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Teoria transcultural na assistência de enfermagem às mulheres com infecções

RESUMO

Objetivo:

Analisar como o enfermeiro considera, na sua assistência de saúde, o contexto sociocultural da mulher com infecção sexualmente transmissível.

Método:

Pesquisa qualitativa, realizada em outubro de 2017, com dez enfermeiros atuantes em equipes da Estratégia de Saúde da Família. A coleta ocorreu por meio de entrevistas semiestruturadas, posteriormente transcritas e submetidas à organização apoiada na técnica do Discurso do Sujeito Coletivo e analisadas segundo a teoria transcultural de Madeleine Leininger.

Resultados:

Os enfermeiros identificaram os aspectos socioculturais de mulheres com infecções sexualmente transmissíveis e reconheceram a presença de fatores influenciadores: tecnológicos, religiosos, econômicos, políticos e legais, de parentesco e sociais, valores culturais e modos de vida.

Considerações finais:

Verificou-se que a realização do cuidado pelos enfermeiros da Atenção Primária à Saúde se aproxima dos aspectos socioculturais dessas mulheres, quando consideram as crenças e os valores de cada indivíduo, sobretudo no contexto de vida e de suas experiências de cuidado.

Descritores:
Doenças Sexualmente Transmissíveis; Mulheres; Profissionais de Enfermagem; Teoria de Enfermagem; Enfermagem Transcultural

ABSTRACT

Objective:

To analyze how nurses consider, in their practice of healthcare, the sociocultural context of women with sexually transmitted infections.

Method:

Qualitative research, carried out in October 2017, with ten nurses working in teams of the Estratégia de Saúde da Família (Family Health Strategy). The data were collected through semi-structured interviews, subsequently transcribed, and submitted to the organization supported by the Discourse of the Collective Subject method and analyzed according to Madeleine Leininger’s transcultural theory.

Results:

Nurses identified the sociocultural aspects of women with sexually transmitted infections and recognized the presence of influencing factors: technological, religious, economic, political, and legal, kinship and social, cultural values, and lifeways.

Final Considerations:

The study found that the provision of care by nurses in Primary Health Care is close to the sociocultural aspects of these women when considering the beliefs and values of each individual, especially regarding the life context and their care experiences.

Descriptors:
Sexually Transmitted Diseases; Women; Nursing professionals; Nursing Theory; Transcultural Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Analizar como el enfermero considera, en su asistencia de salud, el contexto sociocultural de la mujer con infección sexualmente transmisible.

Método:

Investigación cualitativa, realizada en octubre de 2017, con diez enfermeros actuantes en equipes de la Estrategia de Salud de la Familia. La recogida ocurrió por medio de entrevistas semiestructuradas, posteriormente transcritas y sometidas a la organización apoyada en la técnica del Discurso del Sujeto Colectivo y analizadas segundo la teoría transcultural de Madeleine Leininger.

Resultados:

Los enfermeros identificaron los aspectos socioculturales de mujeres con infecciones sexualmente transmisibles y reconocieron la presencia de factores influyentes: tecnológicos, religiosos, económicos, políticos y legales, de parentesco y sociales, valores culturales y modos de vida.

Consideraciones finales:

Se ha verificado que la realización del cuidado por los enfermeros de la Atención Primaria a la Salud se acerca de los aspectos socioculturales de esas mujeres, cuando consideran las creencias y los valores de cada individuo, sobretodo en el contexto de vida y de sus experiencias de cuidado.

Descriptores:
Enfermedades Sexualmente Transmisible; Mujeres; Profesionales de Enfermería; Teoría de Enfermería; Enfermería Transcultural

INTRODUÇÃO

As infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) estão entre os problemas de saúde reprodutiva, referindo-se em particular à transmissão vertical e problemas de fertilidade(11 World Health Organization Global health sector strategy on sexually transmitted infections 2016-2021 [Internet]. 2016[cited 2018 Jul 07]. Available from: http://www.who.int/reproductivehealth/publications/rtis/ghss-stis/en/
http://www.who.int/reproductivehealth/pu...
). No Brasil, em 2016, foram notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) 37.884 casos de infecção pelo HIV, sendo 3.912 (10,3%) casos na região Norte, 7.693 (20,3%) casos no Nordeste, 2.832 (7,5%) no Centro-Oeste, 15.759 (41,6%) no Sudeste e 7.688 (20,3%) no Sul(22 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde; Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais Boletim Epidemiológico HIV AIDS 2017 [Internet]. Editora do Ministério da Saúde. 2017. [cited 2018 Jul 07]. Available from: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-hivaids-2017
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
). Nos últimos cinco anos, observou-se um constante aumento no número de casos de sífilis adquirida, sífilis congênita e sífilis em gestante(33 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde - Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das ISTs, do HIV/Aids e das Hepatites Virais Boletim Epidemiológico Sífilis 2017 [Internet]. Editora do Ministério da Saúde. 2017[cited 2018 Oct 04]. Available from: http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/boletim-epidemiologico-de-sifilis-2017
http://www.aids.gov.br/pt-br/pub/2017/bo...
).

Estudo realizado no primeiro centro de saúde da América Latina, em São Paulo, no período de 2013 a 2015, constatou que as ISTs predominaram no sexo masculino, em adultos jovens, de raça branca, com elevado nível de escolaridade e, principalmente, entre os heterossexuais(44 Marchezini RMR, Oliveira DAM, Fagundes LJ, Ciosak SI. Sexually transmitted infections in specialized service: who they are and who has them?. Rev Enferm UFPE. 2018; 12(1):137-49. doi: 10.5205/1981-8963-v12i01a25088p137-149-2018
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), embora alguns estudos demonstrem um processo de feminização(55 Pinho AA, Cabral CS, Barbosa RM. Diferenças e similaridades entre mulheres que vivem e não vivem com HIV: aportes do estudo GENIH para a atenção à saúde sexual e reprodutiva. Cad Saúde Pública. 2017;33(12):e00057916. doi: 10.1590/0102-311x00057916
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). Verifica-se, nos serviços de saúde, um maior aumento da procura pelas mulheres com problemas de ISTs, havendo maior prevalência em idade fértil entre 18 e 49 anos, infectadas por HPV, tricomoníase, sífilis e herpes genital(66 Farias IA, Silva DGKC. Estudo da prevalência de doenças sexualmente transmissíveis entre mulheres em idade fértil. Biota Amazônia. 2015;5(1):1.6. doi: 10.18561/2179-5746/biotaamazonia.v5n1p1-6
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).

Referente ao comportamento sexual de risco, na literatura, encontra-se uma maior prevalência da IST em mulheres de apenados devido ao maior número de parceiros, violência sexual, sexo por dinheiro ou sob efeito de álcool/drogas(77 Martins DC, Pesce GB, Silva GM, Fernandes CAM. Sexual behavior and sexually transmitted diseases among the female partners of inmates. Rev Latino-Am Enfermagem. 2018; 26:e3043. doi: 10.1590/1518-8345.2568.3043
https://doi.org/10.1590/1518-8345.2568.3...
). As mulheres negras também parecem apresentar alta vulnerabilidade às ISTs, HIV/Aids, e as hipóteses explicativas para isso são as desigualdades socioeconômicas e o racismo institucional(88 Santo NJS. To be black and woman: dual vulnerability to STD/HIV/AIDS. Saúde Soc. 2016; 25(3):602-618. doi: 10.1590/s0104-129020162627
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). A vulnerabilidade à transmissão de IST, também, encontra-se em especial em adolescentes e estão associadas a determinantes sociais, que envolvem a necessidade de hábitos de conversar sobre sexualidade, integração entre pais e profissionais de saúde, acesso à internet e considerar o consumo de álcool(99 Fontes MB, Cribelaro RC, Scartezini AM, Lima DD, Garcia AA, Fujioka RT. Determinant factors of knowledge, attitudes and practices regarding STD/AIDS and viral hepatitis among youths aged 18 to 29 years in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva . 2017; 22(4):1343-52. doi: 10.1590/1413-81232017224.12852015
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).

Diante do exposto, as vulnerabilidades ou os fatores apresentados pelas mulheres com IST devem ser considerados no contexto da equipe de saúde, na Atenção Primária à Saúde, sobretudo pelo enfermeiro que realiza o cuidado às ISTs em diversos ambientes e tem como foco principal: a triagem, a educação, o aconselhamento em saúde e o escopo da prática de enfermagem. Apesar disso, quando a enfermagem não trabalha com todo o escopo para o cuidado de saúde inerente às ISTs, pode apresentar limitação da pesquisa relativa à investigação do contexto da prática e não atender às necessidades dos pacientes(1010 Bungay V, Handlovsky I, Phillips JC, Prescott C. A scoping review of the literature on nursing practices with persons seeking care for sexually transmitted infections. J Clin Nurs. 2017;26(1-2):33-8. doi: 10.1111/jocn.13561
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).

As dificuldades apresentadas na abordagem da sexualidade pelas enfermeiras foram identificadas nos roteiros construídos durante a sexualidade na infância/adolescência, no processo de formação e na interface sexualidade-cuidado. Esses estereótipos e os obstáculos estão imbricados no aconselhamento, quando se limitam a orientações sobre práticas de prevenção de IST/HIV, diante do reduzido número de acesso desses usuários ao serviço de saúde(1111 Santos SMP, Freitas JLS, Freitas MIF. Roteiros de sexualidade construídos por enfermeiros e a interface com a atenção em infecções sexualmente transmissíveis/HIV. Esc Anna Nery. 2019;23(4):e20190078. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0078p
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-1212 Barbosa TLA, Gomes LMX, Holzmann APF, De Paula AMB, Haikal DSA. Aconselhamento em doenças sexualmente transmissíveis na atenção primária: percepção e prática profissional. 2015; 28(6):531-8. doi: doi:10.1590/1982-0194201500089
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).

Salienta-se que os fatores socioculturais influenciam a aquisição de conhecimento sobre IST, com implicações importantes para a prevenção, tratamento e estigmatização da doença, especialmente em grupos etários mais velhos(1313 Dalrymple J, Booth J, Flowers P, Hinchliff S, Lorimere K. Socio-cultural influences upon knowledge of sexually transmitted infections: a qualitative study with heterosexual middle-aged adults in Scotland. Reprod Health Matt. 2016;(24):34-42. doi: 10.1016/j.rhm.2016.10.003
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). Sendo assim, tem-se a necessidade de que as construções culturais possam ser consideradas na formação profissional(1111 Santos SMP, Freitas JLS, Freitas MIF. Roteiros de sexualidade construídos por enfermeiros e a interface com a atenção em infecções sexualmente transmissíveis/HIV. Esc Anna Nery. 2019;23(4):e20190078. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0078p
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)e impliquem qualidade na priorização do atendimento dos casos, com maior preparo e segurança na comunicação dos resultados dos exames, sigilo e privacidade(1212 Barbosa TLA, Gomes LMX, Holzmann APF, De Paula AMB, Haikal DSA. Aconselhamento em doenças sexualmente transmissíveis na atenção primária: percepção e prática profissional. 2015; 28(6):531-8. doi: doi:10.1590/1982-0194201500089
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). Logo, devem-se valorizar os contextos da população assistida, sobretudo das mulheres com IST que cotidianamente buscam o cuidado na Atenção Primária à Saúde.

Dessa perspectiva, os aspectos como modo de viver, comportamentos e hábitos representam parte integrante da cultura de cada indivíduo. Eles influenciam as práticas de saúde, incluindo a área de conhecimentos e práticas da enfermagem que são focalizados na teoria da diversidade e universalidade do cuidado cultural (TDUCC), de Madeleine Leininger. A teórica propõe o cuidado sob a ótica transcultural e holística, pois cada cultura tem a sua forma, seus padrões, expressões e estruturas para conhecer, explicar e predizer o estado de bem-estar. Baseia-se em três principais aspectos: 1) Preservação cultural do cuidado; 2) Acomodação cultural do cuidado; 3) Reestruturação do cuidado cultural. Na sua aplicação, o enfermeiro considera os indivíduos, famílias ou grupos ativamente envolvidos no processo de cuidar e, desse modo, evita as práticas de saúde culturalmente impositivas(1414 McFarrland MM, Wehbe-Alamah H. Leininger´s Culture care diversity and university: a worldwide nursing theory. Canadá: Jones and Bartlett’s Publishers Inc; 2005.).

Portanto, observa-se a necessidade de que o enfermeiro identifique os fatores socioculturais imbricados no processo saúde-doença da mulher na sua contemporaneidade, de maneira que desenvolva o cuidado ao mesmo tempo que identifique como este é recebido e aceito pela usuária. Assim, surge o seguinte questionamento: Como o enfermeiro considera os fatores socioculturais na sua assistência de saúde às mulheres com IST?

OBJETIVO

Analisar como o enfermeiro considera, na sua assistência de saúde, o contexto sociocultural da mulher com IST.

MÉTODOS

Aspectos éticos

A pesquisa seguiu os preceitos éticos vigentes na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, que se fundamenta nas diretrizes internacionais sobre pesquisas envolvendo seres humanos. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Regional do Cariri. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em duas vias. Para garantir o anonimato, os participantes foram codificados por pseudônimos formados pela letra “E” (enfermeiro) seguida de algarismos arábicos de 1 a 10, de acordo com a ordem da entrevista (E1, E2… E10).

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa. É um recorte do trabalho monográfico intitulado “Empoderamento e autonomia das mulheres com IST: percepção e cuidados de enfermagem à luz da teoria de Madeleine Leininger”, do curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Regional do Cariri (URCA).

Referencial teórico

Utilizou-se como referencial a teoria da diversidade e universalidade do cuidado cultural (TDUCC), proposta por Madeleine Leininger. Identificaram-se os seguintes aspectos da teoria nos discursos: fatores influenciadores (fatores de parentesco e sociais, valores culturais e modos de vida), fatores religiosos, econômicos, tecnológicos, políticos e legais e fatores educacionais(1414 McFarrland MM, Wehbe-Alamah H. Leininger´s Culture care diversity and university: a worldwide nursing theory. Canadá: Jones and Bartlett’s Publishers Inc; 2005.). Eles repercutem na produção do cuidado da família e dos profissionais de saúde.

Cenário do estudo

O estudo foi realizado em Unidades Básicas de Saúde (UBS) com Estratégia Saúde da Família (ESF) em um município da região sul do estado do Ceará, Brasil, que contava com uma população de 268.248 habitantes, 69 ESFs, sendo 63 urbanas e 6 rurais. Destaca-se que, no período do estudo, 88,74% da população era coberta pela ESF(1515 Ministério da Saúde (BR). Departamento de Atenção Básica. Cobertura da Atenção Básica [Internet]. 2018 [cited 2018 Mar 10]. Available from: https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml[Links]
https://egestorab.saude.gov.br/paginas/a...
).

Coleta e organização dos dados

A coleta ocorreu no mês de outubro de 2017. O município possuía 67 equipes de Estratégia de Saúde da Família; foram visitadas as 27 equipes mais próximas da sede, por permitir maior acesso e menor risco para a pesquisadora, tendo em vista o período de coleta. Após abordagem com os enfermeiros da ESF, dez atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ser profissional da ESF e ter atendido pelo menos uma mulher com IST na UBS. Foram critérios de exclusão: estar em férias ou em afastamento do trabalho no período da coleta de dados (uma), dificuldade de agendar a entrevista após três tentativas (duas) e não permitir a gravação das entrevistas (duas).

Utilizou-se a entrevista semiestruturada, com questões sobre o perfil socioeconômico e de formação dos profissionais, bem como a seguinte questão norteadora: Durante o seu atendimento às mulheres com IST, você leva em consideração o contexto sociocultural no tratamento? Como isso é realizado?

As entrevistas foram realizadas individualmente em ambiente reservado nas próprias UBSs, com duração média de 15 minutos. Foram gravadas em um aparelho smartphone e transcritas na íntegra. Ressalta-se que foi identificada certa redundância ou repetição nas falas dos entrevistados, de tal maneira que essa condição definiu a suspensão de inclusão de novos participantes, conforme a orientação posta na definição de saturação teórica(1616 Rhiry-Cherques RH. Saturação em pesquisa qualitativa: estimativa empírica de dimensionamento. Af-Rev PMKT[Internet]. 2009[cited 2020 Mar 26];4(08):20-7. Available from: http://www.revistapmkt.com.br/Portals/9/Edicoes/Revista_PMKT_003_02.pdf
http://www.revistapmkt.com.br/Portals/9/...
).

Análise dos dados

As entrevistas foram transcritas integralmente e organizadas por meio da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Trata-se de um discurso-síntese, elaborado a partir de fragmentos de discursos semelhantes, organizado por meio de técnica de tabulação de dados que agrega depoimentos sem reduzi-los às quantidades(1717 Lefevre F, Lefevre AMC. Discourse of the collective subject: social representations and communication interventions. Texto Contexto Enferm [Internet] 2014 [cited 2018 Jun 20]; 23 (2):502-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v23n2/0104-0707-tce-23-02-00502.pdf
http://www.scielo.br/pdf/tce/v23n2/0104-...
). Para isso, realizou-se a transcrição integral do conteúdo das entrevistas; reconhecimento e recorte dos trechos dos depoimentos com maior conteúdo semântico, denominados Expressões-Chave (ECH); identificação das Ideias Centrais (IC); nomeação de categorias e categorização das Expressões-Chave de acordo com semelhança de conteúdo semântico.

RESULTADOS

Participaram do estudo dez enfermeiros, sendo nove do sexo feminino e um do sexo masculino, com idade entre 24 a 52 anos; a maioria, com estado civil “casado”. Quanto à cor/raça, seis enfermeiros se autodeclararam da cor parda, três da cor branca e um da cor negra. Em relação ao tempo de formação, seis estavam com mais de dez anos; dois enfermeiros, entre cinco a dez anos; e dois, com menos de cinco anos. Oito realizaram algum curso com abordagem em IST ou saúde da mulher após a graduação. Nove possuíam algum curso de especialização, e um estava com o curso em andamento.

As falas foram organizadas por meio do DSC, do qual revelaram-se sete Ideias Centrais (IC) apresentadas no Quadro 1. Os discursos emergidos foram analisados considerando os fatores influenciadores apontados na teoria de Leininger.

Quadro 1
Discurso do sujeito coletivo de enfermeiros sobre o contexto sociocultural das mulheres com infecção sexualmente transmissível, Crato, Ceará, Brasil, 2017

No tocante às considerações dos enfermeiros, estes reconhecem os aspectos sociais e culturais das mulheres com IST atendidas na ESF, bem como o adequado diagnóstico, vínculo, comunicação efetiva e adesão ao tratamento. Também, utilizam-se dos princípios de equidade e integralidade para atender às vulnerabilidades dessas mulheres. A visualização dos fatores influenciadores da teoria de Leininger interfere direta ou indiretamente no cuidado de enfermagem às mulheres com IST, fornecendo subsídios e ponto de partida para a elaboração de um cuidado culturalmente congruente (Figura 1).

Figura 1
Modelo Sunrise - Identificação dos fatores influenciadores das mulheres com infecções sexualmente transmissíveis

DISCUSSÃO

Neste estudo, a análise de como o enfermeiro considera o contexto sociocultural da mulher com IST, na sua assistência de saúde, apontou os fatores influenciadores, que devem ser percebidos no planejamento do cuidado cultural e considerados no cotidiano do processo de trabalho, evidenciando a importância de se abordar a TDUCC.

A comunicação efetiva foi uma preocupação dos enfermeiros da ESF, reconhecida como fator educacional influenciador na abordagem à mulher, pela necessidade de considerar o seu grau de instrução e compreensão, no sentido de alcançar a comunicação efetiva e possibilitar o cuidado culturalmente congruente. A comunicação efetiva se mostra uma ferramenta útil para promover melhor adesão ao tratamento e otimizar os cuidados de enfermagem(1414 McFarrland MM, Wehbe-Alamah H. Leininger´s Culture care diversity and university: a worldwide nursing theory. Canadá: Jones and Bartlett’s Publishers Inc; 2005.). Nesse sentido, conhecer o grau de instrução do cliente perpassa por orientações mais compreensíveis, que impactam positivamente o processo saúde-doença.

Estudo indicou que a prática de aconselhamento sobre IST por parte de médicos e enfermeiros foi considerada relevante, pois estava inserida no planejamento familiar e nas atividades escolares. Contudo, diferentemente do exposto aqui, centrava-se em parâmetros biológicos e limitava-se às ações pontuais de orientação e prevenção de doenças. Foi detectada pouca procura ao serviço e fragilidade na comunicação, manutenção do sigilo e da privacidade dos usuários(1818 Campos C. A comunicação terapêutica enquanto ferramenta profissional nos cuidados de enfermagem. Rev Serv Psiquiatr Hosp Prof Dr Fernando Fonseca, EPE. 2017;15(1):91-101. doi: 10.25752/psi.9725
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).

As interferências sociais e culturais no diagnóstico foram apresentadas como resultado da falta de acesso à informação de boa qualidade, devido à busca de cuidado e tratamentos de saúde em seu contexto social. Os fatores de parentesco e sociais permitem que isso aconteça, pois é concedida a possibilidade de um tratamento alternativo na comunidade, contribuindo para as dúvidas mencionadas ou conceitos preestabelecidos sobre a doença. Essa realidade também foi identificada em estudo realizado na Itália sobre o estado da saúde sexual e necessidades reprodutivas de adolescentes. Constatou-se que apresentavam sinais e sintomas avançados da IST e tratamentos realizados na comunidade. Essa condição relacionava-se ao despreparo destes no contexto da educação em saúde sexual, que necessita de conscientização sobre o tema ainda na idade escolar, para que possa repercutir no comportamento adequado, no interesse individual e de toda a coletividade(1919 Drago F, Ciccarese G, Zangrillo F, Gasparini G, Cogorno L, Riva S. et-al. A survey of current knowledge on sexually transmitted diseases and sexual behaviour in Italian Adolescents. Int J Environ. Res Public Health. 2016;13(4):422. doi: 10.3390/ijerph13040422
https://doi.org/10.3390/ijerph13040422...
).

Outro estudo internacional, realizado entre adultos de meia-idade no Reino Unido, também apontou a influência de fatores sociais e culturais no conhecimento sobre a IST ao longo da vida, que refletem na continuação da estigmatização, comprometem a identificação dos sintomas, da prevenção e, consequentemente, do diagnóstico precoce e tratamento(1313 Dalrymple J, Booth J, Flowers P, Hinchliff S, Lorimere K. Socio-cultural influences upon knowledge of sexually transmitted infections: a qualitative study with heterosexual middle-aged adults in Scotland. Reprod Health Matt. 2016;(24):34-42. doi: 10.1016/j.rhm.2016.10.003
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).

No presente estudo, o vínculo estabelecido pelo enfermeiro com a população da sua área de abrangência ao longo do tempo permitiu um cuidado mais direcionado, bem como auxílio no intuito de minimizar os atritos entre o casal/profissional de saúde, por se tratar de um problema íntimo que é permeado por questões culturais. Assim, foram considerados os diversos fatores e a forma de se comunicar para estabelecer o melhor manejo do caso. Essa interface e as contribuições da diversidade cultural na enfermagem agregaram valor ao cuidado, por permitirem reconhecer o diálogo, o respeito entre as civilizações e as culturas para promoção da equidade na assistência de saúde(2020 Fontana R. A interculturalidade na formação dos profissionais de enfermagem. Rev Contexto Educ. 2019; 34(109):36-51. doi: 10.21527/2179-1309.2019.109.36-51
https://doi.org/10.21527/2179-1309.2019....
).

Entende-se que o conhecimento dos fatores culturais das mulheres com IST pressupõe o diálogo aberto e escuta sensível do enfermeiro. Estudo realizado em uma universidade dos Estados Unidos refere que os profissionais de saúde — em especial, os enfermeiros — devem abordar atitudes e comportamentos culturais específicos para o controle de ISTs, pois podem influenciar a exposição a elas, principalmente ao HPV(2121 Thomas TL, Yarandi HN, Dalmida SG, Frados A, Klienert K. Cross-Cultural Differences and Sexual Risk Behavior of Emerging Adults. J Transcult Nurs. 2015; 26(1):64-72. doi: 10.1177/1043659614524791
https://doi.org/10.1177/1043659614524791...
). Nesse sentido, os aspectos culturais determinam os comportamentos dos indivíduos, e, para contemplar a diversidade cultural, as formas de atuação da equipe da ESF devem ser o foco do cuidado.

Neste estudo, na IC “equidade e integralidade” no atendimento, viu-se que os enfermeiros fizeram referências aos fatores tecnológicos (tecnologias em saúde indisponíveis), econômicos, políticos e legais no atendimento das mulheres com IST e, na tentativa de garantir a integralidade do cuidado, buscaram encaminhá-las ao serviço secundário. Todavia, diante da dificuldade de acesso, as mulheres procuraram o serviço privado. Na literatura, a necessidade do olhar da equidade e integralidade em relação ao cuidado de pessoas com IST é retratada no acompanhamento de pessoas com HIV/aids, no nível de Atenção Primária e Secundária, a fim de possibilitar o acesso e a qualidade no cuidado, o que ainda apresenta desafios de ordem moral, ética, técnica, organizacional e política(2222 Melo EA, Maksud I, Agostini R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica. 2018;42:e151. doi: 10.26633/RPSP.2018.151
https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.151...
). Ainda é um desafio manter serviços de saúde com qualidade e equidade, sendo esta última necessária para garantir o fluxo do atendimento imediato de mulheres com IST nos serviços secundários.

A dificuldade em garantir a integração dos serviços de saúde no contexto das ISTs foi identificada em estudo de revisão sistemática, que revelou modelos de integração dos serviços de IST aos serviços de pessoas vivendo com o vírus da imunodeficiência humana (HIV). Tratou também da necessidade de abordagem centrada nas pessoas, na igualdade de gênero e na equidade em saúde com vistas à melhoria da acessibilidade e informação, bem como tratamento em longo prazo para uma melhoria da prestação de serviços no contexto das ISTs(2323 Kennedy CE, Haberlen SA, Narasimhan M. Integration of sexually transmitted infection (STI) services into HIV care and treatment services for women living with HIV: a systematic review. I. BMJ Open. 2017;21;7(6):e015310. doi: 10.1136/bmjopen-2016-015310
https://doi.org/10.1136/bmjopen-2016-015...
).

Na IC “Identificação do contexto socioambiental”, os enfermeiros percebem que as condições de moradia precárias e as relações estabelecidas com cônjuges usuários de drogas consistem em fatores que devem ser levados em consideração no atendimento; e são identificados no comportamento de risco às ISTs, como constatado no estudo com mulheres usuárias ou exusuárias de drogas injetáveis, na região Metropolitana de Santos(2424 Haiek RC, Martin D, Rocha FCM, Ramiro FS, Silveira DX. Injection drug use among women in Metropolitan Region of Santos, São Paulo state, Brazil. Physis. 2016; 26(3):917-937. doi: 10.1590/s0103-73312016000300011
https://doi.org/10.1590/s0103-7331201600...
). São casos de alta complexidade e vulnerabilidade presentes na prática da Atenção Primária à Saúde, que requerem competências do enfermeiro na abordagem, convocação, aconselhamento e tratamento dos cônjuges, na perspectiva de aumentar a equidade no acesso aos cuidados para saúde reprodutiva do casal.

Quanto à IC “Preservação do sigilo”, é necessário que os enfermeiros garantam confidencialidade das informações concedidas pelas adolescentes, colhendo informações importantes sobre as práticas sexuais ao mesmo tempo que construindo relação de confiança entre enfermeiro e cliente. Dessa forma, é possível conhecer o perfil de comportamentos sexuais das adolescentes e, assim, elaborar intervenções educacionais para essa população, com vistas à desconstrução de preconceitos e mitos, à prevenção de gravidez e IST, à informação sobre métodos contraceptivos, e consequentemente, à promoção da saúde sexual das adolescentes(2525 Ferreira JPT, Miranda T, Baroni ALLR. Conhecimento sobre as DST entre adolescentes escolares em Vespasiano, Minas Gerais. Rev. Adolesc. Saúde [Internet]. 2016 [cited 2019 Oct 06];13(Supl. 2):51-59. Available from: http://www.adolescenciaesaude.com/detalhe_artigo.asp?id=584#.
http://www.adolescenciaesaude.com/detalh...
).

No presente estudo, apontou-se a presença da figura materna durante o atendimento de enfermagem à adolescente. Diante dessa situação, utilizou-se como alternativa a consulta individualizada para favorecer a confiança e confidencialidade. O acolhimento de enfermagem ao adolescente na Atenção Primária à Saúde tem papel importante na educação sexual de adolescentes, pois os pais ainda têm dificuldade em falar sobre sexualidade ou o fazem superficialmente(2626 Nery IS, Feitosa JJM, Sousa AFL, Fernandes ACN. Approach to sexuality in the dialogue between parents and adolescents. Acta Paul Enferm. 2015; 28(3):287-92. doi: 10.1590/1982-0194201500048
https://doi.org/10.1590/1982-01942015000...
).

De forma semelhante, estudo desenvolvido nos Estados Unidos indicou a difícil comunicação entre pais e adolescentes no tocante à sexualidade, devido ao papel de educadores primários do tema para os filhos. Dentre os fatores que impedem o cumprimento desse papel educador, têm-se a falta de conhecimento, habilidades ou conforto. Nesse sentido, os pais podem receber incentivos advindos de profissionais de saúde, instituições educacionais e religiosas, mídia e educadores profissionais, visando maior compreensão sobre o assunto(2727 Breuner CC, Mattson G. AP Committee on adolescence, AAP Committee on psychosocial aspects of child and family health: sexuality education for children and adolescents. Pediatr. 2016;138(2):e20161348. doi: 10.1542/peds.2016-1348
https://doi.org/10.1542/peds.2016-1348...
).

Esse grupo etário apresenta prevalência de IST e requer rastreio e investimento continuado na educação, a fim de prevenir suas complicações tardias(2828 Sá MI, Silva MT, Almeida D, Vieira B, Lima T, Conde C. et-al. Infeções sexualmente transmissíveis e factores de risco nas adolescentes e jovens: dados de um Centro de Atendimento a Jovens. Nascer Crescer [Internet]. 2015 [cited 2019 Oct 09]; 24(2):64-9. Available from: http://www.scielo.mec.pt/pdf/nas/v24n2/v24n2a03.pdf
http://www.scielo.mec.pt/pdf/nas/v24n2/v...
). É nesse sentido que as ações de promoção de saúde sexual podem ocorrer, pois, quando se considera a participação da família, escolas e comunidade médica, pode-se conhecer a realidade desses jovens, tornando-se mais viável o compartilhamento de informações(2525 Ferreira JPT, Miranda T, Baroni ALLR. Conhecimento sobre as DST entre adolescentes escolares em Vespasiano, Minas Gerais. Rev. Adolesc. Saúde [Internet]. 2016 [cited 2019 Oct 06];13(Supl. 2):51-59. Available from: http://www.adolescenciaesaude.com/detalhe_artigo.asp?id=584#.
http://www.adolescenciaesaude.com/detalh...
).

A IC “Religiosidade versus tratamento” permitiu a identificação do discurso dos enfermeiros pautado na dificuldade existente entre a abordagem sexual e a resistência de realizar o tratamento das ISTs com as mulheres de práticas religiosas de cunho conservador. Os enfermeiros reconhecem que a religião tem influência na saúde sexual e sexualidade das mulheres; e que intervenções impositivas devem ser evitadas, sendo necessária uma assistência de enfermagem culturalmente congruente que repercuta em mudança de comportamento e adoção de estilo de vida mais saudável.

É preciso que os enfermeiros desenvolvam estratégias buscando o respeito de sua fé e crença, mas aliando-as à prática de promoção da saúde e prevenção de IST. Estudo com um grupo de jovens de baixo nível socioeconômico, no Brasil, encontrou associação da religiosidade com a diminuição das chances de iniciar a vida sexual(2929 Elder CS, Koller S. Sexual risk-taking behavior: the role of religiosity among poor brazilian youth. Universitas Psychol. 2016; 15(4):1-9. doi: 10.11144/Javeriana.upsy15-4.srbr
https://doi.org/10.11144/Javeriana.upsy1...
). O papel da religiosidade familiar e de estudantes que a praticam também esteve associada a uma menor probabilidade de se envolver em qualquer atividade sexual e em maior probabilidade de uso de preservativos. Apontou-se que a influência religiosa interfere positivamente no comportamento sexual de estudantes universitários(3030 Quinn DA, Lewin A. Family religiosity, parental monitoring, and emerging adults’ sexual behavior. Religions. 2019;10(2):114. doi: 10.3390/rel10020114
https://doi.org/10.3390/rel10020114...
).

Os fatores culturais relacionados aos cuidados exercem influência sobre as expressões humanas relativas à saúde, doença, bem-estar ou enfrentamento de morte e deficiências. A teoria intenciona, portanto, fornecer cuidados harmoniosos com as crenças, práticas e valores culturais individuais ou de grupo, consolidando o que a teórica conceitua por “cuidado culturalmente congruente”. Com isso, vislumbra-se a promoção da saúde, do bem-estar ou o auxílio no enfrentamento de deficiências, doenças ou morte de modo culturalmente significativo(1414 McFarrland MM, Wehbe-Alamah H. Leininger´s Culture care diversity and university: a worldwide nursing theory. Canadá: Jones and Bartlett’s Publishers Inc; 2005.).

Para tanto, faz-se necessária a construção desse cuidado com base no relacionamento enfermeiro-cliente, estabelecido com o objetivo de criar novo estilo de vida e cuidado para a saúde e bem-estar. Isso requer o uso de conhecimentos específicos dos profissionais, bem como adequações dos cuidados de enfermagem com base nos fatores culturais reconhecidos. Assim a competência do enfermeiro na atenção em IST e na inserção da sexualidade nas práticas do cuidado aponta a necessidade de investimento nos processos de formação profissional que rompam com o aprendizado pelo estereótipo, incorporem mudança de paradigma de saúde e considerem, sobretudo, as construções culturais e vulnerabilidades dos usuários(1111 Santos SMP, Freitas JLS, Freitas MIF. Roteiros de sexualidade construídos por enfermeiros e a interface com a atenção em infecções sexualmente transmissíveis/HIV. Esc Anna Nery. 2019;23(4):e20190078. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0078p
https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-20...
). A formação deve, ainda, se basear na comunicação eficaz e em práticas que envolvem os diferentes atores no planejamento de ações; na prevenção de erros e danos; e na perspectiva da prática do cuidado seguro(3131 Campelo CL, Sousa SMAS, Silvia LDC, Dias RS, Azevedo PR, Nunes FD. et-al. Patient safety culture and the cultural nursing care. Rev Enferm UFPE. 2018; 12(9):2500-6. doi: 10.5205/1981-8963-v12i9a235048p2500-2506-2018
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).

Notou-se, no presente estudo, que a abordagem dos aspectos culturais é mostrada de forma representativa pelos enfermeiros que atuam no cuidado às mulheres com IST. Eles reconhecem a interferência dos fatores culturais nos cuidados prestados, porém se sentem incapazes de proceder ao enfrentamento de problemas de caráter macrossocial.

Limitações do estudo

A principal limitação do estudo refere-se à impossibilidade de generalização de seus achados, o que é próprio do delineamento metodológico utilizado e da temática em questão, pois fatores culturais estão na dependência dos diferentes contextos. Ademais se captou a visão dos enfermeiros a respeito do cuidado à mulher com IST, havendo possibilidade de ampliação da pesquisa captando a visão das mulheres envolvidas nesse cuidado.

Destaca-se, porém, que os dados aqui discutidos viabilizaram a compreensão de importantes aspectos a serem introduzidos no planejamento de cuidados de enfermagem em outros contextos.

Contribuições para a área da Enfermagem

A TDUCC de Madeleine Leiniger contribuiu como aporte teórico para identificação dos fatores que a enfermagem, dentro da Atenção Primária à Saúde, deve considerar no contexto e no modo de viver de mulheres com IST. Da perspectiva do cuidado cultural, o enfermeiro da Atenção Primária à Saúde pode tanto identificar os fatores sociais, culturais e ambientais que envolvem essas mulheres quanto compreender seus padrões de cuidado. Tendo em vista o exposto, interessa à enfermagem conhecer as mulheres com IST para elaborar seu processo de trabalho culturalmente embasado e estabelecer práticas mais efetivas de cuidado. Conforme identificado, espera-se que os enfermeiros, além de incluírem a integralidade do cuidado, possam adaptar ações mais congruentes que sustentem a autonomia das mulheres com IST diante de suas vulnerabilidades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo identificou que os enfermeiros consideraram os fatores influenciadores tecnológicos, religiosos, econômicos, políticos e legais, de parentesco e sociais, valores culturais e modos de vida na atenção a mulheres com IST. Infere-se que, para prestar cuidado cultural de enfermagem, é necessário conhecer e considerar as crenças e valores de cada indivíduo, o que exige, dos profissionais, conhecimentos para além dos sinais e sintomas referidos.

Ressalta-se que o enfermeiro desenvolve sua assistência considerando ou não os fatores influenciadores que repercutirão (im)positivamente no cuidado e também em seus modos de decisão; e, uma vez ancorado no modelo proposto por Leininger, pode valorizar a diversidade de contextos culturais em que as mulheres com IST estão inseridas.

AGRADECIMENTO

Especial agradecimento para Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Capes, Brasil., pela concessão de bolsa para o Programa de Mestrado Acadêmico em Enfermagem da Universidade Regional do Cariri (URCA).

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Maria Isabel Salamanca

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2019
  • Aceito
    30 Abr 2020
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