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As barbas de um Bluesman: um signo de resistência negra no rap baiano

RESUMO

As barbas são um indício de que o homem alcançou a maturidade. Com essa imagem, são analisadas as canções do segundo álbum do artista Baco Exu do Blues, Bluesman. Com apenas 22 anos de idade, em seu ato de criação, Baco criticou as condições de desigualdade socioeconômica e o racismo impostos ao afrodescendente, atuando como um signo ideológico na construção de uma consciência negra. Como um símbolo de insurgência, Baco também se utilizou de linguagem mítica para compor uma identidade e formatar o seu rap, criando um herói. O hip hop critica o capitalismo racial, instaurado no Brasil com a colonização e o sequestro de africanos escravizados. As composições são apreendidas como gritos de resistência à necropolítica - um chamado para a execução de atos que relacionam valores éticos e poesia ao fazer político.

PALAVRAS-CHAVE:
Ato de criação; Baco Exu do Blues; Necropolítica; Signo ideológico

ABSTRACT

Beards are an indication that man has reached maturity. It is with this idea in mind that the songs from the second album by artist Baco Exu do Blues, Bluesman, are analyzed. At the early age of 22, in his act of creation, Baco criticized the conditions of socioeconomic inequality and racism imposed on people of African descent, acting as an ideological sign in the construction of a Black Consciousness. As a symbol of insurgency, Baco also used mythical language to compose an identity and format his rap, creating a hero. Hip hop criticizes racial capitalism, established in Brazil with the colonization and the arrival of enslaved Africans. The compositions are analyzed as cries of resistance to necropolitics – a call to perform acts that relate ethical values and poetry when doing politcs.

KEYWORDS:
Act of creation; Baco Exu do Blues; Necropolitics; Ideological sign

Introdução

Nascido na cidade de Salvador, em 1996, e um fenômeno aos 20 anos de idade, o produtor, rapper e compositor Diogo Álvaro Ferreira Moncorvo, conhecido como Baco Exu do Blues, produz em sua música uma linguagem estética que dinamiza a negociação de agências marginais, tornando-se um ator político. Baco estudou somente até o sexto ano do ensino fundamental, por sentir que se tratava de um sistema opressor e racista. Na canção Sulicídio, composta em 2016 com o rapper Diomedes Chinaski e que o lançou no cenário musical brasileiro, há a emergência da inclusão do rap nordestino no cenário nacional, dominado por rappers do sudeste do país.

Advindo do hip hop, um movimento cultural pós-moderno e urbano que tem como alvo a dissolução de sistemas opressores, principalmente o capitalista e racista, o rap configura a linguagem musical escolhida por Baco Exu do Blues que evidenciamos como um ato de criação estética de resistência cultural e afirmação identitária, a partir de uma realidade que o expõe às próprias mazelas que o inspiram a escrever. Fazendo-se um mito, o rapper-bluesman é uma representação do empoderamento negro na indústria fonográfica brasileira.

Baco tem demonstrado ser um artista versátil e multifacetado, como o seu nome artístico indica, fazendo alusão ao deus grego Baco; ao Orixá Exu, de origem africana, representado nos cultos afro-brasileiros, e ao ritmo afro-americano blues. O rapper utiliza o sample - técnica eletrônica que utiliza trechos de outras músicas - e vocais masculinos e femininos. Além do hip hop e do blues, também possui como referência a musicalidade baiana, a carioca, a clássica, a latina, o rhythm and blues ou soul e a musicalidade percussiva do Candomblé. Um compositor autodidata, Baco Exu do Blues é uma demonstração de resistência cultural e de afirmação identitária negra na música baiana que guarda essa narrativa desde um longo processo, iniciado no ano 1974, com a estreia do bloco afro Ilê Ayê, na cidade de Salvador. Baco opera com tradições na escolha do seu repertório artístico.

Neste estudo1 1 Estudo realizado no escopo do projeto de pesquisa “O oceano de fronteiras invisíveis: literaturas em línguas inglesa e portuguesa e fluxos epistemológicos sul-sul”, com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia – FAPESB; e parte de capítulo de tese em andamento, com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes. , é construído um olhar sobre um produto da cultura popular afro-brasileira, mediante a análise das práticas discursivas de emancipação inscritas na diáspora. Articula-se um diálogo entre estudos diversos relativos à dinâmica entre a cultura, a linguagem e o signo ideológico, buscando produzir como conhecimento uma noção acerca da interface entre a política, o ritmo e a poesia negra de Baco Exu do Blues. A obra do artista é analisada como um produto cultural que se utiliza em grande parte de textos que argumentam sobre uma realidade que precisa de uma revolução. A obra de Baco inscreve uma ideologia de emancipação e valorização do potencial de afrodescendentes, na construção de uma contracultura inclusiva e antirracista, buscando interferir no arranjo da necropolítica tão evidente em nossa sociedade.

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O contexto do repertório estético e a política inserida na arte

Homenageado em diversos prêmios da música, e inscrevendo discursos a partir da vivência de uma minoria política inserida na periferia e da sua própria experiência como um homem negro e nordestino, Baco Exu do Blues evoca a superação de estigmas sociais. Foi indicado ao Troféu APCA 2017 nas categorias artista revelação, música do ano e disco do ano, com o hit romântico e erótico intitulado Te amo disgraça; laureado como a Melhor Música de rap pelo site Genius, através do Prêmio Genius Brasil de Música 2017, e Canção do Ano, pelo Prêmio Multishow de Música Brasileira, mesma ocasião em que Baco foi laureado como Artista Revelação. O seu primeiro trabalho solo, Esú, foi eleito o quinto melhor álbum brasileiro do ano 2017 pela revista Rolling Stone Brasil.

Em Bluesman, álbum lançado em 2018, há as afirmações de que o samba, o funk e o rap equivalem ao blues, relacionando esses quatro gêneros musicais ao empoderamento e à visibilidade de afrodescendentes, também ligados profundamente a discursos de ordem política e pertencimento cultural. O vídeo curta-metragem intitulado Bluesman, dirigido por Douglas Ratzlaff Bernardt, que engloba três músicas do álbum, venceu o Gran Prix do festival Cannes Lion, em 2019, superando a megaprodução de Beyoncé e Jay-Z. O mesmo vídeo foi premiado na categoria Direção do ano, no Superjúri do Prêmio Multishow 2019. Nesse mesmo ano, Baco lançou singles em parcerias e o selo fonográfico 999, que tem divulgado artistas negros. Em 2020, interrompeu a produção do seu terceiro álbum intitulado Bacanal, em razão da pandemia da Covid-19, e lançou o EP de nove faixas Não tem bacanal na quarentena.

Segundo Brandão (1999), Baco, em grego Bákkhos, e seus derivados Bákkhe, Bacante e o verbo bakkheúein, que significa “ser tomado de um delírio sagrado”, não possuem etimologia segura definida, assim como o equivalente Dioniso. Deus da transformação, do vinho, das orgias e dos “desregramentos”, a perseguição, sob o ângulo político, pode ser explicada pela séria e longa oposição à penetração do culto a esse deus na pólis aristocrática da Grécia antiga. Apresentando-se como o menos político dos deuses gregos, em seu culto eram comuns banhos de mar ou rio para a purificação antes das orgias, além da existência de uma vítima sacrifical e homenagens aos mortos. “Ao contrário de Apolo, jamais houve um Dioniso nacional e nem tampouco um Dioniso sacerdotal. Deus imortal, talvez o filho de Sêmele tenha sido mais humano que o próprio homem grego” (BRANDÃO, 1999BRANDÃO, J. de S. Mitologia grega. Vol. II. 10. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1999., p.125).

Orixá da comunicação, Exu traz consigo a revelação dos mistérios que levam os seres humanos às divindades do Candomblé. Foi demonizado pela cultura ocidental. Segundo Sàlámì (King) e Ribeiro (2015)SÀLÁMÌ(KING), S.; RIBEIRO, R. I. Exu e a ordem do universo. 2 ed. São Paulo: Ed. Oduduwa, 2015., é um Orixá de natureza controversa, uma entidade neutra entre o bem e o mal que realiza as vontades humanas. O seu caráter é disciplinador, exigindo ordem e organização. Conforme Prandi (2001)PRANDI, R. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001., um dos mitos africanos conta que Exu, certa vez, andava por terras dos povos yorubá procurando de aldeia em aldeia a solução para os problemas que afligiam aos homens e aos Orixás. Exu foi aconselhado a ouvir todos os dramas vividos pelos seres humanos, pelas divindades, pelos animais e por todos os outros seres. Todas as narrativas deveriam ser consideradas, desde aquelas que relatavam glórias até as que tratavam de infortúnios. O mensageiro deveria, também, estar atento aos relatos sobre as providências tomadas e sobre as oferendas feitas aos Orixás para o alcance das realizações. De acordo com Prandi (2001)PRANDI, R. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001., assim Exu reuniu um número incontável de histórias que guardam todo o conhecimento necessário para explicar os mistérios sobre a origem e o governo do mundo dos humanos e da natureza. Todo esse conhecimento foi dado por Exu ao adivinho Orunmilá, que transmitiu o saber aos seus seguidores - os sacerdotes do Oráculo de Ifá.

Baco Exu do Blues imprime, com as insígnias, o poder evocado por duas divindades consideradas “pagãs” que representam o caos na sociedade ocidental. O blues também não foge dessa regra. O rapper costuma abordar em suas letras a sua inconformidade com dogmas dominantes, como na canção Kenye West2 2 Kanye Omari West [1977-], também conhecido por Ye ou Yeezy, é um rapper, produtor musical e estilista americano. da Bahia, na qual enuncia: “Jesus, eu espanquei Jesus/ Quando vi ele chorando, gritando, falando/ Que queria ser branco, alisar o cabelo/ E botar uma lente pra ficar igual/ A imagem que vocês criaram.” (BLUES, 2018aBLUES, B. E. do. Kanye West da Bahia. Baco Exu do Blues [Intérprete] (part. DKVPZ e Bibi Caetano) São Paulo: Selo EAEO Records, 2018a.). Também, as escolhas do deus grego Baco e do Orixá Exu revelam a vinculação de valores humanos ao que se revela como divino, por parte do artista. De acordo com Aranha e Martins (1993)ARANHA, M. I. de A.; Martins, H. P. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993., o deus pessoal caracteriza-se por ser capaz de sofrer e agir como a humanidade, atuando de maneiras diversas. Os seus múltiplos nomes expressam diferentes aspectos de sua natureza, o seu poder e a sua eficiência.

De acordo com Abal e Trombetta (2011)ABAL, F. C.; TROMBETTA, G. L. O Blues e o diabo: um encontro na encruzilhada. In: XXVI Simpósio Nacional de História - ANPUH. São Paulo: Anais eletrônicos, Associação Nacional de História - ANPUH, 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1322667935_ARQUIVO_Gerson_Felipe.pdf.Acesso em 06 abr. 2019.
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, nos anos 1920 surgia no mercado fonográfico algo novo, derivado dos descendentes de escravos do sul dos Estados Unidos, que se tornou uma influência importante para músicos nos noventa anos seguintes: o blues. As condições precárias e as dificuldades financeiras e amorosas eram as inspirações prediletas dos compositores que escreviam sobre o diabo, o sexo, traições amorosas, a situação de pobreza e o desamparo social. Conforme os estudiosos, o blues caracterizava-se como uma música que vinha dos negros, dos pobres e dos marginalizados. A elite branca, que enxergava os negros como inferiores, sem alma e desumanizados, via-se frente a letras que expunham o dia a dia de pobreza, dor e sentimentos feridos, feitas por negros e para negros, sem qualquer intenção de agradar os seus, outrora, “senhores”. Abal e Trombetta (2011)ABAL, F. C.; TROMBETTA, G. L. O Blues e o diabo: um encontro na encruzilhada. In: XXVI Simpósio Nacional de História - ANPUH. São Paulo: Anais eletrônicos, Associação Nacional de História - ANPUH, 2011. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1322667935_ARQUIVO_Gerson_Felipe.pdf.Acesso em 06 abr. 2019.
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descrevem que o blues representou uma ruptura dentro de uma sociedade religiosa, racista e oligárquica como a que existia na época, não se sujeitando às restrições impostas e trazendo uma separação na ordem vigente.

De acordo com Postali (2010)POSTALI, T. Práticas culturais urbanas: estudo sobre o blues e o hip hop como comunicações específicas de grupo, 2010, 139f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) - Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2010. Disponível em: http://comunicacaoecultura.uniso.br/producao-discente/2010/pdf/Thifani_Postali.pdf.Acesso em: 06 abr. 2019.
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, assim como o blues, o hip hop3 3 Postali (2010) enumera que os principais elementos que compõem o hip hop são: o DJ, o grafite, o rap e o break. A dança não se restringe ao break, incluindo também outras modalidades. O elemento que sustenta todos é o conhecimento. Conforme a estudiosa, assim, o hip hop vale-se de diversos elementos que se combinam a fim de disseminar ideias. , surgido entre os anos 1960 e 1970 no bairro do Bronx, Nova Iorque, é o resultado do processo de hibridização cultural em que diferentes povos em contato criaram novas práticas culturais. Juntando-se aos elementos culturais norte-americanos, a música jamaicana foi se transformando no que hoje é conhecido como rap: rythm and poetry - ou seja, ritmo e poesia. Caracteriza-se pela improvisação poética sobre uma batida musical rápida realizada por sons digitais, possuindo a expressão oral como o elemento mais importante da música.

Postali (2010)POSTALI, T. Práticas culturais urbanas: estudo sobre o blues e o hip hop como comunicações específicas de grupo, 2010, 139f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) - Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2010. Disponível em: http://comunicacaoecultura.uniso.br/producao-discente/2010/pdf/Thifani_Postali.pdf.Acesso em: 06 abr. 2019.
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esclarece que as práticas culturais do blues e do hip hop fazem parte de uma história marcada pela batalha dos afrodescendentes contra a situação social do grupo existido em diáspora. A insistência em encontrar um lugar crível onde a segregação afirmou e, ainda, afirma presença faz parte da luta dos negros em alcançar o reconhecimento como um grupo pertencente aos países que os haviam explorado em escravização, há pouco. Segundo a estudiosa, como forma de amenizar o sentimento gerado pelos problemas suportados desde a chegada ao continente americano, procurou-se remontar a estrutura cultural africana, tendo a música como um pilar das manifestações culturais. Isso porque, por meio da memória, a cultura foi a única amostra possível de ser transportada no período escravagista. No entanto, em terras americanas, quaisquer comportamentos originais africanos foram proibidos. Postali (2010)POSTALI, T. Práticas culturais urbanas: estudo sobre o blues e o hip hop como comunicações específicas de grupo, 2010, 139f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) - Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2010. Disponível em: http://comunicacaoecultura.uniso.br/producao-discente/2010/pdf/Thifani_Postali.pdf.Acesso em: 06 abr. 2019.
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expõe que, dessa forma, o hip hop passou a ser considerado a manifestação precursora da resistência marginal da segunda metade do século XX, iniciada pelo blues no final do século XIX. Assim como o blues, o hip hop procura manifestar a resistência perante o sistema social que manteve grupos afrodescendentes em condições secundárias.

Em entrevista ao cantor e compositor Caetano Veloso, Baco Exu do Blues (2019a)BLUES, B. E. do. [Entrevista concedida a] Caetano Veloso. Mídia Ninja, 31 jan. 2019a. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ZHCeTlWAXQM&feature=youtu.be&fbclid=IwAR0UtlszHaHBjtDlQB1_YIQQIZKC-W0i3DS_sSAXD03VNBPqVA6E3Nhxyq0.Acesso em: 25 abr. 2019.
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afirma que tem a proposta de não se curvar à indústria musical que reproduz modelos padronizados e repetitivos. Baco diz entender que o seu sucesso se deve, em parte, ao acolhimento de um público branco e elitizado, mas que não mudará a sua arte para agradar a esse nicho, pois continuará compondo para que as pessoas que não passam pela vivência de ser um afrodescendente possam conhecer e compreender tal contexto. Conforme Blues (2019a)BLUES, B. E. do. [Entrevista concedida a] Caetano Veloso. Mídia Ninja, 31 jan. 2019a. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ZHCeTlWAXQM&feature=youtu.be&fbclid=IwAR0UtlszHaHBjtDlQB1_YIQQIZKC-W0i3DS_sSAXD03VNBPqVA6E3Nhxyq0.Acesso em: 25 abr. 2019.
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, a questão do racismo é vivenciada por ele próprio integralmente, todos os dias, apesar de já ter alcançado a fama e, no Brasil, costuma-se camuflar essa questão. O artista afirma que o cotidiano de mulheres e homens afrodescendentes prova que existe muito preconceito ainda, de forma que, talvez, seja impossível a eleição de outro presidente negro, como ocorreu com Barack Obama nos Estados Unidos.

Por seu turno, Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001. analisa a música do Atlântico Negro que corresponde a uma cultura diaspórica, e nela inclui o hip hop. O historiador descreve a música negra como uma narrativa insurgente que articula discursivamente uma contracultura a partir da diáspora. Compreende a produção e a expressão de uma “transvalorização de todos os valores” abafada pela história do terror racial nas Américas. O historiador considera que a acuidade crítica do movimento inclui, mas também supera o anticapitalismo, subjugando, na verdade, o capitalismo racial. O hip hop articula uma política de realização em torno de demandas por metas como a justiça não racializada e a organização racional dos processos produtivos. O historiador descreve outra política que não lhe é coextensiva, pois atua num campo diverso relacionando outros valores. Segundo Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001., a questão de como as utopias são concebidas é mais complexa, principalmente porque elas insistem continuamente em fugir ao alcance do meramente linguístico, textual e discursivo. Ainda:

A invocação da utopia referencia aquilo que, conforme a sugestiva indicação de Seyla Benhabib, proponho chamar de política da transfiguração. Esta política enfatiza o surgimento de desejos, relações sociais e modos de associação qualitativamente novos no âmbito da comunidade racial de interpretação e resistência e também entre esse grupo e seus opressores do passado. Ela aponta especificamente para a formação de uma comunidade de necessidades e solidariedade, que é magicamente tornada audível na música em si e palpável nas relações sociais de sua utilidade e reprodução culturais. [...] Os sinais voluntariamente adulterados que traem a política decididamente utópica da transfiguração, portanto, transcendem parcialmente a modernidade, construindo tanto um passado imaginário antimoderno como um vir-a-ser pós-moderno. Não se trata de um contradiscurso, mas de uma contracultura que reconstrói desafiadoramente sua própria genealogia crítica, intelectual e moral em uma esfera pública parcialmente oculta e inteiramente sua. A política da transfiguração, portanto, revela as fissuras internas ocultas no conceito de modernidade (GILROY, 2001, p.96, grifos nossos).

Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001. define que a política da realização inclui a noção de que uma sociedade futura será capaz de realizar a promessa social e política que a sociedade presente tem deixado irrealizada. Em geral, se contenta em jogar a racionalidade ocidental em seu próprio campo: “Ela necessita de uma orientação hermenêutica que possa assimilar o semiótico, o verbal e o textual” (GILROY, 2001, p.97). Por sua vez, a política da transfiguração busca o sublime, esforçando-se numa utópica necessidade de repetir o irrepetível e apresentar o inapresentável. Possui como foco hermenêutico o avanço para o mimético, o dramático e o performativo. Deseja-se basicamente conjurar e instituir novos modos de amizade, felicidade e solidariedade consequentes com a superação da opressão racial sobre a qual se assentava a modernidade e sua antinomia do progresso racional, ocidental, como barbaridade excessiva. Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001. salienta que, mediante as suas expressões estéticas, em particular a música, os negros têm relacionado valores éticos ao fazer político, uma aquisição histórica elementar nos processos de emancipação pela representação cultural e política. É nessa perspectiva que Baco Exu do Blues pode ser uma manifestação emblemática.

Embora não sejam coextensivas, as duas formas de atuação descritas reinscrevem os seus agentes a partir da negação da subalternidade que lhes foi atribuída desde a colonização europeia, a desumanização de indivíduos e a sua exclusão de uma vivência política e da livre manifestação cultural. Conforme Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001., as culturas expressivas desenvolvidas na escravidão continuam a preservar, em sua forma artística, as necessidades e desejos que vão além da satisfação de demandas materiais. Em oposição à suposição do Iluminismo, de uma separação fundamental entre a arte e a vida, essas formas expressivas reiteram a continuidade entre ambas, celebrando o enraizamento do estético em outras dimensões da vida social.

A desumanização dos povos africanos, iniciada com a colonização europeia disseminada a partir do século XVI, culminou num grande massacre e no protótipo do capitalismo racial. Escravos revoltosos eram mortos; as condições do transporte transatlântico e de moradia eram insalubres; filhos bastardos eram assassinados ainda bebês; mulheres eram estupradas e sofriam mutilações causadas por suas senhoras tomadas por ciúmes etc. São práticas do necropoder. De fato, Mbembe (2018)MBEMBE, A. Necropolítica: soberania, estado de exceção, política da morte. Tradução de Renata Santini. São Paulo: n-1 edições, 2018. define a necropolítica como uma ação terrorista, arquitetada segundo uma tecnologia militar que compreende os indivíduos dominados como animais, e o seu massacre não é considerado um crime. Trata-se de uma técnica europeia de controle que visa à soberania, desenvolvida durante a colonização, e levada às suas últimas consequências com o nazismo e o stalinismo. É uma política de Estado moderna que tem a despersonalização de subjugados e a sua morte como uma finalidade para a manutenção do poder. É criada uma ficção acerca da existência de um inimigo absoluto, o que convém para justificar o combate. O teórico político exemplifica o necropoder instaurado com o apartheid, na África do Sul, que negava a cidadania aos locais, em seu próprio território.

Mbembe (2018)MBEMBE, A. Necropolítica: soberania, estado de exceção, política da morte. Tradução de Renata Santini. São Paulo: n-1 edições, 2018. descreve, ainda, que decorre do necropoder uma forma de violência que se constitui como a forma original do direito. O estado de exceção proporciona a estrutura da soberania e a aplicação de diversas tecnologias, demarcando o controle físico e o geográfico. Nesse contexto, ocorre a produção de uma ampla reserva de imaginários culturais que justificam a instituição de direitos diferentes para diferentes categorias de pessoas, relacionando os dominados a objetos descartáveis. A vida cotidiana é militarizada. Segundo o teórico, atualmente, o necropoder está associado à economia de mercado, funcionando como uma empresa em Estados onde as milícias urbanas, os exércitos privados, os exércitos de senhores regionais, a segurança privada e os exércitos de Estado proclamam o direito de exercer a violência ou de matar. Para os oprimidos, que vivenciam o enlace que embaralha as fronteiras entre a resistência e o suicídio, o sacrifício e a redenção, o martírio e o alcance da liberdade, a autoimolação é uma escolha forçada e matar pode se tornar a única forma de sobrevivência.

No Atlas da Violência (2020)ATLAS DA VIOLÊNCIA 2020. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Org.). In: Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, 2020., foi apurado o aprofundamento do processo da desigualdade racial nos indicadores de violência letal no Brasil. Segundo o levantamento, a região Nordeste apresenta as maiores taxas de homicídios de afro-brasileiros. Em 2018, os negros representaram 75,7% das vítimas de homicídios no Brasil, com uma taxa de homicídios por 100 mil habitantes de 37,8%. Os jovens negros figuram como as principais vítimas de homicídios do país. Da mesma forma, as mulheres negras representaram 68% do total das mulheres assassinadas. Em 2018, a taxa de homicídio de negros por 100 mil habitantes na Bahia foi de 50,8%. O estudo concluiu que o referido grupo é vulnerável à morte violenta e a situação, evidentemente, demanda políticas públicas de segurança e ações para a garantia de seus direitos.

A sociedade brasileira, nos termos de Chaui (2011)CHAUI, M. S. Ética, violência e política. In: CHAUI, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 13ª ed. São Paulo: Editora Cortez, 2011, p.340-359., é “violenta e autoritária”. Ainda:

A ação policial pode ser, às vezes, considerada violenta, recebendo o nome de ‘chacina’ ou ‘massacre’ quando, de uma só vez e sem motivo, o número de assassinados é muito elevado. No restante das vezes, porém, o assassinato policial é considerado normal e natural, uma vez que se trata de proteger o ‘nós’ contra o ‘eles’ (CHAUI, 2011CHAUI, M. S. Ética, violência e política. In: CHAUI, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 13ª ed. São Paulo: Editora Cortez, 2011, p.340-359., p.348).

Os negros, subjugados necessários da violência policial, não são reconhecidos como alteridade em sua autonomia e arbítrio. Assim, o rap se inscreve na trama sociocultural como um articulador de um movimento de emancipação em torno de uma memória coletiva dominada. De acordo com Chaui (2011)CHAUI, M. S. Ética, violência e política. In: CHAUI, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 13ª ed. São Paulo: Editora Cortez, 2011, p.340-359., a violência se opõe à ética porque desnaturaliza seres racionais e sensíveis, dotados de linguagem e liberdade. Tratar um indivíduo como se fosse desprovido de razão, vontade, liberdade e responsabilidade, é tratá-lo como coisa, e não como um ser humano. Segundo a filósofa, conservando memórias da sua sociedade ocidental primitiva, a colonial escravista, as diferenças e as assimetrias presentes na nação brasileira são, sempre, transformadas em desigualdades que reforçam uma relação mando-obediência.

Em perspectiva similar, Nascimento (1978)NASCIMENTO, A. do. O embranquecimento da cultura: uma outra estratégia de genocídio. In: NASCIMENTO, A. do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978. alerta que a “democracia racial” corresponde a uma metáfora para designar o racismo brasileiro. Não se trata de um tipo de exclusão tão óbvio como o racismo dos Estados Unidos e nem legalizado como o apartheid da África do Sul, embora varie em mera questão de grau e na aparência do sintoma. De acordo com o ativista, a discriminação racial, no Brasil, compreende uma instituição nos níveis oficiais de governo, assim como aparece difusa no tecido social, psicológico, econômico, político e cultural:

Da classificação grosseira dos negros como selvagens e inferiores, ao enaltecimento das virtudes da mistura de sangue como tentativa de erradicação da ‘mancha negra’; da operatividade do ‘sincretismo’ religioso; [...] a história não oficial do Brasil registra o longo e antigo genocídio que se vem perpetrando contra o afro-brasileiro. [...] A palavra-senha desse imperialismo da brancura, e do capitalismo que lhe é inerente, responde a apelidos bastardos como assimilação, aculturação, miscigenação; mas sabemos que embaixo da superfície teórica permanece intocada a crença na inferioridade do africano e seus descendentes. Em adição aos órgãos do poder - o governo, as leis, o capital, as forças armadas, a polícia - as classes dominantes brancas têm à sua disposição poderosos implementos de controle social e cultural: o sistema educativo, as várias formas de comunicação de massas - a imprensa, o rádio, a televisão - a produção literária; todos esses instrumentos estão a serviço dos interesses das classes no poder e são usados para destruir o negro como pessoa, e como criador e condutor de uma cultura própria (NASCIMENTO, 1978NASCIMENTO, A. do. O embranquecimento da cultura: uma outra estratégia de genocídio. In: NASCIMENTO, A. do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978., p.93-94).

Nesse sentido, Nascimento (1978)NASCIMENTO, A. do. O embranquecimento da cultura: uma outra estratégia de genocídio. In: NASCIMENTO, A. do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978. chama a atenção para o fato de que o embranquecimento cultural corresponde à outra estratégia de genocídio contra o povo negro no Brasil, fazendo parte de um processo que é mascarado. Atentando para a necessidade dessa discussão no âmbito da produção de imaginários e da análise da cultura brasileira, “nenhuma retórica acadêmica pode apagar que o afro-brasileiro é liquidado nas malhas difusas, dissimuladas, sutis e paternalistas do genocídio mais cruel dos nossos tempos” (NASCIMENTO, 1978NASCIMENTO, A. do. O embranquecimento da cultura: uma outra estratégia de genocídio. In: NASCIMENTO, A. do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978., p.96). Baco Exu do Blues vivencia, escreve e canta a resistência a essa configuração violentadora.

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A encarnação de um signo heroico no ato de criação e o grito de resistência

Segundo Bakhtin/Volochínov (2006), um produto ideológico faz parte da realidade social, assim como um corpo físico. Trata-se, de certa forma, de um instrumento de produção ou produto de consumo, mas, ao contrário destes, o produto ideológico também reflete e refrata outra realidade, que lhe é exterior. Conforme os filósofos: “Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia” (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2006BAKHTIN, M. M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006., p.29; grifos dos autores). Cada signo ideológico não é apenas um reflexo, uma sombra da realidade, mas também um fragmento material dessa realidade, de modo que todo fenômeno que funciona como signo ideológico tem uma encarnação material, seja como som, massa física, cor, movimento do corpo etc. Cada signo se opõe a outro signo, e a própria consciência só pode surgir e se afirmar como realidade mediante a encarnação material em signos. Bakhtin/Volochínov (2006) definem que compreender um signo consiste em aproximar o signo apreendido de outros signos já conhecidos, ou seja, a compreensão consiste em uma resposta a um signo por meio de signos.

Para Bakhtin/Volochínov (2006), portanto, o verdadeiro lugar da criação ideológica é o material social particular de signos criados pela humanidade. A sua especificidade reside no fato de que o ideológico se encontra entre indivíduos organizados, sendo o meio da sua comunicação. Segundo os filósofos, os signos só podem aparecer em um terreno interindividual. É fundamental que os indivíduos estejam socialmente organizados, que formem um grupo, uma unidade social, para que o sistema de signos possa constituir-se. “A consciência só se torna consciência quando se impregna de conteúdo ideológico (semiótico) e, consequentemente, somente no processo de interação social” (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2006BAKHTIN, M. M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006., p.32). Os filósofos explicam que a realidade dos fenômenos ideológicos é a realidade objetiva dos signos sociais, e as leis dessa realidade são as leis da comunicação semiótica, diretamente determinadas pelo conjunto das leis sociais e econômicas.

Também segundo Bakhtin/Volochínov (2006), embora existam signos ideológicos que não sejam substituíveis por palavras, como, por exemplo, uma representação pictórica ou uma composição musical, cada um desses signos, ao mesmo tempo, se apoia nas palavras e é acompanhado por elas, como o canto e seu acompanhamento musical. Os filósofos definem que nenhum signo cultural permanece isolado quando compreendido e dotado de um sentido, pois se torna parte da unidade da consciência verbalmente constituída, ou seja, a consciência tem o poder de abordar cada signo verbalmente quando este é compreendido, independentemente da sua natureza. Ainda:

A palavra é o fenômeno ideológico por excelência. A realidade toda da palavra é absorvida por sua função de signo. A palavra não comporta nada que não esteja ligado a essa função, nada que não tenha sido gerado por ela. A palavra é o modo mais puro e sensível de relação social (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2006BAKHTIN, M. M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006., p.34; grifos dos autores).

Sobre a relação existente na valoração daquilo que é culturalmente aceito, porque é branco, e aquilo que é rejeitado por ser negro, na letra da canção Bluesman, homônima do segundo álbum de Baco Exu do Blues, destacam-se as seguintes palavras:

Oh, yeah/ Woo/ Everything, everything/ Everything’s gonna be alright this morning [...] Eu sou o primeiro ritmo a formar pretos ricos/ O primeiro ritmo que tornou pretos livres/ Anel no dedo em cada um dos cinco/ Vento na minha cara, eu me sinto vivo/ A partir de agora considero tudo blues/ O samba é blues, o rock é blues, o jazz é blues/ O funk é blues, o soul é blues, eu sou Exu do Blues/ Tudo que quando era preto era do demônio/ E depois virou branco e foi aceito, eu vou chamar de blues/ É isso, entenda/ Jesus é blues/ Falei mermo/ Eu amo o céu com a cor mais quente/ Eu tenho a cor do meu povo, a cor da minha gente/ Jovem Basquiat4 4 Jean-Michel Basquiat [1960-1988] foi um artista neo-expressionista e o primeiro grafiteiro nova-iorquino que ganhou popularidade. Suas pinturas influenciam artistas contemporâneos e costumam atingir preços altos em leilões de arte. , meu mundo é diferente/ Eu sou um dos poucos que não esconde o que sente/ Choro sempre que eu lembro da gente/ Lágrimas são só gotas, o corpo é enchente/ Exagerado, eu tenho pressa do urgente/ Eu não aceito sua prisão, minha loucura me entende/ Baby, nem todo poeta é sensível/ Eu sou o maior inimigo do impossível/ Minha paixão é cativeiro, eu me cativo/ O mundo é lento ou eu que sou hiperativo, oh? [...] Me escuta quem cê acha que é ladrão e prostituta/ Vai me dizer que isso não te lembra Cristo? [...] (BLUES, 2018bBLUES, B. E. do. Bluesman. Baco Exu do Blues [Intérprete] São Paulo: Selo EAEO Records, 2018b.).

Baco protesta contra o embranquecimento da cultura negra e a sua descaracterização em capital cultural “branco”. Reflete que a cultura produzida por indivíduos negros, dessa forma, é subjugada. Porém, por meio do orgulho das raízes, de fato é possível reaver o poder antropologicamente concebido a cada cultura. Embora embranquecidos, os signos citados pelo artista e os estereótipos de dominação podem adquirir uma nova retórica no limiar da ambiguidade de todo signo. Bakhtin/Volochínov (2006) expõem que em todo signo ideológico confrontam-se índices de valor contraditórios, de forma que o signo se torna a arena onde se desenvolve a luta de classes. Isso faz com que esse signo tenha como traço de maior importância a sua plurivalência social. De acordo com os filósofos, na verdade, o entrecruzamento dos índices de valor torna o signo vivo e móvel, sendo também a capacidade de garantir a sua evolução:

A classe dominante tende a conferir ao signo ideológico um caráter intangível e acima das diferenças de classe, a fim de abafar ou de ocultar a luta dos índices sociais de valor que aí se trava, a fim de tornar o signo monovalente. Na realidade, todo signo ideológico vivo tem, como Jano, duas faces. Toda crítica viva pode tornar-se elogio, toda verdade viva não pode deixar de parecer para alguns a maior das mentiras. Esta dialética interna do signo não se revela inteiramente a não ser nas épocas de crise social e de comoção revolucionária. Nas condições habituais da vida social, esta contradição oculta em todo signo ideológico não se mostra à descoberta porque, na ideologia dominante estabelecida, o signo ideológico é sempre um pouco reacionário e tenta, por assim dizer, estabilizar o estágio anterior da corrente dialética da evolução social e valorizar a verdade de ontem como sendo válida hoje em dia (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2006BAKHTIN, M. M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006., p.46, grifos dos autores).

Apesar da necropolítica que assombra afro-brasileiras e afro-brasileiros com a morte pela violência e uma vida de sofrimento psíquico, a angústia é superada pela imortalidade que a alteridade criada por Baco assume. O seu valor pode ser reconhecido como inferior, porém, em suas palavras, a simplicidade o fez maior. Sobre o seu empoderamento como um artista afro-brasileiro, Baco Exu do Blues expressa na canção Preto e prata:

Facção Carinhosa, ei, ei/ Nós vive pela prata tatata tatata/ Nós mata pela prata tatata tatata/ Protegemos a prata tatata tatata/ Nós negros somos prata tatata tatata [...] Eu tô cheio de ódio e você nem imagina [...] Eles querem que eu mate e morra pelo ouro/ Querem que eu mate e morra por mulheres brancas/ Querem que eu mate e morra pelo meu ego/ Mas, irmão, só mato e morro pela minha banca/ Eu não acredito no seu Deus branco/ Eu acredito em Exu do Blues, eu acredito em Baco/ Querer o ouro só me fez mais fraco/ O rap game é cocaína branca, vicia e nos mata/ Virei imortal ao aceitar, minha pele é prata/ Virei imortal ao aceitar, minha pele é prata (BLUES, 2018cBLUES, B. E. do. Preto e prata. Baco Exu do Blues [Intérprete] São Paulo: Selo EAEO Records, 2018c.).

Baco Exu do Blues evoca as tradições afro-brasileiras na composição rítmica e na menção à cumplicidade que existe entre os irmãos de cor na canção Minotauro5 5 Personagem da mitologia grega que possui uma cabeça de touro sobre o corpo de um homem. Habitava no centro de um labirinto e devorava seres humanos. de Borges. Expõe a perseguição policial sofrida por afrodescendentes e a sua trajetória como artista:

Negro correndo da polícia com tênis caro/ Tipo Usain Bolt6 6 Usain St. Leo Bolt é um ex-velocista jamaicano multicampeão olímpico e mundial. Trata-se do único atleta na história a tornar-se tricampeão em duas modalidades de pista em Jogos Olímpicos de forma consecutiva e bicampeão também de forma consecutiva na modalidade revezamento 4 x 100 metros. de Puma não paro/ Correndo mais que os carros/ Eu não fui feito do barro/ Pisando no céu enquanto eles se perguntam: Como esse negro não cai?/ Dizem que o céu é o limite/ Eles se perguntam: Porque esse negro não cai?/ Fiz roda punk com os anjos/ Pintei o Éden de preto/ Fui ghost rider7 7 Motoqueiro fantasma. de Beethoven/ Escrevi vários sonetos/ Cortei minhas asas/ Vejam minhas cicatrizes/ Eu vi Deus em depressão/ O ajudei com suas crises/ Depois que eu morri com um tiro na cabeça/ Sempre que um preto faz dinheiro grita: Baco vive, Baco vive [...]. (BLUES, 2018dBLUES, B. E. do. Minotauro de Borges. Baco Exu do Blues [Intérprete] São Paulo: Selo EAEO Records, 2018d.).

A canção Minotauro de Borges, composta com influência da musicalidade do Candomblé, narra um mito. Conforme Bastide (2001)BASTIDE, R. O candomblé da Bahia: rito nagô. Tradução Maria Isaura Pereira de Queiroz. São Paulo: Companhia das Letras, 2001., a música é de extrema importância durante as cerimônias de Candomblé. A dança e os cânticos são representações de fragmentos de mitos que contam sobre os Orixás, evocando certos episódios das histórias das divindades que são chamadas através de, no mínimo, três cânticos. A força da imitação dos gestos da coreografia confere o poder de encantamento da palavra proferida. Burke (2002)BURKE, P. História e teoria social. Tradução Klaus Brandini Gerhardt e Roneide Venâncio Majer. São Paulo: Editora UNESP, 2002. descreve o mito como uma história com função social, detentora de uma moral estereotipada, a partir do emprego desse termo por psicólogos, antropólogos e teóricos literários. Segundo Burke, é esclarecedor definir um mito em termos não só de funções, mas também de formas ou “enredos” recorrentes, como está inscrito no significado do termo grego mythos. As narrativas orais e escritas, inclusive aquelas que os narradores consideram pura verdade, encerram elementos arquetípicos, estereotípicos ou míticos.

O perigo de morte eminente consiste num desafio colocado à prova constantemente nos enredos de um negro que vivencia as dores de um povo. Nas composições citadas, por exemplo, a fidelidade e a comunhão com a consciência negra possuem o caráter de conduzir à redenção. Segundo Burke (2002)BURKE, P. História e teoria social. Tradução Klaus Brandini Gerhardt e Roneide Venâncio Majer. São Paulo: Editora UNESP, 2002., um mito, em qualquer matiz de significado será sempre um produto da cultura, um sistema conflitivo de significados compartilhados, que corresponde a uma produção da vida intelectual, da cognição humana. Essa é uma evidência nas articulações de resistência popular a um dado sistema vigente, mediante a criatividade, uma estrutura de categoria mental. De acordo o historiador, a cultura corresponde a um objeto a ser “construído” ou “constituído” como um fato social, logo dinâmica. A relação entre a cultura e a sociedade deve ser considerada em termos dialéticos, ao mesmo tempo, ativa e passiva, determinante e determinada. Conforme Burke, a “tradição”, ou a “reprodução cultural”, está relacionada aos processos de transmissão da cultura, resultado do empenho de agentes envolvidos em processos de socialização.

Em entrevista ao ator, apresentador, cineasta e escritor Lázaro Ramos, Baco Exu do Blues (2019b)BLUES, B. E. do. [Entrevista concedida a] Lázaro Ramos. Espelho, 26 mar. 2019b. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ghzaX-NteLI&feature=youtu.be&fbclid=IwAR2qZUtXrde2szOqrXuFyLqnAX65lUlN7SpzD17q_KnEmalIcj_GX9kJOXcA.Acesso em: 25 abr. 2019.
https://www.youtube.com/watch?v=ghzaX-Nt...
afirma que a sua existência é a luta negra, e que sofreu racismo por parte de sua família materna, que é branca. Utiliza a sua agressividade para declarar guerra contra os estereótipos que disseminam ideias racistas. Baco relembra que sua mãe, uma professora de Literatura, o enriqueceu culturalmente, assim como o seu pai, o primeiro professor de Tai Chi Chuan da Bahia, um autodidata que faleceu precocemente. Baco Exu do Blues (2019b)BLUES, B. E. do. [Entrevista concedida a] Lázaro Ramos. Espelho, 26 mar. 2019b. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ghzaX-NteLI&feature=youtu.be&fbclid=IwAR2qZUtXrde2szOqrXuFyLqnAX65lUlN7SpzD17q_KnEmalIcj_GX9kJOXcA.Acesso em: 25 abr. 2019.
https://www.youtube.com/watch?v=ghzaX-Nt...
confessa sofrer de depressão e fala da dificuldade que sentiu em lidar com a situação por medo, sendo a canção En tu mira, do álbum Esú, uma de suas composições que refletem a sua tentativa de superação. Suas canções, segundo o artista, trazem como um de seus temas a falta de condições saudáveis de sobrevivência, inclusive psicológica, as quais os afrodescendentes vivenciam desde a infância, desenvolvendo uma tendência a sofrerem de uma depressão independentemente de classe social ou de qualidades individuais.

A vontade de tirar a própria vida, por conta de uma depressão, está presente como forma de desabafo em algumas composições, apesar do autoconhecimento do artista das suas capacidades intelectuais e do seu lastro de signo ideológico de resistência. Tal sofrimento psíquico decorre da necropolítica, como já foi elencado. Na canção Minotauro de Borges esse contexto é descrito em tom de desespero, evocando a política da realização, ao evidenciar-se como um artista vencedor no mercado fonográfico, e a política da transfiguração por utilizar-se de arquétipos reconhecidos pelos irmãos pretos. Ainda:

Museus estão a procura de mármore negro/ Pra fazer uma estátua minha [...] 150 por hora, nome gravado na história/ Imortal na sua memória/ Rei da poesia de escória/ [...] Como Britney8 8 Britney Spears [1981- ]é cantora, compositora, dançarina e atriz norte-americana que teve um surto em 2007, causado pela perseguição dos paparazzi. Ela raspou a cabeça na rua e tentou agredir um paparazzo com um guarda-chuva. em 2007/ Meio incompreendido/ Me matei em gravação/ Posso fazer isso ao vivo/ Bebo da depressão/ Até que isso me transborde/ Vencer me fez vilão/ Eu sou Minotauro de Borges/ [...] Vivo a depressão/ Bebo, sim, sempre, todo dia/ Tô me acabando por inteiro/ Você me mata ou eu me mato primeiro (BLUES, 2018dBLUES, B. E. do. Minotauro de Borges. Baco Exu do Blues [Intérprete] São Paulo: Selo EAEO Records, 2018d.).

Bakhtin/Volochínov (2006) explicam que em toda enunciação, ainda que insignificante, renova-se a síntese dialética viva entre o psíquico e o ideológico, entre a vida interior e a vida exterior. Em todo ato de fala, a atividade mental subjetiva se dissolve no fato objetivo da enunciação realizada, enquanto que a palavra enunciada se subjetiva no ato de descodificação que deve provocar uma codificação em forma de réplica. Conforme os filósofos, o psiquismo e a ideologia se impregnam mutuamente no processo único e objetivo das relações sociais, à medida que a palavra, expressão sígnica exterior e interior, revela-se como o produto da interação viva das forças sociais. Em outros termos, e enfatizando o fator cognitivo do fenômeno linguístico, “a palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial”, no sentido que a língua, no seu uso prático, é inseparável de seu conteúdo ideológico ou relativo à vida (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2006BAKHTIN, M. M. (VOLOCHÍNOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006., p.96; grifos dos autores).

Em um de seus manuscritos, catalogado como um sumário para uma filosofia do ato, Bakhtin (2010)BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010. pretendeu estabelecer uma análise acerca de uma possível, e ideal, mediação entre o ato vivido e a sua representação estética. O filósofo postulou que a responsabilidade especial, por conter o significado de um dado ato moral, o qual apenas representa, constitui-se como um fenômeno cultural. O ideal se realiza quando a cultura é articulada como uma intersecção, e prolongamento necessário, da responsabilidade moral. Esta última, para a Filosofia, é um objeto-conceito que representa o centro que irradia o real e absoluto devir do Ser. O filósofo compreende que um ato deve adquirir um plano unitário singular para se tornar capaz de refletir-se em ambas as direções. Assim, no seu sentido ou significado e em seu ser, o ato vivido deve adquirir a unidade de dupla responsabilidade: tanto pelo seu conteúdo, ou responsabilidade especial, como pelo seu Ser, dotado de responsabilidade moral. Conforme Bakhtin (2010)BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010., o produto da atividade estética não corresponde, em relação ao seu significado, ao Ser real em processo de devir. Esse produto cultural corresponde ao ser que entra em comunhão com o Ser através de um ato histórico de uma ativa percepção estética, pois está em comunhão com a unidade única do Ser em processo, cujo devir é a prática absoluta da ética, que o filósofo define como responsabilidade ativa. Aí está localizada o obra de Baco Exu do Blues, na perspectiva aqui adotada.

Em reforço, Chaui (2011)CHAUI, M. S. Ética, violência e política. In: CHAUI, M. S. Cultura e democracia: o discurso competente e outras falas. 13ª ed. São Paulo: Editora Cortez, 2011, p.340-359. define a ética como o conjunto de atos racionais e conscientes, praticados por um agente que pode decidir livremente por suas escolhas, e que está apto a ter responsabilidade por suas ações. As ações éticas variam de acordo com o seu contexto sócio-histórico, balizadas através de ideias que definem virtudes, por exemplo. Todo esse complexo pressupõe a autonomia do indivíduo, no sentido de que este será capaz de normatizar seus próprios atos, não estando obrigado a obedecer a ordens ou a pressões. Segundo a filósofa, o conflito entre as vontades do indivíduo e as normas sociais pode ser resolvido se este, enquanto agente ético, reconhecer os valores morais da sociedade em que vive como os seus.

De acordo com Bakhtin (2010)BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010., o ato vivo, sob o aspecto de seu desempenho, de algum modo, possui o ser da vida unitário e único, e se orienta dentro desse ser. O ato realizado contempla um contexto único, ao qual ele se refere tanto no seu próprio sentido quanto na sua própria fatualidade. A responsabilidade do ato poderá ser reconhecida a partir da consideração de sua validade de sentido, e de sua realização em toda a sua concreta historicidade e individualidade. Como o filósofo expõe, a partir do interior de seu sentido e de sua fatualidade, o ato desempenhado tenta atualizar responsavelmente a verdade individual única, tanto do fato como do sentido de sua unidade concreta. Assim, o ato realizado se torna um ato responsável. Segundo Bakhtin (2010)BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010., a expressão imanente de um ato realizado e a expressão do Ser em devir único e unitário, no qual esse ato é realizado, requerem a plenitude da palavra em sua forma integral: a palavra como conceito em seu aspecto de conteúdo. A palavra torna-se imagem em seu aspecto palpável-expressivo, e a entonação da palavra o seu aspecto emotivo-volitivo.

Destacando a importância da entonação da palavra para os atos desempenhados, como uma função que abrange o seu real valor afirmado, Bakhtin (2010)BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello & Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010. argumenta que toda experiência é dotada de um tom emotivo-volitivo, um momento inalienável do ato realmente executado; ainda que no pensamento mais abstrato, na medida em que este seja realmente atualizado no processo do devir. Conforme o filósofo, as raízes da responsabilidade ativa encontram-se na entonação da palavra - o lastro de fidelidade de uma consciência real. A unidade do mundo na visão estética, em sua concretude, está impregnada do tom emotivo-volitivo, estando mais próximo do mundo unitário e único do ato vivo do que qualquer outro âmbito cultural, analisado isoladamente.

Nesse contexto, Baco Exu do Blues desabafa sobre ser um afrodescendente e os resquícios de uma cultura colonial presente na mentalidade de brancos e negros, na canção Kanye West da Bahia:

Eu não abaixo a cabeça, não vou te obedecer/ Ser preto de estimação não, eu prefiro morrer/ Sinhozinho eu troco soco nunca fui de correr/ Feche os olhos eu vi Deus nascer/ Eu me vi nascer, eu te vi nascer/ Tão livre que nem a polícia pode me prender/ Suas palavras não vão me ofender/ Apaga a luz tente me entender/ Sinta a África pra me entender/ Transe ao máximo pra me entender/ Não tema a morte pra me entender/ Enquanto cê tiver limite, não vai me entender/ Todo líder negro é morto, cê consegue entender?/ Tenho recebido cartas falando/ O próximo é você [...] Ser preto não é só ter pele/ Coisa que joalheiro entende/ A minha cultura é minha febre/ Eu sou a explicação pra quem não sente [...] Porque esses brancos amam chamar a polícia/ Porque esses negros me olham com tanta malícia/ Porque aprendemos a odiar os semelhantes/ Sua inveja não me deixa ser o mesmo de antes/ Se o sucesso te irrita, sou um cara irritante/ Não me chame de preto bonito/ Preto inteligente/ Preto educado/ Só de pessoa importante/ Seu rótulo não toca na minha poesia [...] (BLUES, 2018aBLUES, B. E. do. Kanye West da Bahia. Baco Exu do Blues [Intérprete] (part. DKVPZ e Bibi Caetano) São Paulo: Selo EAEO Records, 2018a.).

Baco, desse modo, traz a representação de um herói afro-brasileiro em suas composições, com poderes de superar os estigmas, estereótipos e infortúnios enfrentados pela sua gente. No texto intitulado “O autor e o herói”, Bakhtin (1997)BAKHTIN, M. M. O autor e o herói. In: BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão G. Pereira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.23-221.9 9 A escolha dessa edição se deve à adequação das suas terminologias aos propósitos do estudo, inclusive em relação à versão em inglês, em comparação com outra edição mais recente à qual tivemos acesso. descreve a situação da relação constituída entre o autor e o herói que se torna, em parte, a relação do herói consigo mesmo. Assim, o herói empreende determinar a si, quando a autoprojeção do autor se entranhou na alma do herói e nas suas palavras, tratando-se do herói autobiográfico. O filósofo explica que, com a assimilação da autoprojeção do autor, assegurando o acabamento desse herói, há a incorporação do autor à sua própria vivência criativa e uma superação. Na reação global que lhe assegura uma forma, o herói é refratário a qualquer acabamento interno. Nesse sentido, o herói criado existe como que infinito para o autor, ou seja, ele sempre renasce e sempre exige novas formas de acabamento que ele próprio destrói com a sua autoconsciência. Corresponde ao herói do romantismo, onde o autor romântico teme trair-se através de seu herói e deixa-lhe uma espécie de respiradouro, por onde o herói poderá escapar para transcender o seu próprio acabamento.

Conforme Bakhtin (1997)BAKHTIN, M. M. O autor e o herói. In: BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão G. Pereira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.23-221., o autor reflete a posição emotivo-volitiva de seu herói e não a sua própria atitude para com o herói; esta última o autor terá concretizado em um objeto que não pode ser analisado como uma vivência reflexiva. Para o filósofo, em resumo, envolvendo aspectos diferentes do que ocorre numa simples projeção psicanalítica, a reação ativa do autor no ato de criação condiciona e se manifesta na estrutura de uma visão ativa do herói percebido como um todo, seja na estrutura da sua imagem, no ritmo da sua revelação, na estrutura da entonação, ou na escolha das unidades significantes da obra de arte.

Conforme Deleuze (1999)DELEUZE, G. O ato de criação: palestra de 1987. Tradução de José Marcos Macedo. Edição brasileira: Folha de São Paulo, 1999., o ato de criação, em qualquer área técnica, é executado por uma necessidade, lapidado através do desenvolvimento das tecnologias que lhe cabem. O lampejo de uma ideia presume a erudição. Segundo o filósofo, a criação estética não deve ser compreendida como um ato de comunicar uma informação, pois a informação refere-se ao sistema controlado das palavras de ordem que têm curso numa dada sociedade. O Estado, por exemplo, é aquele que informa através da regulamentação de condutas civis a serem controladas, policiadas. Há tipos de discurso que podem ser compreendidos como uma contrainformação, contradizendo as informações oficiais do Estado. Todavia, de acordo com Deleuze, a obra de arte não se realiza em nenhuma dessas naturezas, uma vez que a obra de arte é um ato de resistência:

A obra de arte não tem nada a ver com a comunicação. A obra de arte não contém, estritamente, a mínima informação. Em compensação, existe uma afinidade fundamental entre a obra de arte e o ato de resistência. Isto sim. Ela tem algo a ver com a informação e a comunicação a título de ato de resistência. [...] Esse ato de resistência na música culmina num grito. [...] O ato de resistência possui duas faces. Ele é humano e é também um ato de arte. Somente o ato de resistência resiste à morte, seja sob a forma de uma obra de arte, seja sob a forma de uma luta entre os homens (DELEUZE, 1999, p.13-14).

Como um grito de resistência ao estereótipo imposto pela sociedade dominante, Baco Exu do Blues compôs os seguintes versos:

Eles querem um preto com arma pra cima/ Num clipe na favela gritando: cocaína/ Querem que nossa pele seja a pele do crime/ Que Pantera Negra só seja um filme/ Eu sou a p*** do Mississipi em chamas/ Eles têm medo pra c*** de um próximo Obama/ Racista filha da p***, aqui ninguém te ama/ Jerusalém que se f***, eu tô à procura de Wakanda10 10 Lar do super-herói Pantera Negra, Wakanda é um país fictício localizado na África subsaariana, presente nas histórias em quadrinhos publicadas pela Marvel Comics e em outras mídias que nelas são baseadas. , ah [...] (BLUES, 2018aBLUES, B. E. do. Kanye West da Bahia. Baco Exu do Blues [Intérprete] (part. DKVPZ e Bibi Caetano) São Paulo: Selo EAEO Records, 2018a.).

Na canção BB King11 11 Riley Ben King [1925-2015] foi um guitarrista de blues, compositor e cantor afro-americano. , Baco Exu do Blues descreve o que é ser um Bluesman:

1903/ A primeira vez um homem branco observou um homem negro/ Não como um animal agressivo, ou força braçal desprovida de inteligência/ Desta vez, percebe-se o talento, a criatividade, a música!/ O mundo branco nunca havia sentido algo como o blues/ Um negro, um violão e um canivete/ Nasce na luta pela vida, nasce forte, nasce pungente/ Pela real necessidade de existir/ O que é ser um Bluesman?/ É ser o inverso do que os outros pensam/ É ser contracorrente/ Ser a própria força, a sua própria raiz/ É saber que nunca fomos uma reprodução automática/ Da imagem submissa que foi criada por eles/ F*** a imagem que vocês criaram/ Não sou legível, não sou entendível/ Sou meu próprio Deus, meu próprio santo, meu próprio poeta/ Me olhe como uma tela preta, de um único pintor/ Só eu posso fazer minha arte/ Só eu posso me descrever/ Vocês não têm esse direito/ Não sou obrigado a ser o que vocês esperam/ Somos muito mais/ Se você não se enquadra ao que esperam/ Você é um Bluesman (BLUES, 2018eBLUES, B. E. do. BB King. Baco Exu do Blues [Intérprete] (part. DKVPZ e Bibi Caetano) São Paulo: Selo EAEO Records, 2018e.).

Baco Exu do Blues aproveita o seu alcance midiático para suscitar reflexões que devem ser estendidas como atos da vida pública de cada pessoa. O seu discurso demonstra intimidade com a situação dos seus ouvintes que também são afro-brasileiros. O herói criado está ao alcance de todos, basta pensar e agir politicamente, tomando para si uma responsabilidade de se reconhecer como um ente capaz. Trata-se de um chamado para uma revolução negra através da música. Nesse sentido, Hall (2003)HALL, S. Que “negro” é esse na cultura negra? In: HALL, S. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Tradução Adelaide La Guardia Resende et al. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003, p.317-330. defende que a cultura popular negra, na chamada “pós-modernidade global”, age como uma voz vinda das margens com um poder transformador. Utiliza o seu discurso de etnicidade diaspórica como o resultado das políticas culturais da diferença. Nesse movimento, há um deslocamento nas disposições de poder, embora essa cultura periférica continue sendo policiada e regulada, pois a cultura hegemônica resiste agressivamente. Trata-se de um espaço em que o controle sobre narrativas e representações passa para as mãos das burocracias culturais estabelecidas, às vezes, até sem resistência, enraizadas na experiência popular e, ao mesmo tempo, disponível para expropriação.

Apesar de contar com alguns artistas brancos, o rap não foi embranquecido ou passou a defender um ideal burguês. Continua a ser produzido por pessoas pretas que querem modificar a realidade de opressão, defendendo que ser um afrodescendente não pode ser uma sentença de morte. Conforme Hall (2003)HALL, S. Que “negro” é esse na cultura negra? In: HALL, S. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Tradução Adelaide La Guardia Resende et al. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003, p.317-330., por definição, a cultura popular negra é um espaço contraditório e um local de contestação estratégica, mas não pode ser explicada nos termos das simples oposições binárias. De acordo com o crítico:

Em sua expressividade, sua musicalidade, sua oralidade e na sua rica, profunda e variada atenção à fala; em suas inflexões vernaculares e locais; em sua rica produção de contranarrativas; e, sobretudo, em seu uso metafórico do vocabulário musical, a cultura popular negra tem permitido trazer à tona, até nas modalidades mistas e contraditórias da cultura popular mainstream, elementos de um discurso que é diferente - outras formas de vida, outras tradições de representação (HALL, 2003, p.324).

Portanto, Hall (2003)HALL, S. Que “negro” é esse na cultura negra? In: HALL, S. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Tradução Adelaide La Guardia Resende et al. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003, p.317-330. expõe que o povo da diáspora negra tem encontrado a estrutura profunda de sua vida cultural na música, utilizando o corpo como o seu único capital cultural. A cultura diaspórica é o resultado da transmissão de heranças e hibridizações, fruto da negociação entre posições dominantes e subalternas - um ato de significação. Essa manifestação não deve ser ouvida como uma simples recuperação de um diálogo perdido que carrega indicação para novas produções musicais. Não basta, em termos de ação, o significante negro como fator identitário, pois, nesse jogo de forças, o que interfere na cultura são as políticas empreendidas. Segundo o crítico, a cultura popular negra pode ser definida como:

[...] adaptações conformadas aos espaços mistos, contraditórios e híbridos da cultura popular. Elas não são a recuperação de algo puro pelo qual, finalmente, podemos nos orientar. Somos obrigados a reconhecer que elas são o que o moderno é, naquilo que Kobena Mercer chama de uma estética diaspórica. [...] A ‘boa’ cultura popular passa no teste de autenticidade, que é referência à experiência negra e à expressividade negra. Estas servem como garantias na determinação de qual cultura popular negra é a certa, qual é a nossa e qual não é (HALL, 2003, p.325).

Finalmente, Gilroy (2001)GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Tradução de Cid Knipel. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-asiáticos, 2001. salienta que as negações, não apenas da integridade cultural negra, mas também da capacidade dos negros de sustentarem e reproduzirem qualquer cultura digna produzem efeitos importantes. O lugar referenciado para a expressão cultural negra na hierarquia da criatividade gerada pelo dualismo metafísico que identifica os negros com o corpo, e os brancos com a mente, é um fator importante. O historiador considera residir a necessidade de se projetar uma cultura racial coerente e estável como meio de estabelecer a legitimidade das políticas diaspóricas e as noções de particularidade étnica recorrentes.

A realidade cruel perpetrada contra afro-brasileiras e afro-brasileiros é engendrada como um produto do racismo. Pensar a dinâmica dialética que ocorre no campo da linguagem, principalmente a que ocorre a partir de produtos culturais que se inserem no cenário político como resistência à materialidade das condições opressoras das relações étnico-raciais, é possibilitar a reflexão sobre a realidade de exclusão. O racismo e os sintagmas que disseminam injúrias contra o povo preto circulam na produção simbólica reforçando estereótipos que inferiorizam indivíduos dotados de plena capacidade de autonomia, responsabilidade e liberdade, porém sem oportunidades concretas fora da atuação de movimentos de resistência político-cultural. A depressão de Baco Exu do Blues é uma realidade que atinge milhões de jovens, provocando suicídios ou uma vida vegetativa. Segundo um levantamento realizado pelo Ministério da Saúde (2018)MINISTÉRIO DA SAÚDE. Óbitos por suicídio entre adolescentes e jovens negros 2012 a 2016. Brasília: Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão Participativa e ao Controle Social, Universidade de Brasília, Observatório de Saúde de Populações em Vulnerabilidade, 2018. sobre os óbitos por suicídio entre adolescentes e jovens negros brasileiros, entre 2012 e 2016, os jovens negros estão entre os mais vulneráveis ao suicídio, devido ao preconceito e à discriminação racial, muitas vezes imputando-se a culpa pelo próprio sofrimento. A taxa de óbitos em 2016 chegou a 5,88 por 100 mil indivíduos, aumentando em 12% em relação a 2012, sendo que a cada 10 suicídios entre adolescentes e jovens, aproximadamente seis eram negros. O estudo alerta que, uma violação de direitos e crime inafiançável, o racismo institucionalizado gera efeitos que incidem diretamente no comportamento de afrodescendentes, normalmente associados à humilhação racial e à negação de si, que podem levar ao suicídio. O acesso e permanência na educação são apontados como determinantes sociais que influenciam adolescentes e jovens negras e negros sobre as suas perspectivas em relação à vida, de modo que são fatores de proteção contra o óbito por suicídio.

Considerações finais

Disseminando uma ideologia e demarcando um lugar de fala, Baco Exu do Blues é voz para a busca pela justiça social e empoderamento de afrodescendentes, rumo a sua liberdade efetiva, além de discutir e provocar o conhecimento das mazelas que os afligem. As composições analisadas demonstram que, em seu segundo álbum, embora tão jovem, o rapper-bluesman ostenta as barbas que carregam consigo a incumbência de preservar a resistência de uma ancestralidade. O tom emotivo-volitivo diz respeito à vida e aos anseios de um ator político que mantém um ato responsivo com as/os racistas, e assume para si a responsabilidade de gritar contra o sistema dominante.

Baco Exu do Blues é um mito, frente ao genocídio de jovens negros nas periferias de todo Brasil. Não é diferente na cidade de Salvador, onde o artista reside e a população clama por justiça quanto às chacinas e abusos provocados pelo próprio Estado, por meio da polícia, principalmente, e das demais instituições públicas, de modo estrutural, em sua atuação e/ou omissão. A instituição de políticas públicas e a mobilização da sociedade em torno desses aspectos, assim como a atenção ao adoecimento psíquico que leva ao suicídio de cidadãs e cidadãos vulneráveis é emergencial. Construir narrativas de empoderamento, assim como denunciar o sistema que opera desfavorecendo e aniquilando vidas que importam, constitui o primeiro passo para a construção de uma sociedade democrática nos termos de uma ética antirracista.

Declaração de autoria e responsabilidade pelo conteúdo publicado

Declaramos, para os devidos fins, que a autora Camilla Ramos dos Santos teve acesso ao corpus de pesquisa e participou ativamente da discussão dos resultados. A autora Marlúcia Mendes da Rocha e o autor Isaias Francisco de Carvalho participaram ativamente da discussão dos resultados, revisaram e aprovaram a versão final do artigo.

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  • 1
    Estudo realizado no escopo do projeto de pesquisa “O oceano de fronteiras invisíveis: literaturas em línguas inglesa e portuguesa e fluxos epistemológicos sul-sul”, com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia – FAPESB; e parte de capítulo de tese em andamento, com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes.
  • 2
    Kanye Omari West [1977-], também conhecido por Ye ou Yeezy, é um rapper, produtor musical e estilista americano.
  • 3
    Postali (2010)POSTALI, T. Práticas culturais urbanas: estudo sobre o blues e o hip hop como comunicações específicas de grupo, 2010, 139f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) - Universidade de Sorocaba, Sorocaba, 2010. Disponível em: http://comunicacaoecultura.uniso.br/producao-discente/2010/pdf/Thifani_Postali.pdf.Acesso em: 06 abr. 2019.
    http://comunicacaoecultura.uniso.br/prod...
    enumera que os principais elementos que compõem o hip hop são: o DJ, o grafite, o rap e o break. A dança não se restringe ao break, incluindo também outras modalidades. O elemento que sustenta todos é o conhecimento. Conforme a estudiosa, assim, o hip hop vale-se de diversos elementos que se combinam a fim de disseminar ideias.
  • 4
    Jean-Michel Basquiat [1960-1988] foi um artista neo-expressionista e o primeiro grafiteiro nova-iorquino que ganhou popularidade. Suas pinturas influenciam artistas contemporâneos e costumam atingir preços altos em leilões de arte.
  • 5
    Personagem da mitologia grega que possui uma cabeça de touro sobre o corpo de um homem. Habitava no centro de um labirinto e devorava seres humanos.
  • 6
    Usain St. Leo Bolt é um ex-velocista jamaicano multicampeão olímpico e mundial. Trata-se do único atleta na história a tornar-se tricampeão em duas modalidades de pista em Jogos Olímpicos de forma consecutiva e bicampeão também de forma consecutiva na modalidade revezamento 4 x 100 metros.
  • 7
    Motoqueiro fantasma.
  • 8
    Britney Spears [1981- ]é cantora, compositora, dançarina e atriz norte-americana que teve um surto em 2007, causado pela perseguição dos paparazzi. Ela raspou a cabeça na rua e tentou agredir um paparazzo com um guarda-chuva.
  • 9
    A escolha dessa edição se deve à adequação das suas terminologias aos propósitos do estudo, inclusive em relação à versão em inglês, em comparação com outra edição mais recente à qual tivemos acesso.
  • 10
    Lar do super-herói Pantera Negra, Wakanda é um país fictício localizado na África subsaariana, presente nas histórias em quadrinhos publicadas pela Marvel Comics e em outras mídias que nelas são baseadas.
  • 11
    Riley Ben King [1925-2015] foi um guitarrista de blues, compositor e cantor afro-americano.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Set 2021
  • Data do Fascículo
    July/Sept. 2021

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2020
  • Aceito
    31 Maio 2021
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