Acessibilidade / Reportar erro

Estimativa da produção do capim dourado (Syngonanthus nitens) para subsidiar o seu extrativismo socioeconômico sustentável no Parque Estadual do Jalapão, TO

Estimation of the production of capim dourado (Syngonanthus nitens) to subsidize its socioeconomically sustainable extractivism in the Jalapão State Park, TO

Resumo

A exploração de capim dourado (CD) corresponde a uma das atividades econômicas mais importantes na região do Jalapão, TO. Neste sentido, este trabalho teve como objetivo estimar a produção de CD nos Campos Limpos Úmidos (CLUs) associados às Veredas no Parque Estadual do Jalapão, TO. A produção de CD foi levantada em vinte áreas de CLUs nos anos de 2011 e 2012. Ao longo de transeções perpendiculares às linhas de drenagem, foram coletadas amostras de escapos representativas do capim por meio de um gabarito com dimensões internas de 0,5 m x 0,5 m. Os escapos foram secos em estufa e pesados para obtenção da massa seca (produtividade). A produção foi obtida multiplicando-se a área de ocorrência de CLUs pela produtividade média de escapos. Foram realizadas ainda entrevistas com setenta afiliados das associações de artesanatos e extrativistas da região do Jalapão, cadastrados no Órgão Ambiental do Estado do TO - Naturatins. A produção, estimada em 125.696 kg ano-1, pode ser considerada alta em relação ao que vem sendo comercializado pelas associações entrevistadas, que é de aproximadamente 20.250 kg ano-1. Este valor representa em torno de 16% do que é produzido na área do Parque. Existe um elevado risco do extrativismo de CD no Parque aumentar acima da sua capacidade de produção se não houver um maior controle sobre a exploração da espécie.

Palavras-chave:
Campos Limpos Úmidos; comunidades tradicionais; sustentabilidade; extrativismo

Abstract

The exploration of capim dourado corresponds to one of the most important economical activities in the Jalapão region, Tocantins State. This study aimed to estimate the production of capim dourado in the Campos Limpos Úmidos associated to Veredas in the Jalapão State Park. The productivity was estimated from 20 sites over the Campo Limpo Úmido in the years of 2011 and 2012. Along the transects perpendicular to the streams located in areas dominated by Campos Limpos Úmidos, we sampled stems of capim dourado within a set of sampling areas of 0.5 m x 0.5 m. The stems were oven-dried and weighed to calculate the dry biomass (productivity). The production was estimated multiplying the area occupied by Campos Limpos Úmidos by the average productivity of stems. We also interviewed 70 affiliates of local associations of handicrafts and extractors registered in the Jalapão region. The production, estimated in 125,696 kg, can be considered high if we compare to the average amount of capim dourado explored by local associations registered in the environmental agency of Tocantins State, which is approximately 20,250 kg ano-1. This is about 16% of the amount produced in the Park. Considering that the exploration is increasing in the region, a more tight control of such exploration inside the Park is recommended.

Keywords:
Campos Limpos Úmidos; traditional communities; sustainability; extraction

Introdução

O capim dourado (CD) (Syngonanthus nitens) é uma "sempre-viva", espécie de planta que, após colhida e seca, consegue resistir consideravelmente ao tempo. É muito utilizada na decoração de interiores e confecção de artesanatos (Giulietti et al., 1988GIULIETTI, N.; GIULIETTI, A. M.; PIRANI, J. R.; MENEZES, N. L. Estudos de sempre-vivas: importância econômica do extrativismo em minas Gerais, Brasil. Acta Botânica Brasilica, v. 1, n. 2, p. 179-193, 1988., 1996). O CD na região do Jalapão ocorre associado à fisionomia campestre denominada de Campo Limpo Úmido (CLU) que se encontra adjacente às Veredas. Pacifico et al. (2011PACIFICO, M.; NAPOLITANO, A.; MASULLO, M.; HILARIO, F.; VILEGAS, W.; PIACENTE, S.; SANTOS, L. C. Metabolite fingerprint of “capim dourado” (Syngonanthus nitens), a basis of Brazilian handcrafts. Industrial Crops and Products, v. 33, p. 488-496, 2011. https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2010.10.023
https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2010.1...
) realizaram um estudo analítico para definir a impressão digital metabólica do capim dourado a fim de identificar as moléculas responsáveis pela cor dourada da espécie. A conclusão foi de que os flavonóides são os responsáveis pela cor dourada do referido capim. O CD é a quarta espécie com maior valor de cobertura relativa (3,5%) nos Campos Limpos Úmidos do Parque Estadual do Jalapão (PEJ), ficando atrás de duas espécies da família Poaceae ainda não identificadas (48,6% e 14,3%) e da Mesosetum agropyroides (10,4%) (Resende, 2007). Mesmo ocupando o quarto lugar, o CD tem baixa cobertura relativa. Os CLUs correspondem a áreas onde as comunidades tradicionais da região do Jalapão desenvolvem atividades econômicas relacionadas à agricultura de subsistência, pecuária extensiva e extrativismo de recursos naturais. A principal atividade econômica desenvolvida na região ocorre com o extrativismo de capim dourado para a confecção de artesanato (SEPLAN, 2003).

A atividade extrativista de CD no PEJ é conduzida principalmente pelas comunidades tradicionais de Mumbuca e Prata (SCHMIDT et al., 2007SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; SCARIOT, A. Ethnobotany and effects of harvesting on the population ecology of Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae), a NTFP from Jalapão region, central Brazil. Economic Botany, v. 61, n. 1, p. 73-85, 2007. https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)61[73:EAEOHO]2.0.CO;2
https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)6...
). Entretanto, verifica-se uma demanda crescente do extrativismo para a produção de artesanato pela população urbana, representada pelas cidades de Lagoa do Tocantins, Mateiros, Novo Acordo, Ponte Alta do Tocantins, São Félix e Santa Tereza. Na região, existem dezessete associações de artesãos e extrativistas, com mais de 900 artesãos cadastrados. A renda familiar dos artesãos pode ser superior a dois salários mínimos, tornando essa atividade economicamente importante para a população da região do Jalapão, caracterizada por um índice de desenvolvimento humano (IDH) médio-baixo, em torno de 0,59 (PNUD, 2016).

Uma das motivações desta pesquisa foi a importância econômica e social que o extrativismo de capim dourado promove na região do Jalapão. A atividade extrativista é caracterizada como uma exploração de produto florestal não-madeireiro (PFNM). De acordo com Santos et al. (2003SANTOS, A. J.; HILDEBRAND, E.; PACHECO, C. H. P.; PIRES, P. T. L.; ROCHADELLI, R. Produtos não madeireiros: conceituação, classificação, valoração e mercado. Revista Florestal, v. 33, n. 2, p. 215-224, 2003. https://doi.org/10.5380/rf.v33i2.2275
https://doi.org/10.5380/rf.v33i2.2275...
), tais produtos são “secundários” e bastante variados.

Estudos quantitativos relacionados à produtividade e à produção de espécies nativas no Brasil ainda são escassos. O Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) disponibiliza pouca ou nenhuma informação sobre os PFNMs. As informações quantitativas relacionadas aos produtos extrativistas são disponibilizadas nos Anuários Estatísticos do IBGE e no Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). As informações disponíveis no SIDRA sobre a produção dos principais PFNMs explorados no bioma Cerrado se referem à amêndoa de babaçu, ao óleo de copaíba, à fibra de buriti, à folha de jaborandi, às cascas de barbatimão e angico, ao fruto da mangaba e à amêndoa de pequi (IBGE, 2016).

De acordo com estudo realizado por Afonso e Ângelo (2009AFONSO, S. R.; ÂNGELO, H. Mercado dos produtos florestais não-madereiros do cerrado brasileiro. Ciências Florestais, v. 19, n. 3, p. 315-326, 2009. https://doi.org/10.5902/19805098887
https://doi.org/10.5902/19805098887...
), houve uma queda na produção dos PFNMs de ocorrência no Cerrado durante o período de 1982 a 2005, com exceção do pequi e do óleo de copaíba. Embora a copaíba tenha apresentado maior aumento na produção (12,9%) do que o pequi (8,5%), sua oferta provém em quase sua totalidade da região amazônica. Assim, o pequi se destacou como o principal produto do Cerrado e é bastante demandado na culinária regional e na extração de óleo de cozinha e produção de cosméticos. Os autores identificaram ainda as causas nas quedas da produção dos produtos estudados. Em relação ao babaçu, a queda ocorreu em virtude de mudança de consumo dos óleos extraídos das amêndoas e à redução e eliminação das alíquotas de importação de óleos de palma e palmiste, ambos provenientes da Malásia e similares ao óleo de babaçu. Sano et al. (2008SANO, S. M.; SIMON, M. F. Produtividade do baru (Dipteryx alata Vong.) em ambientes modificados, durante 10 anos. In: IX Simpósio Nacional do Cerrado, Brasília, Anais..., Planaltina, Embrapa Cerrados, 2008. https://doi.org/10.1590/S0100-204X2008000100020
https://doi.org/10.1590/S0100-204X200800...
) estudaram a produtividade do baru em ambientes antropizados e concluíram que a produção do baru é variável entre os anos e que os seus frutos têm dimensões maiores nos anos de safra menores e vice-versa. Portanto, a produção do baru parece estar relacionado mais com a fenologia da planta do que com as flutuações do mercado. De acordo com os autores, as amêndoas do baru tem alvo valor nutricional, tornando-se uma importante fonte de renda para comunidades rurais da região do Cerrado.

Schmidt et al. (2011SCHMIDT, I. B.; MANDLE, L.; TICKTIN, T.; GAOUE, O. What do matrix population models reveal about the sustainability of non-timber forest product harvest? Journal of Applied Ecology, v. 48, p. 815-826, 2011. https://doi.org/10.1111/j.1365-2664.2011.01999.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2664.2011...
) e Schmidt e Ticktin (2012) conduziram estudos envolvendo efeitos da colheita de capim dourado explorados no Tocantins, objetivando a sustentabilidade da espécie e a produção de informações que possam subsidiar políticas públicas. Neste contexto, este trabalho teve como objetivo estimar a produção de capim dourado nos Campos Limpos Úmidos associados às Veredas no Parque Estadual do Jalapão, TO como forma de inferir a produção e a sustentabilidade econômica dessa atividade no contexto local.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de Estudo

A área de estudo situa-se no Parque Estadual do Jalapão (PEJ), município de Mateiros, localizada na porção leste do estado do Tocantins e pertencente à região do Jalapão (SEPLAN, 2003). No município de Mateiros, a densidade demográfica é de 0,23 habitantes km-2 (IBGE, 2016). O PEJ encontra-se a 324 km de Palmas, entre as latitudes 10º 08' 73" S e 10º 35' 09" S e entre as longitudes 47º 04' 01" W e 47º 35’ 06" W (Figura 1). O PEJ foi criado pela Lei Estadual no. 1.203 de 12 de janeiro de 2001, apresentando uma área de 158.885 hectares, o que corresponde a 16% do município de Mateiros. O PEJ abriga diferentes manifestações vegetacionais savânicas, com predominância da formação campestre (SANO et al., 2008SANO, S. M.; SIMON, M. F. Produtividade do baru (Dipteryx alata Vong.) em ambientes modificados, durante 10 anos. In: IX Simpósio Nacional do Cerrado, Brasília, Anais..., Planaltina, Embrapa Cerrados, 2008. https://doi.org/10.1590/S0100-204X2008000100020
https://doi.org/10.1590/S0100-204X200800...
; SANTIAGO e PEREIRA JÚNIOR, 2010SANTIAGO, A. R.; PEREIRA JÚNIOR, A. C. Mapeamento da cobertura da terra dos Parques Estaduais do Jalapão (PEC), Cantão (PEC) e município de Itaguatins (Tocantins). Ambiência, v. 6, n. 1, p. 109-124, 2010.).

Figura 1
Mapa de localização do Parque Estadual do Jalapão no município de Mateiros, Tocantins. A imagem mostrada na figura corresponde à imagem do satélite RapidEye de 2010

De acordo com estudo realizado por Santana et al. (2014SANTANA, H. M. P.; SANO E. E.; LACERDA, M. P. C. Levantamento dos campos limpos úmidos no Parque Estadual do Jalapão, TO por meio de fotografias aéreas analógicas: Abordagem metodológica. Revista Brasileira de Cartografia, v. 66, n. 1, p. 75-85, 2014.) utilizando fotografias aéreas, foram mapeados 12.656 ha de CLU no perímetro do PEJ, o que equivale a 7,9% da área oficial do Parque, ambiente onde ocorre a presença do capim dourado. A área de estudo foi selecionada em função de ser uma unidade de conservação com elevada ocorrência de capim dourado, sendo permitido, mediante autorização, estudos científicos, pois trata-se de uma unidade de conservação de proteção integral.

O clima da região é Aw - tropical úmido de savana com verão úmido e inverno seco de quatro a cinco meses (Figura 2). O relevo dominante é plano a suave ondulado, com altitudes variando de 400 m a 500 m. No Parque, destacam-se ainda as escarpas erosivas constituídas pelas serras do Espírito Santo, Jalapinha e Porco, com cotas que variam de 770 m a 798 m (SEPLAN, 2003). No interior do Parque, ocorrem várias nascentes que alimentam a bacia do rio Sono e contribuem com o sistema hidrográfico Tocantins-Araguaia.

Figura 2
Gráfico de precipitação média de chuvas no período de 1999 a 2011 da estação pluviométrica de Mateiros - TO

Levantamento da Produtividade de Capim Dourado

A estimativa da produtividade de capim dourado foi realizada em vinte áreas de Campos Limpos Úmidos adjacentes às Veredas no PEJ (Figura 3), consideradas representativas em relação ao desenvolvimento e distribuição de CD nos CLUs na região de estudo, segundo avaliações preliminares de campo, de imagens de satélites, de fotografias aéreas, de mapas temáticos de vegetação, entre outros. Foram realizadas duas campanhas de campo, a primeira de 27 de agosto a 02 de setembro de 2011 e a segunda de 27 a 31 de agosto de 2012. Tais períodos correspondem à estação seca na região.

Em cada área de CLU selecionada para o estudo, foram estabelecidas três transeções, ou seja, caminhamentos perpendiculares às linhas de drenagem, a partir da ocorrência do CLU até o início da área inundada com desenvolvimento da palmácea popularmente conhecida como buriti (Mauritia flexuosa), que corresponde à vegetação nativa típica da fitofisonomia Vereda. As transeções apresentaram comprimentos diversificados, em função da variação da extensão dos CLUs associados às Veredas no PEJ. As transeções foram divididas em três segmentos de mesma extensão, no sentido de borda-curso d'água, denominadas neste estudo de: Segmento 1 - S1 (borda - com ocorrência de solos mais secos - Neossolos Quartzarênicos Órticos típicos); Segmento 2 - S2 (medianos - solos com umidade intermediária - Neossolos Quartzarênicos Hidromórficos típicos); e Segmento 3 - S3 (borda - solos mais úmidos, Organossolos Háplicos Fíbricos típicos) (SANTANA et al., 2015SANTANA, H. M. P.; SANO, E. E.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. P.; LACERDA, M. P. C.; MALAQUIAS, J. V. Relação entre atributos físicos e químicos dos solos e a produtividade de capim dourado na região do Jalapão, TO. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 1172-1180, 2015. https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
https://doi.org/10.1590/01000683rbcs2014...
) (Figura 4).

Figura 3
Localização das vinte áreas de Campos Limpos Úmidos associados às Veredas consideradas no levantamento da produtividade de capim dourado no Parque Estadual do Jalapão

Foram coletados escapos (hastes) de CD nas três transeções das vinte áreas de CLUs associados às Veredas em S2, totalizando sessenta amostras anuais. O entendimento foi de que a espécie ocorre de forma dispersa ao longo dos três segmentos (S1, S2 e S3). Entretanto, foi em S2 que foi encontrada a maior ocorrência de escapos, pois nela o CD ocorre de forma mais homogênea e contínua (SANTANA et al., 2015SANTANA, H. M. P.; SANO, E. E.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. P.; LACERDA, M. P. C.; MALAQUIAS, J. V. Relação entre atributos físicos e químicos dos solos e a produtividade de capim dourado na região do Jalapão, TO. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 1172-1180, 2015. https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
https://doi.org/10.1590/01000683rbcs2014...
). Schmidt (2005SCHMIDT, I. B. Etnobotânica e ecologia populacional de Syngonanthus nitens: sempre-viva utilizada para artesanato no Jalapão, Tocantins. 91 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, 2005.) também conduziu suas unidades experimentais no Parque nesse segmento, por ser essa a faixa de maior ocorrência de capim dourado para descrever aspectos relativos à produção, dispersão e potencial germinativo de sementes de Syngonanthus nitens.

Figura 4
Esquema do levantamento da produtividade de capim dourado em campo nos vinte Campos Limpos Úmidos associados às Veredas no Parque Estadual do Jalapão. T = transeções; S = segmentos

Nesse segmento, ocorrem os Neossolos Quartzarênicos Hidromórficos típicos com umidade intermediária, com teor médio de 0,40 cm3 cm-3 de umidade, sendo este valor intermediário em relação a S1 (0,03 cm3 cm-3) e S3 (0,73 cm3 cm-3) (Figura 5). O levantamento da umidade do solo foi conduzido em dez CLUs adjacentes às Veredas no PEJ no ano de 2011 no período de seca (SANTANA et al., 2015SANTANA, H. M. P.; SANO, E. E.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. P.; LACERDA, M. P. C.; MALAQUIAS, J. V. Relação entre atributos físicos e químicos dos solos e a produtividade de capim dourado na região do Jalapão, TO. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 1172-1180, 2015. https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
https://doi.org/10.1590/01000683rbcs2014...
).

A amostragem dos escapos de CD foi realizada em três repetições aleatórias para o segmento S2, por meio de um gabarito com dimensões de 0,5 m x 0,5 m. Todos os escapos posicionados dentro do gabarito foram coletados e acondicionados em sacos e identificados para determinação da massa seca. Os escapos foram secos em estufa de circulação forçada de ar a uma temperatura de 55 °C por 48 horas ou até peso constante, de acordo com metodologia descrita por Silva e Queiroz (2002SILVA, D. J.; QUEIROZ, A. C. Análise de Alimentos: Métodos Químicos e Biológicos. Viçosa, UFV, 235 p., 2002.). Em seguida, foram pesadas em balança analítica de precisão, calculando a média aritmética simples das repetições.

Figura 5
Diagrama de dispersão da produtividade de capim dourado em relação à umidade do solo levantadas em dez Campos Limpos Úmidos associados às Veredas do Parque Estadual de Jalapão no ano de 2011 (agosto e setembro), nos segmentos S1, S2 e S3

Estimativa da Produtividade e Produção de Capim Dourado

A estimativa da produtividade de capim dourado nos CLUs associados às Veredas avaliadas foi calculada pela média da massa seca dos escapos coletados na área de 0,25 m-2 (Figura 6).

Figura 6
Coleta de capim dourado nos Campos Limpos Úmidos no segmento S2 nas transeções. A) área do gabarito de 0,25 m-2; e b) coleta dos escapos de capim dourado

Para a obtenção da produtividade em g m-2, a área avaliada foi multiplicada por quatro. Em seguida, fez-se a sua conversão para kg ha-1. Para a estimativa da produção média de CD, foi utilizada a área mapeada nos CLUs (SANTANA et al., 2014SANTANA, H. M. P.; SANO E. E.; LACERDA, M. P. C. Levantamento dos campos limpos úmidos no Parque Estadual do Jalapão, TO por meio de fotografias aéreas analógicas: Abordagem metodológica. Revista Brasileira de Cartografia, v. 66, n. 1, p. 75-85, 2014.) dividida por três, que representa a área correspondente ao segmento S2 dos CLUs, considerado representativo da produção de CD, versus a produtividade calculada em kg ha-1.

Levantamento da Estimativa da Exploração de Capim Dourado na Região

Com o intuito de levantar a quantidade de CD comercializado na região do Jalapão, foram realizadas entrevistas com extrativistas e artesãos afiliados nas associações de artesãos e extrativistas cadastradas no Naturatins (órgão estadual de meio ambiente do estado de Tocantins). De acordo com esse órgão ambiental, existiam dezessete associações regularmente cadastradas em 2012. Todas as associações estavam localizadas na região do Jalapão em Tocantins, nos municípios de Dianópolis, Lagoa do Tocantins, Lizarda, Mateiros, Novo Acordo, Novo Jardim, Ponte Alta, São Félix e Santa Tereza.

Das dezessete associações de artesanato e extrativistas cadastradas no estado, em quatorze delas foram realizadas entrevistas com os presidentes das associações e associados, totalizando setenta entrevistas, o que correspondeu a uma amostragem de aproximadamente 7,7% dos associados. A finalidade das entrevistas foi buscar dados que indicassem quantidade e origem do capim dourado explorado pelos associados (Figura 7), que são as pessoas legalmente autorizadas para comercializar, confeccionar e coletar o capim dourado no Estado.

Existe uma condição especial para os associados que estão localizados no interior da PEJ, como, por exemplo, o caso do povoado Mumbuca, uma comunidade tradicional estabelecida a mais de 80 anos, ou seja antes da criação do PEJ no ano de 2001. O Parque, por ser uma UC de proteção integral, não poderia ser explorado, mas o SNUC prevê o Termo de Compromisso como instrumento para regular a relação entre populações tradicionais residentes/usuárias de recursos naturais no interior de UC de proteção integral, onde assentamentos humanos não são admitidos.

Figura 7
a) Artesã entrevistada quando confeccionava artesanato no município de Santa Tereza; b) Artesanato produzido no município de Lagoa do Tocantins. Os municípios de Santa Tereza e Lagoa do Tocantins fazem parte da região do Jalapão

Para Lindoso e Parente (2015LINDOSO, L. C.; PARENTE, T. G. Ação Coletiva para o Termo de Compromisso na Região do Jalapão-TO: fortalecendo os sistemas de uso comum? VII Enanppas, 2015.), as comunidades tradicionais da região do Jalapão têm ligação geográfica, histórica e sentimental com o local onde vivem. O Decreto 6.040/2007, que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), conforme o art. 3º, inciso I, define o que são povos e comunidades tradicionais:

“São grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

Os dados obtidos nas entrevistas incluíram: atualização do número de associados cadastrados nas associações, quantidade de capim que é explorado por ano na confecção de artesanato, origem (município) do capim dourado e qual o valor do quilo comercializado. Esse levantamento foi feito para responder às seguintes questões: Qual a quantidade de CD explorado por meio dos artesãos afiliados nas associações cadastradas no Estado? Qual a proporção entre a quantidade de capim explorado pelos artesãos associados cadastrados no Estado e a estimativa da produção no Parque?

Resultados

As produtividades médias de capim dourado no segmento S2 nos anos de 2011 e 2012 estão apresentadas na Tabela 1. Foi verificada uma queda no ano de 2012 em relação a 2011 de 37,3%. Este decréscimo de produtividade em 2012 provavelmente está relacionado à ocorrência de queimadas em seis áreas de CLUs das vinte estudadas, totalizando dez transeções das sessenta avaliadas neste trabalho para cada ano.

Tabela 1
Produtividade média de massa seca de capim dourado avaliada em vinte Campos Limpos Úmidos associados às Veredas no Parque Estadual do Jalapão, nos anos de 2011 e 2012 no segmento S2

Apesar do PEJ representar uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, o governo do estado do Tocantins ainda não indenizou as populações que ali se estabeleceram antes da sua criação no ano de 2001. Por isso, muitas delas ainda permanecem no interior do mesmo. Essas comunidades tradicionais utilizam os CLUs do PEJ como pastagem nativa para criação de bovinos e extrativismo de capim dourado, adotando queimadas para renovação de pastagens e de CD (Figura 8). Essas queimadas fazem parte do manejo da cultura pelas comunidades cujo território encontra-se em sobreposição com a área do PEJ.

As atividades de extrativismo de capim dourado e pecuária são alternadas ao longo dos anos. O uso do fogo é realizado com a expectativa de aumento da produtividade e produção de CD no ano seguinte. A prática de queimada é recorrente na região do Jalapão com esse objetivo. O trabalho realizado por Figueiredo (2007FIGUEIREDO, I. B. Efeito do fogo em populações de capim dourado (Syngonanthus nitens Euriocaulaceae) no Jalapão, TO. 73 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, Brasília, 2007.) constatou que o uso do fogo nos CLUs do PEJ estimula a floração de CD. Dessa forma, nos anos de ocorrência de queimadas ocorre o decréscimo da produtividade do capim dourado nos CLUs, pela eliminação de escapos de capim dourado, tal como verificado em 2012, podendo, no entanto, recuperar a produção e produtividade nos anos seguintes. O que se observou em dois anos foi uma bianualidade na produtividade, ou seja, uma ocorrência alternada de alta e baixa produção. Essa alternância pode ser atribuída a diversos fatores além do uso do fogo, como a fenologia da espécie, os componentes hídricos, térmicos, edáficos, grau de sombreamento, entre outros.

Figura 8
Área de Campo Limpo Úmido associada à Vereda no PEJ; a) Campo Limpo Úmido com presença de capim dourado no ano 2011; e b) Campo Limpo Úmido com presença de gado no ano 2012

Schmidt et al. (2007SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; SCARIOT, A. Ethnobotany and effects of harvesting on the population ecology of Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae), a NTFP from Jalapão region, central Brazil. Economic Botany, v. 61, n. 1, p. 73-85, 2007. https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)61[73:EAEOHO]2.0.CO;2
https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)6...
) também encontraram uma alternância de alta e baixa produtividade de escapos no Parque (uma mais alta em 2003 e seguida de uma mais baixa em 2004). Em espécies cultivadas como, por exemplo, o café, é comum ocorrer um ano de produtividade alta seguida de uma baixa, proveniente de vários fatores como a falta de precipitação pluviométrica no período de floração (DAMATTA et al., 2007DAMATTA, F. M.; RONCHI, C. P.; MAESTRI, M.; BARROS, R. S. Ecophysiology of coffee growth and production. Brazilian Journal of Physiology, v. 19, n. 4, p. 485-510, 2007. https://doi.org/10.1590/S1677-04202007000400014
https://doi.org/10.1590/S1677-0420200700...
). Nas espécies de ocorrência natural como o baru, também foi observada variação na produtividade ao longo dos anos (SANO et al., 2008SANO, S. M.; SIMON, M. F. Produtividade do baru (Dipteryx alata Vong.) em ambientes modificados, durante 10 anos. In: IX Simpósio Nacional do Cerrado, Brasília, Anais..., Planaltina, Embrapa Cerrados, 2008. https://doi.org/10.1590/S0100-204X2008000100020
https://doi.org/10.1590/S0100-204X200800...
).

A média da produtividade de CD no PEJ, computada pela massa seca de capim no segmento S2 das transeções referente aos anos de 2011 e 2012 em 10 veredas, correspondeu a 2,98 g m-². Esse valor difere do encontrado por Schmidt et al. (2007SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; SCARIOT, A. Ethnobotany and effects of harvesting on the population ecology of Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae), a NTFP from Jalapão region, central Brazil. Economic Botany, v. 61, n. 1, p. 73-85, 2007. https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)61[73:EAEOHO]2.0.CO;2
https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)6...
) em três veredas no PEJ para os anos de 2003 e 2004, com uma média de 5,7 g m-². Utilizando a área total de Campos Limpos Úmidos S1, S2 e S3 (12.656 ha) estimada por Santana et al. (2015SANTANA, H. M. P.; SANO, E. E.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. P.; LACERDA, M. P. C.; MALAQUIAS, J. V. Relação entre atributos físicos e químicos dos solos e a produtividade de capim dourado na região do Jalapão, TO. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 1172-1180, 2015. https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
https://doi.org/10.1590/01000683rbcs2014...
), obtém-se uma área de 4.218 ha para o segmento S2. A produtividade de CD foi calculada em 29,8 kg ha-1, portanto, a produção de capim dourado dentro do perímetro do PEJ foi estimada em 125.696 kg.

Esta produção pode ser considerada alta, pois os dados coletados nas entrevistas realizadas demonstraram que, dos novecentos artesãos cadastrados, cada um utiliza, em média, 22,5 kg ano-1 de CD na confecção de artesanato. Com estes dados, pode-se estimar uma exploração de 20.250 kg de capim dourado via associações de artesãos e extrativistas, sendo este valor bem menor do que o valor obtido para o PEJ. Portanto, a produção de capim dourado explorado representa 16,1% da produção total do Parque. Vale ressaltar que a exploração de 20.250 kg pelos artesãos é proveniente da região do Jalapão, o que inclui a área do PEJ.

Ainda de acordo com os entrevistados, o quilo de capim é comercializado pelo valor médio de R$ 30,00 para a variedade douradão e de R$ 50,00 para o douradinho. Segundo Watanabe (2009WATANABE, M. T. C. Análise morfométrica e variabilidade morfológica Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Euriocaulaceae). 72 p. Dissertação (Mestrado em Botânica), Universidade de São Paulo, 2009.), a principal diferença entre douradão e douradinho está no tamanho dos escapos. Esse é o mesmo entendimento relatado pelas comunidades tradicionais entrevistadas e que coletam o capim. Considerando o quilo de CD com um valor médio de R$ 40,00 e a produção total do mesmo no PEJ de 125.696 kg, o valor econômico da exploração do capim dourado poderia alcançar R$ 5.027.840,00 ao ano, somente com o extrativismo da espécie, sendo que a matéria-prima transformada em peças de artesanato (valor agregado) aumentaria de forma expressiva o valor mencionado. Este montante é representativo para a economia do município de Mateiros e para a região do Jalapão. O capim dourado utilizado pelos associados entrevistados é proveniente principalmente dos municípios de Lagoa do Tocantins, Lizarda, Mateiros, Novo Acordo, Ponte Alta, Rio da Conceição, São Félix e até mesmo Formosa do Rio Preto (BA), uma área de abrangência bem superior à área de estudo neste trabalho, maior que o perímetro do PEJ, representativo da região do Jalapão.

Discussões

De acordo com a legislação ambiental, a fitofisionomia de Veredas é considerada, pela Lei no 12.651/2012, como uma Área de Preservação Permanente (APP) (BRASIL, 2012) e sua utilização é permitida apenas em casos de serviços de utilidade pública. As Veredas são consideradas, para alguns autores, complexos vegetacionais compostos de estratos herbáceo, herbáceo-arbóreo e arbóreo (Mata de Galeria). Nesse sentido, os CLUs associados às Veredas se enquadram como parte desse complexo vegetacional e se caracterizam como APPs.

As áreas de CLUs associados às Veredas avaliadas neste trabalho, além de serem consideradas APPs, estão inseridas no interior do PEJ que, de acordo com o Sistema de Nacional de Unidades de Conservação pela Lei no 9985/2000, é classificado como uma Unidade de Proteção Integral (BRASIL, 2000). O objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. O uso indireto é aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais (BRASIL, 2000). Portanto, a atividade extrativista dentro do PEJ é uma atividade que tem causado conflito segundo o que dispõe nas duas leis citadas acima. As áreas localizadas fora dos limites do PEJ se enquadram apenas como APP de acordo com a Lei no 12.651/2012 (BRASIL, 2012).

Questões relacionadas à desapropriação das comunidades tradicionais instaladas na região e que exploram o capim dourado há mais de 80 anos tem gerado conflitos desde a criação do Parque em 2001. As áreas dessas comunidades foram sobrepostas ao limites do PEJ e ainda não foram desapropriadas ou indenizadas. Esse fato tem gerado conflitos socioambientais entre as comunidades tradicionais e as normas que regulamenta a Unidade de Conservação como de Proteção Integral, categorias que visam a preservação das áreas naturais sem a presença humana. Um estudo realizado por Rodrigues e Fredrych (2013RODRIGUES, W.; FREDRYCH, T. V. O dilema da comunidades tradicionais de conservação: O caso da comunidade Mumbuca no Parque Estadual do Jalapão (TO). Boletim Goiano de Geografia, v. 33, n. 3, p. 407-423, 2013. https://doi.org/10.5216/bgg.v33i3.27331
https://doi.org/10.5216/bgg.v33i3.27331...
) concluiu que a comunidade tradicional do povoado de Mumbuca, situado nos limites do PEJ, não tem como reproduzir-se culturalmente dentro das especificações de Unidade de Proteção Integral e suas normas de manejo, uma vez que estas não consideram a presença das populações humanas dentro delas. Os autores relataram que existem, na comunidade de Mumbuca, cerca de 170 habitantes que há mais de 80 anos vem se reproduzindo humana e culturalmente a partir de um modo de vida tradicional.

Não se pode ignorar que as comunidades tradicionais e mesmo a população urbana tem se beneficiado do extrativismo de CD e do comércio de artesanato confeccionado a partir do mesmo. A importância desse extrativismo e artesanato pode ser avaliada não apenas pela produção e renda, mas pelo seu papel no mercado de trabalho como geradora de empregos e ainda como divulgadora das tradições de uma comunidade localizada na região do Jalapão. Essas atividades são representativas para a economia local e regional, onde a população de Mateiros tem um IDH classificado em médio-baixo (0,59) e para a região do Jalapão esse índice ainda é menor. O IDH combina três indicadores de base: a esperança de vida (longevidade), o rendimento (renda) e o nível de educação (educação).

Diante dessa situação, ocorre uma dicotomia entre fazer cumprir o que determinam as leis, interrompendo a exploração de CD no PEJ e na região, ou ser sensível a situação, que parece ser, de fato, o que vem ocorrendo. Em outras palavras, a exploração de CD cumpre um papel relacionado à função social que, na prática, está além do que preconizam as leis. Para tanto, o instrumento de gestão adotado pelo Órgão Ambiental do TO para essa situação foi o Termo de Compromisso que contempla a legislação, os interesses ambientais e a comunidade de forma coletiva. Esse instrumento estabelece a base legal e o ordenado das atividades que serão permitidas e das obrigações e direitos das partes que simultaneamente serão assumidas.

Entende-se, também, que a viabilização de estudos para subsidiar o planejamento adequado da produção de CD com a implementação de sistemas de manejo sustentáveis, que aumentam a produtividade da espécie, constituem medidas efetivas para alcançar a sustentabilidade econômica, além de desempenhar a função social que esta atividade de extrativismo e da confecção de artesanato representa na região. Verifica-se, na literatura, alguns estudos com esse enfoque, podendo-se citar o estudo relacionado à produção e germinação de sementes de capim dourado no PEJ conduzido por Schmidt et al. (2008SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; BORGHETTI, F.; SCARIOT, A. Produção e germinação de sementes de "capim dourado" Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae): implicações para o manejo. Acta Botanica Brasilica, v. 22, n. 37, p. 37-42, 2008. https://doi.org/10.1590/S0102-33062008000100005
https://doi.org/10.1590/S0102-3306200800...
) e o trabalho desenvolvido por Figueiredo (2007FIGUEIREDO, I. B. Efeito do fogo em populações de capim dourado (Syngonanthus nitens Euriocaulaceae) no Jalapão, TO. 73 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, Brasília, 2007.), na avaliação da prática de fogo nos Campos Limpos Úmidos no PEJ como forma de manejo do extrativismo. Um exemplo de boas práticas relacionadas a queimadas na região foi proposto pelo “Projeto de Manejo Integrado do Fogo - MIF” objetivando proteger áreas de vegetação sensíveis ao fogo, como mata ciliar; fragmentar e reduzir o combustível de massa seca, criando mosaicos de vegetação com diferentes estágios de regeneração pós-fogo; e mudar o atual regime do fogo, caracterizado pela ocorrência de grandes incêndios ao final da estação seca, meses de agosto a outubro (SCHMIDT et al., 2016SCHMIDT, I. B.; FONSECA, C. B.; FERREIRA, C. F; SATO, M. N. Implementação do programa piloto de manejo integrado do fogo em três unidades de conservação do Cerrado. Biodiversidade Brasileira, v. 6, n. 2, p. 55-70, 2016.). O manejo integrado do fogo de baixa intensidade é conduzido no começo da estação seca e implementada nas unidades de conservação do Cerrado como estratégia de manejo.

Outra forma de solucionar a dicotomia de interesses é propor parcerias entre as comunidades tradicionais, os extrativistas e artesãos tais como prestação de serviços ambientais de preservação relacionados ao CD como combater o fogo quando da ocorrência de incêndios, atuando como brigadistas; monitorar os limites permitidos de exploração, relacionados tanto à área explorada quanto com a quantidade de sobre-exploração da espécie e ainda no que se refere à fiscalização com respeito às coletas ilegais do extrativismo de capim dourado praticadas por pessoas não autorizadas.

Conclusões

A produtividade média de capim dourado nos Campos Limpos Úmidos do Parque Estadual do Jalapão nos anos de 2011 e 2012 foi de 29,8 kg ha-1 no segmento S2. A produção total de capim dourado no Parque Estadual do Jalapão foi estimada em 125.696 kg.

O capim dourado explorado por artesãos e extrativistas cadastrados no Órgão Estadual de Meio Ambiente do Tocantins representa aproximadamente 16% da produção total do PEJ. Constatou-se que poderá haver um risco de aumento do extrativismo de capim dourado no PEJ, podendo provocar danos ambientais, demandando um maior controle sobre a exploração da espécie pelos órgãos ambientais responsáveis.

A relação entre a produtividade e produção de capim dourado no Parque Estadual do Jalapão e o percentual explorado encontrado neste estudo trouxe um cenário inédito sobre as primeiras análises de comportamento da exploração de capim dourado na região e no estado de Tocantins.

Os Termos de Compromissos representam um instrumento que permite reconhecer e fortalecer sistemas de recursos de uso comum no interior de UC de proteção integral como estratégia para a conservação, onde existem a presença de comunidades tradicionais. No entanto, a regularização das terras dessas comunidades que foram sobrepostas com o limite do PEJ criado no ano de 2001, ainda persiste como demandas futuras a serem pacificados.

Considerando todos esses aspectos, conclui-se que o CD da região do Jalapão possui condições de ser explorado pela comunidade tradicional local de forma racional, por meio do reconhecimento de muitas ações que estão sendo desenvolvidas no sentido de valorizar o conhecimento das comunidades tradicionais. Acredita-se que os Termos de Compromissos sejam essenciais para permitir algum nível de extrativismo em unidades de conservação de proteção integral.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Secretaria de Ciências e Tecnologia do Estado do Tocantins, pela bolsa de doutorado concedida à primeira autora e pelo apoio financeiro concedido na forma de bolsa de estudo do Programa Universidades e Comunidades no Cerrado (UNICOM), e ao Projeto Elos Ecossociais entre as Florestas Brasileiras: Modos de Vida Sustentáveis em Paisagens Produtivas (FLORELOS), desenvolvido pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) com apoio financeiro da União Europeia. A Embrapa Cerrados e o Naturatins permitiram utilizar a infraestrutura necessária para a execução deste projeto. A administração do Parque Estadual do Jalapão possibilitou a realização de campanhas de campo. Esse trabalho contou ainda com a valiosa contribuição do Heleno Bezerra, Potira Hermuche e Balbino Evangelista nas atividades de campo.

Referências

  • AFONSO, S. R.; ÂNGELO, H. Mercado dos produtos florestais não-madereiros do cerrado brasileiro. Ciências Florestais, v. 19, n. 3, p. 315-326, 2009. https://doi.org/10.5902/19805098887
    » https://doi.org/10.5902/19805098887
  • ANA. Agência Nacional de Águas. Sistema de Informações Hidrológicas. Disponível em: http://www.snirh.gov.br/hidroweb/. Acesso: 04/06/2016.
    » http://www.snirh.gov.br/hidroweb
  • BRASIL. Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 18 de julho de 2000.
  • BRASIL. Lei nº 12.651 de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetal nativa. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 28 de maio de 2012.
  • DAMATTA, F. M.; RONCHI, C. P.; MAESTRI, M.; BARROS, R. S. Ecophysiology of coffee growth and production. Brazilian Journal of Physiology, v. 19, n. 4, p. 485-510, 2007. https://doi.org/10.1590/S1677-04202007000400014
    » https://doi.org/10.1590/S1677-04202007000400014
  • FIGUEIREDO, I. B. Efeito do fogo em populações de capim dourado (Syngonanthus nitens Euriocaulaceae) no Jalapão, TO. 73 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, Brasília, 2007.
  • GIULIETTI, N.; GIULIETTI, A. M.; PIRANI, J. R.; MENEZES, N. L. Estudos de sempre-vivas: importância econômica do extrativismo em minas Gerais, Brasil. Acta Botânica Brasilica, v. 1, n. 2, p. 179-193, 1988.
  • GIULIETTI, A. M.; WANDERLEY, M. G. L.; LONGHI-WAGNER, H. M.; PIRANI, J. R.; PARRA, L. R. Estudos em "sempre vivas": taxonomia com ênfase nas espécies de Minas Gerais, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v. 10, n. 2, p. 329-383, 1996. https://doi.org/10.1590/S0102-33061996000200007
    » https://doi.org/10.1590/S0102-33061996000200007
  • IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/listabl.asp?c=289&n=0&u=0&z=t&o=18&i=P> acesso: 13/06/2016.
    » http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/listabl.asp?c=289&n=0&u=0&z=t&o=18&i=P
  • LINDOSO, L. C.; PARENTE, T. G. Ação Coletiva para o Termo de Compromisso na Região do Jalapão-TO: fortalecendo os sistemas de uso comum? VII Enanppas, 2015.
  • PACIFICO, M.; NAPOLITANO, A.; MASULLO, M.; HILARIO, F.; VILEGAS, W.; PIACENTE, S.; SANTOS, L. C. Metabolite fingerprint of “capim dourado” (Syngonanthus nitens), a basis of Brazilian handcrafts. Industrial Crops and Products, v. 33, p. 488-496, 2011. https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2010.10.023
    » https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2010.10.023
  • PNUD. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Ranking do IDH dos municípios do Brasil 2003. Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/>. Acesso: 13/06/2016.
    » http://www.atlasbrasil.org.br/2013
  • REZENDE, J. M. Florística, fitossociologia e a influência do gradiente de umidade do solo em Campos Limpos Úmidos no Parque Estadual do Jalapão, TO. 74 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, Brasília, 2007.
  • RODRIGUES, W.; FREDRYCH, T. V. O dilema da comunidades tradicionais de conservação: O caso da comunidade Mumbuca no Parque Estadual do Jalapão (TO). Boletim Goiano de Geografia, v. 33, n. 3, p. 407-423, 2013. https://doi.org/10.5216/bgg.v33i3.27331
    » https://doi.org/10.5216/bgg.v33i3.27331
  • SANO, E. E.; ROSA, R.; BRITO, J. L. S.; FERREIRA, L. G. Mapeamento semidetalhado do mapeamento do uso da terra do bioma Cerrado. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 43, n. 1, p. 153-156, 2008.
  • SANO, S. M.; SIMON, M. F. Produtividade do baru (Dipteryx alata Vong.) em ambientes modificados, durante 10 anos. In: IX Simpósio Nacional do Cerrado, Brasília, Anais..., Planaltina, Embrapa Cerrados, 2008. https://doi.org/10.1590/S0100-204X2008000100020
    » https://doi.org/10.1590/S0100-204X2008000100020
  • SANTANA, H. M. P.; SANO E. E.; LACERDA, M. P. C. Levantamento dos campos limpos úmidos no Parque Estadual do Jalapão, TO por meio de fotografias aéreas analógicas: Abordagem metodológica. Revista Brasileira de Cartografia, v. 66, n. 1, p. 75-85, 2014.
  • SANTANA, H. M. P.; SANO, E. E.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. P.; LACERDA, M. P. C.; MALAQUIAS, J. V. Relação entre atributos físicos e químicos dos solos e a produtividade de capim dourado na região do Jalapão, TO. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 1172-1180, 2015. https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
    » https://doi.org/10.1590/01000683rbcs20140364
  • SANTIAGO, A. R.; PEREIRA JÚNIOR, A. C. Mapeamento da cobertura da terra dos Parques Estaduais do Jalapão (PEC), Cantão (PEC) e município de Itaguatins (Tocantins). Ambiência, v. 6, n. 1, p. 109-124, 2010.
  • SANTOS, A. J.; HILDEBRAND, E.; PACHECO, C. H. P.; PIRES, P. T. L.; ROCHADELLI, R. Produtos não madeireiros: conceituação, classificação, valoração e mercado. Revista Florestal, v. 33, n. 2, p. 215-224, 2003. https://doi.org/10.5380/rf.v33i2.2275
    » https://doi.org/10.5380/rf.v33i2.2275
  • SCHMIDT, I. B. Etnobotânica e ecologia populacional de Syngonanthus nitens: sempre-viva utilizada para artesanato no Jalapão, Tocantins. 91 p. Dissertação (Mestrado em Ecologia), Universidade de Brasília, 2005.
  • SCHMIDT, I. B.; TICKTIN, T. When lessons from population models and local ecological knowledge coincide - Effects of flower stalk harvesting in the Brazilian savanna. Biological Conservation, v. 152, p. 187-195, 2012. https://doi.org/10.1016/j.biocon.2012.03.018
    » https://doi.org/10.1016/j.biocon.2012.03.018
  • SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; SCARIOT, A. Ethnobotany and effects of harvesting on the population ecology of Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae), a NTFP from Jalapão region, central Brazil. Economic Botany, v. 61, n. 1, p. 73-85, 2007. https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)61[73:EAEOHO]2.0.CO;2
    » https://doi.org/10.1663/0013-0001(2007)61[73:EAEOHO]2.0.CO;2
  • SCHMIDT, I. B.; FIGUEIREDO, I. B.; BORGHETTI, F.; SCARIOT, A. Produção e germinação de sementes de "capim dourado" Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Eriocaulaceae): implicações para o manejo. Acta Botanica Brasilica, v. 22, n. 37, p. 37-42, 2008. https://doi.org/10.1590/S0102-33062008000100005
    » https://doi.org/10.1590/S0102-33062008000100005
  • SCHMIDT, I. B.; MANDLE, L.; TICKTIN, T.; GAOUE, O. What do matrix population models reveal about the sustainability of non-timber forest product harvest? Journal of Applied Ecology, v. 48, p. 815-826, 2011. https://doi.org/10.1111/j.1365-2664.2011.01999.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1365-2664.2011.01999.x
  • SCHMIDT, I. B.; FONSECA, C. B.; FERREIRA, C. F; SATO, M. N. Implementação do programa piloto de manejo integrado do fogo em três unidades de conservação do Cerrado. Biodiversidade Brasileira, v. 6, n. 2, p. 55-70, 2016.
  • SEPLAN. Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente. Plano de Manejo do Parque Estadual do Jalapão, Palmas, 204 p., 2003.
  • SILVA, D. J.; QUEIROZ, A. C. Análise de Alimentos: Métodos Químicos e Biológicos. Viçosa, UFV, 235 p., 2002.
  • WATANABE, M. T. C. Análise morfométrica e variabilidade morfológica Syngonanthus nitens (Bong.) Ruland (Euriocaulaceae). 72 p. Dissertação (Mestrado em Botânica), Universidade de São Paulo, 2009.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2016
  • Aceito
    24 Ago 2018
Editora da Universidade Federal de Uberlândia - EDUFU Av. João Naves de Ávila, 2121 - Bloco 5M – Sala 302B, 38400902 - Uberlândia - Minas Gerais - Brasil, +55 (34) 3239- 4549 - Uberlândia - MG - Brazil
E-mail: sociedade.natureza@ig.ufu.br