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Mapeamento multitemporal da cobertura de terra, por meio de árvore de decisão, na bacia hidrográfica do rio Marombas-SC

Multi-temporal land-cover mapping by means of decision tree of the Marombas River basin-SC, Brazil

RESUMO

O conhecimento sobre a cobertura da terra é fundamental como informação para o planejamento e o estudo dos efeitos da substituição de paisagens naturais por paisagens antropizadas. Este estudo objetivou analisar a dinâmica da cobertura da terra entre os anos de 1989 e 2011, na bacia hidrográfica do rio Marombas (SC), empregando o classificador árvore de decisão (AD). Foram utilizadas bandas espectrais do satélite Landsat 5, índices de vegetação e atributos de terreno extraídos do modelo digital de elevação. Esses dados foram utilizados como atributos de classificação da cobertura da terra, nos anos de 1989, 1991, 1993, 1997, 2001, 2004 e 2011. A qualidade do classificador AD foi avaliada por um conjunto de 500 pontos aleatórios e independentes, gerados para cada ano, o que permitiu calcular os parâmetros índice Kappa e exatidão global a partir das matrizes de confusão. O algoritmo AD obteve desempenho médio próximo a 83% para o índice Kappa e exatidão global média de 86%. Esses valores permitem considerar a classificação como excelente, o que permitiu uma associação segura entre a influência antrópica e a dinâmica da cobertura da terra na bacia hidrográfica estudada. Foi diagnosticado o aumento das atividades agrícolas e silvicultoras em detrimento das coberturas naturais, além de uma fragmentação dos corredores ecológicos da Floresta Ombrófila Mista, no intervalo analisado de 22 anos.

sensoriamento remoto; classificação supervisionada; uso da terra; mineração de dados

ABSTRACT

Land-cover information is essential for planning and studying the effects of changes from natural to disturbed landscapes. This study aimed at studying the dynamics of land cover from 1989 to 2011 in the Marombas River basin using a Decision Tree (DT) algorithm. Landsat-5 spectral bands, vegetation indices, and terrain attributes from elevation models were used as attributes for classification in the years of 1989, 1991, 1993, 1997, 2001, 2004, and 2011. DT classifier quality was assessed by a set of 500 independent random points, generated for each year; which allowed calculating Kappa index parameters and overall accuracy from the confusion matrices. The DT algorithm achieved a mean Kappa index of about 83% and a mean global accuracy of 86%. Therefore, it can be stated an excellent classification, from which we can securely associate anthropogenic influence with land-cover dynamics in this basin. We also observed an increase of agricultural and silvicultural activities at the expense of more natural land covers. Adding to that, the results showed that rapid fragmentation has occurred in the natural mixed ombrophilous forest along this interval of 22 years.

remote sensing; supervised classification; land use; data mining

INTRODUÇÃO

A cobertura terrestre passa por constantes mudanças devido às atividades naturais e antrópicas. Nesse contexto, o ser humano é um dos principais causadores das alterações que acontecem no ambiente, afetando a biofísica, a biogeoquímica e a biogeografia da superfície terrestre. As alterações da cobertura da terra podem ocasionar, por exemplo, maior emissão dos gases de efeito estufa (GIRI et al., 2013GIRI, C.; PENGRA, B.; LONG, J.; LOVELAND, T. R. Next generation of global land cover characterization, mapping, and monitoring. International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation , Amsterdam, v.25, p.30–37, dez. 2013.). Assim, o estudo da cobertura da terra é essencial para o entendimento da dinâmica ambiental e para a compreensão das possíveis implicações decorrentes da ação antrópica (SEXTON et al., 2013SEXTON, J. O.; URBAN, D.L.; DONOHUE, M.J.; SONG, C. Long-term land cover dynamics by multi-temporal classification across the Landsat-5 record.Remote Sensing of Environment , New York, v.128, p.246–258, jan. 2013.).

A utilização das imagens do satélite Landsat 5 na confecção de mapas de cobertura da terra é bastante difundida. Essa plataforma forneceu, durante 29 anos de operação, imagens com resolução espacial de 30 m e resolução temporal de 16 dias (GIRI et al., 2013GIRI, C.; PENGRA, B.; LONG, J.; LOVELAND, T. R. Next generation of global land cover characterization, mapping, and monitoring. International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation , Amsterdam, v.25, p.30–37, dez. 2013.). A gratuidade desses dados, associada ao sensoriamento contínuo desde o final da década de 1980, influenciou positivamente sobre a avaliação ambiental em diversas localidades do globo terrestre (OTTINGER et al., 2013OTTINGER, M.; KUENZER, C.; LIU, G.; WANG, S.; DECH, S. Monitoring land cover dynamics in the Yellow River Delta from 1995 to 2010 based on Landsat 5 TM. Applied Geography , Oxford, v.44, p.53–68, out. 2013.).

Dados obtidos por sensores remotos podem ser classificados por diferentes métodos. Existem algoritmos clássicos, que representam as classes com parâmetros estatísticos, como é o caso da máxima verossimilhança (SILVA et al., 2013SILVA, C. R.; SOUZA, K. B.; FURTADO, W. F. Evaluation of the progress of intensive agriculture in the cerrado Piauiense – Brazil. IERI Procedia , Amsterdam, v.5, p.51–58, jan. 2013.), e outros mais recentes, como Máquina de Vetor de Suporte (MVS) (GAVIER-PIZARRO et al., 2012GAVIER-PIZARRO, G. I.; KUEMMERLE, T.; HOYOS, L.E.; STEWART, S.I.; HUEBNER, C.D.; KEULER, N. S.; RADELOFF, V. C. Monitoring the invasion of an exotic tree (Ligustrum lucidum) from 1983 to 2006 with Landsat TM/ETM+ satellite data and Support Vector Machines in Córdoba, Argentina.Remote Sensing of Environment , New York, v.122, p.134–145, jul. 2012.), considerado um método não paramétrico. Entre os algoritmos de classificação, a aplicação de Árvore de Decisão (AD) tem demonstrado ser capaz de associar poder preditivo, confiabilidade das informações geradas e resultados de fácil interpretação (CHASMER et al., 2014CHASMER, L.; HOPKINSON, C.; VENESS, T.; QUINTON, W.; BALTZER, J. A decision-tree classification for low-lying complex land cover types within the zone of discontinuous permafrost. Remote Sensing of Environment , New York, v.143, p.73–84, mar. 2014.), com acurácia até mesmo superior àqueles gerados por MVS (GAVIER-PIZARRO et al., 2012GAVIER-PIZARRO, G. I.; KUEMMERLE, T.; HOYOS, L.E.; STEWART, S.I.; HUEBNER, C.D.; KEULER, N. S.; RADELOFF, V. C. Monitoring the invasion of an exotic tree (Ligustrum lucidum) from 1983 to 2006 with Landsat TM/ETM+ satellite data and Support Vector Machines in Córdoba, Argentina.Remote Sensing of Environment , New York, v.122, p.134–145, jul. 2012.) e máxima verossimilhança (FRIEDL & BRODLEY, 1997FRIEDL, M. A.; BRODLEY, C. E. Decision tree classification of land cover from remotely sensed data. Remote Sensing of Environment , New York, v.61, n.3, p.399–409, set. 1997.).

A cobertura terrestre apresenta peculiaridades que afetam o comportamento espectral das informações coletadas por sensoriamento remoto. Exemplo disso são as áreas sombreadas por encostas íngremes. Essa heterogeneidade espectral pode ser trabalhada com o uso de métodos de classificação apropriados, e.g., utilizando a AD (RUIZ et al., 2014RUIZ, L. F. C.; TEN CATEN, A.; DALMOLIN, R. S. D. Árvore de decisão e a densidade mínima de amostras no mapeamento da cobertura da terra.Ciência Rural , Santa Maria, v.44, n.6, p.1001- -1007, jun. 2014.). O algoritmo AD possui natureza e propriedades não paramétricas e apresentam resultados satisfatórios no processamento de dados heterogêneos (TEN CATEN et al., 2013TEN CATEN, A.; DALMOLIN, R. S. D.; PEDRON, F. A.; RUIZ, L. F. C.; SILVA, C. A. An appropriate data set size for digital soil mapping in Erechim, Rio Grande do Sul, Brazil. Revista Brasileira de Ciência do Solo , Viçosa, MG, v.37, n.2, abr. 2013.). Outro aspecto favorável à aplicação de AD é que tanto dados binários, contínuos e categóricos podem ser utilizados como a informação de entrada no algoritmo AD (CHASMER et al., 2014CHASMER, L.; HOPKINSON, C.; VENESS, T.; QUINTON, W.; BALTZER, J. A decision-tree classification for low-lying complex land cover types within the zone of discontinuous permafrost. Remote Sensing of Environment , New York, v.143, p.73–84, mar. 2014.). A AD gerada pode ser interpretada de tal forma que permite conhecer a estrutura preditiva do problema (MEGETO et al., 2014MEGETO, G. A. S.; OLIVEIRA, S. R. de M.; PONTE, E. M. de; MEIRA, C. A. A. Árvore de decisão para classificação de ocorrências de ferrugem asiática em lavouras comerciais com base em variáveis meteorológicas. Engenharia Agrícola , Jaboticabl, v.34, n.3, p. 590-599, mai./jun. 2014.).

A estrutura relativamente simples, intuitiva e explícita do algoritmo AD (FRIEDL & BRODLEY, 1997FRIEDL, M. A.; BRODLEY, C. E. Decision tree classification of land cover from remotely sensed data. Remote Sensing of Environment , New York, v.61, n.3, p.399–409, set. 1997.) possibilitou sua aplicação no estudo de avaliação ambiental conduzido por OTTINGER et al. (2013)OTTINGER, M.; KUENZER, C.; LIU, G.; WANG, S.; DECH, S. Monitoring land cover dynamics in the Yellow River Delta from 1995 to 2010 based on Landsat 5 TM. Applied Geography , Oxford, v.44, p.53–68, out. 2013.. Nessa avaliação, desenvolvida no delta do Yellow River, na China, com dados da plataforma Landsat 5, em uma escala temporal de 15 anos, os autores constataram mudança drástica na paisagem decorrente das atividades antrópicas, principalmente pela conversão da cobertura da terra natural em áreas de agricultura intensiva e em área urbana.

A integração de diferentes atributos no processo de geração da AD também é considerada um fator positivo, segundo CARVALHO JÚNIOR et al. (2008)CARVALHO JÚNIOR, O. A.; COELHO, M. A. N.; MARTINS, E. S.; GOMES, R. A. T.; COUTO JÚNIOR, A. F.; OLIVEIRA, S. N.; SANTANA, O. A. Mapeamento da vegetação na floresta Atlântica usando o classificador de árvore de decisão para integrar dados de sensoriamento remoto e modelo digital de terreno.Revista Brasileira de Geofísica , São Paulo, v.26, n.3, p.331–345, jul/set. 2008.. Esses autores integraram valores do modelo digital de elevação com dados espectrais do sensor ASTER, resultando no melhor detalhamento da cobertura da terra em uma região de relevo acidentado do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. A AD mostrou-se ser mais acurada no trabalho desenvolvido por CHASMER et al. (2014)CHASMER, L.; HOPKINSON, C.; VENESS, T.; QUINTON, W.; BALTZER, J. A decision-tree classification for low-lying complex land cover types within the zone of discontinuous permafrost. Remote Sensing of Environment , New York, v.143, p.73–84, mar. 2014., quando esses autores integraram atributos espectrais, de elevação e das características estruturais da vegetação, para a classificação da cobertura da terra em regiões de Pergelissolo (Permafrost). No estudo, foram alcançados valores de Kappa de 91%.

A classificação da cobertura da terra possibilita a definição de corredores ecológicos na paisagem. Os corredores ecológicos atuam com o objetivo específico de promover a conectividade entre fragmentos de áreas naturais. Promovem a mitigação dos efeitos da fragmentação dos ecossistemas e a ligação entre diferentes áreas, possibilitando o desempenho das funções ecológicas da paisagem (MMA, 2007MMA - Ministério do Meio Ambiente. Corredores ecológicos : experiências em planejamento e implementação. Brasília, 2007. 57p.). Em estudo realizado por PORTILLO-QUINTERO & SÁNCHEZ-AZOFEIFA (2010)Portillo-Quintero, C. A.; Sánchez-Azofeifa, G. A. Extent and conservation of tropical dry forests in the Americas. Biological Conservation , Kidlington, v.143, p.144-155, jan. 2010., os autores aplicaram AD para identificar a cobertura da terra e o grau de fragmentação das florestas tropicais e subtropicais de áreas secas de folhas largas nas Américas. Os autores reportaram que 66% das áreas dessas florestas já foram convertidos para outros usos, e que mais de 60% dos fragmentos são maiores do que 10 km2. O estudo recomenda que os dados de localização dos fragmentos sejam considerados para a definição de corredores ecológicos. Essa, segundo os autores, deve ser uma ação prioritária para a mitigação dos efeitos da substituição da cobertura da terra nessas regiões.

Diante do exposto, este trabalho teve como objetivo analisar a dinâmica da cobertura da terra entre os anos de 1989 e 2011, na bacia hidrográfica do rio Marombas (SC), integrando bandas espectrais, índices de vegetação e atributos de terreno por meio do algoritmo classificador por Árvore de Decisão.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudo e dados de sensoriamento remoto

A bacia hidrográfica do rio Marombas (4.450 km2) está localizada na mesorregião Serrana do estado de Santa Catarina, abrangendo o território de onze municípios. Segundo a classificação de Köppen, a região possui clima mesotérmico úmido com verão ameno (Cfb), com temperatura média anual de 16º C e precipitação média de 1.600 mm por ano. A vegetação natural pertence à Floresta Ombrófila Mista, e há a predominância das classes de solos do tipo Cambissolos, Argissolos e Neossolos (EPAGRI;CEPA, 2003EPAGRI;CEPA - EMPRESA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA E EXTENSÃO RURAL DE SANTA CATARINA; CENTRO DE SOCIOECONOMIA E PLANEJAMENTO AGRÍCOLA. Caracterização regional: Curitibanos. Florianópolis: Epagri, 2003. 34p.).

Foram utilizadas no estudo cenas obtidas pelo sensor Thematic Mapper (TM) a bordo da plataforma Landsat 5, com resolução espacial de 30 metros. As cenas utilizadas foram coletadas na órbita/ponto 221/79, nos anos de 1989, 1991, 1993, 1997, 2001, 2004 e 2011. O critério de seleção das datas ocorreu conforme a cobertura de nuvens nas imagens, além do critério sazonal de fim do inverno e primavera. Esses critérios acarretaram intervalos variados entre as cenas utilizadas, mas que, mesmo assim, permitiram avaliar a dinâmica da cobertura de forma detalhada no período de 22 anos (1989 a 2011). Além das imagens do satélite Landsat 5, utilizou-se também do modelo digital de elevação (MDE) com pixels de 30 m, disponível no banco de dados TOPODATA (VALERIANO & ROSSETTI, 2012VALERIANO, M. M.; ROSSETTI, D. F. Topodata: Brazilian full coverage refinement of SRTM data. Applied Geography , Oxford, v.32, p.300-309, 2012.). Com o MDE, foi possível gerar, nos programas SAGA GIS v.2.1 e Quantum GIS v2.0, os atributos de terreno utilizados neste estudo. A Figura 1 apresenta um fluxograma geral da metodologia empregada e a localização da área de estudo no Estado de Santa Catarina. As imagens de satélite e os atributos de terreno possibilitam criar os atributos preditores. Esses atributos preditores são utilizados para treinar os modelos preditivos do algoritmo AD. O modelo gerado irá definir um conjunto de regras, ou condições, que relacionam cada classe de cobertura da terra a características específicas dos atributos preditores.

FIGURA 1
Fluxograma geral da metodologia empregada. General flowchart of the used method.

Os atributos preditivos utilizados para a classificação por AD foram: bandas 1, 2, 3, 4, 5 e 7 do sensor TM; declividade e elevação obtidas do MDE; Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI), Índice de Água por Diferença Normalizada (NDWI) e Razão Simples (RS). Os índices de vegetação foram calculados no SAGA GIS, a partir das bandas do sensor TM, utilizando-se das fórmulas que estão apresentadas no trabalho de ZARATE-VALDEZ et al. (2012)ZARATE-VALDEZ, J. L.; WHITING, M.L.; LAMPINEN, B.D.; METCALF, S.; USTIN, S.L.; BROWN, P.H. Prediction of leaf area index in almonds by vegetation indexes. Computers and Electronics in Agriculture , v.85, p.24–32, jul. 2012.. Também foi utilizada como atributo de classificação a distância euclidiana entre os povoamentos florestais comerciais, gerada por uma classificação não supervisionada no programa SAGA GIS.

O atributo distância euclidiana foi empregado para facilitar a localização das áreas com a classe desflorestamento. Essa classe caracteriza-se pela presença de solo exposto e/ou presença de manchas de capoeira em áreas de colheita florestal recente. Essas regiões de desflorestamento foram identificadas facilmente na composição falsa cor (4R, 5G e 3B), porém apresentaram certa confusão entre as classes de campo e palhada. Tal confusão foi minimizada a partir da classificação com o atributo distância euclidiana entre áreas de silvicultura.

Pré-processamento e geração da AD

Realizou-se correção geométrica utilizando malha hidrográfica da região para o georreferenciamento de todos os atributos de terreno para as mesmas coordenadas geográficas. Foi aplicada também a correção do espalhamento atmosférico nas imagens de satélite com a subtração do pixel mais escuro (CHAVEZ Jr., 1996CHAVEZ Jr., P. S. Image-based atmospheric corrections - revisited and improved. Photogrammetric Engineering and Remote Sensing , Glasgow, v.62, p.1025-1036, set. 1996.), o qual foi obtido individualmente para cada banda e cada ano. Mesmo ocorrendo um efeito proporcional para toda a imagem, VANONCKELEN et al. (2013)VANONCKELEN, S.; LHERMITTE, S.; ROMPAEY, A. V. The effect of atmospheric and topographic correction methods on land cover classification accuracy. International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation , Amsterdam, v.24, p.9–21, out. 2013.sugeriram, a partir de seu estudo, que a correção atmosférica fosse feita em estudos multitemporais. Salienta-se ainda a importância desse processamento preliminar quando são utilizados atributos de classificação que envolvam índices de vegetação.

Para o treinamento dos modelos de AD, foram identificadas as coberturas da terra nas composições falsa cor das imagens. As coberturas da terra foram identificadas, empregando-se o conhecimento tácito da área de estudo pelos pesquisadores, apoiada pelas imagens disponíveis nos programas Google Earth e Bing Maps. Foi possível a identificação e a delimitação de oito classes de coberturas da terra, a saber: silvicultura (povoamentos florestais predominantemente de Pinus sp. eEucalyptus spp.); floresta nativa (vegetação da Floresta Ombrófila Mista); campo (áreas com gramíneas nativas ou manejadas para pecuária); cultura agrícola (predominantemente trigo e milho); palhada (resíduo de vegetação colhida ou senescida); solo exposto (solo sem cobertura da vegetação ou resíduos); desflorestamento (áreas onde ocorreu a retirada das florestas), e água (rios, açudes e barragens).

Na sequência, foram criados vetores poligonais em cada cobertura da terra. Esses polígonos possibilitaram a amostragem dos dados das bandas do sensor TM, assim como dos demais atributos de terreno. Os dados amostrados nessa fase foram tabulados para o posterior ajuste dos modelos preditivos da cobertura da terra por AD. Esses polígonos de amostragem apresentaram proporções entre 7.500 e 22.500 pixels (0,15 a 0,45%) da área total da bacia hidrográfica para cada classe de cobertura. Esses valores de densidade de amostragem são compatíveis com aqueles reportados por RUIZ et al. (2014)RUIZ, L. F. C.; TEN CATEN, A.; DALMOLIN, R. S. D. Árvore de decisão e a densidade mínima de amostras no mapeamento da cobertura da terra.Ciência Rural , Santa Maria, v.44, n.6, p.1001- -1007, jun. 2014..

Os dados tabulados foram importados no programa Weka 3.6. Nesse programa, foi utilizado o algoritmo J48 (HALL et al., 2009HALL, M.; FRANK, E.; HOLMES, G.; PFAHRINGER, B.; REUTEMANN, P; WITTEN, I. H. The WEKA Data Mining Software: An Update. SIGKDD Explorations , New York, v.11, n.1, p.10–18, 2009.) para a geração dos modelos preditivos por AD. No processo de geração da AD, foram seguidas as recomendações de configuração propostas porRUIZ et al. (2014)RUIZ, L. F. C.; TEN CATEN, A.; DALMOLIN, R. S. D. Árvore de decisão e a densidade mínima de amostras no mapeamento da cobertura da terra.Ciência Rural , Santa Maria, v.44, n.6, p.1001- -1007, jun. 2014.. As áreas correspondentes às manchas urbanas foram suprimidas no estudo devido à pouca representatividade que se manteve constante ao longo dos anos.

Avaliação da classificação

Para a validação das imagens classificadas, foram criados 500 pontos aleatórios dentro dos limites da área de estudo, densidade compatível com o que foi proposto por CONGALTON (1991)CONGALTON, R. G. A review of assessing the accuracy of classifications of remotely sensed data. Remote Sensing of Environment , New York, v.37, n.1, p.35–46, jul. 1991.. Em cada ponto foi identificada a cobertura da terra anteriormente à classificação, utilizando a composição falsa cor, e a cobertura gerada pelo algoritmo AD após o processo de classificação. Esses dados de validação permitiram gerar a matriz de confusão da classificação, assim como o índice Kappa e a exatidão global para a avaliação de desempenho (CONGALTON, 1991CONGALTON, R. G. A review of assessing the accuracy of classifications of remotely sensed data. Remote Sensing of Environment , New York, v.37, n.1, p.35–46, jul. 1991.). As amostras para a classificação por AD da cobertura da terra, os modelos preditivos por AD, as imagens classificadas e o conjunto de 500 pontos para validação foram gerados de forma independente para cada um dos sete anos estudados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Classificação por árvore de decisão

O algoritmo classificador por AD foi avaliado pelos índices de validação – índice Kappa e exatidão global –, calculados a partir do conjunto de 500 pontos independentes (Tabela 1). Os valores de Kappa obtidos variaram de 77,3% a 88,8%, com valor médio de 83,6%, o que demonstra um desempenho similar ao que foi reportado por CHASMER et al. (2014)CHASMER, L.; HOPKINSON, C.; VENESS, T.; QUINTON, W.; BALTZER, J. A decision-tree classification for low-lying complex land cover types within the zone of discontinuous permafrost. Remote Sensing of Environment , New York, v.143, p.73–84, mar. 2014.. Esses autores aplicaram AD para o mapeamento de áreas complexas de altitude e vegetação de Pergelissolos (Permafrost). Os autores relataram que a aplicação de atributos de terreno, derivados de LiDAR, melhora a qualidade do mapeamento em relação a classificações da cobertura da terra realizadas apenas com dados espectrais do satélite WorldView 2. Os valores de exatidão global variaram entre 80,4 e 90,6% para os anos de 1991 e 2004, respectivamente. Esses valores indicam uma boa concordância entre o total de pontos amostrados e aqueles na diagonal das matrizes da Tabela 1. No entanto, conforme CONGALTON (1991)CONGALTON, R. G. A review of assessing the accuracy of classifications of remotely sensed data. Remote Sensing of Environment , New York, v.37, n.1, p.35–46, jul. 1991., a exatidão global pode superestimar a qualidade do mapeamento da cobertura da terra, e seus valores devem ser tomados com cautela.

TABELA 1
Matrizes de confusão, obtidas pelo conjunto de 500 pontos aleatórios, com os parâmetros exatidão global e índice Kappa para validação da cobertura da terra. Confusion matrices obtained from the set of 500 random points with global accuracy and Kappa index parameters for land-cover quality control.

Os valores de Kappa encontrados neste estudo (Tabela 1) são considerados de qualidade Excelente, conforme as categorias propostas por LANDIS & KOCH (1977)LANDIS, J.; KOCH, G. G. The measurements of agreement for categorical data. Biometrics , Oxford, v.33, n.3, p.159-179, 1977.. Apenas as classificações dos anos de 1989 e 1991 resultaram em classificações com qualidade Muito Bom. Esses menores valores do índice Kappa ocorreram nas primeiras datas da série analisada. Esse fato pode ser um indicativo de que há uma dificuldade em se empregar o conhecimento tácito da área de estudo para realizar o treinamento do algoritmo de AD, na medida em que dados mais antigos de sensoriamento remoto são utilizados. No entanto, como os valores de Kappa foram gerados por um conjunto de dados independentes e aleatórios, esse índice propicia maior confiabilidade no estabelecimento de relações entre a ocupação antrópica e as mudanças verificadas em cada uma das oito coberturas da terra, no período de 22 anos.

As coberturas de campo, palhada e desflorestamento foram as que apresentaram as maiores dificuldades de diferenciação pelo algoritmo AD, como observado em quase todas as matrizes de confusão (Tabela 1). Nessas três classes, os erros de classificação podem estar associados a diferentes fatores, uma vez que essas classes são caracterizadas por uma diversidade de misturas espectrais, produto da presença de diferentes proporções de vegetação rasteira, como capoeira e/ou gramíneas, assim como de matérias vegetais senescidas, cobrindo parcial ou integralmente o solo. Essa complexidade presente nos pixels localizados nessas coberturas acarreta variações no comportamento espectral desses três alvos (VANONCKELEN et al., 2013VANONCKELEN, S.; LHERMITTE, S.; ROMPAEY, A. V. The effect of atmospheric and topographic correction methods on land cover classification accuracy. International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation , Amsterdam, v.24, p.9–21, out. 2013.), dificultando sua predição.

Em pesquisa que buscou identificar as áreas cultivadas com cana-de-açúcar, NONATO et al. (2013)NONATO, R. T.; OLIVEIRA, S. R. de M. Técnicas de mineração de dados para identificação de áreas com cana-de-açúcar em imagens Landsat 5.Engenharia Agrícola , Jaboticabal, v.33, n.6, p.1268-1280, nov./dez. 2013. reportaram que a AD teve dificuldade em diferenciar as diferentes fases fenológicas da cana em virtude da grande semelhança entre os pixels dessas fases. Esses resultados podem ser um indicativo de que a AD tem dificuldades de diferenciar classes de cobertura em que ocorra pouca diferença entre os pixels.

O algoritmo AD possibilitou a espacialização das oito classes de cobertura da terra e a avaliação da dinâmica temporal da cobertura da terra na bacia hidrográfica do rio Marombas (Figura 2).

FIGURA 2
Dinâmica temporal da modificação em valores absolutos (km2) e relativos (%), em relação ao total de 4.450 km2, da cobertura da terra, no período de 22 anos. Land-cover time dynamics throughout the period of 22 years in absolutes (km2) and relative (%) values, considering a total area of 4,450 km2.

Dinâmica da cobertura da terra

A classe silvicultura tem grande representatividade na bacia e duplicou durante o intervalo de tempo analisado, com uma área correspondente a 827,0 km2em 2011 (Figura 2). Os povoamentos florestais de maior importância na região são de Pinus sp. eEucalyptus spp. A partir da década de 1950, a região do planalto catarinense começou a modificar sua estrutura econômica baseada na pecuária. A grande quantidade de matéria prima oriunda das florestas nativas, principalmente da espécie Araucaria angustifolia, possibilitou que a região começasse a explorar intensivamente esse recurso para as madeireiras. A exploração das florestas nativas foi substituída pela implantação de reflorestamentos compostos por espécies exóticas de rápido crescimento. Assim, a região tornou-se referência na produção de madeira e derivados – papel, celulose e pasta mecânica – com a instalação de empresas consolidadas nesse setor (RAUD, 1999RAUD, C. Indústria, território e meio ambiente no Brasil : perspectivas da industrialização descentralizada a partir da análise da experiência catarinense. Florianópolis - SC: Editora da UFSC. 1999. 276p.).

A maior área territorial da bacia hidrográfica é ocupada por floresta nativa (Figura 2). Contudo, a cobertura por essa classe modificou-se em torno de 20% de 1989 até 2011 e, atualmente, estão presentes 1.481,6 km2 dessa cobertura. As florestas nativas ocorrem com mais frequência nas regiões mais a leste da bacia hidrográfica, onde o relevo declivoso impõe uma limitação natural à substituição dessa cobertura da terra (Figura 3). Verificou-se, no entanto, a diminuição das grandes áreas de floresta nativa para pequenos fragmentos espalhados em toda a região de estudo. Para ANJOS et al. (2011)ANJOS, L.; COLLINS, C. D.; HOLT, R. D.; VOLPATO, G. H.; MENDONÇA, L. B.; LOPES, E. V.; BOÇON, R.; BISHEIMER, M. V.; SERAFINI, P. P.; CARVALHO, J. Bird species abundance–occupancy patterns and sensitivity to forest fragmentation: Implications for conservation in the Brazilian Atlantic forest.Biological Conservation , Kidlington, v.144, n.9, p.2213–2222, set. 2011., essa fragmentação ocasiona problemas para a conservação da biodiversidade e o fluxo gênico da flora e fauna pertencentes ao bioma Mata Atlântica.

FIGURA 3
Mapas de cobertura da terra da bacia hidrográfica do rio Marombas. Land cover maps of the Marombas river basin.

A classe campo está compreendida pelos campos nativos e campos manejados para pecuária. Essa classe foi a que apresentou maior modificação no período analisado, decrescendo em 75% a partir de 1993, de 1.334,0 para 301,2 km2 no ano 2011 (Figura 2). Provavelmente, as áreas de campo tenham sido convertidas para atividades agrícolas e silviculturais, as quais aumentaram no período analisado. Esse processo tem profundas implicações ambientais na região, uma vez que coberturas com características mais naturais e conservadas, foram substituídas por coberturas de forte intervenção na paisagem, como silvicultura e agricultura (cultura agrícola, palhada e solo exposto).

No período analisado neste estudo, há uma marcante tendência do aumento da classe palhada (Figura 2). Em 1989, essa classe correspondia a 36,8 km2 e, 22 anos mais tarde, a classe alcançou 217,3 km2, o que representa o aumento próximo a seis vezes, possivelmente, relacionado ao plantio direto e à aplicação de técnicas de manejo e conservação do solo para culturas anuais. Desde a década de 1990, observa-se maior adoção pelos agricultores de técnicas conservacionistas do solo, como o sistema de plantio direto na palha fortemente difundido no Brasil.

Em todos os anos analisados, a presença de solo exposto foi, pelo menos, o dobro superior que a classe palhada, com o crescimento de 144,4 km2 em 1989 para cerca de 433,3 km2 em 2011 (Figura 2). O crescimento da classe solo exposto tem relação com o fato de que na bacia hidrográfica do rio Marombas estão localizados os municípios catarinenses com maior produção de alho (Alliumsativum L.) do Estado. Essa atividade iniciou-se no final da década de 1970 e difundiu- -se na região com pequenas e médias propriedades rurais. A produção de cebola (Allium cepa L.) também é bastante representativa na região (EPAGRI;CEPA, 2012EPAGRI;CEPA - EMPRESA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA E EXTENSÃO RURAL DE SANTA CATARINA;CENTRO DE SOCIOECONOMIA E PLANEJAMENTO AGRÍCOLA. Síntese anual da Agricultura de Santa Catarina . Florianópolis: Epagri, 2012. 182p.). O manejo dessas culturas requer o preparo do solo na forma convencional, com revolvimento e formação de canteiros para o plantio dessas culturas. Ambas as culturas, mesmo atingindo seu máximo desenvolvimento vegetativo, não são capazes de cobrir totalmente o solo nas condições normais de manejo (LUCINI, 2004LUCINI, M. A. Cultura do Alho. Curitibanos: Epagri escritório local de Curitibanos, 2004. 9p. Disponível em: < www.anapa.com.br/.../Cultura_do_alho_no_sul.pdf>. Acesso em: 27 jan. 2014.
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). A quantificação da classe solo exposto, voltada a culturas de grande revolvimento de solo, permite entender a dinâmica das atividades agrícolas predominantes na região e auxiliar na geração de dados com aplicação em estudos de processos erosivos da bacia do rio Marombas.

A classe cultura agrícola com predomínio de culturas de inverno, em pleno estágio vegetativo, teve crescimento de quase 100% entre 1989 e 2011 (Figura 2). As culturas como trigo e outras gramíneas utilizadas para cobertura verde estão compreendidas nessa classe. Essas áreas com pastagem de inverno não foram incluídas na classe campo por se situarem, de modo geral, em locais que possuem manejo diferenciado do solo e da cultura, em áreas onde ocorre uma integração lavoura e pecuária. A classe água foi identificada como corpos de água que apresentam baixa reflectância espectral em relação às demais classes. Sua representatividade na bacia, durante o período analisado, foi constante e de proporção pouco significativa, com área média de 30 km2 (Figura 2).

A classe desflorestamento foi a que apresentou maior dinâmica entre os anos analisados. Foi verificada a representatividade de até 831 km2 na bacia para o ano de 2011 (Figura 2). Essa classe é caracterizada, predominantemente, pela colheita dos povoamentos florestais, com a cobertura do solo composta pela mistura heterogênea de serapilheira, galhos, plantas herbáceas e outros materiais vegetais em decomposição. Áreas de campo, em uma condição de menor cobertura do solo por vegetação, também podem ter sido assimiladas nessa classe. Embora possa ter havido a categorização de outras classes como sendo desflorestamento, o que se constitui um erro do algoritmo de classificação; as classes solo exposto e campo merecem, também, especial atenção quanto à possibilidade de degradação do recurso natural solo nesses locais com essas coberturas.

A frequência temporal adotada neste estudo, em intervalos de três a sete anos, no período de 22 anos, possibilitou uma análise minuciosa da dinâmica da cobertura da terra, destacando variações que muitas vezes passam despercebidas numa análise bi ou unitemporal (OTTINGER et al., 2013OTTINGER, M.; KUENZER, C.; LIU, G.; WANG, S.; DECH, S. Monitoring land cover dynamics in the Yellow River Delta from 1995 to 2010 based on Landsat 5 TM. Applied Geography , Oxford, v.44, p.53–68, out. 2013.). Estudos nessa linha precisam ser aprofundados, por exemplo, para o entendimento de processos biogeoquímicos, como acumulação de carbono no solo, haja vista que ocorrem variações quando a cobertura da terra é modificada. Por fim, ressalta-se a importância desse tipo de análise na bacia hidrográfica para auxiliar na tomada de decisões, bem como nas possíveis aplicações dos dados para complementação dos estudos ambientais na região.

CONCLUSÕES

A classificação da cobertura da terra pelo algoritmo de Árvore de Decisão possibilitou a identificação das diferentes coberturas com um índice Kappa de, pelo menos, 76% no período de 22 anos.

Neste estudo, foi possível associar os dados de dimensões da cobertura e de sua dinâmica com fatores antrópicos ocorridos na bacia hidrográfica. Ao longo do período analisado, foi verificada uma conversão de coberturas naturais, como campo e florestas nativas, para coberturas de uso intensivo da paisagem, como agricultura e silvicultura.

A dinâmica das classes de cobertura da terra, no período analisado, indica maior fragmentação dessas. Essa conclusão permite inferir que há um impacto na fauna e na flora da bacia hidrográfica, pois a fragmentação afeta os corredores ecológicos da Floresta Ombrófila Mista e a consequente conservação da biodiversidade na bacia hidrográfica do rio Marombas (SC).

AGRADECIMENTOS

Os autores gostariam de agradecer ao CNPq pelos recursos concedidos via processo número 550177/2012-4, assim como pelas bolsas de Iniciação Científica e de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial. Os autores agradecem ainda as contribuições dos anônimos revisores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    22 Out 2014
  • Aceito
    29 Jul 2015
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