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A Incômoda Ausência do Espaço e da Espacialidade em Estudos da Estratégia como Prática Social: uma Agenda de Pesquisa

Resumo

Neste ensaio teórico, nós analisamos como os estudos da estratégia, vista como uma prática social, se beneficiam de um diálogo com estudos da filosofia, sociologia e geografia sobre o espaço e conceitos correlatos: espacialidade, território, região e lugar. Esses estudos compõem um quadro epistêmico e teórico diverso. As ciências humanas e sociais promoveram duas viradas epistêmicas no final do século XX: a volta à prática e ao espaço. No campo da estratégia organizacional, a virada prática não foi acompanhada por uma virada espacial. O nosso objetivo é analisar a espacialidade da estratégia como prática e propor uma agenda de pesquisa que conecta a estratégia organizacional com temáticas que vão além do mundo dos negócios. Ainda, amplia as fronteiras para o estudo da estratégia como um complexo de práticas socialmente situadas de strategizing de uma pluralidade de atores que criam e transformam o espaço como multiplicidade: físico/material, cultural/simbólico, político/econômico e representado/narrado.

espaço; espacialidade; estratégia como prática; strategizing; território

Abstract

In this theoretical essay, we analyze how strategy studies, seen as social practice, benefit from a dialogue with studies of Philosophy, Sociology and Geography about space and associated concepts such as spatiality, territory, region and place. These studies compose a diversified epistemic and theoretical framework. Human and Social Sciences have promoted two epistemic changes in the late 20th century, namely: the return to practice and space. The practical turn in the organizational strategy field was not followed by spatial turn. The aims of the present study are to analyze the spatiality of strategy seen as practice and to suggest a research agenda to connect organizational strategy to topics that go beyond the business world. It has also expanded the frontiers of studies focused on investigating strategy as a complex of socially-situated strategizing practices implemented by a plurality of actors who create and transform space as multiplicity: physical / material, cultural / symbolic, political / economic, represented / narrated.

space; spatiality; strategy-as-practice; strategizing; territory

Introdução

O que todas essas estratégias espaciais (eu as denominaria antiespaciais) fazem é evitar o desafio do espaço como uma multiplicidade.

Doreen Massey (2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , pp. 97-98)

Os estudos de estratégia como uma prática social foram estimulados por uma virada rumo à prática ocorrida nas ciências sociais. Em estratégia, a virada prática ocorre no final dos anos 1990 ( Chia, 2004Chia, R. (2004). Strategy-as-practice: reflections on the research agenda. European Management Review , 1 (1), 29-34. doi:10.1057/palgrave.emr.1500012 ; Gherardi, 2012Gherardi, S. (2012). How to conduct a Practice-Based Study . Cheltenham: Edward Elgar. ; Whittington, 2004Whittington, R. (2004). Strategy after modernism: recovering practice. European Management Review , 1 (1), 62-68. doi:10.1057/palgrave.emr.1500006 , 2007Whittington, R. (2007). Strategy practice and strategy process: family differences and the sociological eye. Organization Studies , 28 (10), 1575-1586. doi:10.1177/0170840607081557 ) juntamente com o debate sobre a estratégia pós-processual ( Chia & Mackay, 2007Chia, R., Mackay, B. (2007). Post-processual challenges for the emerging strategy-as-practice perspective: discovering strategy in the logic of practice. Human Relations , 60 (1), 217-242. doi:10.1177/0018726707075291 ) e estratégia após o modernismo ( Whittington, 2004Whittington, R. (2004). Strategy after modernism: recovering practice. European Management Review , 1 (1), 62-68. doi:10.1057/palgrave.emr.1500006 ; Wilson & Jarzabkowski, 2004)Wilson, D. C., Jarzabkowski, P. (2004). Thinking and acting strategically: new challenges for interrogating strategy. European Management Review , 1 (1), 14-20. doi:10.1057/palgrave.emr.1500008 . Também no final do século XX, os ceticismos pós-moderno e pós-estruturalista deram origem a outras viradas: a volta ao espaço em ciências sociais e humanas ( Warf & Arias, 2009)Warf, B., Arias, S. (2009). The spatial turn: interdisciplinary perspectives . Abingdon-on-Thames: Routledge. e a volta ao território, à região e à regionalidade ( Haesbaert, 2010Haesbaert, R. (2010). Região, regionalização e regionalidade. Antares: Letras e Humanidades , (3), 2-24. Recuperado de https://bit.ly/39gFC8e
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; Santos, 1996)Santos, M. (1996). O retorno ao território. In M. Santos, M. A. A. de Souza, M. L. Silveira (Orgs.), Território, globalização e fragmentação (2a ed., pp. 15-20). São Paulo, SP: Hucitec. . O espaço passa a ser visto como uma construção social conectada às histórias dos sujeitos humanos e à produção cultural, pois, do ponto de vista da geografia humana, compreender onde as coisas acontecem é essencial para entender como e por que razões acontecem ( Warf & Arias, 2009)Warf, B., Arias, S. (2009). The spatial turn: interdisciplinary perspectives . Abingdon-on-Thames: Routledge. .

Tanto a volta à prática quanto a ao espaço estão fundamentadas em mudanças ocorridas no capitalismo moderno e em novas formas de sociabilidade e de regulação das relações humanas chamadas “pós-modernistas” ( Warf & Arias, 2009Warf, B., Arias, S. (2009). The spatial turn: interdisciplinary perspectives . Abingdon-on-Thames: Routledge. ). Além dos debates sobre a ordem do território e da região, o espaço adquire significados de ordem política, econômica e cultural relacionados a ideias como vida nas cidades, globalização, imigração, novas tecnologias, ciberespaço, mudanças climáticas, epidemias, entre outras.

No campo da administração, o espaço foi ignorado ou tratado de modo implícito pelas teorias tradicionais ( Chanlat, 2006Chanlat, J.-F. (2006). Space, organization and management thinking: a socio-historical perspective. In S. R. Clegg, M. Kornberger (Eds.), Space, organization and management theory (pp. 17-43). Frederiksberg: Liber & Copenhagen Business School Press. ). Também os estudos da estratégia como prática social e como strategizing têm negligenciado as dimensões espaço e tempo ( Hydle, 2015Hydle, K. M. (2015). Temporal and spatial dimensions of strategizing. Organization Studies , 36 (5), 643-663. doi:10.1177/0170840615571957 ). Todavia, uma concepção epistemológica que considera a estratégia não como algo que a organização possui ( Jarzabkowski, 2005Jarzabkowski, P. (2005). Strategy as practice: an activity-based approach . Thousand Oaks: Sage Publications. ), mas que é construída por pessoas e por fazeres em um espaço-tempo, torna necessário o debate acerca da questão do espaço. A estratégia como experiência vivida implica o debate sobre os modos como espaço e tempo habilitam e limitam o strategizing, que constitui aquela experiência (Samra-Fredericks, 2013); ainda, não pressupõe uma concepção do espaço como uma superfície sobre a qual a vida acontece ou um container onde as coisas são fixadas ( Massey & Keynes, 2004Massey, D., Keynes, M. (2004). Filosofia e política da espacialidade: algumas considerações. GEOgrafia , 6 (14), 7-23. doi:10.22409/GEOgraphia2004.612.a13477 ).

Neste ensaio, o nosso objetivo é analisar a espacialidade da estratégia como prática e propor uma agenda de pesquisa sobre o tema. O ensaio, enquanto gênero textual, tem uma longa tradição nos campos da filosofia e da crítica literária e pode ser utilizado para alcançar diferentes objetivos, entre eles, introduzir novas fronteiras e contextualizar o conhecimento ao se questionar a “ordem das coisas” ( Suddaby, 2019Suddaby, R. (2019). Objectivity and truth: the role of the essay in management scholarship. Journal of Management Studies , 56 (2), 441-447. doi:10.1111/joms.12340 ), articular o conhecimento acumulado e abrir novas perspectivas de estudo ( Bertero, 2011Bertero, C. O. (2011). Réplica 2 – O que é um ensaio teórico? Réplica a Francis Kanashiro Meneghetti. Revista de Administração Contemporânea , 15 (2), 338-342. doi:10.1590/S1415-65552011000200012 ). Nós articulamos um diálogo entre os estudos da estratégia, vista como uma prática social, e estudos da filosofia, sociologia e geografia sobre o espaço e conceitos correlatos: espacialidade, território, região e lugar. Esses estudos compõem um quadro epistêmico e teórico diverso que considera as implicações entre o espaço e a coexistência com os outros, a reponsabilidade pelo lugar e a capacidade de (re)imaginar novas espacialidades.

Além dessa seção de introdução, o ensaio é composto por duas seções com abordagens teóricas sobre o espaço e a espacialidade: estudos da filosofia e da sociologia e estudos de diferentes áreas da geografia. Na terceira seção, nós apresentamos um quadro teórico-epistêmico que relaciona o espaço, as organizações e a perspectiva da estratégia como uma prática socialmente situada. Em seguida, nós propomos uma agenda de pesquisa sobre a espacialidade da estratégia como prática. Considerações finais encerram o estudo.

O espaço constituído e constituinte da coexistência social

Esta seção aborda autores e conceitos do campo da filosofia e da sociologia que tratam do espaço e da coexistência social. A despeito da quantidade de estudiosos que tratam do assunto, destacamos autores que têm, também, contribuído com a chamada “volta à prática” nesses campos de conhecimento. Tais autores contribuem para uma compreensão da espacialidade como produção, organização e apropriação dos espaços.

No campo da teoria social, Lefebvre (1991)Lefebvre, H. (1991). The production of space . Oxford: Blackwell Publishing. desenvolve uma concepção dialética e tridimensional da produção do espaço. Na perspectiva epistemológica lefebvriana, o espaço é produzido pelos seres humanos que interagem entre si por meio de suas atividades e práticas, corpos, pensamento, sensibilidade, imaginação e ideologias; tempo e espaço são aspectos que integram a prática social, ou seja, ambos são tanto resultado quanto precondição da produção da sociedade ( Schmid, 2012Schmid, C. (2012). A teoria da produção do espaço de Henri Lefebvre: em direção a uma dialética tridimensional. GEOUSP – Espaço e Tempo , 16 (3), 89-109. doi:10.11606/issn.2179-0892.geousp.2012.74284 ). A análise tridimensional lefebvriana da produção do espaço ( Lefebvre, 1991Lefebvre, H. (1991). The production of space . Oxford: Blackwell Publishing. ; Schmid, 2012Schmid, C. (2012). A teoria da produção do espaço de Henri Lefebvre: em direção a uma dialética tridimensional. GEOUSP – Espaço e Tempo , 16 (3), 89-109. doi:10.11606/issn.2179-0892.geousp.2012.74284 ) baseia-se em uma tríade que trata da autoprodução do sujeito e da autoprodução da sociedade. Essa tríade implica três processos: (a) espaço percebido: apreensão por meio dos sentidos, necessária à prática social e à percepção da materialidade do espaço; (b) espaço concebido: a prévia concepção ou a produção de conhecimento sobre o espaço; (c) espaço vivido: experimentação cotidiana do espaço pelos seres humanos em suas práticas.

A concepção triádica da produção do espaço de Lefebvre (1991)Lefebvre, H. (1991). The production of space . Oxford: Blackwell Publishing. pressupõe que esse processo produtivo é histórico. Toda sociedade produz seu próprio espaço, portanto, cabe indagar sob quais fundações estes espaços são construídos; sob que circunstâncias e pressões ocorrem as mudanças espaciais; qual o poder construtivo e destrutivo das forças produtivas, das novas tecnologias e da capacidade científica que são empregadas na transformação do espaço natural; sob que circunstâncias os espaços são disputados por meio de guerras e violência e/ou são instituídos pelo Estado. Portanto, para compreendermos criticamente o espaço que produzimos e vivemos, é preciso superar os limites de uma análise instrumental e homogênea do espaço e se ter um entendimento das políticas do espaço .

Certeau (1998)Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. conduziu um estudo urbano sobre as desigualdades sociais nas cidades, baseado em seu conceito político da ação e das relações sociais ( Dosse, 2013Dosse, F. (2013). O espaço habitado segundo Michel de Certeau. ArtCultura, 15 (27), 85-96. ). Ele analisa que modalidades da ação, formalidades das práticas e tipos de operações ou “maneiras de fazer” são indissociáveis do instante presente e de circunstâncias particulares. A análise dos comportamentos, segundo o seu lugar no “tabuleiro social”, mostra tanto as táticas desviacionistas, que não se definem pelo lugar e nem obedecem à lei do lugar, quanto as estratégias tecnocráticas, que visam criar, mapear e impor lugares. Apenas as estratégias criam lugares, enquanto as táticas os utilizam, manipulam e alteram. O lugar é “uma configuração instantânea de posições” com implicações de estabilidade e “o espaço é o lugar praticado” ( Certeau, 1998Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. , pp. 201-202).

Há uma distinção entre estratégia e tática conforme Certeau (1998)Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. , considerando-se as relações de poder dirigidas para o consumo. A tática é o modo de agir do fraco perante a ordem dominante e a estratégia é o agir do forte perante essa mesma ordem. A estratégia é a ação calculada ou manipulação das relações de forças de um sujeito acerca do seu querer e poder. A estratégia postula um lugar possível de ser “circunscrito como algo próprio” (p. 99) a partir de onde se pode gerir as relações com uma exterioridade de alvos ou ameaças. A estratégia possibilita distinguir e circunscrever um lugar próprio do querer e do poder, enquanto a tática é a ação calculada “determinada pela ausência de um próprio’’ (p. 100). A tática relaciona-se com a autonomia, pois é a ação daqueles que não têm meios para manterem-se à distância; portanto, exige o movimento dentro do campo de visão do outro (adversário). Além disso, a tática joga com o terreno que lhe é imposto por uma lei que lhe é estranha e tática opera em um “não lugar” (golpe por golpe e lance por lance), pois não tem condição de atribuir a si um “projeto global”. A mobilidade da tática refere-se às possibilidades de se fazer uso do senso de ocasião de utilizar, de forma incansável, perspicaz, vigilante, criativa e surpreendente as falhas de conjunturas particulares do poder proprietário.

A relação entre estratégia e tática é dialética, pois a tática é determinada pela ausência de poder e a estratégia é organizada pelo postulado do poder ( Certeau, 1998Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. ). A tática se mobiliza à espera da ocasião para o seu agir nos “terrenos da ordem dominante” (p. 102), em que a regras da racionalidade são impostas pela estratégia com base “no direito adquirido de um próprio” (p. 102). Portanto, a tática aguarda as circunstâncias para o seu agir e espera, com seus movimentos, mudar a organização do espaço. A respeito do presente e do futuro da vida nas grandes cidades, Certeau (1998)Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. avalia que as transformações na história contemporânea afetam essas relações entre estratégia e tática: um espaço mais amplo, homogêneo, instável e contínuo diminui as possibilidades das táticas escaparem da regulamentação (migrantes), e a estratégia que se ancorava em uma “definição de um próprio”, distinto dos outros, perde-se em manipulações aleatórias e incontroláveis, redes de coerções e seguranças socioeconômicas.

No campo da sociologia do espaço, uma das questões que emergem de uma abordagem material do espaço e de uma abordagem baseada nas teorias da ação é se o espaço é condição e produto (resultado) de processos sociais ou se ele opera de modo estruturador das ações sociais ( Löw, 2008Löw, M. (2008). The constitution of space: the structuration of spaces through the simultaneity of effect and perception. European Journal of Social Theory, 11 (1), 25-49. doi:10.1177/1368431007085286 , 2013Löw, M. (2013). O spatial turn. Tempo Social , 25 (2), 17-34. doi:10.1590/S0103-20702013000200002 ). O espaço passou a ser compreendido como uma categoria relacional entre objetos e pessoas que envolve não somente uma dimensão simbólica , mas também uma dimensão material: “espaços são experienciados”. O espaço emerge a partir dos ordenamentos estruturados de bens sociais e de pessoas nos lugares; novos espaços são criados por ações performativas que sintetizam e relacionam esses ordenamentos.

Ao analisar as práticas sociais e o espaço, Bourdieu (2013Bourdieu, P. (2013). Espaço físico, espaço social e espaço físico apropriado. Estudos Avançados , 27 (79), 133-143. doi:10.1590/S0103-40142013000300010 , 2018Bourdieu, P. (2018). Social space and the genesis of appropriated physical space. International Journal of Urban and Regional Research , 42 (1), 106-114. doi:10.1111/1468-2427.12534 ) argumenta que o espaço físico é uma abstração do espaço habitado, espaço apropriado ou “ espaço do possível ” ( Ribeiro, 2014Ribeiro, M. T. R. (2014). O espaço dos possíveis, de Pierre Bourdieu. Ciências Sociais Unisinos , 50 (2), 101-107. doi:10.4013/csu.2014.50.2.01 ), demarcado e construído socialmente. O espaço social torna-se espaço objetivado e/ou fisicamente realizado – campos – mediante distribuição, no espaço físico, de diferentes espécies de bens, serviços, pessoas e grupos. Esta distribuição define “o valor diferencial das diversas regiões do espaço social realizado” ( Bourdieu, 2013Bourdieu, P. (2013). Espaço físico, espaço social e espaço físico apropriado. Estudos Avançados , 27 (79), 133-143. doi:10.1590/S0103-40142013000300010 , p. 136; 2018, p. 109). Essa distribuição gera os espaços desprovidos (guetos) e os lucros espaciais , que são lucros de localização e de ocupação relacionados com os espaços em que há concentração de bens raros. Os proprietários dominantes de tais espaços se distinguem por estarem em determinada vizinhança usufruindo de segurança e de outros serviços públicos, lucros simbólicos de distinção, lucros de ocupação de espaços. Uma segregação social é entendida como “causa e efeito da posse exclusiva do espaço e dos equipamentos necessários ao grupo que o ocupa, e à sua reprodução” ( Bourdieu, 2013Bourdieu, P. (2013). Espaço físico, espaço social e espaço físico apropriado. Estudos Avançados , 27 (79), 133-143. doi:10.1590/S0103-40142013000300010 , p. 138; 2018, p. 110). Na análise bourdieusiana, a manipulação da distribuição dos grupos no espaço está a serviço da dominação do espaço, uma das formas privilegiadas do exercício da dominação.

Ao analisar a constituição da sociedade, Giddens (2013)Giddens, A. (2013). A constituição da sociedade (3a ed.). São Paulo, SP: WMF Martins Fontes. trata da “situabilidade”, entendida como a ação/interação no tempo e no espaço. Em sua teoria da estruturação, tempo e espaço/geografia interessam porque dizem respeito às restrições e ao caráter prático das atividades diárias. A estruturação de tempo-espaço dos cenários de interação em que as pessoas comuns passam suas vidas cotidianas pressupõe os conceitos de local e de acessibilidade da presença. O local refere-se aos modos de uso do espaço, fornece o cenário para as interações e permite especificar a contextualidade dessas interações. A regionalização é entendida como o “zoneamento do tempo-espaço” das práticas sociais cotidianas. Para Giddens (2013)Giddens, A. (2013). A constituição da sociedade (3a ed.). São Paulo, SP: WMF Martins Fontes. , “toda a vida social ocorre em – e é constituída por – interseções de presença e ausência no ‘escoamento’ do tempo e na ‘transformação gradual’ do espaço”. Esta afirmação da teoria da estruturação implica outros conceitos: “percursos espaços-temporais diários, distribuição e encontros, regionalização de locais, contextualização de regiões, interseção de locais” (pp. 155-156).

Espaço e espacialidade na geografia

A geografia é um campo rico em conceitos e perspectivas epistêmicas e teóricas com longa tradição de pesquisa. Nesta seção, nós abordamos diferentes pesquisadores e seus temas de estudo que contribuem para uma reflexão sobre a espacialidade, para isso, serão destacados os conceitos de espaço, território, região e lugar. Esses conceitos são polissêmicos por serem apropriados não só por geógrafos, mas também por cientistas de outros campos de conhecimento e especialistas e técnicos que precisam aplicá-los em políticas, decisões e práticas de planejamento e desenvolvimento de grupos sociais, organizações, cidades, estados e países.

Os conceitos de território, região e lugar ensejam um prolífico debate no campo da geografia sobre a ideia de “recortar” o espaço ( Haesbaert, 2018Haesbaert, R. (2018). Regional-global: dilemas da região e da regionalização na geografia contemporânea (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. ). Esse debate implica abordar “espaço, território, região e lugar” como noção, categoria ou conceito e aprofunda-se nos anos 1980 devido aos movimentos de globalização e de fragmentação, movimentos sociais e ambientais e fluxos e movimentos de conectividade (satélites, internet, computadores), que tornam as relações sociais mais híbridas e multifacetadas. Quanto à relação entre os conceitos, Raffestin (1993)Raffestin, C. (1993). Por uma geografia do poder . São Paulo, SP: Ática. argumenta que “o espaço é anterior ao território” pois o “território se forma a partir do espaço” (p. 143); as pessoas se apropriam (concreta e abstratamente) do espaço a partir do resultado de suas ações, programas e práticas e, assim, essas pessoas “territorializam” o espaço. De acordo com Haesbaert (2018)Haesbaert, R. (2018). Regional-global: dilemas da região e da regionalização na geografia contemporânea (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , o espaço é anterior à região. Ele lembra que existe uma “hegemonia do conceito de território” nas geografias latinas, sobretudo devido aos pesquisadores latino-americanos, bem como existe uma preferência pelo conceito de lugar por geógrafos anglo-saxônicos (p. 42). Identidades, intersubjetividade e trocas simbólicas são as dimensões mais visíveis que subsidiam a construção de imagens e de sentido do lugar: espacialidade vivida, percebida e dotada de significado (Souza, 2015c).

As trajetórias dos conceitos de espaço, território, região e lugar podem ser consultadas em estudos conduzidos por Bezzi (2004)Bezzi, M. L. (2004). Região: uma (re)visão historiográfica – da gênese aos novos paradigmas . Santa Maria, RS: Editora da UFSM. , Haesbaert (2018)Haesbaert, R. (2018). Regional-global: dilemas da região e da regionalização na geografia contemporânea (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , Lencioni (2014)Lencioni, S. (2014). Região e geografia . São Paulo, SP: Edusp. e Massey (2015)Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , porém, são conceitos imbricados, conforme relata Souza (2015c): uma região ou um bairro são espaços! Uma região ou um bairro podem ser “lugares” (espaços vividos e percebidos). Uma região ou um bairro podem ser um território, quando um movimento social passa a exercer ali um “contra poder insurgente” (p. 57) ou mesmo quando o Estado adota essas unidades espaciais a serviço de sua administração ou planejamento. A seguir, nós analisamos a espacialidade a partir dos conceitos de espaço, território, região e lugar. A espacialidade , enquanto espaço prático simultaneamente ideal, material e concebido (Retaillé, 2005) é, portanto, um conjunto das práticas espaciais.

Nos anos 1980, em estudo no campo da geografia crítica, Santos (1988)Santos, M. (1988). Metamorfoses do espaço habitado . São Paulo, SP: Hucitec. propõe que “o espaço é uma realidade relacional: coisas e relações juntas” (p. 10). O espaço só pode ser compreendido em relação a outras realidades: natureza, sociedade e trabalho. Santos (2013)Santos, M. (2013). Técnica, espaço, tempo (5a ed.). São Paulo, SP: Edusp. argumenta que a análise de qualquer fração do espaço revelará uma técnica ou um conjunto de técnicas particulares. A implicação desse argumento é que o estudo da relação espaço-técnicas possibilita e exige uma profunda incursão nas próprias relações sociais. Santos (1996)Santos, M. (1996). O retorno ao território. In M. Santos, M. A. A. de Souza, M. L. Silveira (Orgs.), Território, globalização e fragmentação (2a ed., pp. 15-20). São Paulo, SP: Hucitec. também propôs que é o uso do território que faz dele objeto de análise social. O autor questionou o conceito de território herdado da modernidade (Estado-nação, noção jurídico-política) ao afirmar que o território é o nosso “quadro de vida”. Uma noção pós-moderna do território deve considerar que: (a) a interdependência dos lugares se torna uma nova realidade do território; (b) o valor dos recursos naturais locais é relativo e/ou relativizado; (c) está em curso a transnacionalização/mundialização do território; (d) territórios podem desempenhar papel ativo em processos de transnacionalização. Daí, decorre a metáfora do “retorno do território”.

No campo da geografia crítica marxista, em estudos de 1975 a 2001, Harvey (2005)Harvey, D. (2005). A produção capitalista do espaço . São Paulo, SP: Annablume. questiona a produção capitalista do espaço e reposiciona o espaço de “dado” para “produzido”, com implicações materiais e ideológicas relacionadas à acumulação capitalista, além da criação e destruição de novos espaços de investimento e ao consumo. O autor argumenta que, para escapar de sua própria contradição, o capitalismo busca, simultaneamente, a intensificação de desejos e de necessidades sociais e a expansão geográfica para espaços existentes ou novos espaços criados para a acumulação capitalista. Ao buscar escapar de sua própria contradição, o capitalismo promove (e requer) determinadas formas de organização do espaço, todavia, a busca por estes novos espaços pode conduzir à reflexão e à ação política progressistas. Estes novos espaços são vistos pelo autor como “ espaços de esperança ” que devem ser pesquisados e cultivados pelos movimentos de oposição e forças progressistas da cultura.

No campo dos estudos pós-modernos sobre o espaço na geografia, Gibson e Watson (1995)Gibson, K., Watson, S. (1995). Postmodern spaces, cities and politics: an introduction. In S. Whatson, K. Gibson (Eds.), Postmodern cities and spaces (pp. 1-12). Oxford: Blackwell. propõem o conceito de “espaços pós-modernos”. As autoras entendem por “pós-moderno” um período socioeconômico e um campo científico de pensamento e conhecimento. Em relação ao primeiro, torna-se necessária a compreensão do espaço urbano no capitalismo, as cidades e a política, o que implica o estudo do espaço a partir de eventos, histórias e lugares como “peças empíricas”. Ao propor o estudo da espacialidade pós-moderna, as autoras incentivam a reflexão sobre como “nós pensamos, representamos, vivemos e criamos o espaço” ( Gibson & Watson, 1995Gibson, K., Watson, S. (1995). Postmodern spaces, cities and politics: an introduction. In S. Whatson, K. Gibson (Eds.), Postmodern cities and spaces (pp. 1-12). Oxford: Blackwell. , p. 2).

Ainda no campo dos estudos pós-modernos sobre o espaço e da geografia crítica, Soja (1993)Soja, E. W. (1993). Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social crítica . Rio de Janeiro, RJ: Zahar. afirma que o espaço é socialmente produzido e a organização do espaço é um produto social, pois “emerge da prática social deliberada” (p. 102). A espacialidade é o centro de uma teoria crítica marxista do espaço e tem caráter “essencialmente dialético” de oposição, unidade e contradição das relações sociais e espaciais e das esferas da produção e do consumo (p. 98). Em sua proposta de uma ontologia espacializada, o autor conclui que: (a) a espacialidade é um produto social que incorpora os espaços físicos e psicológicos ao socializá-los e transformá-los; (b) a espacialidade “é, simultaneamente, o meio e o resultado da ação e das relações sociais”; (c) a “estruturação espaçotemporal da vida social define o modo como a ação e as relações sociais são materialmente constituídas e concretizadas”; (d) o processo de “constituição/concretização espaço-temporal é problemático, repleto de contradições e de lutas”; (e) as “contradições decorrem, primordialmente, da dualidade do espaço produzido, como resultado/encarnação/produto e meio/pressuposto/produtor da atividade social”; (f) a espacialidade concreta (a geografia humana efetiva) implica competição e lutas de práticas sociais que visam “a manutenção e o reforço da espacialidade existente” ou buscam uma “reestruturação significativa e/ou a uma transformação radical”; (g) “a espacialidade da vida social se enraíza na contingência temporal/histórica”; e (h) a interpretação materialista da história e da geografia “são inseparavelmente entremeadas e teoricamente concomitantes” (p. 158-159).

No campo da geografia cultural e da geografia marxista, Massey (2015)Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. propõe uma nova política da espacialidade e uma espacialização da teoria social e do pensamento político. A autora oferece três proposições: reconhecer “o espaço como produto de inter-relações” e “constituído através de interações”; compreender o “espaço como esfera da possibilidade da existência da multiplicidade” e “pluralidade contemporânea” e como esfera da coexistência de distintas trajetórias, ou seja, “multiplicidade e espaço são coconstitutivos”; e reconhecer o espaço como “um produto de relações-entre”, ou seja, essas relações estão embutidas em práticas materiais que devem ser efetivadas; portanto, o espaço “está sempre no processo de fazer-se”, jamais acabado ou fechado, o que implica pensar “o espaço como uma simultaneidade de estórias-até-agora ” ( stories-so-far ) (p. 29).

Essas pressuposições podem orientar políticas progressistas em lugar de um liberalismo individualista, com base no argumento que “ o espacial é político ”. Identidade e relações são construídas como parte do jogo político, e relações são entendidas como “práticas encaixadas” em um “entendimento relacional do mundo” ( Massey, 2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , p. 30). O espaço não é anterior às identidades e é, desde o princípio, integrante da constituição de identidade e de relações. Epistemologicamente, o entendimento do espaço como um processo em vez de um sistema fechado, propõe uma “abertura para o futuro”, possibilita e estimula o engajamento político com políticas que possam “fazer a diferença” (p. 32). Tal engajamento político se mostra relevante se considerarmos que o “lugar como uma sempre-mutante constelação de trajetórias coloca a questão de nosso permanecer [viver] juntos” (p. 215).

No campo da geografia crítica, Carlos (2016)Carlos, A. F. A. (2016). A condição espacial . São Paulo, SP: Contexto. analisa “os movimentos da produção espacial como momento necessário da reprodução do humano (e do seu mundo)” (p. 17). Para a autora, o espaço não é o pano de fundo das práticas humanas e nem “palco” dos fenômenos, o espaço é condição: “o ato de produzir é o ato de produzir o espaço”; “a produção do espaço faz parte da produção das condições materiais objetivas da produção da história humana”; “não existe uma sociedade a-espacial” (p. 18). A vida e as condições de vida revelam um espaço-tempo da ação e desvelam o seu uso como forma de apropriação. A apropriação do espaço é entendida como movimento de produção e de reprodução continuada do espaço. Na prática socioespacial da vida cotidiana, “a história particular de cada um se realiza numa história coletiva, onde se insere, e em relação à qual ganha significado” (p. 55).

Também nos anos 1970, além do retorno ao espaço, fala-se do retorno ao território, quando uma visão positivista do território se torna insuficiente para dar conta das transformações e demandas da geopolítica, da organização territorial do capitalismo, da dominação social, do desenvolvimento desigual e das formas de controle na vida social cotidiana ( Saquet, 2015Saquet, M. A. (2015). Abordagens e concepções de território (4a ed.). São Paulo, SP: Outras Expressões. ). Nos anos 1990, estudos nos campos da geografia política e do desenvolvimento territorial e urbano buscam compreender as “novas territorialidades” e as formas de regulação territorial pós-modernas. A mundialização, a emergência de novos atores territoriais e os processos migratórios são analisados por Antheaume e Giraut (2005)Antheaume, B., Giraut, F. (2005). Au nom du développement, une (re)fabrication des territoires. In B. Antheaume, F. Giraut (Eds.), Le territoire est mort, vive les territoires! (pp. 9-38). Paris: IRD Éditions. , que editaram uma coletânea de artigos que problematizam a territorialidade: territórios com fronteiras fixas ou fronteiras flexíveis ( Piermay, 2005Piermay, J-L. (2005). La frontière et ses ressources: regards croisés. In B. Antheaume, F. Giraut (Eds.), Le territoire est mort: vive les territoires! (pp. 203-222). Paris: IRD Éditions. ), territórios que se movem ( Fremónt, 2005Fremónt, A. (2005). Le système territorial en France, en Afrique du Sud, dans le monde: éléments pour une comparaison. In B. Antheaume, F. Giraut (Eds.), Le territoire est mort: vive les territoires! (pp. 109-132). Paris: IRD Éditions. ), territorialidade fluída (itinerante), múltipla, plural e instável (guerras) ( Mbembé, 2005Mbembé, A. (2005). À la lisière du monde: frontières, territorialité et souveraineté en Afrique. In B. Antheaume, F. Giraut (Eds.), Le territoire est mort, vive les territoires! (pp. 47-78). Paris: IRD Éditions. ).

Mas, afinal, o que é o território? Conforme Sack (2013)Sack, R. D. (2013). O significado de territorialidade. In L. C. Dias, M. Ferrari (Orgs.), Territorialidades humanas e redes sociais (2a ed., pp. 63-89). Florianópolis, SC: Insular. , “territórios requerem esforços constantes para estabelecê-los e mantê-los”, isso implica o uso de “estratégias para afetar, influenciar e controlar pessoas, fenômenos e relações” (p. 77). Para Saquet (2015)Saquet, M. A. (2015). Abordagens e concepções de território (4a ed.). São Paulo, SP: Outras Expressões. , o conceito de território implica movimento (está relacionado com a produção e reprodução do espaço), processualidades (produção-troca-consumo do espaço envolve contradições sociais e tecnificação) e multiescalaridade (fluxos, redes, hierarquias, centros e periferias). O território pode ser compreendido como espaço geográfico, “como uma área controlada e delimitada por alguma autoridade, como resultado de estratégias de influência que ocorrem individualmente ou através de grupos sociais” (p. 84).

O território e os processos de territorialização envolvem problemáticas materiais-funcionais e questões simbólico-identitárias. Se o território se refere a uma “extensão apropriada e usada”, a territorialidade “pode ser definida como o sentido de pertencer àquilo que nos pertence”, ou seja, “é um sentimento de exclusividade e limite” da área de vivência e reprodução, tanto para humanos quanto para animais ( Silveira, 2013Silveira, M. L. (2013). Novos aconteceres, novas territorialidades. In L. C. Dias, M. Ferrari (Orgs.), Territorialidades Humanas e Redes Sociais (2a ed., pp. 39-62). Florianópolis, SC: Insular. , p. 39). Indivíduos e empresas utilizam o território de modos distintos e esse comportamento em relação ao território depende de sua força ou posição na lógica capitalista global ( Corrêa, 1998Corrêa, I. L. (1998). Territorialidade e corporação: um exemplo. In M. Santos, M. A. A. de Souza, M. L. Silveira (Orgs.), Território, globalização e fragmentação (2a ed., pp. 251-256). São Paulo, SP: Hucitec. , Silveira, 2013Silveira, M. L. (2013). Novos aconteceres, novas territorialidades. In L. C. Dias, M. Ferrari (Orgs.), Territorialidades Humanas e Redes Sociais (2a ed., pp. 39-62). Florianópolis, SC: Insular. ). Para Raffestin (1993)Raffestin, C. (1993). Por uma geografia do poder . São Paulo, SP: Ática. , a territorialidade humana envolve a construção do futuro; portanto, tem uma dimensão política, de poder e de controle: natalidade e mortalidade, mobilidade (fluxos migratórios), recursos (língua e religião), diferenças (raças, etnias e discriminação).

O conceito de territorialidade diz respeito a uma ampla variedade de atividades e práticas: a relação entre Estado e grupos sociais, o lar e a casa, locais de trabalho. Para Sack (2013)Sack, R. D. (2013). O significado de territorialidade. In L. C. Dias, M. Ferrari (Orgs.), Territorialidades humanas e redes sociais (2a ed., pp. 63-89). Florianópolis, SC: Insular. , os territórios requerem estratégias “constantes para estabelecê-los e mantê-los”, ou seja, “seus limites são usados para afetar o comportamento ao controlar o acesso”; assim, um lugar ou uma região se tornam território se os seus limites são “usados por alguma autoridade para moldar, influenciar ou controlar atividades” (p. 77). Para Corrêa (1998)Corrêa, I. L. (1998). Territorialidade e corporação: um exemplo. In M. Santos, M. A. A. de Souza, M. L. Silveira (Orgs.), Território, globalização e fragmentação (2a ed., pp. 251-256). São Paulo, SP: Hucitec. , o território “é o espaço revestido da dimensão política, afetiva ou ambas” (pp. 251-252), enquanto a territorialidade “refere-se ao conjunto de práticas e suas expressões materiais e simbólicas capazes de garantirem a apropriação e permanência de um dado território por um determinado agente social, o Estado, os diferentes grupos sociais e as empresas”; a desterritorialidade, por sua vez, refere-se à “perda do território apropriado e vivido em razão de diferentes processos derivados de contradições capazes de desfazerem o território” (p. 252).

De acordo com Souza (2015c), a política é a dimensão central na definição de território, pois diz respeito ao exercício do poder: soberania, movimentos emancipatórios, práticas espaciais insurgentes e de resistência e discursos ideológicos. Para além da dimensão política, tem-se ainda as dimensões cultural (simbolismos, significados e identidades) e econômica (processos de produção, troca/consumo de bens e trabalho). O território é, portanto, uma das “manifestações do espaço social e da espacialidade” (p. 61). Para Medeiros (2015)Medeiros, R. M. V. (2015). Território, espaço de identidade. In M. A. Saquet, E. S. Sposito. (Orgs.), Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos (2a ed., pp. 215-225). Rio de Janeiro, RJ: Consequência Editora. , o território “é um espaço de identidades” e “um espaço de identificação” (p. 215). Há o entendimento do território como lugar de mediação entre as pessoas e a cultura, o sentimento e o imaginário. Novamente, espaço e território estão imbricados: a existência do território exige o espaço. Para além dessa dimensão cultural (de identificação e de pertencimento), há que se pensar na apropriação do território, visto como espaço político: lugar de poder, que define limites, recorta-o, é sinônimo de dominação e de controle, afinal, o “domínio entre pessoas e nações passa pelo exercício do controle do solo” (p. 216).

Em estudos no campo da geografia humana e da geografia cultural, Haesbaert (2016)Haesbaert, R. (2016). O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade (10a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. argumenta que perspectivas pós-modernas, no final do século XX, redescobrem o espaço apenas para declararem o fim do território: a desterritorialização. O autor analisa a destruição e a criação de novos territórios como parte do processo social de mudança e de novas formas de territorialização; e o estudo desses movimentos mostra a intensidade das mudanças, permite novas leituras dos espaços e das novas formas de articulação territorial. Numa concepção econômica , a desterritorialização se interessa por temas da globalização econômica e do mercado mundial; fluxos comerciais; relação entre território e distintos momentos do capitalismo (fordista/industrial, capitalismo financeiro, acumulação flexível); fortalecimento ou perda de poder econômico dos territórios; lógica de localização das empresas e as relações de trabalho e a precarização; imaterialidade que caracteriza o setor financeiro e uma economia globalizada. Numa concepção política , a desterritorialização se interessa por temas da perda de poder dos territórios estatais; questões de segurança; territórios partilhados por diferentes etnias e grupos sociais; as fronteiras criadas pelo ciberespaço; fluxos de migrantes; mudanças no papel do Estado. Numa concepção cultural , a desterritorialização se interessa por temas relacionados ao sentido de coletividade; identidades territoriais; movimentos sectários; convivência nos grandes centros urbanos; múltiplas tribos modernas; etnicização da vida e do território; identidades culturais e fraturas.

Estudos sobre a região também contribuem para uma reflexão sobre a espacialidade. A região já teve sua “morte” decretada por várias perspectivas teóricas/epistêmicas, mas vários movimentos também a “ressuscitaram” como categoria geográfica. O surgimento de mesoescalas regionais ( Haesbaert, 2018Haesbaert, R. (2018). Regional-global: dilemas da região e da regionalização na geografia contemporânea (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. ), no final do século XX, colocou a região e a regionalização na agenda política e teórica. De um ponto de vista histórico e epistêmico, o conceito de região é analisado por Bezzi (2004)Bezzi, M. L. (2004). Região: uma (re)visão historiográfica – da gênese aos novos paradigmas . Santa Maria, RS: Editora da UFSM. e Lencioni (2014)Lencioni, S. (2014). Região e geografia . São Paulo, SP: Edusp. , que mostram as influências do positivismo (experimentalismo, ênfase na região natural e existência concreta da região) e do determinismo (cientificidade, relação de causalidade, a região como entidade objetiva) na trajetória desse conceito. De um ponto de vista teórico-conceitual, a região interessa aos geógrafos, aos cientistas de outros campos do conhecimento e aos técnicos no campo das políticas públicas e do planejamento regional.

A reestruturação regional e a região são analisadas por Soja (1993)Soja, E. W. (1993). Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social crítica . Rio de Janeiro, RJ: Zahar. a partir da teoria social crítica e de uma perspectiva da construção de geografias pós-modernas. Uma outra ontologia da sociedade humana, do espaço e da região fazia-se necessária no final do século XX. Uma ontologia concretizadora, historicamente situada e politicamente engajada, que compreendesse a estruturação espacial da sociedade e as especificidades interpretativas das diferentes regiões como parte de uma espacialidade (propriedades da produção social do espaço) que se estende “desde a vida cotidiana, às redes, aos fluxos e conexões transnacionais que se unem à economia global do espaço” (p. 198).

Região/lugar, no campo da geografia humana, passam a ser entendidos como constituídos e constitutivos da vida social, das relações e da identidade. As espacialidade s são “parte de uma ampla rede de processos culturais, políticos, econômicos e de divisão do trabalho” ( Paasi, 2002Paasi, A. (2002). Place and region: regional worlds and words. Progress in Human Geography , 26 (6), 802-811. doi:10.1191/0309132502ph404pr , p. 804); em vez de algo garantido ( taken for granted ), as regiões passam a ser estudadas como processos históricos e identitários, como parte de escalas mais amplas da própria história humana. A região deixa de ser vista como algo dado, unicamente natural, e passa a ser vista como construída social e historicamente em práticas, discursos, narrativas e significados produzidos pelos atores: dimensões simbólica e material do processo de construção da região. Pensar a espacialidade a partir do conceito de região exige, ainda, reflexão sobre o conceito de identidade regional. Esse conceito emerge nas últimas décadas do século XX, imerso nos movimentos democráticos que trouxeram novos temas para as cenas social, política e econômica. Todavia, as narrativas de identidade regional apoiam-se em uma variedade de elementos: “ideias sobre natureza, paisagem, meio-ambiente, cultura/etnicidade, dialetos, sucesso/recessão econômicos, relação centro/periferia, marginalização, imagens estereotipadas de pessoas/comunidades, ‘nós’ e ‘eles’, histórias atuais e inventadas, utopias e argumentos divergentes sobre a identificação das pessoas” ( Paasi, 2003Paasi, A. (2003). Region and place: regional identity in question. Progress in Human Geography , 27 (4), 475-485. doi:10.1191/0309132503ph439pr , p. 477).

Um estudo conduzido por Tomaney (2017)Tomaney, J. (2017). Region and place III: well-being. Progress in Human Geography , 41 (1), 99-107. doi:10.1177/0309132515601775 questiona as medidas tradicionais do desenvolvimento local e regional e a contribuição dessas para o bem-estar humano. O autor ainda ressalta os limites de abordagens tradicionais (Produto Interno Bruto – PIB) e propõe alternativas de avaliação de políticas para o desenvolvimento humano. Porém, isso não implica que uma abordagem relacional para o estudo da região e do lugar seja consensual. Jonas (2012)Jonas, A. E. G. (2012). Region and place: regionalism in question. Progress in Human Geography , 36 (2), 263-272. doi:10.1177/0309132510394118 questiona que a abordagem relacional negligencia as questões territoriais e de política territorial presentes na literatura sobre o Novo Regionalismo ( New Regionalism ). Para o autor, uma ontologia da região não pode considerar que esta é construída exclusivamente fora ou por um processo não territorial, por isso, questiona a abordagem de cidades-regiões centradas no capital, vistas como construtos de forças externas de competição separadas das políticas de território.

Alternativamente, os regionalismos podem ser pensados como “expressão das práticas relacionais de alteridade” ou alternativas de territorialização ( Jonas, 2013Jonas, A. E. G. (2013). Place and region III: alternative regionalisms. Progress in Human Geography , 37 (6), 822-828. doi:10.1177/0309132513479088 p. 822): regionalismos contra hegemônicos; regionalismos baseados em novas políticas urbanas ambientais; regionalismos baseados em políticas urbanas progressistas, ou seja, em mudanças nas relações de classe, em novas formas de coalizão e em práticas econômicas alternativas que desafiam a hegemonia do mercado; regionalismo baseado na arte/artesanato que contrapõe sistemas tradicionais de organização do trabalho e da inovação; regionalismo baseado na vida em comunidade, que contrapõe a agenda neoliberal e a ideia de integração regional via mercado.

A Tabela 1 apresenta os conceitos relacionados à discussão da espacialidade no campo da geografia, que abordamos nessa seção. Nós concluímos esta seção com o conceito de “lugar” e de seu papel no entendimento da espacialidade. Em estudo sobre o sentido (identidade) do lugar, de uma perspectiva crítica e da geografia humana, Massey (2000)Massey, D. (2000). Um sentido global do lugar. In A. A. Arantes (Org.), O espaço da diferença (pp. 177-185). Campinas, SP: Papiros. analisa se a busca por sentido do lugar é necessariamente reacionária (porque baseada em tradicionalismos, nacionalismos e antagonismos) ou se essa busca pode ser progressista (não fechada e defensiva, aberta ao outro e voltada para fora). A autora afirma que os lugares não têm “identidades singulares e essenciais” (p. 182), também não é suficiente pensar a nossa experiência com o lugar exclusivamente relacionada à economia, ao capitalismo, ou à compressão espaço-tempo, afinal, a mobilidade do capital e do trabalho/trabalhadores são distintas. A contingência do lugar exige dos humanos uma política de negociações devido às conectividades globais entre humanos e não humanos. Essas negociações “serão sempre invenções, haverá necessidade de julgamento, aprendizagem, improvisação e não haverá regras meramente portáteis” ( Massey, 2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , p. 230).

Tabela 1
: Um Quadro conceitual para pensar a espacialidade na geografia

Portanto, pensar em um conceito de lugar implica refletir sobre a nossa experiência: níveis de mobilidade; comunicação através do espaço; dimensão geográfica das relações sociais; (in)segurança e sensação de vulnerabilidade; e questões de raça e de gênero ( Massey, 2000Massey, D. (2000). Um sentido global do lugar. In A. A. Arantes (Org.), O espaço da diferença (pp. 177-185). Campinas, SP: Papiros. ). A busca por um sentido global de lugar implica pensar a diferenciação social também como uma questão espacial, moral e política. A autora nos oferece diferentes imagens do lugar: pessoas que, mesmo contribuindo para a compressão do espaço-tempo, são prisioneiras do lugar; pessoas que se movem livres e rapidamente de um lugar para o outro; pessoas que buscam o lugar como um refúgio; pessoas que reconhecem as múltiplas identidades de um lugar, ou a identidade do lugar é a mistura complexa de várias identidades.

Um estudo conduzido por Relph (2014)Relph, E. (2014). Reflexões sobre a emergência, aspectos e essência de lugar. In E. Marandola Júnior, W. Holzer, L. Oliveira (Orgs.), Qual o espaço do lugar? (pp. 17-32). São Paulo, SP: Perspectiva. , no campo da geografia humana, analisou o lugar como: (a) reunião: de qualidades, experiências e significados do lugar; (b) localidade: altera a experiência de lugar (não implica uma localização fixa, websites); (c) place escape: a forma do lugar (pessoas, ruas, edifícios, colinas); (d) “ genius loci ”: lugares que têm identidade muito forte (igrejas, templos); (e) sentido de lugar: experimentação e apreensão das qualidades do lugar; (f) raízes e enraizamento: profunda associação e sentimento de pertencimento; (g) interioridade: familiaridade e conhecimento do lugar; (h) lar: lugar “onde se conhece e se é conhecido por outros”, (i) placelessness e não lugar: toda parte é um lugar ou configurações de coisas, atividades e significados; não lugares são lugares construídos de modo padronizado (supermercados, aeroportos, lanchonetes fast-food); (j) nós: “lugares são os nós de redes nacionais e internacionais”; (l) exclusão/inclusão: forte apego ao lugar ou sentir-se fora de lugar; (m) sentido contaminado de lugar: visão preconceituosa dirigida àqueles que são vistos como estranhos ao lugar (limpeza étnica, deslocamentos compulsórios); (n) construção de lugar: por aqueles que vivem no lugar e arquitetos e engenheiros; (o) fabricação do lugar: práticas de construção da identidade de lugar, incluindo práticas manipuladoras de identidades inventadas, práticas baseadas em vaga ligação histórica ou fictícia, práticas de identidade emprestada (imitação de monumentos) e práticas de construção de identidade divertida (pp. 22-27).

O espaço, as organizações e a estratégia vista como prática social

O interesse pelo espaço, território, região e lugar ultrapassa o campo da geografia. Nos estudos organizacionais, esses conceitos dão suporte ao estudo de uma variedade de temas: estudo da dinâmica urbana a partir das relações de poder entre camelôs, poder público e comerciantes ( Mendes & Cavedon, 2015Mendes, L., Cavedon, N. R. (2015). “Território como ordem e caos”: relações de poder entre camelôs, poder público e comerciantes. Base – Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos , 12 (1), 15-26. doi:10.4013/base.2015.121.02 ); pesquisa da relação entre o território e as estratégias utilizadas para agregar valor aos produtos e serviços ( Vieira & Pellin, 2015)Vieira, A. C. P., Pellin, V. (2015). As indicações geográficas como estratégia para fortalecer o território: o caso da indicação de procedência dos Vales da Uva Goethe. Desenvolvimento em Questão , 13 (30), 155-174. doi:10.21527/2237-6453.2015.30.155-174 ; uma abordagem crítico-reflexiva das formações econômicas, sociais e simbólicas no desenvolvimento de territórios criativos ( Closs & Oliveira, 2017)Closs, L., Oliveira, S. R. (2017). Economia criativa e território usados: um debate baseado nas contribuições de Milton Santos. Cadernos EBAPE.BR , 15 (2), 349-363. doi:10.1590/1679-395152437 ; e um ensaio que problematiza a apreensão da cultura organizacional territorializada ( Mendes & Cavedon, 2013)Mendes, L., Cavedon, N. R. (2013). As culturas organizacionais territorializadas. Revista de Ciências da Administração , 15 (35), 108-123. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p108 . Esse último conclui que a produção simbólica e política da cultura organizacional pode ser mais amplamente compreendida quando situada, delimitada e alocada. Damásio Filho, Kitazawa, Klichowski, Silva, & Chagas. (2017) apresentam um panorama dos estudos sobre espaço e território nos estudos organizacionais. Os autores mostram a existência de propostas multidisciplinares de pesquisas sobre conexões espaciais e sociais, configuração capitalista do espaço urbano, cidades como espaços de produção e consumo de bens e serviços e o papel do território no qual essas atividades ocorrem.

Nessa seção, nós lembramos de uma afirmação de Chanlat (1996)Chanlat, J.-F. (1996). O ser humano, um ser espaço-temporal. In J.-F. Chanlat (Org.), O indivíduo na organização (vol. 3, pp. 107-110). São Paulo, SP: Atlas. sobre o fato de que toda experiência, ação e atividade humana – indivíduos e coletivos, Organizações & Sociedades – estão enraizadas nessas duas dimensões: espaço e tempo. O autor nos lembra que é necessário ultrapassar uma visão funcionalista e quantitativa de tempo e espaço nas questões de gestão, vistos sobretudo (ou tão somente) como recurso ou variável econômica de custo e desempenho. O ordenamento do espaço contempla as interações locais, regionais, nacionais e internacionais e envolve a sobrevivência biológica, a existência psicológica, as relações de poder, a construção de sentido e a crítica dos espaços. Enquanto categoria explicativa, a dimensão tempo-espaço amplia a compreensão das organizações e de suas práticas, configuradas de modos distintos conforme tempo-espaço ( Vergara & Vieira, 2005Vergara, S. C., Vieira, M. M. F. (2005). Sobre a dimensão tempo-espaço na análise organizacional. Revista de Administração Contemporânea , 9 (2), 103-119. doi:10.1590/S1415-65552005000200006 ).

Com base na psicologia, Fischer (1994)Fischer, G. N. (1994). Espaço, identidade e organização. In J.-F. Chanlat (Org.), O indivíduo na organização (vol. 2, pp. 81-102). São Paulo, SP: Atlas. desenvolve o conceito de “espaços de trabalho” e define que os indivíduos organizam suas atividades e regulam as suas trocas com os outros a partir do domínio dos espaços e da fixação das pessoas aos lugares. Os indivíduos interagem no e com o espaço e o espaço tem um papel no comportamento humano: a ocupação e a transformação; as dimensões física, psicológica e social deste espaço; como esses espaços são experimentados e representados, simbólica e funcionalmente, ou seja, como esses espaços de relações são imaginados, evitados ou buscados por serem facilitadores de encontros e de deslocamentos. Sobretudo, o espaço de trabalho é um espaço de posições, de diversas intervenções e de práticas em um processo de repartição/distribuição, apropriação e utilização dos espaços. Esse processo não se baseia exclusivamente na relação de produção, mas em valores e estéticas da conduta humana. A experiência humana com os espaços não é passiva; trata-se de espaços de agir e se autodeterminar, espaços de domínio físico, simbólico e psicológico . Indivíduos e/ou coletivos que ocupam um espaço tendem a influenciar o local e a adotar comportamento de controle: demarcação de fronteiras e dominação territorial.

As organizações não são apenas espaços de recursos e de produção e constituem “o lugar que cada indivíduo explora, adapta e habita, a fim de realizar seus próprios objetivos” ( Fischer, 1994Fischer, G. N. (1994). Espaço, identidade e organização. In J.-F. Chanlat (Org.), O indivíduo na organização (vol. 2, pp. 81-102). São Paulo, SP: Atlas. , p. 89). A racionalidade instrumental confere ao espaço organizacional determinadas características: espaço dividido; espaço imposto; espaço controlado; e o espaço-emblema. Logotipo, jardins, arquitetura, decoração, perfume e tantos outros índices evocam sensações, valores e imagens; são mobilizados como símbolo de potência e de dominação inabaláveis e podem esconder “a feiura, o caráter vetusto, e as pressões reais dos lugares que eles abrigam” (p. 99).

Ainda a partir deste estudo de Fischer (1994)Fischer, G. N. (1994). Espaço, identidade e organização. In J.-F. Chanlat (Org.), O indivíduo na organização (vol. 2, pp. 81-102). São Paulo, SP: Atlas. e de uma variedade de outros estudos, Chanlat (2006)Chanlat, J.-F. (2006). Space, organization and management thinking: a socio-historical perspective. In S. R. Clegg, M. Kornberger (Eds.), Space, organization and management theory (pp. 17-43). Frederiksberg: Liber & Copenhagen Business School Press. apresenta uma síntese sócio-histórica do espaço nas principais escolas de gestão e mostra que o espaço vem ganhando interesse, nos estudos, sob quatro perspectivas mais recentes. Nos estudos culturais e simbólicos, o espaço organizacional é social , visto que produz e estrutura as relações sociais; é espaço simbólico , visto que é fonte de imagens para os membros internos e pessoas externas; é espaço estético da experiência pessoal dos membros com a harmonia ou desarmonia, beleza ou feiura, graça ou desgraça; o espaço é pensado como lugar com ênfase no que é peculiar e significativo para cada organização; o espaço organizacional é espacialidade porque se torna um elemento da linguagem, da ordem simbólica e do sistema de significados.

Na teoria política da organização, a organização é vista como um espaço social, cultural e político regulado por relações de poder, que buscam controlar materiais, recursos, pessoas, dinheiro e técnicas. O poder é exercido nas relações interpessoais e grupais, no uso da linguagem e de símbolos, regras e estrutura; e, para reduzir a incerteza, a dependência e manter o controle espacial, pode-se fazer uso da oposição entre interno e externo, oposição entre aqueles que seguem as regras do jogo e aqueles que não seguem.

A perspectiva da psicossociologia enfatiza o espaço organizacional como aspecto relevante da vida psíquica dos indivíduos. O espaço organizacional é produtor e produto de desejos, de representações e narrativas e de uma dinâmica afetiva e psíquica que influencia as ações de indivíduos megalomaníacos, paranoicos ou obsessivos-compulsivos. Essas ações trazem implicações para a estrutura, a cultura e a estratégia organizacional, e temas recentes abordam como os espaços em que nós vivemos e trabalhamos estão mudando a partir da globalização, tecnologia da informação, fragmentação do trabalho e flexibilização da localização das atividades organizacionais em diferentes países, uso massivo de tecnologias eletrônicas e novas formas organizacionais em espaços virtuais ( Chanlat, 2006Chanlat, J.-F. (2006). Space, organization and management thinking: a socio-historical perspective. In S. R. Clegg, M. Kornberger (Eds.), Space, organization and management theory (pp. 17-43). Frederiksberg: Liber & Copenhagen Business School Press. ). O que implica repensar os espaços organizacionais como mutantes .

Em estudo que tem como ponto de partida a concepção triádica de espaço (praticado, planejado, vivido) de Lefebvre (1991)Lefebvre, H. (1991). The production of space . Oxford: Blackwell Publishing. , Petani e Mengis (2016)Petani, F. J., Mengis, J. (2016). In search of lost space: the process of space planning through remembering and history. Organization , 23 (1), 71-89. doi:10.1177/1350508415605102 examinam a relação entre história, espaço, tempo e memória no planejamento e criação de um grande centro cultural. Em um estudo longitudinal, os autores adotam uma perspectiva espaço-temporal do planejamento que envolve recorrências, mudanças, narrativas contestadas sobre “ espaços perdidos ” ( lost spaces ), lembranças de espaços de felicidade ( happy spaces ) que se articulam com desejos de recuperar estes espaços do passado. Os autores concluem que a noção de espaços perdidos nos leva a considerar que o planejamento é um trabalho espaço-temporal e sociomaterial de relacionar diferentes espaços e tempos em narrativas não lineares de repetição a partir de lembranças organizacionais. O trabalho de planejamento está imerso no passado, no presente e nas possibilidades futuras, pois, para os autores, a lembrança de um espaço perdido e suas narrativas requerem um espaço que “é ou foi, ambos, materialmente praticado e fortemente e imaginativamente apropriado ” (grifo nosso, p. 83), o que não implica que tais narrativas assegurem algum poder na concepção do espaço.

Em estudo sobre o papel das escalas espaciais, Spicer (2006)Spicer, A. (2006). Beyond the convergence-divergence debate: the role of spatial scales in transforming organizational logic. Organization Studies , 27 (10), 1467-1483. doi:10.1177/0170840606067515 analisa a globalização como transformações em escalas espaciais e lógicas organizacionais, o que envolve também mudanças nos padrões de acumulação, regulação e discursos. As distintas lógicas organizacionais podem ser observadas em escalas externas (economia global), em novas escalas internas (o projeto da União Europeia), em escalas híbridas (organizações não governamentais que atuam local e globalmente) ou em novas escalas compartilhadas (uma região industrial). O processo de (re)escala espacial e transformação da lógica organizacional não diz respeito apenas aos grupos dominantes, mas também aos grupos que resistem, visto que este processo é político, além de econômico, geográfico e social. Esta abordagem concebe o espaço por uma abordagem transformacional: o espaço e as organizações são vistos como entidades dinâmicas e busca compreender os mecanismos pelos quais os espaços são produzidos . Além disso, a abordagem ultrapassa a concepção do espaço organizacional para o reconhecimento de espaços em grandes escalas ( larger-scale spaces ); e, sobretudo, enfatiza que as organizações existem e atuam em múltiplas escalas e que atores podem manipular recursos e adotar práticas e discursos que levam a organização a alcançar determinadas escalas.

Transitando para o campo específico dos estudos da estratégia como uma prática social, Nicolini (2012)Nicolini, D. (2012). Practice theory, work & organization . Oxford: Oxford University Press. argumenta que a virada prática e o idioma da prática são uma alternativa para aqueles que buscam compreender o fenômeno social e organizacional. A busca por projetos ontológicos, que providenciam um novo vocabulário para descrever o mundo, a organização e a estratégia a partir de “unidades de análise” específicas – as práticas – gerou diferentes abordagens que revelam dissimilaridades entre as teorias da prática. A existência de diferentes teorias da prática e de posicionamentos epistêmicos ocorrem porque prática é “um conceito polissêmico”. Vistas de fora ( from outside ), as práticas são um “padrão de atividades organizadas socialmente, reconhecidas e normativamente sustentadas” ( Gherardi, 2010Gherardi, S. (2010). Telemedicine: a practice-based approach to technology. Human Relations , 63 (4), 501-524. doi:10.1177/0018726709339096 , p. 507) e “mais ou menos compartilhadas” ( Gherardi, 2009Gherardi, S. (2009). Introduction: The Critical Power of the ‘Practice Lens’. Management Learning , 40 (2), 115-128. doi:10.1177/1350507608101225 , p. 116). Vistas de dentro ( from inside ), as práticas são “ação coletiva reconhecível” ( Gherardi, 2010Gherardi, S. (2010). Telemedicine: a practice-based approach to technology. Human Relations , 63 (4), 501-524. doi:10.1177/0018726709339096 , p. 507), “do ponto de vista dos praticantes e da atividade que está sendo performada com sua temporalidade e processualidade, bem como a emergente e negociada ordem da ação sendo feita” ( Gherardi, 2009Gherardi, S. (2009). Introduction: The Critical Power of the ‘Practice Lens’. Management Learning , 40 (2), 115-128. doi:10.1177/1350507608101225 , p. 117). Os níveis de engajamento dos autores com a teoria da prática podem variar: empírico, teórico e filosófico ( Feldman & Orlikowski, 2011Feldman, M. S., Orlikowski, W. J. (2011). Theorizing practice and practicing theory. Organization Science , 22 (5), 1240-1253. doi:10.1287/orsc.1100.0612 ).

Diferentes rotas de pesquisas e conceitos da estratégia como prática foram analisadas por Rouleau (2013)Rouleau, L. (2013). Strategy-as-practice research at a crossroads. Management , 16 (5), 547-565. doi:10.3917/mana.165.0574: (a) a prática vista como ação dos estrategistas que ocupam o nível gerencial; (b) a prática entendida como um conjunto de ferramentas do fazer estratégia; (c) a prática entendida como conhecimento; (d) a prática concebida como os recursos organizacionais; e (e) a prática como narrativa e discurso global. Enquanto agenda de pesquisa, a estratégia como prática tem como objeto de estudo o strategizing ( Jarzabkowski, 2005Jarzabkowski, P. (2005). Strategy as practice: an activity-based approach . Thousand Oaks: Sage Publications. , p. 3): como estrategistas pensam, falam, agem, refletem, interagem, emocionam, estetizam e politizam; que ferramentas e tecnologias usam; quais as implicações de diferentes formas de strategizing para a estratégia enquanto uma atividade organizacional.

A estratégia vista como prática social amplia as possibilidades de aplicação do próprio conceito de estratégia quando adota o pressuposto da pluralidade (Denis, Langley, & Rouleau, 2007; Johnson, Langley, Melin, & Whittington, 2007Whittington, R. (2007). Strategy practice and strategy process: family differences and the sociological eye. Organization Studies , 28 (10), 1575-1586. doi:10.1177/0170840607081557 ; Vaara & Whittington, 2012)Vaara, E., Whittington, R. (2012). Strategy as practice: taking social practices seriously. Academy of Management Annals , 6 (1), 285-336. doi:10.5465/19416520.2012.672039: (a) dos níveis de análise; (b) dos atores; (c) das teorias; (d) dos contextos. Entre os termos que emergiram para o estudo da estratégia como prática ( Tabela 2 ), nós destacamos as abordagens SAP e PBS, mais disseminadas em estratégia.

Tabela 2
: Quadro teórico da virada prática em estratégia

Pesquisas que adotam a abordagem da SAP, ou seja, a estratégia vista como uma atividade socialmente engajada/comprometida, devem enfrentar teórica e empiricamente cinco desafios: o que é a estratégia? Quem é o estrategista? O que os estrategistas fazem? O que uma análise dos estrategistas e suas práticas explica? Como as teorias social e organizacional existentes contribuem com uma análise da “estratégia-como-prática”? ( Jarzabkowski & Spee, 2009Jarzabkowski, P., Spee, A. P. (2009). Strategy-as-practice: a review and future directions for the field. International Journal of Management Review , 11 (1), 69-95. doi:10.1111/j.1468-2370.2008.00250.x ). Baseados em outra agenda de pesquisa da SAP, Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007) mostram as lacunas sobre o que (não) sabemos acerca dos tipos de praticantes (atores individuais nas organizações, agregados de atores nas organizações e agregados de atores extra organizacionais) e dos níveis de práxis (micro, meso e macro). A ideia inicial de distinguir e contrapor prática e processo ( Whittington, 2004, 20Whittington, R. (2004). Strategy after modernism: recovering practice. European Management Review , 1 (1), 62-68. doi:10.1057/palgrave.emr.1500006 , 2007Whittington, R. (2007). Strategy practice and strategy process: family differences and the sociological eye. Organization Studies , 28 (10), 1575-1586. doi:10.1177/0170840607081557 ) vem sendo substituída por conversações entre o conceito de processo de estratégia e o conceito da prática da estratégia. Burgelman et al. (2018)Burgelman, R. A., Floyd, S. W., Laamanen, T., Mantere, S., Vaara, E., Whittington, R. (2018). Strategy process and practices: dialogues and intersections. Strategic Management Journal , 30 (3), 531-558. doi:10.1002/smj.2741 propõem um modelo analítico que combina ambos os conceitos ( Strategy as Process and Practice – SAPP). Mirabeau, Maguire e Hardy (2018) analisam que pouca atenção foi dirigida às manifestações transitórias de estratégia. Eles ainda identificam seis formas de manifestação da estratégia: pretendida, realizada, deliberada, emergente, não realizada e efêmera.

A SAP enfrenta desafios de natureza ontológica, epistemológica e teórica (Clegg, Carter & Kornberger, 2004; Chia & Mackay, 2007Chia, R., Mackay, B. (2007). Post-processual challenges for the emerging strategy-as-practice perspective: discovering strategy in the logic of practice. Human Relations , 60 (1), 217-242. doi:10.1177/0018726707075291 ; Ezzamel & Willmott, 2010)Ezzamel, M., Willmott, H. (2010). Strategy and strategizing: a poststructuralist perspective. In J. A. C. Baum, J. Lampel (Eds.), The globalization of strategy research (vol. 27, pp. 75-109). Bingley: Emerald. , entre os quais encontramos: (a) o problema da agência-estrutura; (b) a pesquisa dos indivíduos e dos fazeres como “complexos de práticas” ( practice-complexes ); (c) o desenvolvimento de uma perspectiva pós-processual da estratégia que compreende as predisposições internalizadas e o modus operandi dos praticantes da estratégia e reconhece a construção coletiva da estratégia enquanto prática cultural e historicamente situada. Essa perspectiva pós-processual da estratégia se distingue da visão tradicional do processo de estratégia, constituído por etapas de tomadas de decisões dispostas em uma lógica sequencial e linear, enquanto ação consciente, intencional e deliberada de um único indivíduo ou de indivíduos em posições hierárquicas específicas.

Os PBS propõem que práticas são situadas e socialmente aprendidas; são sustentadas e refinadas ( Gherardi, 2012Gherardi, S. (2012). How to conduct a Practice-Based Study . Cheltenham: Edward Elgar. ). Os PBS têm forte interesse na aprendizagem, no conhecimento e na tecnologia ( Gherardi, 2010Gherardi, S. (2010). Telemedicine: a practice-based approach to technology. Human Relations , 63 (4), 501-524. doi:10.1177/0018726709339096 ; Nicolini, 2012Nicolini, D. (2012). Practice theory, work & organization . Oxford: Oxford University Press. ). As novas práticas requerem “conhecimento sensível”, testes e experimentação, negociação contínua de categorias estéticas, construção de identidades, refinamento de performances e julgamentos éticos e instrumentais ( Gherardi, 2012Gherardi, S. (2012). How to conduct a Practice-Based Study . Cheltenham: Edward Elgar. ). Do ponto de vista epistemológico, os PBS ( Gherardi, 2009Gherardi, S. (2009). Introduction: The Critical Power of the ‘Practice Lens’. Management Learning , 40 (2), 115-128. doi:10.1177/1350507608101225 ) buscam novos caminhos para estudar as organizações e a superação dos dualismos ação/estrutura e humano/não humano. A organização é vista como uma textura de práticas entre humanos e não humanos inter-relacionadas na forma de uma rede de ações sustentada pelo conhecimento em ação ( knowledge‐in‐action ), pela linguagem e por significados simbólicos, enquanto renova a si e se transforma a partir da prática ( Gherardi, 2012Gherardi, S. (2012). How to conduct a Practice-Based Study . Cheltenham: Edward Elgar. ).

A vertente PBS traz um novo impulso ao estudo da aprendizagem, enfatiza o papel da sociomaterialidade como uma forma de agência compartilhada e um relacionamento íntimo entre humanos e não humanos. Uma prática social é “o resultado das práticas interconectadas e seus circuitos de reprodução” ( Gherardi, 2010Gherardi, S. (2010). Telemedicine: a practice-based approach to technology. Human Relations , 63 (4), 501-524. doi:10.1177/0018726709339096 , p. 507). Para uma concepção do fenômeno social e humano, as diferentes teorias da prática enfatizam: o trabalho de produção e reprodução do cotidiano por trás da aparente ordem ou estabilidade social; repensar o papel dos agentes/indivíduos; entender o mundo em termos relacionais (interações sociais); o papel do conhecimento e do discurso nas práticas de construção de sentido, da identidade e das coisas sociais; “a centralidade dos interesses e do poder em todas as coisas que fazemos” ( Nicolini, 2012Nicolini, D. (2012). Practice theory, work & organization . Oxford: Oxford University Press. , p. 6).

Espacialidade da estratégia vista como prática: uma agenda de pesquisa

Uma agenda de pesquisa fundamentada na espacialidade da estratégia como prática é apresentada na Tabela 3 . As linhas pontilhadas retratam a porosidade entre as concepções de espaço e suas possibilidades de estudo, ou seja, trata-se do espaço como multiplicidade: simultaneidade de trajetórias múltiplas constituídas no e pelo espaço ( Massey, 2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. ). Essa agenda de pesquisa considera que diferentes concepções do espaço orientam as intervenções nos espaços e moldam nossas relações com o outro. Do ponto de vista ideológico, ético e conceitual, o indivíduo liberal concebe o espaço com noções individualistas de justiça, espaço-abstrato ; o indivíduo comunitarista vincula espaço com lealdades locais e comunicação intersubjetiva, espaço-local ; e o indivíduo pós-moderno concebe o espaço em sua corporeidade e intimidade, espaço íntimo/corpóreo ( Bridge, 2000Bridge, G. (2000) Rationality, ethics, and space: on situated universalism and the self-interested acknowledgement of “difference”. Environment and Planning D: Society and Space , 18 (4), 519-535. doi:10.1068/d204t ).

Tabela 3
: Espacialidade da estratégia vista como prática: uma agenda de pesquisa

O espaço praticado e vivido ( Massey, 2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. ) e os espaços possíveis (habitado e apropriado) ( Bourdieu, 2013Bourdieu, P. (2013). Espaço físico, espaço social e espaço físico apropriado. Estudos Avançados , 27 (79), 133-143. doi:10.1590/S0103-40142013000300010 ) referem-se a uma construção relacional que se faz por meio de práticas materiais, sociais, políticas e de significados/representação. Uma pluralidade de atores representa essas práticas (performances), que constituem a essência dos processos de produção, apropriação e reprodução do espaço, conforme os estudos revisitados da teoria social e da geografia crítica, humana e cultural. O território, a região e o lugar são espaços praticados e vividos, ainda que os discursos hegemônicos ou as estratégias antiespaciais ( Massey, 2015Massey, D. (2015). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil. , p. 263) insistam na oposição do “lugar-como-real” e do “espaço-como-abstrato”. Essa oposição facilita a localização do compromisso ético das práticas vis-à-vis a dispersão das responsabilidades globais, o que é irônico e problemático, visto que as questões globais e a interconectividade global são tão prementes no lugar.

Além da análise dos espaços percebidos, concebidos e vividos ( Lefebvre, 1991Lefebvre, H. (1991). The production of space . Oxford: Blackwell Publishing. ), também encontramos outras concepções do espaço. As práticas de construção de identidade regional são questionadas quando essas práticas criam espaços-estereótipos para enfraquecer o outro e estigmatizar identidades coletivas. Said (2007)Said, E. W. (2007). Orientalismo: o oriente como invenção do ocidente . São Paulo, SP: Companhia das Letras. analisa como o ocidente orientalizou o oriental a partir de interpretação, de representação e de práticas equivocadas, propondo práticas reflexivas que considerem a ideia de que o oriente não é um fato inerte, nem apenas uma ideia. Albuquerque Júnior (2011) argumenta que a região Nordeste, enquanto paisagem imaginada do Brasil, foi originada no final da primeira década do século XX: um nordeste “adequado para os estudos da academia, para a exposição no museu, para o programa de televisão, para ser tema de romances, pinturas, filmes, peças de teatro, discursos políticos, medidas econômicas” (p. 78-79). Said (2007)Said, E. W. (2007). Orientalismo: o oriente como invenção do ocidente . São Paulo, SP: Companhia das Letras. e Albuquerque Júnior (2011) mostram o espaço narrado .

Os espaços e as identidades espaciais estão sujeitos à manipulação e podem ser influenciados por projetos de poder individuais e de grupos (Souza, 2015b). Com base nesse argumento é possível ientificar: (a) espaços eternizados, sonhados e desejados: trabalhar em uma determinada empresa, cidades que são desejos turísticos (Veneza, Paris, Barcelona, Nova York) e até bairros (Copacabana e Ipanema no Rio de Janeiro); (b) espaços de declínio/renascidos ou deixados: a prática dos moradores ou de grupos de interesse pode afetar a imagem e os limites do bairro e da cidade por meio de práticas que geram o seu declínio ou o seu revigoramento (Detroit nos EUA, nos anos 1960 e no início do século XX); (c) espaços criados/inventados por políticas governamentais (Dubai nos Emirados Árabes Unidos). Na perspectiva da relação entre corpo e lugar, surgem os bioespaços (laboratórios, farmácias, hospitais, plantações transgênicas, sequenciamento genético, prolongamento da vida), espaços simbólicos (catedrais, teatros, cinemas, museus), espaços blasfêmicos (campos de futebol, bares), lugares orgiásticos e lugares silenciosos ( Chaveiro, 2014Chaveiro, E. F. (2014). Corporeidade e lugar: elos da produção da existência. In E. Marandola Júnior, W. Holzer, L. Oliveira (Orgs.), Qual o espaço do lugar? (pp. 249-279). São Paulo, SP: Perspectiva. ).

As práticas socioespaciais também definem os espaços de resistência e a luta pelos espaços , visto que a hegemonia do capitalismo afeta a qualidade das relações sociais, políticas e econômicas, gerando espaços marcados pela expropriação e exploração, reduzindo os indivíduos de um bairro (Paraisópolis em São Paulo), de uma cidade ou região, de um país ou território a mero fornecedor de mão de obra ( Ribeiro, 2018Ribeiro, F. V. (2018). A prática socioespacial da resistência. In A. F. A. Carlos, C. S. Santos, I. P. Alvarez (Orgs.), Geografia urbana crítica: teoria e método (pp. 53-64). São Paulo, SP: Contexto. ). Práticas político-espaciais geram espaços de controle/disputados (Complexo do Alemão no Rio de Janeiro, militarização de espaços) e espaços dissidentes/insurgentes/de resistência (algumas universidades, dependendo da conjuntura, espaços de ocupação pelos sem-teto, espaço de ativismo ambiental, campos de refugiados). Esses últimos, com suas práticas emancipatórias e anti-heterônomas e seu papel nas agendas de poder: a luta pelo direito à cidade e ao planeta (Souza, 2015a), práticas denominadas “táticas” por Certeau (1998)Certeau, M. (1998). A invenção do cotidiano (3a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. que buscam a reorganização do espaço em busca de “ espaços de esperança ” ( Harvey, 2005Harvey, D. (2005). A produção capitalista do espaço . São Paulo, SP: Annablume. ).

A presente agenda de pesquisa para os estudos da estratégia vista como prática social, faz-se necessário o debate para além do tempo objetivo e do espaço objetivo ( Hydle, 2015Hydle, K. M. (2015). Temporal and spatial dimensions of strategizing. Organization Studies , 36 (5), 643-663. doi:10.1177/0170840615571957 ): concepção de práticas que são realizadas em algum momento do tempo e em algum lugar. Nós mostramos que maior atenção à temporalidade e à espacialidade das práticas contribui para explicar como o strategizing – enquanto modo de ser no mundo – é habilitado e limitado, deliberado e não deliberado, caracterizado por formas efêmeras de práticas (Mirabeau, Maguire, & Hardy, 2018). Se é possível discutir o tempo e o espaço objetivos, que existem independentes da atividade humana; o mesmo não se aplica à temporalidade e à espacialidade , visto que essas estão enraizadas nas atividades humanas. Se a temporalidade embaralha passado, presente e futuro enquanto a ação se desenvolve, a espacialidade envolve os lugares e as trajetórias de uma pluralidade de atores, suas identidades, relações, experiências humanas. O strategizing se insere nessas intrincadas relações entre o espaço (e a espacialidade) e os sujeitos em ação: interações, identidades, história/trajetórias. Afinal, espaços não identitários, não relacionais e não históricos são um não lugar ( Augé, 2012)Augé, M. (2012). Não lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade (9a ed.). Campinas, SP: Papirus.: espaços que prometem “individualidade solitária” (trens, metrôs, aeroportos, caixas eletrônicos), espaços de passagem, provisórios e efêmeros (hotéis, clubes de férias, acampamentos de refugiados); já Relph (2014)Relph, E. (2014). Reflexões sobre a emergência, aspectos e essência de lugar. In E. Marandola Júnior, W. Holzer, L. Oliveira (Orgs.), Qual o espaço do lugar? (pp. 17-32). São Paulo, SP: Perspectiva. define que não lugares são lugares construídos de modo padronizado (supermercados, aeroportos, lojas franqueadas).

Considerações finais

O diálogo entre os estudos da estratégia como prática e os estudos sobre espaço na teoria social e na geografia humana, cultural e crítica revela temáticas da estratégia que vão além do mundo dos negócios, sem excluí-lo. Neste ensaio, nós mostramos o espaço como multiplicidade, o que implica pensar o espaço como uma pluralidade de trajetórias individuais e/ou coletivos mediante variadas práticas socioespaciais. Espaços dizem respeito aos fazeres, escolhas, ações, interações, comportamentos, sentimentos, símbolos de poder, expressões culturais, presença ou ausência de elementos físicos de bem-estar, entre outros aspectos que interessam ao strategizing . Espaços não são o palco em que a estratégia acontece ou em que a estratégia é praticada, são parte dos fazeres da estratégia, pois facilitam, dificultam, impedem e exigem estratégias socioespaciais que interpretam, representam, criam, transformam e reproduzem os espaços.

Além da questão do espaço e da espacialidade, outros conceitos – território, região e lugar – também possibilitam um estudo mais amplo e realista da prática estratégica. A multiescalabilidade dos espaços no “fazendo estratégia” ( strategizing ) é um aspecto a ser contemplado nos estudos da estratégia como prática social (SAP e PBS) e parece ser conceitualmente mais rico que a questão micro-macro proposta pela SAP ou os conceitos de local-global de estratégias antiespaciais. Uma análise política da estratégia nos espaços é também conceitualmente mais rica que a noção de tensão relacional abordada pela SAP. O estudo do papel do strategizing na construção da identidade dos espaços públicos e privados, tais como fonte de pertencimento, de confiança e de proteção, de medo e insegurança, de apego ou repulsa ao lugar, também possibilita o conhecimento, a aprendizagem e a sociomaterialidade das práticas dos indivíduos e coletivos/grupos de indivíduos, que contribuem para um aprofundamento da pesquisa em PBS.

Ao refletir sobre a incômoda ausência do espaço nos estudos da estratégia como prática, nós mostramos que a espacialidade da estratégia como prática abre novas janelas para o estudo da realidade organizacional e, mais especificamente, oferece maior densidade às pesquisas do campo da estratégia como uma prática social. Também abre caminho para o entendimento da questão: o que implica para o estudo da estratégia ser esta uma prática situada?

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Editado por

Editora Associada: Josiane Oliveira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Set 2021
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2018
  • Aceito
    16 Jun 2020
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