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A Importância do Psicólogo na Criação e Implantação dos programas Educativos e de Prevenção em Saúde

The Importance of Psychologists in Planning and Developing Educational Programs in Health Prevention

Resumo:

Vários autores têm demonstrado a eficácia dos programas educativos para favorecer a adesão dos pacientes ao tratamento recomendado, visando educá-los e informá-los sobre suas patologias e propostas terapêuticas. A literatura mostra que não está definida a especificidade do psicólogo nessas atividades. Acreditamos que, além de poder transmitir informações a respeito do tratamento, esse profissional deve realizar também um diagnóstico da real situação do grupo-alvo e identificar conteúdos subjetivos que possam interferir no modo como esses pacientes lidam com sua doença e seu tratamento, propondo intervenções efetivas. Percebemos a necessidade da inserção específica do psicólogo na elaboração e execução de tais programas, o que permite considera-los como “psicoeducativos”, havendo propostas fundamentadas nesta direção.

Descritores:
Educação em saúde; Educação médica; Psicologia em saúde

Abstract:

Different studies have shown the efficacy of education program in promotion patient compliance with prescribed medical treatment. Such program aim to educate and inform patient about their disease and proposed treatment. According to the literature, the specificities of the psychologists role are not taken into account in these activities. We contend that beyond transmitting specific information, psychologists should perform the diagnosis of the target groups real situation, including identification of subjective content that might interfere in the way patient cope with disease and treatment. We also emphasize the psychologists importance in creating and developing such program, allowing them to be as “psycho-educational”. We also provide specific proposal in this direction.

Keywords:
Health education; Medical education; Behavioral medicine

INTRODUÇÃO

Os números relacionados à adesão de pacientes aos tratamentos são muito inferiores ao esperado e, por isso, o assunto tem sido estudado e discutido por diferentes profissionais da área de saúde.

A adesão pode ser definida, essencialmente, como a participação do paciente no tratamento proposto pelos profissionais de saúde, no que se refere tanto à freqüência às consultas como à alteração de hábitos e comportamentos que contribuam para a efetivação do tratamento.1 1 Definição criada em consenso pelo NEPP (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psicologia) da Divisão de Psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo em 14/08/98.

Em discussão sobre a magnitude do problema da adesão relacionada a todas as doenças crônicas, Sackett11. Sackett DL. The magnitude of compliance and non-compliance. In: Compliance with therapeutic regimens. Sackett DL and Haynes RB. Eds. Baltimore, The Johns Hopkins University Press, 1976:9-25. refere que os pacientes faltam às consultas de 20 a 50% das vezes e que cerca de 50% deles não tomam as medicações prescritas de acordo com as instruções. Quanto às mudanças de comportamento recomendadas, são ainda menos freqüentemente adotadas.

Smith22. Smith D. Compliance packaging: a patient education tool. American Pharmacy. 1989; 29,02 refere que 125 mil pessoas morrem por ano nos Estados Unidos devido à não adesão aos tratamentos recomendados. Afirma, ainda, que uma porcentagem significativa dos custos de hospitalização é devida a esta não adesão de pacientes, estima-se que aproximadamente US$ 1,000.00 são gastos com paciente não aderente e US$ 250,00 com aquele que adere ao tratamento.

Estes índices de não adesão estão relacionados a inúmeros fatores, entre os quais se destacam, entre outros: as dificuldades em assimilar as informações sobre a doença e o tratamento, a passividade do paciente, a relação que o médico estabelece com este e as dificuldades de modificar comportamentos e hábitos.

Frente a este alto índice de não adesão, tem sido cada vez mais freqüente a estruturação de programas educativos desenvolvidos por equipes multidisciplinares, visando efetivar a transmissão de informações básicas para o seguimento do tratamento, o que resulta, em última instância, numa melhor conscientização e adesão desses pacientes às recomendações da equipe.

A integração entre os profissionais da equipe de saúde tornou-se necessária, uma vez que suas especificidades são indispensáveis à efetivação dos conhecimentos mínimos exigidos do paciente sobre doenças crônicas e complexas, como diabetes, hipertensão e asma.

De acordo com Silva e Bordin,33. Silva JO, Bordin R. Educação em saúde. In: Duncan B. Medicine Ambulatorial condutas clinicas em atenção primária. Porto Alegre, Artes Médicas Sul, 1996. “as atividades de educação em saúde podem ser vistas como um mecanismo de interação entre o saber científico e o popular, com o objetivo de socialização do saber cientifico e de reconhecimento social do saber popular”. Vários autores44. Ghosh CS, Ranvindran P, Joshi M. Stearns SC. Reductions in hospital use from self management training dor chronic asthmatics Soc. Sci. Med.1998; 46, 08: 1087-1093.),(55. Tones K. Health education: evidence of effectiveness. Archives of diseases in childhood. 1997; 77: 189-195.),(66. Palen JVD, Klein JJ, Zielhuis GA, Van Herwaarden CLA. The role of self-tratment guidelines in self-management education for adults asthmatics. Respiratory medicine. 1998; 92: 668-675.),(77. Abdulwadud O, Abramson M, Forbes A, James A, Light L, Thien F, Walters EH. Attendance at an asthma educational intervention characteristics of participants and non-participants. Respiratory medicine . 1997; 91: 524-529.) demonstram a eficácia dos trabalhos educativos e evidenciam a necessidade de um trabalho em equipe, estendendo o conteúdo das informações para um número maior de profissionais, que, além de médicos e enfermeiras, incluiriam ainda nutricionista, fisioterapeuta, assistente social e psicólogo, entre outros, dependendo da especificidade da doença.

O trabalho do psicólogo na educação em saúde deve ir além da simples transmissão de informações a respeito do tratamento adequado ou ideal (o que, aliás, não seria em nada especifico, já que qualquer outro profissional poderia fazê-lo). Os clientes e seus familiares precisam de um espaço, onde não só recebam informações, mas onde seja possível expressara ansiedade e a insegurança proveniente da desinformação, a incapacidade sentida para lidar com a doença.88. Ricr M, Candeias NMF. Padrões mínimos da prática da educação em saúde um projeto pioneiro. Rev. Saúde Publ., São Paulo. 1998; 23, 4: 347-53.

A necessidade da inserção do psicólogo em programas educativos está diretamente ligada à importância da realização de um diagnóstico da situação do grupo-alvo do programa no que se refere à presença de conteúdos subjetivos, como temores, frustrações e impedimentos de ordem psíquica que geralmente estão relacionados com a forma como o paciente se posiciona frente à enfermidade, podendo produzir sintomas psíquicos de diversos tipos ou resultar no abandono do tratamento e em dificuldades na comunicação equipe-paciente, entre outras conseqüências. Estes fatores podem interferir no modo como esses pacientes lidam com sua doença e seu tratamento. Além disso, o trabalho do psicólogo pode propiciar ao paciente motivação para a mudança de atitudes e sua efetivação, ao permitir que tais conteúdos sejam elaborados. Este enfoque está de acordo com as propostas de educação em saúde comentadas por Westphal & Carvalho99. Westphal MF, Carvalho MMB. O papel do educador de saúde nos hospitais: uma visão inovadora. Rev. Paulista de Hospitais. 1987; 35:174-178. no que se refere à “redefinição do que seria 'capacitação dos clientes’ para lidar com seus problemas, auxiliando-os assim a recuperar a parle da responsabilidade que lhes cabe por seus próprios corpos, saúde e ações”.

Tendo clara a noção da especificidade do psicólogo e dos processos, poderíamos então considerar tais programas como “psicoeducativos”, privilegiando mais do que a simples transmissão de informações. De acordo com Blessing-Moore,1010. Blessing-Moore J. Does. Asthma Education change behavior? To know is not to do. Chest. 1996; 109:1. a educação é um processo cm desenvolvimento em todos os aspectos. A informação precisa ser fornecida num ambiente apropriado e de maneira adequada às populações que serão assistidas, levando em consideração os fatores psicossociais, educacionais, econômicos e culturais que influenciam as atitudes, crenças e decisões do paciente. Mais do que isso, “os indivíduos deveriam conhecer melhor suas próprias condições de saúde, de modo que, a partir disto pudessem se transformar em agentes interessados em promover seu próprio desenvolvimento, em vez de representarem apenas meros receptores passivos da ajuda veiculada por outros, muitas vezes até desnecessárias”.

Para Thomison,1111. Thomison JB. The (non) compliant patient. Southern Medical Journal 1992; 85, 7:.679-680. informações são necessárias, mas não suficientes. O autor relata que, apesar de ser um médico e, portanto, conhecedor privilegiado das vantagens e necessidades de seguir um tratamento e de como fazê-lo, quando doente, ele mesmo não seguia todos os procedimentos indicados o que não poderia ser atribuído à falta de informações.

Duncan & Schmidt1212. Duncan BB, Schmidt MI. A Importância de atividades preventivas. In: Duncan B. Medicina Ambulatorial: condutas clinicas em atenção primária. Porto Alegre, Artes Médicas Sul , 1996. afirmam que as “atividades preventivas fazem parte do ofício de todos. Cada médico pode influir, por meio de conselhos e, às vezes, de terapias, no perfil de risco de seus pacientes”. Por outro lado, independentemente do tempo disponível para o atendimento, no momento da consulta, grande parte das informações a respeito do tratamento o que é a doença, qual sua atuação, implicações, como utilizar a medicação de forma adequada, quais os tratamentos complementares e suas finalidades parecem não ser devidamente assimiladas. Isso não se deve simplesmente ao grande número de pacientes atendidos em instituições públicas, mas, principalmente, à gama de informações que envolvem o tratamento e que é impossível assimilar no momento da consulta. Além disso, há muitos fatores que independem da simples transmissão do conhecimento e exigem uma assimilação das mudanças envolvidas no tratamento, entre os quais se incluem o impacto causado pelo diagnóstico e pela proposta terapêutica, bem como os mecanismos defensivos do paciente mobilizados na situação.

Os programas psicoeducativos precisam de linhas de atuação definidas, pois o maior problema da criação desses programas está na ausência deum referencial teórico que possa subsidiar o trabalho proposto. Rosentock1313. Rosenstock IM. Understanding and enhancing patient compliance with diabetes regimens. Diabetes Core.1985; 8, 6: 610-616. sugere que os programas educativos devem ser elaborados de acordo com os critérios propostos por Bandura, embasados na teoria da aprendizagem social. Os principais conceitos desta teoria incluem determinismo recíproco e desempenho de aprendizagem dicotômicos. O primeiro se refere a um modelo de autocuidado em que os fatores ambientais e culturais operam como determinantes dependentes um do outro; o segundo estaria relacionado a traduzir a aprendizagem num comportamento.

A partir da constatação da necessidade de uma intervenção psicológica efetiva interando a questão da adesão do paciente portador de doença crônica no contexto hospitalar, programas psicoeducativos têm sido implantados por psicólogos conjuntamente com a equipe de saúde em alguns ambulatórios do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicinada Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Têm-se observa­ do resultados favoráveis quanto ao conhecimento da patologia, à expressão de angústias e ansiedades, às mudanças de atitudes a partir das considerações das crenças existentes e ao autocuidado, entendido como fruto da responsabilidade desenvolvida.

RELATO DE EXPERÊNCIA

A partir de projetos piloto desenvolvidos tendo como referência as colocações anteriores, constatou-se que alguns itens são de suma importância no processo de criação de programas psicoeducativos eficazes, a saber:

A princípio, cabe ao psicólogo fazer uma avaliação psicológica da população-alvo, com a utilização de entrevistas individuais (que podem ser acompanhadas de testes psicológicos projetivos), com o objetivo de investigar o repertório de informações do paciente, as fantasias e crenças que envolvem o tratamento, visando traçar um plano de intervenção voltado para as dificuldades identificadas;

A população a ser assistida deve ser muito bem definida, levando-se em consideração a patologia relacionada à criação do programa, uma vez que cada enfermidade apresenta características específicas que devem ser consideradas para que se possa delinear a estrutura do programa;

É importante que os profissionais envolvidos na criação e implantação do programa coletem um número variado de materiais que envolvam orientações e explicações acerca da doença. Esta etapa visa auxiliar na integração e na escolha, por parte desses profissionais, das diferentes formas de abordar o assunto;

Como este trabalho desenvolvido por diferentes profissionais, todos eles precisam conhecer as várias abordagens que serão utilizadas pelos membros da equipe. Os folhetos educativos, os artigos relacionados ao tema e a literatura médica sobre fisiopatologia e seu tratamento específico podem auxiliar nessa tarefa. Desta forma a equipe poderá evitar as mensagens contraditórias, havendo uma integração do trabalho de um profissional com o de outro, de especialidade diferente;

A utilização de folhetos educativos para auxiliar o paciente pode ser útil, desde que haja garantia de que estes não sejam meramente informativos, mas permitam sua associação com crenças e valores de quem os lê, permitindo que o leitor esclareça suas dúvidas e siga as orientações. Trabalhando com este enfoque, Bueno e cols.1414. Bueno AG, Azevedo MV, Duarte AJS. Anti-retrovirais: Tire suas dúvidas. 2. Ed., São Paulo: Boehringer Igelheim (Brasil), 2000. elaboraram um folheto educativo sobre o uso da medicação anti-retroviral dirigido a pacientes HIV positivos, respondendo às dúvidas e orientando-os com uma linguagem acessível, conseguindo, assim, atingir os objetivos propostos;

É necessário elaborar um instrumento capaz de avaliar o nível de conhecimento prévio que a população-alvo tem sobre a patologia e o tratamento, analisar fatores clínicos e demográficos, o grau prévio de adesão ou não desses pacientes. As representações e as crenças que envolvem a doença e seu tratamento também devem ser abordadas. Com esses dados, o programa poderá ser elaborado de acordo com a demanda dos pacientes, permitindo o acesso a suas crenças e valores, e uma identificação maior, aumentando o interesse e a probabilidade de atingir as metas propostas;

Após a análise dos dados do instrumento, define-se o conteúdo do programa, o número de sessões e sua seqüência mais adequada. Isto deve ser elaborado em conjunto, por toda a equipe. Sugere-se que o número de sessões do programa fique em cerca de seis, pois, de acordo com nossa experiência clínica, um número maior de sessões tende a aumentar o absenteísmo dos participantes do grupo, acrescentando, de fato, pouca informação ou possibilidades de mudança. A estratégia escolhida deverá trazer aportes criativos sem distanciar-se substancialmente do universo cultural da população-alvo;

O mesmo instrumento (ou equivalente) aplicado no início do programa para avaliar o repertório de informações do paciente deve ser reaplicado no final, para a obtenção de dados que permitam a comparação dos conhecimentos adquiridos, podendo-se, com isso, avaliar a eficácia do programa;

No final do programa, pode ser agregado um novo instrumento, desta vez para permitir que o paciente faça sugestões, críticas e comentários, o que pode contribuir para aperfeiçoar o trabalho. A avaliação do programa pode incluir ainda: a intervenção e o nível de participação dos pacientes durante o programa; o desempenho após a aprendizagem; o desempenho em casa e como o paciente mantém o autocuidado;

A equipe deve-se manter coesa e realizar reuniões constantes para que os propósitos possam ser atingidos, já que este tipo de atuação pede um relacionamento integrado de idéias e métodos;

Os pacientes devem passar por um processo de follow-up esclarecendo, corrigindo e revisando as informações, após um tempo preestabelecido pela equipe, visando verificar a adesão e reforçar a aprendizagem e a disponibilidade para o tratamento.

Tendo como referência este arcabouço referente à criação de programas psicoeducativos, está sendo desenvolvido, entre outros, um trabalho na Divisão de Clínica Obstétrica do HCFMUSP junto a gestantes hipertensas.

A adesão de pacientes hipertensos ao esquema terapêutico não costuma ser alta. Diferentes aspectos são responsáveis por esta ocorrência: o fato de a hipertensão ser amiúde uma “doença silenciosa”, que não produz sintomas significativos ou diferenciados; a dificuldade de mudança de hábitos e comportamentos (inclusive alimentares); os efeitos secundários da medicação prescrita.

A não adesão da gestante hipertensa ao tratamento proposto constitui sério risco para a díade materno-fetal, podendo acarretar graves consequências para a saúde materna. Por este motivo, buscou-se implantar um programa psicoeducativo junto a essas pacientes, visando favorecer o autocuidado e minimizar os riscos associados à condição.

Num primeiro momento, foi realizada uma revisão da literatura folhetos educativos, artigos de revistas e jornais, capítulos de livros. Este material facilitou a elaboração de um roteiro de questões que abrangesse aspectos diversos envolvidos na patologia direcionados a esta população específica gestantes hipertensas da Clínica Obstétrica do HCFMUSP. Este roteiro de entrevista tinha por objetivo verificar o grau de informações e de dificuldades que as pacientes encontravam no tratamento, assim como suas crenças, valores e emoções relacionados à patologia.

A realização, das entrevistas individuais pela psicóloga em local reservado possibilitou obter uma avaliação precisa de aspectos subjetivos que influenciavam diretamente o comportamento dessas pacientes, favorecendo a não adesão. A partir da análise dessas entrevistas, a equipe pôde pensar nos diversos aspectos envolvidos num tratamento e, a partir dessa reflexão, elaborar um programa que pudesse auxiliar as pacientes. Cada profissional se responsabilizou pelo planejamento referente à sua área especifica. Houve reuniões da equipe de saúde para discussão de cada um dos aspectos que seriam apresentados às pacientes, e cada membro pôde conhecer, opinar e refletir acerca do que seria transmitido.

O programa foi implantado com a participação de psicólogo, médico, assistente social e nutricionista. Foi dividido em quatro encontros, sendo um por semana. Ao início de cada encontro, busca-se verificar com as pacientes o que foi entendido e refletido sobre o conteúdo e a experiência do encontro anterior. Ao final desses quatro encontros, o primeiro questionário é reaplicado, com o intuito de avaliar objetivamente a eficácia do programa desenvolvido. Devido à recenticidade de implantação desse trabalho, ainda não existem dados de follow-up a longo prazo.

Outra experiência bem-sucedida na criação e implantação de um programa psicoeducativo ocorreu no Serviço de Imunologia do HCFMUSP.

Para a realização do trabalho, a equipe fez um levantamento bibliográfico relacionado à adesão ao tratamento dos portadores de HIV, tendo elaborado o conteúdo e o cronograma das informações multiprofissionais. O programa foi dividido em cinco áreas (medicina, enfermagem, nutrição, serviço social e psicologia) e separado em seis módulos. Os temas desenvolvidos foram: histórico, epidemiologia, modos de transmissão e atuação do vírus no organismo, exames laboratoriais específicos (anti-HIV, CD4, CD8 e cargaviral), noções básicas sobre as doenças sexualmente transmissíveis, medidas de prevenção de aids e DST, orientações nutricionais gerais e especificas, direitos sociais do portador de HIV/aids e deveres da sociedade para com ele. O trabalho do psicólogo envolveu diagnóstico da população-alvo, com enfoque nas principais questões fantasias surgidas no imaginário grupal em decorrência de informações apresentadas no programa e relacionadas à doença e ao tratamento, dinâmica de grupo e avaliação do impacto das atividades.

Após a realização desse programa, observou-se que algumas das informações essenciais ao tratamento não faziam parle do repertório desses pacientes e que sua introdução instrumentalizava o paciente para cuidar-se melhor e fazer escolhas mais fundamentadas.

Este é apenas um modelo possível de programa psicoeducativo, e vale ressaltar que podem ser criados e implantados outros, considerando quaisquer patologias, com caráter educativo e preventivo, desde que inicialmente se delimitem bem os objetivos e se construam instrumentos voltados para a efetivação dos mesmos.

O essencial é respeitar a especificidade desta abordagem, que prevê um incentivo ao autocuidado do paciente de maneira crítica e consciente, para que este possa responsabilizar-se pelo seu tratamento, deslocando-se a ênfase, portanto, do conteúdo meramente informativo para a integração de informações no sistema de crenças e valores do paciente em seu cotidiano.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Frente a este problema, considerado de saúde pública, que é a dificuldade do paciente em seguir as recomendações da equipe para obter um resultado satisfatório no tratamento, espera-se que os profissionais que desempenham suas atividades em instituições de saúde estejam constantemente preocupados com sua prática, uma vez que é preciso adequar as formas de intervenção junto a esse fenômeno. Embora não seja problema recente, a não adesão cresce a cada dia, evidenciando que há uma gama de fatores complexos a interferir, entre os quais: o modo como as informações a respeito do diagnóstico e o tratamento são passados para o paciente e seus familiares; as condições psicológicas presentes nesse grupo de pacientes e que podem interferir diretamente no assimilação dos conceitos transmitidos: as condições socioeconômicas que podem inviabilizar a resposta ao que foi recomendado para o tratamento, outros aspectos psíquicos que não dizem respeito simplesmente à compreensão, mas ao próprio desejo de se tratar

Enfatizamos que é de extrema importância que os profissionais passam desenvolver trabalhos em equipes multiprofissionais, evitando a fragmentação dos aspectos essenciais ao tratamento, ao mesmo tempo em que são divididas as tarefas e se discutem, em todos os momentos, as dificuldades observados.

No que concerne ao paciente e seus familiares, espera-se que, ao longo do programa proposto, façamos surgir sujeitos responsáveis pelo seu tratamento, cidadãos questionadores, que possam atribuir um sentido ao que é recomendado pela equipe. Sabemos que esta é uma tarefa simples, principalmente quando consideramos que a maior parte da população assistida em serviços públicos parece não ter clara nem mesmo a noção de “universalidade” apresentada pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Portanto, muito mais do que transmitir informações aos pacientes e familiares (e assim repetirmos o modelo falido da “educação bancária"), propomos uma amplitude maior na abordagem do problema, algo que possa se dispor a identificar fatores que normalmente se negligencia nos tratamentos clínicos propostos, incluindo aí não somente as dificuldades observadas nos pacientes, mas também aqueles inerentes aos próprios profissionais e à instituição onde o paciente se trata.

Pensando no quanto os fatores subjetivos es tão permeando, os aspectos descritos anteriormente, salientamos a importância do psicólogo na investigação preliminar, na criação e na implantação dos programas de educação e prevenção em saúde.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2001
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