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Modelo experimental de formação de varizes esofágicas por hipertensão portal esquistossomótica em hamsters

Experimental model of esophageal varices' formation in schistosomal portal hypertension

Resumos

OBJETIVO: Desenvolver um modelo experimental de formação de varizes esofágicas por hipertensão portal esquistossomótica em hamsters. MÉTODO: Utilizamos 55 hamsters divididos em dois grupos: grupo I composto de 50 animais infectados com injeção percutânea de 100 cercarias de Schistosoma mansoni da cepa BH; e grupo II composto de cinco animais sadios (grupo de controle). Foram mantidos por um período de incubação de oito semanas. Após este período os animais eram pesados e posteriormente avaliados cirurgicamente quanto à pressão portal, e aspectos macroscópicos e microscópicos do baço, fígado e esôfago tóraco-abdominal. RESULTADOS: Todos os animais do grupo I perderam peso, enquanto os animais do grupo II apresentavam um aumento do peso corporal durante o período de incubação. Vinte e seis (52%) animais do grupo I morreram. Dos 24 hamsters que permaneceram compondo o grupo I observamos uma pressão portal significativamente elevada quando comparada aos animais do grupo II (8,33 x 4,60 cm H2O respectivamente). Verificamos a presença de varizes esofágicas em 16 hamsters do grupo I (66,70%) sendo nestes animais a pressão portal significativamente mais elevada quando comparada aos animais do grupo I que não desenvolveram varizes (9,50 x 6,00 cm H2O respectivamente). CONCLUSÃO: É possível desenvolver em hamsters um modelo experimental de hipertensão portal esquistossomótica aguda com formação de varizes esofágicas.

Esquistossomose mansoni; Varizes esofágicas e gástricas; Modelos animais


BACKGROUND: There is no ideal therapeutic option for schistosomal portal hypertension because none eliminates the possibility of rebleeding, cause of the death in many patients. The aim of this study was to develop a hamster experimental model of esophageal varices' formation in schistosomal portal hypertension, to better study this disease. METHODS: Fifty-five healthy Sirius Gold's hamsters weighting 90 to 120 g were divided in two groups: group I - 50 animals infected with percutaneous injection of 100 B.H. cercariae of Schistosoma mansoni; and group II - 5 healthy animals (control group). The incubation period was eight weeks. After this period, the animals were weighed and later we surgically evaluated the portal pressure, macroscopic and microscopic aspects of the spleen, liver, thoracic and abdominal esophagus. RESULTS: All animals of group I lost weight, while animals of group II presented an increase of the corporal weight during the incubation period. Twenty and six (52%) animals of group I died. The 24 hamsters remained in group I had a significantly increase in portal pressure when compared with controls (8,33 vs. 4,60 cmH2O, respectively). We observed formation of esophageal varices in 16 hamsters of group I (66,7%) and these animals had increased portal pressure when compared with the other 8 animals in this group I that had not developed varices (9,5 vs. 6,0 cmH2O, respectively). CONCLUSION: It is possible to develop in hamsters an experimental model of acute schistosomal portal hypertension with formation of esophageal varices.

Mansoni schistosomiasis; Esophageal and gastric varices; Models, animal


ARTIGO ORIGINAL

Modelo experimental de formação de varizes esofágicas por hipertensão portal esquistossomótica em hamsters

Experimental model of esophageal varices' formation in schistosomal portal hypertension

José Cesar Assef, TCBC-SPI; Adriana Christina Pozzobon de Oliveira VieiraII; Hellen Christina Garcia SaitoII; Carmen Lúcia Penteado LancellotteIII; Luiz Arnaldo Szutan, TCBC-SPIV; Armando De Capua Junior, TCBC-SPV

IProfessor Adjunto-Doutor do Grupo de Fígado e Hipertensão Portal do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IIResidentes do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IIIProfessora Adjunta do Departamento de Ciências Patológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IVProfessor Adjunto-Doutor e Diretor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

VProfessor Titular e Diretor do Grupo de Fígado e Hipertensão Portal do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Prof. Dr. José César Assef Rua Estado de Israel, 435 apto 132 - Bairro Vila Clementino São Paulo - SP - CEP 04022-001 Tel: (11) 2176-7270 Fax: (11) 3337-8164 E-mail: cefigado@santacasasp.org.br

RESUMO

OBJETIVO: Desenvolver um modelo experimental de formação de varizes esofágicas por hipertensão portal esquistossomótica em hamsters.

MÉTODO: Utilizamos 55 hamsters divididos em dois grupos: grupo I composto de 50 animais infectados com injeção percutânea de 100 cercarias de Schistosoma mansoni da cepa BH; e grupo II composto de cinco animais sadios (grupo de controle). Foram mantidos por um período de incubação de oito semanas. Após este período os animais eram pesados e posteriormente avaliados cirurgicamente quanto à pressão portal, e aspectos macroscópicos e microscópicos do baço, fígado e esôfago tóraco-abdominal.

RESULTADOS: Todos os animais do grupo I perderam peso, enquanto os animais do grupo II apresentavam um aumento do peso corporal durante o período de incubação. Vinte e seis (52%) animais do grupo I morreram. Dos 24 hamsters que permaneceram compondo o grupo I observamos uma pressão portal significativamente elevada quando comparada aos animais do grupo II (8,33 x 4,60 cm H2O respectivamente). Verificamos a presença de varizes esofágicas em 16 hamsters do grupo I (66,70%) sendo nestes animais a pressão portal significativamente mais elevada quando comparada aos animais do grupo I que não desenvolveram varizes (9,50 x 6,00 cm H2O respectivamente).

CONCLUSÃO: É possível desenvolver em hamsters um modelo experimental de hipertensão portal esquistossomótica aguda com formação de varizes esofágicas.

Descritores: Esquistossomose mansoni; Varizes esofágicas e gástricas; Modelos animais.

ABSTRACT

BACKGROUND: There is no ideal therapeutic option for schistosomal portal hypertension because none eliminates the possibility of rebleeding, cause of the death in many patients. The aim of this study was to develop a hamster experimental model of esophageal varices' formation in schistosomal portal hypertension, to better study this disease.

METHODS: Fifty-five healthy Sirius Gold's hamsters weighting 90 to 120 g were divided in two groups: group I - 50 animals infected with percutaneous injection of 100 B.H. cercariae of Schistosoma mansoni; and group II - 5 healthy animals (control group). The incubation period was eight weeks. After this period, the animals were weighed and later we surgically evaluated the portal pressure, macroscopic and microscopic aspects of the spleen, liver, thoracic and abdominal esophagus.

RESULTS: All animals of group I lost weight, while animals of group II presented an increase of the corporal weight during the incubation period. Twenty and six (52%) animals of group I died. The 24 hamsters remained in group I had a significantly increase in portal pressure when compared with controls (8,33 vs. 4,60 cmH2O, respectively). We observed formation of esophageal varices in 16 hamsters of group I (66,7%) and these animals had increased portal pressure when compared with the other 8 animals in this group I that had not developed varices (9,5 vs. 6,0 cmH2O, respectively).

CONCLUSION: It is possible to develop in hamsters an experimental model of acute schistosomal portal hypertension with formation of esophageal varices.

Key words: Mansoni schistosomiasis; Esophageal and gastric varices; Models, animal.

INTRODUÇÃO

A hipertensão portal é uma síndrome caracterizada pelo aumento da pressão no sistema porta e como conseqüência, podem surgir varizes esofagogástricas, responsáveis por hemorragia digestiva alta1-5.

Observações prospectivas em humanos são limitadas, em muitos casos, por coexistência de outras doenças, como hepatite e alcoolismo, e estes estudos são também complicados pela heterogeneidade dos estadios clínicos de apresentação6.

Muitos animais são considerados reservatórios naturais da esquistossomose e animais de pequeno porte, como os roedores, são amplamente utilizados em estudos experimentais devido ao fácil manejo, facilidade na inoculação e manutenção em biotérios e pelo próprio curso da infecção, a qual se assemelha a da esquistossomose em humanos7,8.

Cheever7 observou que a obstrução portal era funcional e morfologicamente mais grave em camundongos que nos demais animais estudados e apenas os primeiros apresentavam circulação colateral porto-sistêmica decorrente da hipertensão portal.

Warren e Peters9 estudando a penetração e maturação do Schistosoma mansoni em hamsters, camundongos, coelhos e ratos, concluíram que os dois primeiros animais constituíram bons modelos de experimentação quando comparados com os demais. Observaram também que o hamster apresentava maior suscetibilidade à esquistossomose, nele ocorrendo o desenvolvimento de maior número de vermes adultos.

Warren e De Witt 10 foram os primeiros a demonstrar que a infecção por Schistosoma mansoni em camundongos desenvolvia elevação significativa na pressão portal e constataram, em pequena parcela destes animais, a presença de varizes esofágicas, somente 32 semanas depois da inoculação, atribuindo o seu surgimento à cronificação da doença hepática.

Outros estudos relataram que os hamsters, embora sejam excelentes hospedeiros quando infectados por Schistosoma mansoni, não apresentam a formação de circulação colateral, nem mesmo na forma de varizes esofágicas 7,11-13.

Não encontramos na literatura perquirida, estudos, exceto os trabalhos de Warren e De Witt10, que demonstram experimentalmente a formação de varizes esofágicas, por hipertensão portal esquistossomótica, em roedores ou animais de pequeno porte. O desenvolvimento de tal modelo experimental é imperativo, pois poderá permitir novas pesquisas em doença tão grave e freqüente.

Assim, o objetivo deste trabalho é desenvolver um modelo experimental de formação de varizes esofágicas por hipertensão portal esquistossomótica em hamsters.

MÉTODO

O experimento foi realizado na Unidade de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, tendo sido previamente aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa desta instituição.

Utilizamos 55 hamsters da espécie Sírio Gold, machos, adultos, clinicamente sadios, com peso entre 90g e 120g.

Os animais foram distribuídos de forma aleatória em dois grupos:

- GRUPO I: 50 hamsters submetidos à inoculação percutânea de cercarias de Schistosoma mansoni.

- GRUPO II: cinco hamsters sadios, não inoculados.

Na inoculação dos animais do grupo I, utilizamos cercarias de cepa B.H. de Schistosoma mansoni, administrando- se, por via percutânea, uma solução com aproximadamente 100 cercarias. Mantivemos os animais dos dois grupos nas gaiolas, devidamente identificados por cartões padronizados, recebendo alimentação e água sem restrições. Após um período pré-determinado de oito semanas de incubação, todos os animais foram operados. Os hamsters infectados que morreram durante este período e apresentavam no máximo 24 horas de óbito, eram estudados por necropsia e depois incinerados conforme normatização do Ministério da Saúde.

Operamos os animais dos grupos I e II, após o término do período de incubação de oito semanas. Foram anestesiados com injeção intraperitonial de cloridrato de Ketamina na dose de 40 mg/kg associado ao cloridrato de xilidino – dihidro – tiazina, na dose de 10mg/Kg.

A incisão cirúrgica, combinou incisão mediana xifopúbica com subcostal direita, abrindo-se a cavidade. Foi realizada cateterização de veia porta através de punção com cateter agulhado nº. 27, e mensuração da pressão portal ao nível do externo, por leitura computadorizada.

Em seguida, os animais eram mortos com injeção intracardíaca de 3 ml de tiopental a 2,5%. Realizava-se retirada do fígado, com prévio clampeamento do hilo hepático e da veia cava inferior, remoção cuidadosa do baço e em seguida, retirava-se o esôfago tóraco-abdominal.

Procedia-se então à abertura longitudinal da parede anterior do esôfago, com exposição da mucosa e colocação sobre uma lâmina de vidro, para observação "a fresco" à microscopia óptica quanto à presença de varizes e focos hemorrágicos. O fígado e o baço eram pesados e observados quanto à macroscopia. As peças cirúrgicas eram depositadas em frasco de vidro contendo formol a 10% e encaminhadas para exame anátomo-patológico.

No fígado avaliou-se a presença e quantidade de granulomas, quantificação do pigmento esquistossomótico e a presença ou não de necrose nos ovos de Schistosoma mansoni encontrados.

Na análise microscópica do baço, estabeleceram-se como padrão normal os achados presentes no grupo II (controle) e classificaram-se as alterações apresentadas no grupo I (infectados) como hipercelulares ou congestivas.

As lâminas dos esôfagos dos animais do grupo I e II eram avaliadas quanto à presença ou não de varizes esofágicas.

Os animais do grupo I que formaram varizes esofágicas foram denominados de grupo Ia e os do grupo I sem varizes de grupo Ib.

Considerou-se esôfago normal, aqueles dos animais do grupo II.

A análise estatística correlacionando os resultados entre o grupo I e II foi feita pelo método t de Student acrescido do teste de Levene para variáveis equivalentes (Dawson- Saunders & Trapp)15. No que se refere à análise entre os animais do grupo I que formaram varizes (grupo Ia) e os que não formaram (grupo Ib), utilizou-se o método t de Student acrescido pelo teste de Levene para as variáveis peso do animal, peso hepático, peso esplênico e pressão portal.

Utilizou-se o teste do qui-quadrado (X2) com aplicação da correção de Yates, para estudar as demais variáveis relatadas dentro do grupo I. Adotou-se como significância o valor de p < 5%. Excluímos os hamsters que morreram durante o experimento de todas as análises estatísticas.

RESULTADOS

Dos 50 animais do grupo I, 26 (52%) morreram a partir da 6º semana pós-infecção e 17 destes foram necropsiados. Na necropsia de 15 deles, verificamos a presença de hemorragia intestinal volumosa. Nos outros dois, não constatamos alterações, não sendo determinada a causa mortis. Restaram 24 hamsters do grupo I e os cinco do grupo II, que constituíram os animais do estudo estatístico.

Nos 24 animais do grupo I observamos varizes esofágicas à microscopia óptica em 16 (66,7%), sendo estes, o grupo Ia. Não constatamos varizes esofágicas em oito (33,3%), estes, o grupo Ib.

O peso dos animais do grupo I ao final do período de incubação variou de 90g a 130 g (média de 105,7g) e do grupo II entre 130 g a 145 g (média de 138 g). Houve diferença de peso estatisticamente significante entre os dois grupos (p < 0,001), sendo que não houve diferença significante entre as médias do peso dos animais dos grupos Ia e Ib.

O valor da pressão portal variou no grupo I entre 4 e 12 cm H2O, e no grupo II entre 3 e 6 cm H2O, com médias de 8,33 e 4,60 cm H2O, respectivamente. Estatisticamente, observamos diferença significante entre os dois grupos (p < 0,005). No grupo Ia a pressão portal variou entre 7 e 12 cm H2O (média de 9,50 cm H2O) e no grupo Ib entre 4 e 11 cm H2O (média de 6 cm H2O), havendo diferença estatisticamente significante (p < 0,001). No grupo I o peso do fígado variou entre 4,06g e 8,45g (média de 5,54g) e no grupo II variou entre 6,17g e 7,99g (média de 6,84g), não havendo diferença estatisticamente significante. No grupo Ia o peso do fígado variou entre 4,06g e 8,45g (média de 5,59g) e no grupo Ib entre 4,14g e 6,80g (média de 5,51g), sem diferença estatisticamente significante (p > 0,05).

O peso do baço no grupo I variou entre 0,03g e 0,29g (média de 0,15g) e no grupo II entre 0,20g e 0,35g (média de 0,25g), não havendo diferença estatisticamente significante (p > 0,05). No grupo Ia o peso do baço variou de 0,03g a 0,25g (média de 0,16g) e no grupo Ib de 0,04 a 0,29g (média de 0,14g), também sem diferença estatisticamente significante (p > 0,05).

No que se refere à macroscopia hepática e esplênica, não foram observadas alterações significativas na consistência, coloração e superfície do fígado e baço quando comparamos os animais do grupo I com os do grupo II. Da mesma forma, entre os do grupo Ia e Ib.

Não observamos alterações hepáticas à microscopia óptica nos animais do grupo II (grupo controle) e inúmeras alterações foram encontradas nos animais do grupo I. O infiltrado celular nos animais do grupo I foi predominantemente linfo-histiocitário. Todos os ovos de Schistosoma mansoni presentes no parênquima hepático destes animais eram viáveis, sem necrose ou demais sinais de degeneração celular. Observou-se grande quantidade de granulomas epitelióides bem delimitados e sem necrose, que foram denominados de granulomas duros. Os animais do grupo Ia apresentaram maior porcentagem de granulomas duros quando comparados aos do grupo Ib. Esta diferença foi estatisticamente significante quando correlacionamos os dois grupos quanto à presença de leve/moderada (2+ / 3+) e grande (4+) quantidade de granulomas no parênquima hepático (p < 0,05), como demonstra a Tabela 1.

Não observamos diferença estatisticamente significante (p > 0,05) na quantidade de pigmento de esquistossomose presente no parênquima hepático dos animais do grupo Ia e grupo Ib (Tabela 2). Notou-se a presença de inúmeros vermes adultos no sistema porta dos animais do grupo I e não se registrou a presença de fibrose de SYMMERS nos animais do grupo Ia e Ib com coloração especial de tricromo de Masson verde (Tolosa, et al.)16.

Na microscopia esplênica, não observamos alterações no grupo II (grupo de controle). No grupo Ia, havia congestão esplênica exuberante, achado este verificado apenas em pequena parcela dos animais do grupo Ib. Evidenciou-se hipercelularidade esplênica na grande maioria dos animais do grupo Ib (Tabela 3). Observou-se diferença estatisticamente significante quando comparados os animais do grupo Ia e Ib que apresentaram congestão esplênica (p < 0,01).

Na microscopia esofágica registrou-se correlação de 100% entre os achados da microscopia óptica a fresco e da com coloração especial, quanto à presença ou não de varizes esofágicas.

Não se observaram alterações na microscopia óptica no segmento de esôfago tóraco-abdominal dos animais do grupo II (controle).

Quando comparados os grupos Ia e Ib, observamos que a formação de varizes esofágicas foi estatisticamente significante (p < 0,005).

DISCUSSÃO

Vários estudos em animais de experimentação demonstraram seu comprometimento hepático por Schistosoma mansoni, similar ao humano7,8,17.

Stirewalt et al.18 e Moore et al.19 referiram em seus estudos experimentais que o hamster, o camundongo e o "cotton rat" são os hospedeiros mais indicados para a manutenção da infecção por Schistosoma mansoni em laboratórios. Além disto, acreditavam que os hamsters eram naturalmente mais susceptíveis à infecção por Schistosoma mansoni, ocorrendo formação de mais vermes adultos que em outros animais.

Warren e Peters9 referiram que os hamsters são os animais mais recomendados para a reprodução experimental de esquistossomose crônica. No que se refere à carga infectante e o tempo de incubação para se estabelecer um modelo experimental de esquistossomose hepatoesplênica, Warren e Grove11 fizeram injeções subcutâneas de 160, 80 40 e 20 cercarias em hamsters e observaram que após 10 semanas da infecção, todos os animais inoculados com 160 cercarias e 50% dos infectados com 80 cercarias, tinham morrido. Cheever7,8 constatou mortalidade de 50%, após 12 semanas da infecção, de hamsters com 140 cercarias.

O estudo brasileiro realizado por Costa et al.20 em camundongos, concluiu que as melhores respostas com relação ao desenvolvimento da hipertensão portal e da sobrevivência foram obtidas com 50 a 70 cercarias.

Pons et al.21 observaram que a hipertensão portal desenvolve-se em camundongos entre cinco e sete semanas e Morgan12, estudando hamsters infectados com 50 cercarias observou progressivo aumento da pressão portal a partir da quinta semana após a infecção, com níveis apreciavelmente elevados na oitava semana. Assim julgamos que 100 cercarias de Schistosoma mansoni, representaria adequada carga parasitária e um período de oito semanas de incubação seria satisfatório para iniciarmos as investigações quanto ao desenvolvimento da doença. A alta mortalidade observada nestes animais (52%) havia sido documentada previamente por outros autores7,8,20.

Dos animais que morreram, realizamos a necropsia em 17, aqueles que haviam morrido a menos de 24 horas. Constatamos a presença de hemorragia intestinal volumosa em 15 (88,23%) deles e não encontramos nos outros dois (11,77%) qualquer alteração que pudesse justificar a morte.

Cheever7,8 constatou a presença de granulomas de Schistosoma mansoni acometendo a serosa e a submucosa intestinal de todas as espécies de animais estudadas e correlacionou a hemorragia intestinal às ulcerações crônicas e agudas presentes na parede intestinal.

A hipertensão portal é definida como o aumento da pressão intra-hepática superior a 200 mm H2O22. Em nosso experimento os animais infectados apresentavam aumentos significativos na pressão portal quando comparados ao grupo controle, sendo os níveis de pressão portal encontrados, similares aos descritos por Morgan12 em hamsters com o mesmo tempo de incubação. Observamos também, aumento na pressão portal estatisticamente significante nos animais do grupo I que formavam varizes esofágicas quando comparados aos que não as formavam.

Não observamos hepatomegalia e/ou esplenomegalia nos animais do grupo I, como é descrito na literatura e atribuído ao grande número de granulomas presentes no parênquima hepático. Embora em nosso experimento obtivéssemos uma quantidade de granulomas no parênquima hepático estatisticamente significante, acreditamos ser necessário maior período de infecção para detectar o aumento no peso do fígado. Não imputamos a hepatomegalia apenas à presença de granuloma no parênquima hepático. Acreditamos que nas infecções agudas por Schistosoma mansoni em hamsters, mecanismos de modulação imune podem estar presentes mais precocemente. Observamos maior porcentagem de granulomas hepáticos nos animais do grupo Ia quando comparados aos do grupo Ib, entretanto, a concentração de pigmento esquistossomótico não mostrou diferença significativa entre os grupos.

Notamos congestão esplênica, com oito semanas após a inoculação, em 19 animais do grupo I, sendo que 84,2% eram do grupo Ia e 15,8% do grupo Ib, e não notamos esplenomegalia nem granulomas no baço à microscopia óptica nos animais do grupo I. Acreditamos que fatores considerados na fisiopatologia das infecções crônicas por Schistosoma mansoni encontram-se dispostos de maneira diferente nas hipertensões agudas. Verificamos que uma alta carga parasitária determinou agudamente níveis consideravelmente elevados de pressão porta e de vermes adultos no sistema portal, com a presença de inúmeros granulomas e pigmento esquistossomótico. Entretanto, acreditamos que fatores intrínsecos de hipersensibilidade e modulação imune acarretem manifestações no fígado e no baço variáveis para a mesma carga infectante.

Warren e Grove11 relataram que os hamsters não formavam varizes esofágicas a partir de hipertensão portal esquistossomótica. Demonstraram em seus experimentos que estes animais apresentavam varizes quando submetidos à ligadura parcial da veia porta ou do ducto biliar. As varizes esofágicas estiveram presentes em porcentagem significante em nosso trabalho. Atribuímos seu surgimento à interação de fatores imuno-moduladores ainda não bem estabelecidos, que se desenvolvem precocemente quando os hamsters são submetidos a uma infecção aguda por Schistosoma mansoni.

Estudos correlacionando a carga parasitária e tempo de segmento ideais devem ser realizados posteriormente, a fim de estabelecer o momento exato em que a infecção por Schistosoma mansoni acarreta nestes animais uma pressão portal mínima para o desenvolvimento de congestão esplênica e subseqüente shunt porto-sistêmico.

Assim, os resultados obtidos nas condições de execução deste trabalho nos permitem concluir que é possível desenvolver em hamsters um modelo experimental de hipertensão portal esquistossomótica aguda com formação de varizes esofágicas.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Prof. Dr. Pedro Paulo Chieffi, Professor Titular e Chefe da Disciplina de Parasitologia do Departamento de Ciências Patológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, pelo incansável espírito de colaboração e pela experiência transmitida de seus conhecimentos, que foram fundamentais para a realização do presente estudo.

Recebido em 18/05/2005

Aceito para publicação em 11/07/2005

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

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  • Endereço para correspondência

    Prof. Dr. José César Assef
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Nov 2005
    • Data do Fascículo
      Ago 2005

    Histórico

    • Aceito
      11 Jul 2005
    • Recebido
      18 Maio 2005
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