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Dissecção da parede interna de tubo endotraqueal aramado que causa obstrução das vias aéreas no intraoperatório sob anestesia geral: relato de caso

Resumos

A intubação endotraqueal é feita para estabelecer uma via aérea segura; contudo, pode trazer riscos. A obstrução de um tubo endotraqueal (TET) é um evento potencialmente fatal. Relatamos dois casos de obstrução de TET reesterilizado, de uso único, aramado por causa da dissecção da parede interna. Como conclusão, sugerimos não reesterilizar tubos individuais em tais casos, para evitar uma complicação como dissecção da parede interna do tubo, pois essa foi a causa principal.

ANESTESIA, Geral; COMPLICAÇÕES, Falha; EQUIPAMENTOS, Tubo traqueal; Reutilização de Equipamento


La intubación endotraqueal se hace para establecer una vía aérea segura; sin embargo, puede traer riesgos. La obstrucción de un tubo endotraqueal (TET) es un evento potencialmente fatal. Relatamos aquí dos casos de obstrucción de TET re-esterilizado de uso único, en formato de espiral y reforzado a causa de la disección de la pared interna. Como conclusiones, sugerimos no re-esterilizar los tubos individuales en esos casos, para evitar una complicación como la disección de la pared interna del tubo, porque esa fue la causa principal.

ANESTESIA, General; COMPLICACIONES, Fallo; EQUIPOS, Tubo endotraqueal; Reutilización de Equipo


Endotracheal intubation is performed to establish a secure airway. However, this carries its risks and obstruction of an endotracheal tube (ETT) is a potentially life-threatening event. We report two cases with an obstruction of the resterilized, single use, spiral, reinforced endotracheal tubes by dissection of the internal wall. As a conclusion, we suggest not reusing and resterilizing single tubes in these cases to avoid a complication like dissection of the internal wall of the tube, as this has been the main cause.

Endotracheal tube; Inner wall dissection; Case report; General anesthesia


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ARTIGO DIVERSO

Dissecção da parede interna de tubo endotraqueal aramado que causa obstrução das vias aéreas no intraoperatório sob anestesia geral. Relato de caso

Esra MercanogluI; Derya TopuzII; Nur KayaIII

IMD; DESA; Departamento de Anestesiologia e Reanimação, Zonguldak Ataturk Government Hospital, Zonguldak, Turquia

IIMD; Departamento de Anestesiologia, Zonguldak Gynecology and Pediatric Government Hospital, Zonguldak, Turquia

IIIMD; Professor Associado, Departamento de Anestesiologia e Reanimação, Uludag University Medical Faculty, Bursa, Turquia

Correspondência para Correspondência para: Esra Mercanoglu Department of Anesthesiology. Institution Zonguldak Ataturk Government Hospital. U.U.T.F Anesteziyoloji ve Reanimasyon A.D. Nilüfer Bursa E-mail: esramercan76@yahoo.com

RESUMO

A intubação endotraqueal é feita para estabelecer uma via aérea segura; contudo, pode trazer riscos. A obstrução de um tubo endotraqueal (TET) é um evento potencialmente fatal. Relatamos dois casos de obstrução de TET reesterilizado, de uso único, aramado por causa da dissecção da parede interna. Como conclusão, sugerimos não reesterilizar tubos individuais em tais casos, para evitar uma complicação como dissecção da parede interna do tubo, pois essa foi a causa principal.

Unitermos: ANESTESIA, Geral; COMPLICAÇÕES, Falha; EQUIPAMENTOS, Tubo traqueal; Reutilização de Equipamento.

Introdução

A intubação endotraqueal é feita para estabelecer uma via aérea segura; contudo, isso pode trazer riscos e a obstrução de um tubo endotraqueal (TET) é um evento potencialmente fatal 1.

A obstrução de um TET causada por muco, sangue ou torção não é incomum, mas aquela causada por corpo estranho ou pelo TET, como a dissecção da parede interna, herniação do manguito ou desprendimento, é um evento raro 1.

Várias causas, como doenças respiratórias ou posicionamento dos pacientes durante as operações e alguns problemas com aparelhos de anestesia ou equipamentos estão associadas à insuficiência respiratória intraoperatória, mas uma obstrução aguda do tubo endotraqueal é difícil de discernir rapidamente entre outras causas. A obstrução do tubo endotraqueal pode ser causada não apenas por corpo estranho, mas também por falha do equipamento.

Relatamos dois casos de obstrução de TET reesterilizado, de uso único, aramado por causa da dissecção da parede interna.

Relato de casos

Primeiro caso: Paciente do sexo masculino, 52 anos, estado físico ASA I, 81 kg, 182 cm de altura, agendado para tireoidectomia eletiva sob anestesia geral, após a assinatura de consentimento informado. Sua história pregressa e seu exame físico eram normais. Depois de ser pré-medicado com atropina (0,5 mg) e diazepam (10 mg) por via intramuscular, o paciente foi anestesiado com tiopental (5 mg.kg-1), fentanil (2 mcg.kg-1) e brometo de rocurônio (0,6 mg.kg-1). A intubação foi feita sem dificuldades com o uso de tubo endotraqueal reesterelizado, aramado e com diâmetro interno de 8 mm (Telefiex Medikal GmbH, Willy Rusch Kermen, Alemanha). A operação foi iniciada depois que a equipe posicionou adequadamente o paciente com extensão da cabeça. A manutenção da anestesia foi feita com concentração alveolar mínima (CAM) de sevofiurano e uma mistura de O2 e N2O (1:1). Todos os parâmetros estavam estáveis, com ETCO2 de 40 mm Hg, pico de pressão das vias aéreas de 30 cm H2O, SpO2 de 99% e outros parâmetros hemodinâmicos, até ocorrer um súbito aumento do pico de pressão das vias aéreas para 42 cm H2O aos 130 minutos de operação. No entanto, ETCO2 e SpO2 não sofreram alteração no início. Salbutamol para broncoconstrição e lidocaína (1,5 mg.kg-1) para laringoespasmo foram administrados, mas nada mudou. Confirmamos o posicionamento correto do tubo por ausculta torácica bilateral. O pico de pressão das vias aéreas aumentava muito rapidamente e atingiu 50 cm H2O. Era muito difícil ventilar o paciente. Durante esse tempo, houve uma diminuição muito rápida de SpO2 e ETCO2, que chegaram a 64% e 20 mm Hg, respectivamente. A curva de capnografia ficou menor, em consequência da diminuição de ETCO2, mas sem alterar a forma original. Interrompemos o fornecimento de N2O nesse ponto e FiO2 voltou a 100%. Inserimos um cateter de sucção para o caso de obstrução, mas ele ficou preso e não progrediu. Logo que trocamos o tubo por outro, todos os parâmetros voltaram rapidamente para os valores basais. Após a cirurgia, administramos 125 mg de metilprednisolona para evitar edema. Nenhuma outra complicação foi observada até o fim da operação e o paciente pode ser extubado.

Segundo caso: Paciente do sexo feminino, 25 anos, estado físico ASA I, agendada para colecistectomia laparoscópica eletiva, após a assinatura de consentimento informado. A paciente foi medicada e a anestesia geral induzida com fármacos iguais ao do primeiro caso. Fizemos a intubação com tubo endotraqueal reesterelizado e diâmetro interno de 7,5 mm - mesmo TET do primeiro caso. Usamos CAM de sevofiurano (1,0) para manutenção da anestesia geral, mas dessa vez usamos ar comprimido em vez de N2O. Todos os parâmetros se mantiveram estáveis até a paciente apresentar dificuldade para ser ventilada mecanica e também manualmente aos 45 minutos. Ao mesmo tempo, o pico de pressão das vias respiratórias aumentou de 20 cm H2O para 45 cm H2O. Dessa vez, SpO2 e ETCO2 mantiveram-se estáveis. Primeiro, inserimos um cateter de sucção para aliviar a obstrução, mas esse não progrediu. Assim que o TET foi trocado por outro,o pico de pressão voltou ao valor inicial e a paciente poôde ser ventilada. No fim da operação, a extubação foi feita sem complicação.

Após a inspeção exterior dos dois tubos, constatamos a existência de formas ovais alongadas de quase 1,5 cm. Como mostram as figuras, havia colapsos de ar sob as paredes dos tubos (Figuras 1 e 2). Quando inspecionamos o interior dos tubos por meio de broncoscópio fiexível com vídeo, observamos a dissecção dos tubos entre as partes em espiral, o que foi suficiente para obstruir os tubos, como mostram as imagens (Figura 3).




Quando presumimos que o dano nos tubos era devido a defeito de fabricação, entramos em contato com a empresa para informar o problema. Contudo, parece que o problema está relacionado à reesterilização e reutilização de tubos descartáveis.

Discussão

O uso de um TET não garante a ventilação satisfatória do paciente, o próprio TET pode se tornar uma fonte de obstrução das vias aéreas 2.

Presenciamos uma complicação muito rara durante a anestesia geral - a obstrução do TET causada pela dissecção da parede interna do tubo, com ou sem uso de N2O. Por causa do risco de difusão de gás para a parede dos tubos e de a esterilização repetida poder aumentar o risco de desenvolvimento de bolhas e dissecção, o N2O deve ser interrompido 3. Caso o pico de pressão das vias aéreas apresente aumento súbito em paciente sob anestesia geral, as manobras recomendadas para suspeita de obstrução do tubo são passar um cateter de sucção através do tubo e examinar com fi bra óptica 4. Não fizemos esse exame porque não tínhamos um broncoscópio na sala de operação naquele momento. No entanto, subsequentemente pudemos observar o interior do TET com broncoscopia flexível.

Há relatos de obstrução de TET durante a anestesia com o uso de N2O e mesmo sem exposição de N2O pelo uso de calor, óxido de etileno e solução de glutaraldeído e distensão de um tubo endotraqueal aramado 3,5-8.

Rao e col. 8 relataram um caso raro de obstrução de um TET aramado. O paciente foi intubado com um TET de 9 mm, feito de látex, aramado com nylon (Safety-fi ex, Mallinckrodt®, Athlon, Irlanda). Os autores usaram N2O sem interrupção, pois não mencionaram o contrário. Quando não puderam avançar o cateter de sucção, descobriram uma obstrução parcial no tubo. Depois de substituir o tubo, conseguiram desobstruir as vias aéreas.

Tose e col. 3 relataram um caso de obstrução de um TET aramado durante uma microcirurgia da laringe sob anestesia venosa total. Esse caso mostra uma complicação causada por obstrução que pode ser vista mesmo sem qualquer gás anestésico.

Jeon e col. 9 relataram um evento de dissecção de TET aramado que levou à obstrução parcial. O caso também mostra uma complicação inesperada causada pela reutilização de produtos descartáveis.

Paul e col. 7 relataram um caso raro de obstrução de TET causada pelo desprendimento de um pedaço do revestimento interior da espiral de um tubo aramado, que agiu como uma válvula. Esse exemplo difere das obstruções relatadas em nossos casos e em outros. Da mesma foram que nós, os autores recomendam não reutilizar um TET, pois acreditam que a reutilização do tubo é a causa principal de complicações semelhantes.

Em conclusão, para evitar complicações, como a dissecção da parede interna do tubo, os tubos descartáveis não devem ser reutilizados ou reesterilizados, pois estas podem ser causa de obstrução.

Submetido em 31 de maio de 2012.

Aprovado para publicação em 9 de julho de 2012.

Recebido do Departamento de Anestesiologia e Reanimação, Zonguldak Ataturk Government Hospital, Zonguldak, Turquia.

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  • 9. Jeon YS, Kim YS, Joo JD et al. - Partial airway obstruction caused by dissection of a reinforced endotracheal tube. Eur J Anaesthesiol, 2007;24:978-986.
  • Correspondência para:
    Esra Mercanoglu
    Department of Anesthesiology. Institution Zonguldak Ataturk Government Hospital. U.U.T.F
    Anesteziyoloji ve Reanimasyon A.D. Nilüfer Bursa
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      31 Maio 2012
    • Aceito
      09 Jul 2012
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