenciamento costeiro: estratégias e propostas. SPG, Diretoria de Desenvolvimento das Cidades, 2010.; VIEIRA, 2009VIEIRA, P. F. Políticas ambientais no Brasil: do preservacionismo ao desenvolvimento territorial sustentável. Política e Sociedade, Florianópolis, v. 8, n.14, p. 27-75, 2009. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2009v8n14p27
http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2009...
; MORIN et al., 2002MORIN, E.; KERIN, A. Terra-Pátria. Porto Alegre: Sulina, 2002.), principalmente naqueles ambientes de maior fragilidade do ponto de vista ecossistêmico ou com vocação para um manejo por pelas populações tradicionais que nelas habitam desde o inicio de sua ocupação.

Diante da complexidade inserida na atual crise socioambiental, surge a necessidade da efetivação de medidas preventivas quanto à conservação dos recursos naturais e mitigadoras para a melhoria da qualidade de vida. No Brasil, a criação de Unidades de Conservação (UC) é instrumento regulamentado de proteção aos recursos naturais socioambientais e apesar dos avanços alcançados ainda necessitam de um maior aperfeiçoamento e participação efetiva da sociedade para a gestão pública e participativa destes territórios especialmente protegidos.

As unidades de conservação são espaços territoriais com recursos ambientais ou com características naturais relevantes, que possuem a função de assegurar a representatividade de amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações biológicas, habitats e ecossistemas, preservando o patrimônio natural existente (ARAUJO, 2007ARAUJO, M. A. R. Unidades de Conservação no Brasil: da república à gestão de classe mundial. Belo Horizonte: SEGRAC, 2007. 272 p.). Estas áreas asseguram às populações tradicionais o uso sustentável dos recursos naturais de forma racional e ainda podem propiciar às comunidades do seu entorno o desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis (ARRUDA, 1999ARRUDA, R. “Populações Tradicionais” e a proteção dos recursos naturais em unidades de conservação. Revista Ambiente & Sociedade, n. 5, p. 79-92, 1999. ISSN: 1414-753X.). As UC são áreas sujeitas a normas e regras especiais e podem ser criadas tanto pelo governo federal como pelos governos estaduais e municipais (OLIVEIRA& BARBOSA, 2010OLIVEIRA, J. C. C.; BARBOSA, J. H. C. Roteiro para criação de unidades de conservação municipais. 2010.). Estas unidades de conservação são classificadas em duas categorias, aquelas de proteção integral, onde não devem ocorrer atividades econômicas, tais como parques nacionais, estaduais e municipais, e aquelas de uso sustentáveis, tais como Áreas de Proteção Ambiental- APASs, e RESEXs - Reservas Extrativistas, onde podem ocorrer atividades econômicas, desde que sustentáveis.

A criação de unidades de conservação é regulada pela Lei nº 9.985/2000 e pelo Decreto 4.340/2002. Esses dispositivos possibilitam que os órgãos ligados ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) possam exigir que as entidades ou grupos devam seguir determinados procedimentos em momento da proposição da criação de uma UC.

De acordo com Oliveira &Barbosa (2010OLIVEIRA, J. C. C.; BARBOSA, J. H. C. Roteiro para criação de unidades de conservação municipais. 2010.) os procedimentos para a criação de unidades de conservação estão devidamente regulamentados pela legislação, sendo que um dos momentos mais importantes se dá na consulta pública, na qual ocorre a participação da comunidade local. O proponente deve apresentar a proposta de criação da unidade, fornecendo informações adequadas à população local e a todos os interessados (OLIVEIRA & BARBOSA, 2010OLIVEIRA, J. C. C.; BARBOSA, J. H. C. Roteiro para criação de unidades de conservação municipais. 2010.). Contudo os conflitos socioambientais e as dificuldades de criação de Unidades de Conservação, além da falta de metodologias que possam subsidiar a criação ou definição dos seus limites territoriais são aspectos bastante recorrentes (VARGAS, 2007VARGAS, G. M. Conflitos sociais e sócio-ambientais: proposta de um marco teórico e metodológico. Revista Sociedade & Natureza, 2007, v.19, n.2, p. 191-203.; ARAUJO, 2007ARAUJO, M. A. R. Unidades de Conservação no Brasil: da república à gestão de classe mundial. Belo Horizonte: SEGRAC, 2007. 272 p.). Os problemas de equacionamento dos conflitos socioambientais em áreas protegidas brasileiras têm indicado a necessidade de uma revisão no modelo de gestão dos recursos naturas, adotado pelas agências governamentais em nosso país (VIVACQUA & VIEIRA, 2005VIVACQUA, M.; VIEIRA, P. F. Conflitos socioambientais em Unidades de Conservação. Política e Sociedade, v.4, n.7, p. 139-162, 2005.), além disso, a participação popular deve ser preponderante desde os estudos técnicos iniciais, de forma a minimizar os possíveis conflitos que possam ocorrer nos passos seguintes ao processo de criação da UC que ocorrem após os estudos técnicos.

Por vezes, em momento da consulta pública, os estudos técnicos e as motivações para a criação da UC apresentados não são compreendidos de forma adequada pela população local ou demonstram estar em conflito com áreas ocupadas, podendo ocasionar rejeição por parte dos envolvidos (SOARES & AGRA FILHO, 2008SOARES, S. & AGRA FILHO. Conflitos ambientais e os instrumentos da política nacional de meio ambiente. Gesta - Revista Eletrônica de Gestão de Negócios, v. 4, n. 2, abr.-jun./2008, p. 127-140- ISSN 1809-0079.; CHRISTMANN, 2011CHRISTMANN, L. L. Audiência pública ambiental: um instrumento democrático para a gestão compartilhada do risco ambiental. Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 9, n. 9, p. 54-90, jan./jun. 2011. ISSN 1982-0496.). Todavia, considerando que as diversas ações humanas sobre o ambiente são determinadas por distintas formas de perceber o mundo natural, levar em conta os elementos da paisagem natural que concretizem relevância para os protagonistas num território, pode efetivar uma medida alternativa para amenizar tal problema (INGOLD, 2000INGOLD, T. The perception of the environment. London: Routledge, 2000. 465p.).

O presente estudo tem como objetivo subsidiar a sustentabilidade local por meio da proposição de unidade de conservação integral na zona costeira sul do Estado de Santa Catarina, utilizando mapeamento e análise dos elementos relevantes da paisagem local. Também no que se refere à área de estudo, a sua criação se configura no contexto de estudos anteriores com vistas a criação um mosaico de unidades de conservação, considerando que a área proposta insere-se integralmente no interior da APA da Baleia Franca, uma unidade de conservação marinho-costeira criada na região Centro-Sul do Estado de Santa Catarina no ano de 2000.

MATERIAIS E MÉTODOS

O estudo foi realizado na região do Cabo de Santa Marta, situado na zona costeira do sul catarinense, município de Laguna, Estado de Santa Catarina. A região está inserida integralmente na APA da Baleia Franca (APABF) possui dimensão de área aproximada de 71,70Km² e situa-se entre as coordenadas UTM:709514.989E, 6833055.840N e 713858.293E, 6837146.627N (Figura 1).

A delimitação desta área de estudo se justifica pelo fato de ser uma região com grande potencialidade natural, cultural e social e sofrer pressão ambiental oriundo do atual modelo de desenvolvimento econômico fomentado na zona costeira do sul do Estado de Santa Catarina.

No mapeamento e na análise dos elementos da paisagem para a proposição de unidade de conservação, foram consultados atores da comunidade local que indicaram os elementos a serem mapeados. Foi definido como elementos da paisagem, o cordão de dunas, os sítios arqueológicos da região, bem como os ambientes que sofreram alteração ou influência antrópica (ambientes antropizados).

Figura 1
Localização da área de estudo

Foi estruturada base de dados espaciais a partir de dados em formato vetorial e raster disponibilizados no ano de 2011 pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável - Governo de Santa Catarina. Foram usadas imagens ortoretificadas com resolução de 0,37 metros e os arquivos vetoriais da base hidrográfica ottocodificada compatível para ser trabalhada na escala maior que 1/10000.

Para o mapeamento das áreas de ocorrência do cordão de dunas foi realizada interpretação da imagem aérea. Na interpretação foi possível distinguir duas formações dunares que foram digitalizadas como sendo dunas fixas (com presença de vegetação fixadora) e de dunas móveis (DE SEOANE et al., 2007DE SEOANE, C. L. V.; FERNÁNDEZ, J. B. G.; PASCUAL, C. V. Manual de restauración de dunas costeras. Governo da Espanha e Departamento de Meio Ambiente, Edita: Ministério de Medio Ambiente, Septiembre, 2007.; GOMES & PEREIRA, 2011GOMES, M. A. F.; PEREIRA, L. C. Áreas frágeis no Brasil: subsídios à legislação ambiental. Jaguariúna, SP: Embrapa Meio Ambiente, 2011. 30 p. (Documentos / Embrapa Meio Ambiente; 87).).

Para o mapeamento dos sítios arqueológicos da região, foi obtida a localização e o nome dos sítios por meio do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (CNSA/IPHAN), registrado também em De Blasis et al. (2007DE SEOANE, C. L. V.; FERNÁNDEZ, J. B. G.; PASCUAL, C. V. Manual de restauración de dunas costeras. Governo da Espanha e Departamento de Meio Ambiente, Edita: Ministério de Medio Ambiente, Septiembre, 2007.), Farias & Kneip (2010FARIAS, D. S. E.; KNEIP, A. Panorama Arqueológico de Santa Catarina. Palhoça: Editora UNISUL, 2010.). Foram realizadas visitas aos sítios, para reconhecimento, registro fotográfico e certificação da localização com uso de equipamento de posicionamento global. Posteriormente, sobre as imagens ortoretificadas foram digitalizados os polígonos determinando as formas geométricas a partir das dimensões interpretadas dos sítios. Não foi possível interpretar a porção exposta de todos os sítios, nestes casos foi utilizada a localização geográfica e o nome de registro.

Os ambientes antropizados foram definidos a partir da referência e adaptação do manual técnico de uso da terra do IBGE (2013IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. MANUAL técnico de uso da terra. 3. ed. Rio de Janeiro. 2013. 171p. ISBN 978-85-240-4307-9.). Foram incluídos nessa categoria os caminhos e as trilhas de uso frequente, as estradas não pavimentadas e pavimentadas, o parcelamento de terras modificadas para uso antrópico, as pontes e plataformas de pesca, as construções rurais e a área urbanizada.

Por fim, foi realizada a estruturação da base de dados espaciais dos elementos da paisagem em ambiente de SIG (sistema geográfico de informação) com o objetivo de eleger prioridades de conservação com base na integração dos elementos mapeados.O geoprocessamento foi realizado no software QGIS 2.6.1 (QGIS, 2014) que permitiu quantificar e analisar a distribuição espacial dos elementos da paisagem no território local.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Análise da unidadegeomorfológicaDunas

A partir da interpretação das imagens, do levantamento in loco na área da unidade de dunas da região e da base cartográfica estruturada em ambiente de SIG (Sistema de Informação Geográfica), foi possível determinar a distribuição de dois tipos básicos de formação dunar: uma região com predominância de dunas móveis e outra com o predomínio de dunas fixas. O mapa resultante, com a delimitação da unidade geomorfológica dunas da região, pode ser observado também na Figura 1.

Conforme Tabela 1 a unidade de dunas totaliza uma área de 14,28km2 que corresponde a 19,9% da área do polígono em estudo. A área referente a unidade de dunas fixas possui 7,98 km² e apresenta-se maior se comparada à área correspondente a unidade de dunas móveis que possui 6,30 km2. Os outros ambientes terrestres na faixa do polígono de estudo somam 57,41 km2.

Tabela 1:
As unidades de dunas móveis, dunas fixas e demais ambientes terrestres

As dunas são ambientes extremamente importantes, por atuarem como barreira de progressão marinha e ressacas, por formarem e protegerem o lençol freático e por abrigarem grande quantidade de formas de vida animal e vegetal, os quais são adaptados a esse tipo de ambiente (ESTEVES et al., 2002ESTEVES, L. S.; TOLDO Jr., E. E.; DILLENBURG, S. R.; TOMAZELLI, L. J. Long- and Short- Term Coastal Erosion in Southern Brazil. Journal of Coastal Research, v. 36, p. 273-282, 2002.; RAMALHO et al., 2013RAMALHO, M. F. J. L; LOURENÇO, C. C. C.; MEDEIROS, L. F. C. Efeitos da Dinâmica Eólica no Ambiente de Dunas em Natal/RN. Rev. Sociedade e Território, Natal, v. 25, nº 1, p. 30 - 44, jan./jun. 2013.). As dunas, como ambientes naturalmente dinâmicos, são altamente influenciadas por várias formas de perturbações, que podem ser antrópicas ou naturais, diretas ou mesmo indiretas (ESTEVES et al., 2002ESTEVES, L. S.; TOLDO Jr., E. E.; DILLENBURG, S. R.; TOMAZELLI, L. J. Long- and Short- Term Coastal Erosion in Southern Brazil. Journal of Coastal Research, v. 36, p. 273-282, 2002.; TABAJARA et al., 2005TABAJARA, L. L.; GRUBER, N. L. S.; DILLENBURG, S. R.; AQUINO, R. Vulnerabilidade e Classificação das Dunas da Praia de Capão da Canoa, Litoral Norte do Rio Grande do Sul. Revista GRAVEL, Porto Alegre, RS, p. 71-84, 2005. ISSN 1678-5975.).

Conhecer e registrar as dimensões e dinâmica do ecossistema de dunas do ambiente costeiro pode ser o primeiro passo na implementação de instrumentos ou políticas de manejo. Ao estudar os campos de dunas no Estado do Rio Grande do Sul, Portzet al. (2010PORTZ, L. C.; MANZOLLI, R. P.; GRUBER, N. L. S.; CORREA, I. C. S. Turismo e degradação na orla do Rio Grande do Sul: conflitos e gerenciamento. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Editora UFPR, n. 22, p. 153-166, jul./dez. 2010.) pontuam a implementação de Programas ou Planos de Manejo de Dunas como um forte instrumento para a conservação desses ambientes, já que neste tipo de planejamento são previstos os possíveis usos do ambiente, em um longo período de tempo. Nesse sentido, ao ordenarem as formas de utilização desses espaços, além de controlar a degradação da vegetação e a fauna associada, destacam as implicações do artigo 3º do Código Florestal Brasileiro, que considera este ambiente como Área de Preservação Permanente (PORTZ et al 2010PORTZ, L. C.; MANZOLLI, R. P.; GRUBER, N. L. S.; CORREA, I. C. S. Turismo e degradação na orla do Rio Grande do Sul: conflitos e gerenciamento. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Editora UFPR, n. 22, p. 153-166, jul./dez. 2010.).

De Seoane et al. (2007DE SEOANE, C. L. V.; FERNÁNDEZ, J. B. G.; PASCUAL, C. V. Manual de restauración de dunas costeras. Governo da Espanha e Departamento de Meio Ambiente, Edita: Ministério de Medio Ambiente, Septiembre, 2007.) relatam que o simples tráfego a pé sobre as dunas pode causar graves danos a esse sistema por causa do pisoteio da vegetação e do revolvimento da areia, que causam ressecamento e exposição à ação eólica. Já o tráfego de veículos sobre as dunas, além de causar a destruição da vegetação, ocasiona também a compactação do solo, o que dificulta ainda mais o poder de resiliência desses ecossistemas (DE SEOANE et al., 2007DE SEOANE, C. L. V.; FERNÁNDEZ, J. B. G.; PASCUAL, C. V. Manual de restauración de dunas costeras. Governo da Espanha e Departamento de Meio Ambiente, Edita: Ministério de Medio Ambiente, Septiembre, 2007.). Nesse sentido, Cordazzo et al. (2006CORDAZZO, C. V.; PAIVA, J. B.; SEELIGER, U. Plantas das Dunas da Costa Sudoeste Atlântica: Guia ilustrado. Pelotas, RS, USEB, 2006. 107p.) enfatizam que os efeitos combinados das diferentes perturbações antrópicas e hidrodinâmicas têm reduzido a estabilidade das dunas frontais da costa sudoeste atlântica, aumentando as taxas de transgressão em até 150 metros num só ano. Dessa forma, subtrai drasticamente (até 70%) a biodiversidade de plantas e, concomitantemente, da fauna associada (CORDAZZO et al. 2006CORDAZZO, C. V.; PAIVA, J. B.; SEELIGER, U. Plantas das Dunas da Costa Sudoeste Atlântica: Guia ilustrado. Pelotas, RS, USEB, 2006. 107p.).

Para Cunha et al. (2003CUNHA, L. O.; FONTES, M. A. L.; OLIVEIRA, A. D.; OLIVEIRA-FILHO, A. T. Análise Multivariada da vegetação como ferramenta para avaliar a reabilitação de dunas litorâneas mineradas em Mataraca, Paraíba, Brasil. Revista Árvore, Viçosa-MG, v.27, n.4, p.503-515, 2003.), as dunas possuem papel essencial no equilíbrio hidrológico costeiro, uma vez que as águas pluviais sobre as dunas são inteiramente absorvidas por estas, infiltrando-se para alcançar o aquífero. Borghetti et al. (2004BORGHETTI, N.; BORGHETTI, J. R.; ROSA, E. F. F. Aquífero Guarani - A verdadeira integração dos países do Mercosul. Curitiba: Imprensa Oficial, 2004.) explicam que as dunas são excelentes para o desenvolvimento de água subterrânea devido à sua alta taxa de recarga, boa permeabilidade, condutividade hidráulica e qualidade de água para o consumo. Para tal, é necessário garantir a manutenção da vegetação associada a essas formações.

Análise dos sítios arqueológicos

O mapeamento dos sítios arqueológicos da região resultante da metodologia proposta, no qual foram consultados o CNSA/IPHAN e literatura científica regional (DEBLASIS et al. 2007DEBLASIS, P.; KNEIP, A.; SCHEEL-YBERT, R.; GIANNINI, P. C.; GASPAR, M. D. Sambaquis e paisagem: dinâmica natural e arqueologia regional no litoral do sul do Brasil. Revista arqueología suramericana/arqueologia sul-americana, v. 3, n. 1, enero/janeiro 2007.; FARIAS & KNEIP, 2010FARIAS, D. S. E.; KNEIP, A. Panorama Arqueológico de Santa Catarina. Palhoça: Editora UNISUL, 2010.) e certificação em campo. Foram identificados 17 sítios arqueológicos distribuídos na região, sendo que 12 estão localizados no Cabo de Santa Marta Grande (Região do Farol) e cinco estão distribuídos na região do Cabo de Santa Marta Pequeno (Região da Galheta).

Com base na interpretação em tela das imagens e nos levantamentos de campo, foi possível estabelecer a dimensão relativa da área exposta dos sítios arqueológicos mapeados. Totalizando uma área de 8,31ha, a área exposta dos sambaquis mapeados representa 0,115% da área de estudo. A localização e as dimensões individuais dos sítios arqueológicos mapeados estão expressas na Tabela 2 e representados na Figura 2.

Tabela 2
Localização e caraterização geográfica dos sítios arqueológicos da região do Cabo de Santa Marta

Figura 2
Mapeamento da distribuição espacial dos Sítios Arqueológicos do Cabo de Santa Marta, Laguna, SC, ano de 2015

Os sítios arqueológicos da região do Cabo de Santa Marta são estudados desde a década de 60 a partir dos trabalhos pioneiros de João Alfredo Rohr, indicando uma grande incidência de sítios na região (ROHR, 1962 apud DEBLASIS et al., 2007DEBLASIS, P.; KNEIP, A.; SCHEEL-YBERT, R.; GIANNINI, P. C.; GASPAR, M. D. Sambaquis e paisagem: dinâmica natural e arqueologia regional no litoral do sul do Brasil. Revista arqueología suramericana/arqueologia sul-americana, v. 3, n. 1, enero/janeiro 2007.). Mesmo com esta constatação, são poucas as medidas efetivas para a preservação deste patrimônio. Linheira (2013LINHEIRA, G., Conflitos de uso da terra em Laguna: áreas urbanas versus sítios arqueológicos pré-históricos. Revista Tempos Acadêmicos, Dossiê Arqueologia Pré-Histórica, nº 11, 2013, Criciúma, Santa Catarina. ISSN 2178-081.), ao estudar as formas de uso e ocupação do solo em conflito com as áreas de sítios arqueológicos pré históricos no município de Laguna, percebeu que:

[…] esses espaços não são respeitados e tão pouco protegidos pelo poder público municipal. Pelo contrário, a ausência de sua ação e fiscalização tem permitido que os sítios sejam sistematicamente descaracterizados e gerando como consequência mais grave a impossibilidade de estudo da pré-história da região. (LINHEIRA, 2013LINHEIRA, G., Conflitos de uso da terra em Laguna: áreas urbanas versus sítios arqueológicos pré-históricos. Revista Tempos Acadêmicos, Dossiê Arqueologia Pré-Histórica, nº 11, 2013, Criciúma, Santa Catarina. ISSN 2178-081., p. 257).

Frente a essa situação, o autor enfatiza que os sítios arqueológicos pré-históricos são protegidos por diversas leis, destacando desde a Constituição Federal de 1988 (art.215 e 216), até algumas resoluções e portarias, dentre elas, a Resolução CONAMA 01/86, a Portaria IPHAN 07/88 e a Portaria IPHAN 230/02 (LINHEIRA, 2013LINHEIRA, G., Conflitos de uso da terra em Laguna: áreas urbanas versus sítios arqueológicos pré-históricos. Revista Tempos Acadêmicos, Dossiê Arqueologia Pré-Histórica, nº 11, 2013, Criciúma, Santa Catarina. ISSN 2178-081.).

Além das determinações mencionadas, deve-se considerar também a importância dos Sambaquis como patrimônio histórico universal. Destarte, a Lei de Crimes Ambientais nº 9605/98 deve ser mencionada, pois dentre outros itens, ela regulamenta os usos, a proteção e a defesa do patrimônio arqueológico, considerando-o como bem da União, assim como a legislação estadual e delegações municipais sobre o tema.

Propostas de gestão socioambiental costeira, com o uso do patrimônio arqueológico como subsídio, são oportunas para poucas regiões do mundo que ainda possuem esse privilégio. Beltrán& Cervantes (2013BELTRÁN, C. F.; CERVANTES, O. El patrimonio arqueológico como herramienta de gestión ambiental enla zona costera de Baja California. México. Costas, vol. 2, n.2 - Julio 2013. ISSN 2304 0963.) propuseram medidas semelhantes para a região da Baja Califórnia, no México, onde o uso do patrimônio arqueológico dessa região costeira serviria de subsídio e ferramenta na gestão ambiental local. Em seu estudo, os autores concluíram que o trabalho comunitário na gestão orientada à preservação do patrimônio arqueológico pode servir como um propulsor da preservação da região como um todo (BELTRÁN; CERVANTES, 2013BELTRÁN, C. F.; CERVANTES, O. El patrimonio arqueológico como herramienta de gestión ambiental enla zona costera de Baja California. México. Costas, vol. 2, n.2 - Julio 2013. ISSN 2304 0963.).

A elaboração de planos de manejo que contemplem o manejo do patrimônio arqueológico pode servir de subsídio a diversas ações em benefício da região, como por exemplo, a implementação de planos incentivo a preservação das áreas adjacentes onde ocorrem os sítios ou mesmo amparar ações de educação para formação de guias locais para efetivação de turismo de visitação arqueológica consciente.

Análise dos ambientes antropizados

A partir do mapeamento dos ambientes antropizados, foi possível determinar a distribuição dessa categoria geral de uso na região. Ocupando uma área total de 434,399ha, as parcelas de solo identificadas como ambiente antropizado correspondem a 6,05% da área de terra total do ambiente considerado no estudo, o que pode indicar um bom potencial para conservação, já que a maior parte do território ainda não foi ocupado.

Em contraponto ao baixo percentual de ocupação humana, a distribuição espacial dos ambientes antrópicos da região é preocupante, já que os mesmos se localizam em áreas de preservação permanente e demais ambientes frágeis, na faixa de domínio da União, nos costões rochosos, muito próximos ou mesmo em meio ao cordão de dunas, que coloca estes ambientes e a área de absorção do aquífero em estado permanente de pressão. Linheira (2013LINHEIRA, G., Conflitos de uso da terra em Laguna: áreas urbanas versus sítios arqueológicos pré-históricos. Revista Tempos Acadêmicos, Dossiê Arqueologia Pré-Histórica, nº 11, 2013, Criciúma, Santa Catarina. ISSN 2178-081.) realizou mapeamento de uso e cobertura da terra para o Município de Laguna onde, apesar de não ter estabelecido o percentual de área ocupada, o autor enfatiza a distribuição espacial das ações humanas, confirmando que as principais manchas de urbanização na região do Cabo de Santa Marta, assim como no restante do município, se localizam principalmente às margens da rodovia, nos balneários e Lagoas (LINHEIRA, 2013LINHEIRA, G., Conflitos de uso da terra em Laguna: áreas urbanas versus sítios arqueológicos pré-históricos. Revista Tempos Acadêmicos, Dossiê Arqueologia Pré-Histórica, nº 11, 2013, Criciúma, Santa Catarina. ISSN 2178-081.).

A partir do mapeamento realizado, foi possível constatar evidências de situações de conflito, onde residências de veraneio e condomínios de alto padrão contrastam e descaracterizam o ambiente de comunidade tradicional. Também, foi possível constatar o avanço das construções privadas de propriedade de pessoas da comunidade em áreas de APP (Áreas de Preservação Permanente) e de domínio da União (Figura 3). Cruz (1998CRUZ, O. A Ilha de Santa Catarina e o continente próximo: um estudo de geomorfologia costeira. 1998.) destaca essas áreas como, não indicadas á ocupação, à extração e exposição ao risco de poluição dessas áreas. O autor enfatiza que “é de grande importância, de fato, conservar a vegetação natural em frente à praia” (CRUZ, 1998CRUZ, O. A Ilha de Santa Catarina e o continente próximo: um estudo de geomorfologia costeira. 1998., p.182).

Área proposta para Unidade de Conservação

Os ecossistemas naturais têm sido amplamente ameaçados por um conjunto de influências humanas, principalmente por causa dos usos e ocupação desregrada dos territórios. As estratégias de conservação e preservação ambiental podem, por meio de diferentes formas, contribuir para a preservação das espécies e são também medidas lúcidas para garantir a satisfação das necessidades básicas das atuais e futuras gerações humanas. Nesse contexto, faz-se necessário considerar não somente quais são as áreas prioritárias para a conservação, mas também quais dessas regiões as comunidades locais estão mais dispostas a proteger. A partir da busca de modelos alternativos de desenvolvimento, enfatiza-se a importância da gestão participativa, pois a participação é compartilhamento de poder para se alcançar resultados. Nesse sentido, os moradores locais devem ser os maiores interessados e com o maior poder de decisão sobre as questões socioambientais no seu território.

A partir da integração dos elementos mapeados, as áreas de dunas, os sítios arqueológicos e a exclusão das áreas antropizadas, obteve-se um polígono de área total de 12,23 km2 (Figura 3).

Figura 3
Proposta da área com potencial para conservação ambiental na região do Cabo de Santa Marta, Município de Laguna/SC

Fonte: Org. dos Autores.

A área proposta como unidade de conservação integral se caracteriza por uma porção única e alongada inserida no território do Cabo de Santa Marta, abrangendo além do cordão de dunas e dos sítios arqueológicos, a ocorrência de ambientes alagadiços e de vegetação de restinga com grau de conservação (Figura 4).

Figura 4
Área de dunas e ambiente lacustre/alagadiço presente na área de estudo

A região indicada como unidade de conservação integral é uma porção de terra de importância socioambiental, tanto por caracterizar um mosaico de áreas de preservação permanente, por sua importância ecológica, por abrigar os maiores sítios arqueológicos (sambaquis) do mundo, por conter um aquífero que é a única fonte de água doce potável na região, como por seu valor paisagístico e cultural. Esta é uma área que abriga atributos únicos, que impulsiona o turismo, inclusive em nível internacional.

De acordo com Mapa do Zoneamento Ecológico Econômico Costeiro C - setor 4 Centro Sul, do Plano Estadual de gerenciamento Costeiro - GERCO-SC, esta porção de terra está inserida numa área, onde foi definida pelo ZEE como zona de preservação predominante ou zona de uso restrito.

Diante do padrão civilizatório que se apresenta, vem à tona a perspectiva de que é preciso buscar uma forma de superar o paradigma atual de desenvolvimento, no qual há normatização e conhecimento acerca da importância e fragilidade dos ambientes, todavia sem estrutura de Estado para a fiscalização e implementação efetiva das regulamentações, cujos maiores interessados não se apropriam do seu papel fundamental na cogestão do território e as instituições pouco conseguem avançar além da atuação local, superficial ou paliativa.

Nesse sentido, urge a necessidade da implementação de um planejamento dos territórios, voltado à preservação ambiental, do patrimônio histórico, arqueológico e cultural, a partir de uma perspectiva de desenvolvimento de territórios sustentáveis (VIEIRA, 2010), cujas atividades possam acontecer em sintonia com a natureza, de forma a preservá-la não somente por seu valor de uso ou função ecológica, mas por direito universal à vida, ocorrendo a descentralização do poder numa estrutura democrática e com a participação social e o desenvolvimento a partir das características e valorização das potencialidades locais (MORIN, et al. 2002MORIN, E.; KERIN, A. Terra-Pátria. Porto Alegre: Sulina, 2002.; MARRONI e ASMUS, 2005MARRONI, E. V.; ASMUS, M. L. Gerenciamento Costeiro: uma proposta para o fortalecimento comunitário na gestão ambiental. USEB, 2005.; VIEIRA, 2009VIEIRA, P. F. Políticas ambientais no Brasil: do preservacionismo ao desenvolvimento territorial sustentável. Política e Sociedade, Florianópolis, v. 8, n.14, p. 27-75, 2009. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2009v8n14p27
http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2009...
; PEREIRA& DIEGUES, 2010PEREIRA, E.; DIEGUES, A. C. Conhecimento de populações tradicionais como possibilidade de conservação da natureza: uma reflexão sobre a perspectiva da etnoconservação. Revista Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 22, p. 37-50, jul./dez. 2010.; POLETTE& VIEIRA, 2010POLETTE, M; VIEIRA, P. H. Avaliação do processo de gerenciamento costeiro no Brasil: bases para discussão. Florianópolis, Santa Catarina. Sanitário Geosul, Florianópolis, v. 25, n. 49, p 159-177, jan./jul. 2010. Editora UFPR.; GIARETTA et al. 2012GIARETTA, J. B. Z.; FERNANDES, V.; PHILIPPI JR, A. Desafios e Condicionantes da Participação Social na Gestão Ambiental Municipal no Brasil. Revista o&s-UFBA - Salvador, v.19 - n.62, p. 527-548. 2012. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1984-92302012000300009.
http://dx.doi.org/10.1590/S1984-92302012...
).

Recomendamos para a área delimitada, a criação de uma Unidade de Conservação de proteção integral na categoria de Parque Natural Municipal, pois de acordo com a Lei no 9.985/2000 esta categoria de UC tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização regrada de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza conforme previsto no Plano de Manejo a ser elaborado.

A proposta visa também proteger e administrar de maneira responsável o aquífero que sustenta as comunidades locais, e consequentemente, protegendo também os ecossistemas e paisagens naturais e os sítios arqueológicos presentes na região.

Cordazzo et al. (2006CORDAZZO, C. V.; PAIVA, J. B.; SEELIGER, U. Plantas das Dunas da Costa Sudoeste Atlântica: Guia ilustrado. Pelotas, RS, USEB, 2006. 107p.) colocam que as ações humanas interferem negativamente nas funções ecológicas das regiões de dunas costeiras. Uma vez que os principais serviços ecológicos dessas áreas são a proteção costeira, a preservação da vida selvagem e dos recursos hidrológicos regionais, um gerenciamento costeiro deveria considerar as diferenças ecológicas dentro e dentre as distintas regiões fisiográficas. Dessa forma, poderia preservar o valor dos diferentes ecossistemas costeiros em relação ao uso ordenado da terra e evitar a destruição destes ambientes.

A criação de espaços protegidos pode ser uma medida eficiente na conservação dos recursos naturais, mas também, pode ser uma oportunidade para o desenvolvimento de territórios sustentáveis, no sentido de subsidiar o desenvolvimento das comunidades por meio das suas características e potencialidades.

A importância da delimitação de espaços especialmente protegidos está diretamente relacionada à possibilidade dessas áreas fazerem parte de um sistema mais amplo de sustentabilidade. Desse modo, o estabelecimento das áreas de maior importância ambiental deve ser avaliado em seu contexto socioambiental. Tais áreas de proteção necessitam estar associadas aos projetos de desenvolvimento da comunidade local. Se, por um lado, ficam restritos nestas áreas, vários tipos de uso e ocupação, por outro, os usos turísticos de esporte e lazer podem ser recomendados. Para isso, é fundamental que estejam abertos espaços de discussão, planejamento e gestão integrada com a participação dos diferentes atores sociais, governamentais e institucionais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo foram identificados os elementos da paisagem com importância ambiental e a utilização/ocupação antrópica, de forma a efetivar a realização de um diagnóstico ambiental na região do Cabo de Santa Marta, Município de Laguna, Estado de Santa Catarina, com objetivo de subsidiar a proposição da criação de uma Unidade de Conservação de proteção integral. A partir do mapeamento da área de abrangência das dunas fixas e móveis da região, foi possível calcular sua dimensão e espacializar suas características em dinâmica com o ambiente do seu entorno, onde foram recomendas medidas mitigatórias e de manejo dessas áreas.

A identificação, o mapeamento da localização e dimensionamento das áreas expostas dos sítios arqueológicos possibilitaram conhecer o estado atual e contexto onde estão inseridos os sambaquis da região, assim como permitiu recomendação de ações futuras voltadas à pesquisa e a gestão de forma participativa deste patrimônio, onde é possível aliar a preservação e o turismo controlado.

O mapeamento dos ambientes antrópicos possibilitou efetivar um diagnóstico situacional do uso e ocupação na região estudada, onde foram identificadas situações de conflito referentes ao padrão de assentamento com a legislação vigente, em proteção ao meio ambiente.

Por fim, foi elaborado um mapa temático síntese onde foi proposta a área prioritária à criação de uma área protegida, ao qual se somam a ocorrência de vegetação e fauna protegidas por lei, e onde está distribuída a maior parte dos sítios arqueológicos da região, abrangendo também grande parte do Cordão de Dunas que se caracteriza como uma zona de recarga do aquífero que abastece as comunidades locais.

Entende-se que o estabelecimento de áreas protegidas não é a solução única para o problema do enfrentamento da crise planetária do meio ambiente. Ainda assim, os espaços preservados e de conservação, surgem como uma medida de precaução, enquanto a solução para os atuais dilemas socioambientais não sejam superados.

Em termos ambientais ecossistêmicos e socioambientais, sugerimos a criação de uma UC na categoria de Parque Natural Municipal em uma área contínua, ligando os diferentes ecossistemas associados, garantindo assim, a movimentação das espécies e o fluxo gênico necessário à manutenção da biodiversidade animal. Deste modo, serve também para a regeneração e manutenção da vegetação, das paisagens e dos mananciais hídricos, garantindo assim a sustentabilidade dos serviços ecossistêmicos associados a estes. Consideramos oportuno sugerir também que ações de proteção e manejo destas áreas podem ser consolidadas, num primeiro momento, por meio da sensibilização da população local.

Posteriormente, programas e práticas educativas voltadas para a ecoformação podem instrumentalizar e consolidar o engajamento comunitário em defesa deste patrimônio natural, inclusive com a implementação de propostas de acordo ou regramento de manejo local adequado destes recursos, podendo concretizar oportunidade não só de renda, mas também subsidiar a sinergia necessária à criação de territórios efetivamente sustentáveis.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a participação e apoio da comunidade do Cabo de Santa Marta, Laguna - SC, assim como o suporte financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina - FAPESC, por meio da concessão de uma bolsa de pesquisa de dissertação de mestrado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    22 Jul 2016
  • Aceito
    28 Jun 2017
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