Acessibilidade / Reportar erro

Aplicabilidade da versão espanhola da escala de intensidade de apoio, na população mexicana com doença mental severa

Resumos

Estão apresentados, aqui, os resultados obtidos da avaliação por juízes especialistas sobre a escala de intensidade de apoio (Scale Intensity Support-SIS), na versão espanhola, para determinar a sua aplicabilidade na população mexicana com doença mental severa (DMS). O instrumento, inicialmente concebido para pessoas com deficiência intelectual, é coerente com o conceito multidimensional de qualidade de vida e com o modelo social da deficiência. Foi analisada a equivalência semântica dos itens adotados, através dos juízes especialistas, a confiabilidade das subescalas, utilizando o alfa de Cronbach, e a validade concorrente entre as escalas SIS e a Global Assessment of Functioning (GAF). A média de semelhança com a original foi de 9,91 do máximo de 10 (dp=0,14). Os coeficientes de confiabilidade foram superiores a 0,95 e as correlações entre as escalas SIS e a GAF foram médias altas e significativas. Concluiu-se que, no contexto mexicano, a escala SIS pode ser utilizada para conhecer as necessidades e expectativas das pessoas com doença mental.

Pessoas com Deficiência; Determinação de Necessidades de Cuidados de Saúde; Transtornos Mentais


This study presents the results obtained from the evaluation, by specialist judges, of the Supports Intensity Scale (SIS), Spanish version, to determine its suitability for the Mexican population with severe mental illness (SMI). The instrument, originally designed for people with intellectual disabilities, is consistent with the multidimensional concept of quality of life and the social model of disability. The semantic equivalence of the items adjusted by specialist judges, the reliability of the subscales, using Cronbach’s alpha, and the concurrent validity between the SIS and the Global Functioning Assessment (GAF) were analyzed. The mean similarity to the original was 9.91 from a total of 10 (sd=0.14). The reliability coefficients were above 0.95 and the correlations between the SIS and the GAF were medium to high and significant. In conclusion, in the Mexican context, the SIS scale can be used to understand the needs and expectations of people with mental illness.

Disabled Persons; Needs Assessment; Mental Disorders


Mostramos resultados obtenidos en la evaluación de jueces expertos en la Escala de Intensidad de Apoyos (SIS), versión española, para determinar su adecuación a la población mexicana con Enfermedad Mental Severa (EMS). El instrumento, originalmente diseñado para personas con discapacidad intelectual, es congruente con el concepto multidimensional de calidad de vida y el modelo social de discapacidad. Se analizó la equivalencia semántica de los ítems adaptados a través de jueces expertos, la fiabilidad de las subescalas mediante el coeficiente Alfa de Cronbach y la validez concurrente entre la SIS y la GAF. El promedio de semejanza con el original fue 9,91 sobre 10 (DE=0,14). Los coeficientes de fiabilidad fueron superiores a 0,95 y las correlaciones entre la SIS y la GAF fueron entre medias y altas y significativas. Los resultados confirman que la escala SIS, con mínimas adecuaciones de forma, puede usarse para conocer las necesidades y expectativas en personas con enfermedad mental en el contexto mexicano.

Personas con Discapacidad; Evaluación de Necesidades; Trastornos Mentales


ARTIGO ORIGINAL

Maribel Cruz OrtizI; Cristina Jenaro RíoII; Ma. Del Carmen Pérez RodríguezIII; Noelia Flores RobainaIV

ILicenciada em Enfermagem, Doutoranda, Instituto Superior de Integración a la Comunidad, Universidad de Salamanca, Espanha. E-mail: redazul@hotmail.com

IIDoutor em Psicologia, Profesor Titular, Facultad de Psicología, Universidad de Salamanca, Espanha. E-mail: crisje@usal.es

IIIDoutor em Enfermagem, Profesor, Facultad de Enfermería de San Luís Potosí, Universidad Autónoma de San Luís Potosí, México. E-mail: salina67@hotmail.com

IVDoutor em Psicologia, Profesor Auxiliar, Facultad de Psicología, Universidad de Salamanca, Espanha. E-mail: nrobaina@usal.es

Endereço para correspondência

RESUMO

Estão apresentados, aqui, os resultados obtidos da avaliação por juízes especialistas sobre a escala de intensidade de apoio (Scale Intensity Support-SIS), na versão espanhola, para determinar a sua aplicabilidade na população mexicana com doença mental severa (DMS). O instrumento, inicialmente concebido para pessoas com deficiência intelectual, é coerente com o conceito multidimensional de qualidade de vida e com o modelo social da deficiência. Foi analisada a equivalência semântica dos itens adotados, através dos juízes especialistas, a confiabilidade das subescalas, utilizando o alfa de Cronbach, e a validade concorrente entre as escalas SIS e a Global Assessment of Functioning (GAF). A média de semelhança com a original foi de 9,91 do máximo de 10 (dp=0,14). Os coeficientes de confiabilidade foram superiores a 0,95 e as correlações entre as escalas SIS e a GAF foram médias altas e significativas. Concluiu-se que, no contexto mexicano, a escala SIS pode ser utilizada para conhecer as necessidades e expectativas das pessoas com doença mental.

Descritores: Pessoas com Deficiência; Determinação de Necessidades de Cuidados de Saúde; Transtornos Mentais.

Introdução

Nos últimos anos, têm-se feito sérios esforços para redefinir a incapacidade, passando de modelo que acentua as carências e incapacidades das pessoas, baseado predominantemente num ponto de vista biomédico, para um modelo social, considerando que a incapacidade é, em grande medida, fruto da interação da pessoa num contexto que fracassa em lhe proporcionar os apoios necessários.

Por essa razão, a inclusão do conceito de apoios sob o referencial multidimensional da incapacidade, fortalecido pelo conceito de incapacidade intelectual da Associação Americana de Incapacidades Intelectuais e do Desenvolvimento(1-4) (AIIDD), se converte em elemento indispensável para entender as necessidades específicas das pessoas com incapacidade em distintas áreas, agrupadas de acordo com as dimensões de qualidade de vida propostas(3-4), e assumidas no presente trabalho para abordar o coletivo de pessoas com doença mental que, só recentemente, estão sendo compreendidas sob o referencial da incapacidade.

O instrumento mais coerente com esse referencial teórico conceitual é a Escala de Intensidade de Apoios, desenhada originalmente para pessoas com incapacidade intelectual(5). O modelo de apoios, implícito na escala, se baseia num enfoque ecológico para compreender a conduta, e está orientado para avaliar a discrepância entre as capacidades e habilidades da pessoa e os requerimentos e demandas necessários para funcionar num ambiente concreto. Dessa forma, os apoios são entendidos como recursos e estratégias que promovem o desenvolvimento, educação, interesses e bem-estar pessoal que melhoram o funcionamento individual(6).

Retomando o modelo multidimensional de apoios da AIIDD, o processo de avaliação, sob o conceito de qualidade de vida, advoga a necessidade de se focar tanto nas limitações do indivíduo como nas suas capacidades, ao longo da sua vida.

O enfoque atual dos apoios se relaciona diretamente com a incorporação de perspectiva de Planejamento Centrado na Pessoa (PCP), de resultados referidos à pessoa, de promoção da competência, capacitação e fortalecimento do controle das suas vidas pelas pessoas com incapacidade intelectual e de incentivo à autodeterminação das pessoas para obter integração comunitária(6-7).

Levar à prática esses princípios requer a utilização de instrumentos que permitam obter dados específicos sobre as necessidades de apoio de cada pessoa. A elaboração do plano individualizado de intervenção deve ser consenso entre a equipe, o usuário e a sua família(8). Essa situação complexa tem levado a se tentar diferentes abordagens com instrumentos genéricos e específicos, tratando de responder problemas, no âmbito disciplinar e metodológico, dificultado muitas vezes pela carência de modelos conceituais que apoiem as pesquisas. Daí a relevância do alinhamento do conceito de qualidade com o paradigma dos apoios assinalados(9-10).

No âmbito da saúde mental, particularmente na psiquiatria, tem-se realizado pesquisas do ponto de vista da qualidade de vida, relacionada à sintomatologia, e com o seu controle. Revisões amplas mostram que os sintomas psiquiátricos, em particular, e a psicopatologia em geral são importantes, porém modestos, contribuintes para a qualidade de vida de pessoas com esquizofrenia, e que a influência exercida por elas depende, em parte, da amostra objeto do estudo(11). Os mencionados autores destacam a necessidade de examinar outras influências psicossociais.

Inúmeros estudos têm sido realizados com abordagem mais restrita, enfocando o conceito de qualidade de vida relacionado à saúde (CVRS)(12-13), utilizando instrumentos como o Inventário de Atitudes em relação à medicação(14), a Escala Global de Funcionamento Adaptativo(15), o Questionário de Saúde SF-36(16), o Perfil de Qualidade de Vida de Lancashire(17) e, também, instrumentos amplos criados ad hoc(18). A maioria desses estudos apresenta um problema prático e comum, que é a dificuldade para traduzir as avaliações para planos de atenção, e a obtenção de resultados de qualidade de vida, a partir da identificação das necessidades de apoio de uma pessoa, quer dizer, para levar do possível para além da realidade imediata. Isso é especialmente complexo na população objeto do estudo, se se considerar que, com muito mais frequência que em outros campos, se tem questionado a confiabilidade da percepção das pessoas afetadas(19), optando-se, então, por recolher a informação de familiares ou informantes chaves.

A escolha de um instrumento de avaliação é tarefa complexa. Nesse sentido, concorda-se, aqui, com aqueles que pensam que as ferramentas aplicáveis à população com doença mental devem cumprir os seguintes pré-requisitos: 1) ser apropriada para a população a ser estudada e para a fase da doença, e ter adequadas propriedades psicométricas; 2) refletir a multidimensionalidade do construto de qualidade de vida na doença mental (esquizofrenia etc.); 3) considerando que a CVRS é fenômeno subjetivo, incluir sempre o autorrelatório dos pacientes; 4) adaptar-se à vida dos pacientes e às habilidades cognitivas comprometidas; 5) ser consistente com o referencial teórico usado pelo investigador e 6) ser suficientemente sensível à mudança(20).

As abordagens anteriores dão margem para assinalar a Escala de Intensidade de Apoios SIS(5) como um dos instrumentos mais congruentes, com concepção atualizada da incapacidade e da qualidade de vida, proporcionando elementos objetivos sobre a intensidade de apoios requerida para atingir os objetivos pessoais, o que lhe dá vantagem sobre outros, ao permitir o planejamento de serviços.

Objetivo

Avaliar a aplicabilidade da Escala de Intensidade de Apoios (SIS) (versão espanhola), na população mexicana com doença mental severa (DMS).

Método

Desenho: trata-se de estudo analítico em três etapas. Na primera, realizou-se a análise e adequação semântica com especialistas profissionais e não profissionais. Na segunda, foram analisados os resultados do teste piloto, para se avaliar o comportamento dos itens da escala. Na terceira, aplicou-se o instrumento numa amostra mais ampla para determinar a confiabilidade das subescalas e da escala globalmente considerada.

Participantes: para a primeira fase do estudo foi escolhido um grupo de 11 profissionais, atendendo à variedade dos campos da saúde, sendo que, nesse subgrupo de profissionais, 36,4% eram enfermeiras, 27,3% psicólogos, 18,2% psiquiatras e 18,2% trabalhadores sociais. Nesse grupo, a média referente à experiência profissional era de 13,3 anos (dp=6,3 anos), 54,4% eram especialistas, 18,2% contavam com um mestrado ou eram técnicos, e 9,2% tinham licenciatura.

Na 2ª fase, escolheu-se o segundo subgrupo de participantes, formado por dois grupos focais, cada um deles composto, por sua vez, por 10 familiares de pessoas com doença mental severa. Oitenta por cento dos participantes eram mulheres e assistiram às reuniões mensais em algum desses grupos por 2 a 5 anos.

Para aplicação do teste piloto da escala SIS, escolheram-se, aleatoriamente, pessoas com doença mental severa (como é definida pelo NIMH, em 1987(21), e que, na classificação CIE-10(22), inclui os códigos F20-F22, F24, F25, F28-F31, F32.3, F33.3). Critérios adicionais para a seleção da amostra foram: duração da doença superior a dois anos; existência de disfunção moderada ou severa do funcionamento global (medido através do GAF - Global Assesment of Functioning 1987(23)), serem atendidos pelo serviço de consulta externa; idade entre 18 e 65 anos; contarem com atendimento clínico; participarem da consulta pelo menos duas vezes no ano 2008 e, que, no momento de aplicação do teste, estivessem acompanhadas por uma pessoa responsável pelo cuidado (cuidador primário), sem importar se existiam vínculos consanguíneos ou não. Os critérios de exclusão foram: existência de estado de agitação ou crise, e/ou que a pessoa com doença mental, ou os cuidadores primários, rejeitasse a participação no estudo.

Os participantes desse teste piloto foram 10 pessoas com doença mental, aos quais se aplicou a escala SIS adaptada. A idade média foi de 35 anos (dp=8,2), sendo 30% mulheres e 70% homens e, desses, 30% eram solteiros, 60% casados, 10% separados. Quanto à situação laboral, 40% encontravam-se inativos. Com respeito à educação, 30% tinha estudos primários completos ou incompletos, 40% ensino secundário completo ou incompleto, 20% bacharelado e 10% não havia estudado (10%). A pontuação média na GAF foi de 59,8 (dp=11,6). Quanto ao diagnóstico, predominava esquizofrenia paranóide crônica (80%), e 10% apresentavam transtorno afetivo bipolar ou transtorno mental e do comportamento secundário até disfunção cerebral. Na média, os participantes apresentavam 14,6 anos desde o aparecimento do primeiro surto da doença (dp=10,5).

Na 3ª fase, para aplicação do estudo numa amostra mais ampla, selecionaram-se pessoas com doença mental sob os mesmos critérios do teste piloto. A amostra desses participantes consistiu de 85 pessoas com doença mental crônica, com idade média de 38,28 anos (dp=11,75), dos quais 45,8% eram mulheres e 54,2% homens. Quanto ao estado civil, 61,5% encontravam-se solteiros, 21,9% casados, ou convivendo com seu companheiro, 16,7% separados e 2,1% viúvos. A pontuação média obtida na GAF foi de 59,84 (dp=11,60). Com respeito aos diagnósticos médicos, 73,3% tinham diagnóstico de esquizofrenia paranóide crônica, seguido de 12,6% com diagnóstico de transtorno afetivo bipolar, percentagens inferiores a 5% apresentavam diagnósticos de transtorno esquizóide afetivo, transtorno mental e do comportamento secundário até disfunção cerebral, ou depressão maior. A média de anos desde o primeiro surto da doença foi de 14,56 (dp=10,46), o número médio de internações hospitalares foi de 3,6 (dp=2,19), com média de 4,49 anos (dp=1,76) desde a última hospitalização.

Procedimento: o estudo foi realizado no Estado de San Luís Potosí, no México, região localizada a 363km ao nordeste da cidade do México. A população total é de 2.410.414 de habitantes, sendo 63% na região urbana e 37% rural(24).

O procedimento teve três fases. Na primeira, a escala SIS foi fornecida a um grupo de especialistas para que, numa primeira instância, avaliassem as possibilidades de uso dessa escala na população mexicana com doenças mentais severas. Ademais, solicitou-se que realizassem uma revisão da escala, identificando os itens que considerassem necessários para reformular, em sua totalidade ou em alguma das suas partes, por questões semânticas ou conceituais, de forma que a escala fosse compreensível para cuidadores, pacientes e profissionais.

Figura 1


As observações dos especialistas foram classificadas quanto à utilidade da escala, às suas possibilidades de aplicação e às sugestões sobre mudanças necessárias. Ao mesmo tempo, convocou-se o grupo de familiares, aos quais se solicitou ler junto com o investigador os itens de cada subescala. Com ambos os grupos, foram realizadas duas reuniões de 2 horas de duração cada uma e, com consentimento prévio, foram gravadas em áudio e digitadas, posteriormente, num processador de texto. As observações dos especialistas profissionais e a dos cuidadores familiares possibilitaram a construção de um roteiro de perguntas orientadoras. Esse roteiro foi fornecido, também, aos profissionais para que avaliassem, numa escala de 1 a 10, a coerência da pergunta com o item. Ademais, solicitou-se que anotassem suas sugestões ou perguntas alternativas para melhorá-lo. Depois desse processo, voltou-se a solicitar aos especialistas que avaliassem a semelhança dos itens adaptados com os originais.

Aplicou-se a escala, então, como teste piloto, sob os critérios de inclusão estabelecidos, a 10 pessoas, usando, para isso, os itens adaptados e o roteiro de perguntas orientadoras. A amostragem se realizou acessando os prontuários clínicos das pessoas atendidas nos Serviços de Saúde do Estado. O estudo foi previamente autorizado e teve como base a Lei Geral de Saúde em matéria de pesquisas em saúde, no Título Quinto, Capítulo Único, artigos 100 e 102(25), assim como nos princípios de beneficência e de não maleficência. Além disso, solicitou-se o consentimento informado aos participantes.

Concluída a análise do teste piloto, sem que fossem detectadas dificuldades para a compreensão e aplicação da escala no teste piloto, nem por parte do investigador nem dos participantes, procedeu-se à aplicação da amostra ampliada, para determinar a confiabilidade das subescalas e da escala considerada globalmente. Análises adicionais, omitidas no presente estudo, pemitiram caracterizar as necessidades de apoio dessa população.

Instrumentos

Para o presente estudo utilizaram-se dois instrumentos, a Escala de Intensidade de Apoios (SIS(5) e a Escala de Funcionamento Global (GAF)(23).

A escala SIS (escala de intensidade de apoios adaptada do original Supports Intensity Scale, American Association on Intellectual and Developmental Disabilities(26)) é instrumento que proporciona informação útil na identificação de perfis e da intensidade das necessidades de apoio. Além disso, essa medida pode servir para estruturar planos personalizados para aquelas pessoas com incapacidade intelectual, podendo representar diretiva para avaliar planos e programas estruturados com a informação derivada da sua aplicação. O instrumento consta de três seções (escala de necessidades de apoio, escala suplementar de proteção e defesa e escala de necessidades excepcionais de apoio médico e de conduta), e, ainda, coleta, previamente, os dados sociodemográficos da pessoa com incapacidade intelectual, do fornecedor de serviços e dos informantes que estão proporcionando a informação. Para medir a intensidade dos apoios, nas duas primeiras seções, conta-se com parâmetros que avaliam três dimensões, a saber: frequência, tempo e tipo de apoio requerido pela pessoa, com uma escala de 0 a 4. Com as pontuações totais, é possível obter um perfil de necessidades de apoio e/ou classificar a intensidade de apoio requerido. As escalas de avaliação são fornecidas pelo próprio manual da versão espanhola.

Escala de Avaliação de Funcionamento Global (GAF)(23)- de maneira complementar à escala SIS, aplicou-se a escala GAF, considerando que a sua pontuação é um dos critérios usados para classificar pessoas com doença mental, dentro do grupo de pessoas com doença mental severa. A GAF é o quinto eixo no sistema DSM. O propósito da escala é medir globalmente a gravidade da doença psiquiátrica, centrando-se no funcionamento social, psicológico e profissional do paciente; utiliza como ponto de corte a pontuação correspondente ao estado leve (70 ou menos) nos casos menos restritivos, ou moderado (inferior a 50) que indica importante severidade dos sintomas, com efeito grave no funcionamento e competência social.

Resultados

Os dados da primeira fase do estudo indicam que 18 itens (36,7%) foram modificados na sua redação. A média de semelhança com o original foi de 9,91, num máximo de 10 (dp=0,14). A pontuação média de semelhança obtida, para cada uma das escalas, foi em todos os casos superior a 9,5. A análise da coerência dos itens da SIS com o roteiro de perguntas orientadoras, gerado pelos familiares, indicou coerência média de 9,8 num máximo 10 (dp=0,4). A subescala C (atividades de aprendizagem ao longo da vida) obteve pontuação média inferior, com média de 9,6. Os resultados indicam, ainda, a conveniência, ao iniciar a aplicação da escala, de se definir o período de tempo ao qual se refere, especificando a necessidade de avaliar a pessoa em fases crônicas e não agudas, pois a natureza periódica das doenças mentais pode levar a sobrestimar as necessidades de apoio, durante os períodos de crise.

A análise das opiniões dos familiares foi coincidente com a dos especialistas quanto àquilo que a escala SIS pode ajudar, entre outras coisas, a introduzir o conceito de incapacidade dentro de um modelo social, no campo da doença mental. Quanto aos resultados globais, na Tabela 1 são apresentados os resultados.

Finalmente, quanto à aplicação da escala a uma amostra ampla, para determinar a confiabilidade das subescalas, foi feita a replicação do procedimento seguido pelos autores da adaptação da escala(5). Procedeu-se, em primeiro lugar, à determinação do grau de relação da pontuação de cada subescala com a idade e o sexo das pessoas avaliadas. Em todos os casos, menos na correlação entre as necessidades de apoio de vida no lar e o sexo, as correlações foram inferiores a 0,20, denotando associação insignificante entre essas variáveis. Em consequência, nem a idade nem o sexo foram considerados relevantes na subsequente análise de consistência interna. Na Tabela 2, estão expostos os resultados derivados do cálculo da consistência interna de cada escala (coeficientes alfa de Cronbach), assim como as correlações entre as variáveis indicadas. Indicam-se, também, as correlações entre as subescalas e o total da SIS e as pontuações na GAF, para validação concomitante.

Discussão

Os resultados deste estudo avaliam a utilidade da SIS para determinar as necessidades de apoio de pessoas com doença mental severa, para posterior implementação de intervenções que ofereçam respostas a tais necessidades. Dito de outro modo, a escala SIS é instrumento que, com mínimas adequações na forma, pode ser usado para conhecer as necessidades e expectativas em pessoas com doença mental. A avaliação de aspectos relacionados à vida em geral da pessoa, dentro do seu contexto e não somente em relação à sua doença e aos sintomas da mesma, promove a integração e apresenta a evidente necessidade de acesso mais igualitário às oportunidades básicas esquecidas como educação, lazer, emprego, justiça etc.

A inclusão de itens que se referem não somente à situação atual da pessoa, mas também a situações hipotéticas em contextos possíveis, e às dimensões estabelecidas para sua medição (frequência, tempo e tipo) podem proporcionar dados concretos de utilidade para planejar e desenhar serviços no âmbito sanitário, e incentivar os cuidadores e os próprios pacientes a refletirem sobre alternativas de necessidades de atenção, em áreas que, de outra maneira, talvez nem sequer fossem consideradas.

A autoaplicação da escala SIS, no Estado de San Luis Potosí, México, é pouco factível, devido à falta de integração social das pessoas com doença mental severa, o que impede a obtenção de serviços básicos, levando-os à deterioração cognoscitiva emocional, reforçando sua exclusão social. Os resultados obtidos no grupo piloto mostram, com as necessárias precauções devido à reduzida amostra, que, inclusive dentro do grupo de pessoas com doença mental crônica com sintomas severos, é possível identificar capacidades e limitações. Concretamente, esse grupo ficou localizado, globalmente, no percentil 27 da escala, com comportamento homogêneo. nas seis subescalas avaliadas, identificando-se as maiores necessidades de apoio nas áreas de emprego e atividades sociais (percentil 37 para ambas), e aquela que registrou menores necessidades de apoio foi a subescala com referência à saúde e segurança (percentil 16), com a análise da amostra maior pode-se contextualizar e generalizar esses resultados, porém, e em todo caso, indicam claramente duas áreas que comumente são percebidas fora das possibilidades e necessidades desse coletivo.

Finalmente, a escala aplicada a um grupo mais numeroso de pessoas com doença mental apresenta adequadas propriedades psicométricas de confiabilidade, comparáveis às obtidas pelos autores da adaptação espanhola. Ditos resultados são, ademais, independentes da idade e gênero dos avaliados. Também, as correlações de intensidade média alta entre as pontuações na SIS e na GAF oferecem apoio à validade concorrente da medida.

Se bem é verdade que, nos últimos 5 anos, diversos artigos têm sido publicados no contexto da Enfermagem, abordando o tema de doença mental, esses são dirigidos, de forma predominante, à análise de serviços e modelos de saúde(27-29) ou à concepção da doença mental(30-31), centrados na qualidade dos serviços(32-33) e com carência de instrumentos que sintonizem os constructos de qualidade de vida, incapacidade e sistemas de apoio, e que, por sua vez, ofereçam ferramentas que permitam planejar a atenção e possibilitem atingir resultados pessoais. Nesse sentido, o instrumento aqui apresentado, para ser utilizado numa população com doença mental, pode possibilitar às enfermeiras obter dados concretos para planejar cuidados de forma integral.

Conclusões

Embora existam limitações no presente trabalho, derivadas do seu caráter de estudo piloto, os dados apoiam a utilidade conceitual e empírica da escala SIS para pessoas com doença mental crônica. Posteriores trabalhos permitirão comparar os resultados aqui obtidos.

Referências

  • 1. Schalock R. Quality of life. Conceptualization and measurement. Whasington,D.C.; 1996.
  • 2
    AAMR. Mental Retardation. Definition, classification and systems of support. 10th ed. Whasington, D.C.: American Association on Mental Retardation; 1992.
  • 3. Schalock R, Luckasson R, Shogren K. El nuevo concepto de retraso mental: comprendiendo el cambio al término discapacidad intelectual. Siglo Cero: Rev Espańola sob Discapacidad Intelectual. 2007; 38(224):5-20.
  • 4. AAIDD. Intellectual disability: Definition, Classification, and Systems of Supports. 11th ed. Washington, DC: American Association on Intelectual and Developmental Disabilities; 2010.
  • 5. Verdugo M, AriasB, Ibańez A. Escala de Intensidad de Apoyos. Manual (adaptación espańola del original: Supports Intensity Scale). Salamanca: INIC; 2007.
  • 6. Verdugo M. Análisis de la definición de discapacidad intelectual de la asociación americana sobre retraso mental de 2002. Siglo Cero: Rev Espańola sob Discapacidad Intelectual. 2003; 34(205):5-19.
  • 7. López M, Marín A, y de la parte J. La planificación centrada en la persona, una metodología coherente con el respeto al derecho de autodeterminación. Siglo Cero: Rev Espańola sob Discapacidad Intelectual. 2004; 35(210):45-55.
  • 8. Laviana-Cuetos M. La atención a las personas con esquizofrenia y otros trastornos mentales graves desde los servicios públicos: una atención integral e integrada en un modelo comunitario. Apuntes Psicol 2006;24(1-3):345-73.
  • 9. Schalock R. La nueva definición de discapacidad intelectual, los apoyos individuales y los resultados personales. Mejorando resultados personales para una calidad de vida. Salamanca: Amarú; 2009.
  • 10. Schalock R, Verdugo M, Bonham G, Fantova F, Van-Loon J. Enhancing Personal Outcomes: Organizational Strategies, Guidelines, and Examples. J Policy Practice Intellectual Disabil. 2008; 5(1):18-28.
  • 11. Eack S, Newhill C. Psychiatric Symptoms and Quality of Life in Schizophrenia: A Meta-Analysis. Schizophrenia Bull. 2007; 33(5):1225-37.
  • 12. Eack S, Newhill C, Anderson C, Rotondi A. Quality of life for persons living with schizophrenia: more than just symptoms Psychiatr Rehabil J. 2007; 30(3):219-22.
  • 13. Núńez D, Acuńa F, Rojas G, Vogeln E. Construcción y validación inicial de un cuestionario para medir calidad de vida en pacientes esquizofrénicos. Rev Chilena Neuro-psiquiatría. 2007; 45(2):148-60.
  • 14. Hamann J, Cohen R, Leucht S, Busch R, Kissling W. Do Patients With Schizophrenia Wish to Be Involved in Decisions About Their Medical Treatment? Am J Psychiatry 2005; 162:2382-4.
  • 15. Hay P, Katsikitis M, Begg J, Da Costa J, Blumenfeld N. A Two-Year Follow-Up Study and Prospective Evaluation of the DSM-IV Axis V. Psychiatr Serv. 2003; 54(7):1028-30.
  • 16. Nasrallah H, Duchesne I, Mehnert A, Janagap C, Eerdekens M. Health-related quality of life in patients with schizophrenia during treatment with long-acting, injectable risperidone. J Clin Psychiatry. 2004; 65(4):531-6.
  • 17. Lafuente S, Francisco J, Criado I, Covarrubias C. Desinstitucionalización y calidad de vida en pacientes esquizofrénicos. El caso de Segovia. Rev Asoc Esp Neuropsiq. 2007; 27(100):319-33.
  • 18. Ruiz M, Núńez J, Jódar R, Meana R. Calidad de vida y esquizofrenia. Estudio realizado con la población perteneciente a las Asociaciones de Salud Mental de la Comunidad Autónoma de Madrid. Madrid: Obra Social Caja Madrid; 2008.
  • 19. Goodman M, Smith T. Measuring Quality of Life in Schizophrenia. Psychiatr Mental Health J. [Internet]. 1997. [acesso 20 março 2010]. Disponível em: http://www.medscape.com/viewarticle/430847_3
  • 20. Awad G. Calidad de vida en esquizofrenia. Conceptos y medidas para la práctica clínica. Rev Psiquiatría Uruguay 2008; 72(2):121-9.
  • 21. Bachrach L. Defining Chronic Mental Illness: A Concept Paper. Hosp Communi Psychiatry. 1988; 39:383-8.
  • 22. OMS. Clasificación estadística internacional de enfermedades y problemas relacionados con la salud. - 10a. revisión Washington, D.C; 1994.
  • 23
    APA. DSM IV. Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales. Barcelona: American Psychiatric Association; 2003.
  • 24. INEGI. XII Censo General de Población y Vivienda 2000. México: Instituto Nacional de Estadistica,Geografia e Informática; 2000.
  • 25. CAMARA DE DIPUTADOS H. Ley General de salud. México: Diario Oficial de la Federación; 1984.
  • 26. Thompson J, Bryant B, Campbell E, Craig E, Hughes C, Rotholz D, Silverman W, Tasse M, Wehmeyer M. Supports Intensity Scale. Washington, DC: American Association on Intellectual and Developmental Disabilities; 2004.
  • 27. Bręda M, Rosa W, Pereira MAO, Scatena MCM. Duas estratégias e desafios comuns: a reabilitaçăo psicossocial e a saúde da família. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2005;13(3):450-2.
  • 28. Lussi I, Pereira MAO, Pereira J. A proposta de reabilitaçăo psicossocial de Saraceno: um modelo de auto-organizaçăo? Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(3):448-56.
  • 29. Zerbetto SR, Pereira MAO. O trabalho do profissional de nível médio de enfermagem nos novos dispositivos de atençăo em saúde mental. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2005; 13(1):112-7.
  • 30. Osinaga VLM, Furegato ARF, Santos JLF. Concepts of mental health and care according to mentally-ill patients and their relatives. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2005; 13(3):332-8.
  • 31. Kirschbaum DIK. Concepçőes produzidas pelos agentes de enfermagem sobre o trabalho em saúde mental com sujeitos psicóticos em um centro de atençăo psicossocial. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009; 17(3):368-73.
  • 32. Osinaga VLM, Furegato ARF, Santos JLF. Usuários de tręs serviços psiquiátricos: perfil e opiniăo. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2007; 15(1).
  • 33. Koga M, Furegato ARF, Santos JLF. Opiniőes da equipe e usuários sobre a atençăo ŕ saúde mental num programa de saúde da família. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2006;14(2):163-9.
  • Corresponding Author:
    Ma. del Carmen Pérez Rodríguez
    Universidad Autónoma de San Luis Potosí. Facultad de Enfermería.
    Av. Niño Artillero No.130
    Zona Universitaria
    78400 San Luis Potosi, México
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      23 Jul 2009
    • Aceito
      24 Maio 2010
    Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
    E-mail: rlae@eerp.usp.br