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Jogos de gênero, maternalismo e política: “uma mulher operária” na Câmara de Vereadores de Porto Alegre (1948-1951)

Gender Games, Maternalism and Politics: “A Working Woman” in the Porto Alegre City Council (1948-1951)

RESUMO

Após a queda do Estado Novo, o Brasil passou por um processo de redemocratização e de reestabelecimento de suas casas legislativas. No final de 1947, diversas capitais do país realizaram eleições para suas Câmaras Municipais, em um pleito que levaria algumas mulheres a exercerem o cargo de vereadoras pela primeira vez. Em Porto Alegre, a operária comunista Julieta Battistioli acabou a disputa como primeira suplente do colega Elóy Martins, mas ao longo da legislatura assumiu a tribuna diversas vezes, protagonizando intensos debates com os demais vereadores. O objetivo deste artigo é analisar alguns dos espaços por onde Julieta circulou e, principalmente, alguns desses embates, identificando estratégias e ressignificações adotadas por ela, de forma a se legitimar em um ambiente até então exclusivamente masculino.

Palavras-chave:
gênero; comunismo; política; maternalismo

ABSTRACT

After the fall of the Estado Novo, Brazil went through a process of re-democratization and re-establishment of its legislative houses. At the end of 1947, several capitals of the country held elections for their Municipal Chambers, an election that would lead some women to exercise the position of councilors for the first time. In Porto Alegre, the communist worker Julieta Battistioli ended the dispute as the first substitute for her colleague Elóy Martins, but throughout the legislature she took the stand several times, leading intense debates with the other councilors. The aim of this article is to analyze some of the spaces where Julieta transited and especially these clashes, identifying strategies and resignifications adopted by Julieta in order to legitimize herself in a masculine environment.

Keywords:
Gender; Communism; Politics; Maternalism

INTRODUÇÃO

Após a Segunda Guerra Mundial, mulheres mobilizadas e engajadas de diversas maneiras nos embates contra o nazifascismo resolveram dar continuidade a suas atividades e organizações. Assim, em novembro de 1945, em Paris, nascia a Federação Democrática Internacional de Mulheres (FDIM). Apesar de muitas vezes ter sido ignorada ou tratada apenas como corrente de transmissão soviética pela historiografia, a FDIM foi uma iniciativa muito mais complexa e plural. Francisca de Haan, por exemplo, afirma que os impactos da Guerra Fria também se fizeram sentir na produção acadêmica, o que gerou um apagamento ou uma deturpação das características da entidade. Para a autora, a melhor maneira de caracterizá-la seria como sendo uma organização progressista, de esquerda, transnacional, antifascista, anticolonial, antirracista e de defesa dos direitos da criança e das mulheres (De Haan, 2013DE HAAN, Francisca. Eugénie Cotton, Pak Chong-ae, and Claudia Jones: Rethinking Transnational Feminism and International Politics. Journal of Women’s History, v. 25, n. 4, pp. 174-189, 2013., p. 179).

Apesar do grande protagonismo de mulheres europeias em seu nascedouro, o Congresso de fundação da FDIM já contou com delegadas da China, da Indochina, da Índia, do Ceilão, da Austrália, da Argélia, do Egito, do Marrocos, do Canadá, dos Estados Unidos, de Cuba, da Argentina e do Brasil (De Haan, 2014DE HAAN, Francisca. The Women’s International Democratic Federation (WIDF): History, Main Agenda, and Contributions, 1945-1991. In: KISH SKLAR, Kathryn; DUBLIN, Thomas (Eds.). Women and Social Movements, international: 1840 to present. Alexandria, Virginia: Alexander Street Press, 2014. pp. 1-21., p. 20). Aqui, em 1949, foi criada a Federação de Mulheres do Brasil (FMB), entidade filiada à FDIM e que operava em diapasão similar: apesar do protagonismo de mulheres comunistas, a entidade contava com muitos quadros sem filiação partidária, ou filiados a outros partidos, como o PTB e até mesmo a UDN (ver Morente, 2015MORENTE, Marcela Cristina de Oliveira. Invadindo o Mundo Público: Movimentos de Mulheres (1945-1964). Dissertação (Mestrado em História Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2015.; Alves, 2017ALVES, Iracélli da Cruz. Os movimentos feminista e comunista no Brasil: História, Memória e Política. Revista Tempos Históricos, v. 21, n. 2, pp. 107-140, 2017.).

Há um debate na historiografia feminista acerca de como classificar esses movimentos. A grande maioria dessas mulheres e organizações - especialmente as de fato comunistas - refutavam o rótulo de “feministas”, pois associavam o termo a mulheres burguesas e liberais (ver Alves, 2020ALVES, Iracélli da Cruz. Feminismo entre ondas: mulheres, PCB e política no Brasil. Tese (Doutorado em História) - Instituto de História, Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2020.; Fraccaro, 2018FRACCARO, Gláucia. Os Direitos das Mulheres: feminismo e trabalho no Brasil (1917-1937). Rio de Janeiro: FGV Editora, 2018.). Além da ausência de “autoidentificação”, também houve um entendimento de que, ao supostamente reforçarem estereótipos de gênero - como a defesa da maternidade e da infância -, esses movimentos não teriam lutado “pela transformação da mulher na sociedade” (Pinto, 2003PINTO, Céli Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003., p. 11).

Há, no entanto, outro prisma possível para apreender esses movimentos: trajetórias como as da operária comunista Julieta Battistioli, suas ações, militância e espaços por onde circulou nos ajudam a compreender essas organizações sob outros enfoques, que levam em conta possíveis estratégias de politização da maternidade (Zarco, 2011ZARCO, Abril. Maternalismo, identidad colectiva y participación política: las Madres de la Plaza de Mayo. Revista Punto Género, n. 1, pp. 229-247, abr. 2011.) como forma de buscar legitimidade de atuação no espaço público, evidenciando o que Luc Capdevila (2001CAPDEVILA, Luc. Resistance civile et jeux de genre. Annales de Bretagne et des Pays de L’Ouest, v. 108, n. 2, pp. 103-128, 2001., p. 106) chamou de “jogos de gênero”, segundo os quais haveria um “conjunto de peça e atores a serem organizados para intervir no espaço público”.

A ideia, portanto, não é necessariamente contradizer interpretações consagradas acerca da história das mulheres no Brasil, mas contribuir para apreender suas protagonistas de forma mais complexa e plural, tentando contribuir para que a noção de “mulheres excepcionais” se dissipe, e que elas sejam tratadas como “pontas do iceberg” (Vergara, 1999VERGARA, Moema de Rezende. A noção de excepcionalidade na história das mulheres: o caso da geração de Flora Tristan. Cadernos Pagu, v. 13, pp. 223-251, 1999., p. 227)1 1 Em artigo recente, Céli Pinto (2017, p. 488) também busca reforçar “a diversidade - e não a excepcionalidade” na trajetória de doze mulheres eleitas para o parlamento brasileiro nos anos 1950. . Para isso, em um primeiro momento será apresentada brevemente a militância de Julieta e como a questão da maternidade aparecia no movimento de mulheres comunistas do Brasil e internacional, para em seguida se destrinchar sua atuação parlamentar, seus embates na tribuna e as estratégias e imagens mobilizadas, de forma que ela tentasse se legitimar em um espaço até então exclusivamente masculino.

JULIETA, O PCB E AS MULHERES: POSSIBILIDADES DE DISCURSOS, MILITÂNCIAS E ORGANIZAÇÕES

Julieta Silveira Ramos nasceu em Palmares do Sul, a menos de 100 quilômetros de Porto Alegre, em 13 de janeiro de 1907. Filha de trabalhadores rurais (Carteira de Identidade de Julieta…, s.d.CARTEIRA DE IDENTIDADE de Julieta Battistioli. Acervo Julieta Battistioli. Porto Alegre (Memorial da Câmara Municipal de Porto Alegre). s.d.), mudou-se para Porto Alegre ainda criança. Na capital, morou sempre entre os atuais bairros do Passo D’Areia, Navegantes e São João - à época, o Quatro Distrito Industrial da cidade, região marcadamente operária (ver Fortes, 2004FORTES, Alexandre. Nós do Quarto Distrito: a classe trabalhadora porto-alegrense e a Era Vargas. Caxias do Sul: EDUCS; Rio de Janeiro: Garamond, 2004.), e onde conheceu Fortunato Battistioli, oito anos mais velho, com quem se casou no dia 27 de fevereiro de 1926 (Certidão de Casamento, 1926CERTIDÃO DE CASAMENTO. Cartório de Registro Civil da 1ª Zona de Porto Alegre; Acervo Julieta Battistioli. Porto Alegre (Memorial da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1926. ). Um ano depois, nascia sua filha Seraphina, nome da mãe de Fortunato.

Foi por meio do marido que Julieta ingressou no Partido Comunista (Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., passim), e ao longo dos anos 1930 foi se tornando uma liderança importante no local de trabalho, as Indústrias Renner. Em função de sua organização paternalista, capaz de combinar estrito controle da força de trabalho a uma série de benefícios a quem “andasse na linha”, a Renner se tornou uma “fortaleza inexpugnável, impenetrável pelo movimento operário organizado”, segundo Alexandre Fortes (2004FORTES, Alexandre. Nós do Quarto Distrito: a classe trabalhadora porto-alegrense e a Era Vargas. Caxias do Sul: EDUCS; Rio de Janeiro: Garamond, 2004., p. 213). No chão da fábrica, Julieta era alguém a quem suas colegas sempre pediam ajuda (Nunes, 2020NUNES, Guilherme Machado. Julieta Battistioli: a trajetória militante de uma operária comunista. Aedos, v. 12, n. 26, pp. 580-609, 2020.; Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008.), o que certamente a ajudou a se tornar uma das “caras” do PCB no Rio Grande do Sul quando o partido voltou à legalidade após a Segunda Guerra Mundial.

Ainda sob o Estado Novo, os comícios e eventos de reorganização do PCB eram publicamente divulgados, tanto pela imprensa partidária quanto de grande circulação, aproveitando-se da Lei de Anistia assinada em abril de 1945. Em 1 de agosto, o Correio do Povo cedia uma página inteira para retratar o Cine Imperial lotado durante uma cerimônia de reestruturação do Partido (Martins, 2007MARTINS, Marisângela Terezinha Antunes. De volta para o presente: uma história dos militantes comunistas de Porto Alegre e suas representações acerca da democracia (1945-1947). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2007., p. 52). A reorganização do PCB em Porto Alegre deixou o metalúrgico Elóy Martins como responsável pela área sindical, tendo Julieta Battistioli como sua suplente - dobradinha que se repetiria nas eleições para a Câmara de Vereadores.

Além das incumbências sindicais, Julieta também participava da célula Olga Benário (Marçal; Martins, 2008MARÇAL, João Batista; MARTINS, Marisângela. Dicionário Ilustrado da Esquerda Gaúcha: Anarquistas, Comunistas, Socialistas e Trabalhistas. Porto Alegre: Palmarinca, 2008., p. 31; Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., p. 19), responsável por distribuir materiais volantes com informes e palavras de ordem do Partido - tradicionais atividades de agitação e propaganda. Talvez reconhecendo a popularidade do nome e das ações de Julieta, em 1946 o PCB a escolheu para concorrer a Deputada Estadual (Candidatos pelo PCB à Assembleia..., 1946aCANDIDATOS PELO PCB À ASSEMBLEIA Estadual Gaúcha. A Classe Operária, Rio de Janeiro, n. 37, p. 5, 16 nov. de 1946., p. 5). O Partido, que já havia eleito 15 deputados federais no início do ano, e Luiz Carlos Prestes para o Senado, elegeu mais 69 parlamentares, entre Deputados Estaduais e Federais, além da pouco lembrada eleição de Cândido Portinari para o Senado. No Rio Grande do Sul, o PCB elegeu Antônio Pinheiro Machado Neto, Dyonélio Machado e Otto Alcides Ohlweiller para a Assembleia Legislativa (As Bancadas Estaduais, 1947AS BANCADAS ESTADUAIS. A Classe Operária, Rio de Janeiro, n. 52, p. 1, 22 fev. 1947., p. 1).

A não eleição de Julieta não parece ter afetado muito sua imagem: o DOPS, atuante durante toda a experiência democrática, seguiu de perto os passos desta e de muitas outras militantes naquele período. Após o pleito, as autoridades seguiam afirmando que Julieta era “Oradora obrigatória na maioria dos comícios vermelhos realizados nesta capital e, em alguns, levados a efeito no interior do Estado, como, por exemplo, na zona carbonífera de São Jerônimo, em Santa Maria, etc.” (Ofício n. 419…, 1947OFÍCIO n. 419. Porto Alegre, 25 de outubro de 1947, p. 25; Fundo DOPS, Setor Estados (Rio Grande do Sul. Setor), pasta 19 [C]. cx. 611, disco 5. Porto Alegre (Núcleo de Pesquisa em História/UFRGS). 1947., p. 25).

As forças policiais não apenas acompanharam as movimentações comunistas, como também as inibiram. Em abril de 1948, Julieta foi presa em pleno exercício do mandato, ao lado de “43 comunistas” (Estava articulado um “complot”..., 1948ESTAVA ARTICULADO UM “COMPLOT” Comunista para o dia de Tiradentes. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, n. 92, p. 1, 22 abr. 1948., p. 1). A prisão teria ocorrido durante os preparativos para o Congresso da Paz (Martins, 1989MARTINS, Eloy. Um depoimento político: 55 anos de PCB. Porto Alegre: Palotti, 1989.). Julieta não se recorda dessa prisão - ao menos não dessa forma. Segundo sua memória, em entrevista concedida cerca de 40 anos depois desse evento, ela foi presa apenas duas vezes:

Uma vez foi toda a direção do Partido presa. Aí eu estava doente, eu estava fazendo tratamento porque ia fazer uma operação e saí naquele dia de casa só para ir ao consultório médico e fui na sede no Partido e cheguei lá eles (a polícia) já tinham “engatado” (detido, preso) todos (RISOS), e eu cheguei e “engataram” a mim também. […] E a outra vez foi distribuindo panfletos da Paz (Campanha da Paz contra a Guerra da Coreia) defronte a Fábrica de Tecidos; estava distribuindo panfletos da Paz quando a polícia chegou (Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., p. 49).

Talvez a memória tenha feito com que Julieta confundisse o local da segunda prisão, já que ela se deu no centro da cidade e não no 4º Distrito (sede da Fábrica de Tecidos), ou talvez simplesmente tenha esquecido desse ocorrido. Os risos no relato podem indicar uma forma de lidar com o trauma, mas, ao que tudo indica, ela não sofreu torturas ou outras violências físicas, e também não ficou tanto tempo encarcerada. No entanto, a personagem sugere que, durante um interrogatório, o marcador de gênero ficou bem evidente:

Mas ele [o interrogador] me disse tanta bobagem, tanta besteira… se eu não tinha vergonha, que eu era uma mulher, que andava fazendo comício na rua, uma mulher casada, de filhos, porque… e daí para adiante, daí para fora… E, responder… o que é que eu ia responder… nem podia porque… eram uns três ou quatro. E achei melhor só olhar para a cara deles (Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., p. 50. Grifo meu).

O que Julieta traz em seu relato é muito semelhante à ideia da dupla transgressão, conforme propõe Ana Colling (2004COLLING, Ana Maria. As mulheres e a ditadura militar no Brasil. História em Revista. Pelotas: UFPel, v. 10, pp. 169-178, 2004., p. 175): as mulheres transgridem a ordem “natural”, se recusando a ficar em casa cuidando dos filhos, e acabam se comportando como homens; além disso, no caso da Ditadura, seu objeto de estudo, se engajam na militância de oposição ao regime, ganhando a alcunha de Puta Comunista por parte dos órgãos de repressão. É importante levar o anticomunismo em conta para compreender o período: Gilberto Calil (2010CALIL, Gilberto Grassi. Integralismo e Hegemonia Burguesa: a intervenção do PRP na política brasileira (1945-1965). Cascavel: Edunioeste, 2010., p. 25) aponta que “O desfecho da [segunda] guerra e a divulgação dos crimes do nazismo geravam um contexto claramente desfavorável para os movimentos de direita em geral e para os fascistas em particular”, fazendo com que a tática quase exclusiva desses grupos fosse a denúncia do comunismo atrelada às suas práticas “antifamília”, “antiocidentais” e “anticristãs.” Rodrigo Patto Sá Motta, na mesma direção, afirma que, após a Guerra Civil Espanhola, a Igreja Católica passou a caracterizar a URSS como sendo uma “Sodoma e Gomorra dos tempos modernos” (Motta, 2000MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Em guarda contra o perigo vermelho: o anticomunismo no Brasil (1917-1964). Tese (Doutorado em História) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000., p. 91).

Nesse sentido, Jadwiga Mooney afirma que o maternalismo político foi adotado como uma das estratégias da FDIM e das mulheres comunistas em geral durante a Guerra Fria. Segundo a autora, essas mulheres adotaram uma “imagem conservadora dos papéis tradicionais da família e da maternidade”, utilizando-as para “fazer demandas políticas” e defendendo a “necessidade de envolvimento das mulheres na política do pós-Guerra” (Mooney, 2013MOONEY, Jadwiga E. Pieper. El antifascismo como fuerza movilizadora: Fanny Edelman y la “Federación Democrática Internacional de Mujeres”. Anuario IEHS, n. 28, pp. 207-226, 2013., p. 208).

Assim, Julieta, além de comunista, “não se dava ao respeito” - era casada, tinha filhos... Segundo Viviane Leão (2003LEÃO, Viviane Maria Zeni. Momento feminino: Mulheres e imaginário comunista: (uma nova história; uma história nova) 1945-1956. Dissertação (Mestrado em História) - Setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2003., p. 69), as mulheres comunistas sofreram toda sorte de preconceitos por não desenvolverem a domesticidade esperada, e o discurso anticomunista “desenvolveu códigos e signos simplificados e, no entanto, bem elaborados” para formular imagens redutoras e “empobrecidas de compreensão sobre a opção das comunistas, por buscarem uma alternativa de sociedade e de vida.” O beleguim, portanto, não poderia deixar de comentar o absurdo da situação: uma mulher presa por “bagunçar” o espaço público, um local que não lhe pertencia.

A Campanha da Paz, causadora do quiproquó, adentrou a década de 1950 com muita força, tornando-se uma das principais bandeiras do PCB no período - e, em especial, das mulheres. Em agosto de 1950, por exemplo, a Tribuna Gaúcha estampava em sua capa: “EU DEFENDEREI MEU FILHO! As mães gaúchas saberão erguer-se em defesa do sangue de seus filhos, que irão morrer na Coreia para defender os americanos.” (Eu defenderei meu filho, 1950EU DEFENDEREI MEU FILHO. Tribuna Gaúcha, Porto Alegre, n. 297, p. 1, 27 ago. 1950., p. 1). Ainda segundo o jornal, a União Feminina Gaúcha2 2 A partir de 1950, a União Feminina Gaúcha passaria a se chamar Federação de Mulheres do Rio Grande do Sul, entrando em uniformidade com as Federações dos outros estados (Cf. Atividades femininas, 1950, p. 2). , naquele momento, colheu mais de 15 mil assinaturas para a causa. Diante do avanço da ideia de que o comunismo pretendia dissolver a família, o reforço da imagem maternal e da defesa dos filhos, consciente ou inconscientemente, pode ter sido estratégico para que a empreitada ganhasse mais legitimidade frente à opinião pública3 3 Ao se referir às campanhas de mães de presos e desaparecidos políticos nas Ditaduras de Segurança Nacional, Benito Schmidt mostra como, ao mesmo tempo que essas mulheres “investia[m] em representações tradicionais sobre a maternidade”, também “subvertia[m] fronteiras de gênero”, de modo a “ganhar o espaço público e afirmarem-se enquanto agentes políticos.” (Schmidt, 2017, p. 418). - e veremos, na próxima sessão, como Julieta parece ter feito uso disso na tribuna da Câmara de Vereadores.

Em setembro de 1950, um dos principais quadros da Federação de Mulheres do Estado de São Paulo, a operária têxtil Elisa Branco, foi presa durante uma manifestação do sindicato de sua categoria em pleno vale do Anhangabaú, ao desfraldar uma bandeira com os dizeres “Os soldados, nossos filhos não irão para a Coréia”. Elisa foi presa, e posteriormente julgada e condenada a quatro anos e três meses de prisão (Marta, 2007MARTA, Luciana Bueno. Elisa Branco, a heroína da Paz! 2 jul. 2007. Disponível em: Disponível em: https://www.facebook.com/206300859438634/photos/a.210444902357563/223402061061847/?type=3 . Acesso em: 23 jan. 2023.
https://www.facebook.com/206300859438634...
, n.p.), deixando o cárcere em outubro de 1951. Um pouco antes disso, porém, a presidenta da FDIM, a cientista francesa Eugène Cotton, passou a ser processada pelo governo francês por “desmoralização do exército e da nação” após organizar manifestações com faixas e cartazes muito similares aos que Elisa levantara um ano antes no centro de São Paulo (Libertar Elisa Branco, 1950LIBERTAR ELISA BRANCO. Momento Feminino, Rio de Janeiro, n. 79, p. 5, 20 dez. 1950., p. 5). As denúncias não foram adiante, mas após se manifestar contra a guerra da Indochina/Vietnã, e especialmente depois de elaborar um relatório denunciando uma série de crimes na Guerra da Coreia, a FDIM foi expulsa da França naquele mesmo ano, encontrando novo abrigo na Alemanha Oriental (Gradskova, 2019GRADSKOVA, Yula. Women’s International Democratic Federation, the “Third World” and the Global Cold War from the Late-1950s to the Mid-1960s. Women’s History Review, v. 29, n. 2, pp. 270-288, 2019., p. 2).

Assim, é importante pensar como a maternidade rompeu a esfera doméstica e ganhou ares de política internacional. Segundo Mooney (2013MOONEY, Jadwiga E. Pieper. El antifascismo como fuerza movilizadora: Fanny Edelman y la “Federación Democrática Internacional de Mujeres”. Anuario IEHS, n. 28, pp. 207-226, 2013., p. 222), “o discurso mobilizador da FDIM apelava para a maternidade universal e podia unificar as mulheres acima das categorias de raça, classe, filiação política e divisões nacionais”. Assim, as mulheres passaram a encontrar-se “envoltas em relações internacionais, construção de redes globais de trabalho e de uma nova linguagem de práticas e direitos das mulheres.” Todas as atividades, publicações e demais eventos das organizações femininas comunistas brasileiras - ou vistas como tal pela polícia - precisam ser compreendidos como parte tanto da experiência acumulada de mulheres brasileiras quanto das complexas relações geopolíticas que transcorriam no bojo da Guerra Fria. Esta síntese nos ajuda a compreender e lembrar que essas mulheres e organizações tiveram seu cotidiano bastante vigiado e reprimido pelas forças policiais - fosse em São Paulo, com Elisa Branco, ou na França, com Eugène Cotton.

Em Porto Alegre, Julieta recorda ter ajudado a enviar delegadas gaúchas para o I Congresso Nacional de Mulheres, ocorrido no Rio de Janeiro em 1949, assim como de ter organizado a II Assembleia Nacional de Mulheres em Porto Alegre, em 1953 (Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., p. 30; Nunes, 2021NUNES, Guilherme Machado. Mulheres Comunistas no Brasil: Elisa Kauffmann Abramovich, Julieta Battistioli e Júlia Santiago da Conceição (1935-1965). Tese (Doutorado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2021., p. 153), mas é mais uma vez por meio do DOPS que descobrimos, por exemplo, uma de suas atividades específicas na Federação de Mulheres do Rio Grande do Sul: ministrar um “Curso de capacitação política e revolucionária exclusivamente para mulheres”, em fevereiro de 1954 (Boletim n. 3, 1954BOLETIM N. 3. Fundo DOPS; Setor Estados (Rio Grande do Sul. Setor), pasta 19 [G], cx. 612, disco 9, n.p. Porto Alegre (Núcleo de Pesquisa em História/UFRGS). 15 fev. 1954., pp. 47-50).

Apesar de todo esse percurso, é a experiência parlamentar, lembrada com desgosto por Julieta, o evento por excelência celebrado pela “memória oficial” a seu respeito. Veremos a seguir como se deu essa atuação e como tanto a noção de jogos de gênero quanto de uso político da maternidade se fizeram bastante presentes na tribuna da capital gaúcha.

“UMA MULHER SEM CULTURA, MAS QUE TEM A CORAGEM POLÍTICA DE DEFENDER, NESTA CÂMARA, O INTERESSE DO POVO”

Em 1947, Julieta Battistioli, segundo recorda, recebeu de sua amiga Maria Crespo a notícia de que seria candidata à Câmara Municipal de Porto Alegre. Ainda segundo suas memórias, narradas cerca de quarenta anos depois do ocorrido, ela disse para Crespo que aquilo era “a pior coisa”, pois seria muito difícil “ser vereadora, com a educação, com a cultura que eu tinha” (Carvalho Júnior; Garcia, 2008CARVALHO JÚNIOR, Francisco; GARCIA, Eliane Rosa (Orgs.). Adorável Camarada - Memórias de Julieta Battistioli. Porto Alegre: Câmara Municipal de Porto Alegre, 2008., p. 42). Como recém-exposto, Julieta já havia sido candidata a deputada estadual um ano antes. É possível, inclusive, que ela se refira àquela candidatura, e não a esta, mas como a campanha municipal foi vitoriosa e de fato lhe levou a exercer um cargo eletivo, ela pode ter se confundido.

Em fevereiro de 1948, Julieta assumiu a cadeira na Câmara de Vereadores pela primeira vez. Ao longo da legislatura, ela ocuparia o cargo em diversas ocasiões, ora substituindo Elói Martins, ora no lugar de Marino dos Santos, seus colegas de PCB. No primeiro ano da legislatura, Julieta assumiu a vereança de 11 a 16 de fevereiro e de 11 a 20 de março. Em 1949, o exercício foi ainda menor: apenas de 12 a 17 de julho. No ano seguinte, Julieta não tomou posse nenhuma vez, mas em 1951 ela foi vereadora ao longo de praticamente todo o segundo semestre (Cf. Ficha Admissional de Julieta..., s.d.FICHA ADMISSIONAL DE JULIETA Battistioli. Acervo Julieta Battistioli. Porto Alegre (Memorial da Câmara Municipal de Porto Alegre). s.d.).

Ao lermos as memórias e entrevistas de Julieta acerca de sua atuação parlamentar, é possível construir uma imagem de uma mulher disciplinada, esforçada e simples, atuando conforme as indicações do Partido e que recorda com desgosto da experiência, tida como fora de sua alçada - inclusive intelectual. Lendo-se as atas das sessões das quais ela participou, essa imagem pode ser questionada. Nas próximas páginas, conheceremos uma Julieta com “jogo de cintura”, capaz de articular os manifestos partidários com a cidade de Porto Alegre e as falas de seus colegas vereadores. É possível, ainda, perceber uma ironia em muitas de suas manifestações, às vezes quase adentrando no campo do deboche.

Julieta, porém, não se recordava e não falava sobre si dessa forma, esquecendo ou silenciando essas características. Sobre isso, é importante levar em conta a noção de repertório, conforme sugeriu Daniel James, e como a memória pode operar de forma generificada, segundo alerta Joana Maria Pedro. Ao estudar a vida de Doña María, uma militante operária peronista, James mostra como seu repertório autonarrativo operava de acordo com “papéis, convenções e formas de autorrepresentação” (James, 2004JAMES, Daniel. Contos narrados nas fronteiras: a história de Doña Maria, história oral e questões de Gênero. In: BATALHA, Cláudio H. M.; SILVA, Fernando T. da; FORTES, Alexandre (Orgs.). Culturas de classe. Identidade e diversidade na formação do operariado. Campinas: Unicamp, 2004, pp. 287-314., p. 217) disponíveis para uma operária que se recorda de situações dos anos 1940 e 1950 no final dos anos 1980 - e essas recordações são forjadas a partir das “relações de gênero vigentes”, que configuram “uma ou outra forma de narrar suas trajetórias” (Pedro, 2017PEDRO, Joana Maria. Viver o Gênero na Clandestinidade. In: ROVAI, Marta Gouveia de Oliveira (Org.). História oral e história das mulheres: rompendo silenciamentos. São Paulo: Letra e Voz, 2017. pp. 33-55., p. 33). Uma síntese dessas considerações nos ajuda a compreender porque Julieta nunca se narrou como uma vereadora desenvolta e, involuntariamente, contribuiu para que sua atuação parlamentar nunca tenha ganho o mesmo destaque que sua eleição pura e simples.

Em seu primeiro uso da palavra na tribuna, Julieta afirmou que suas palavras “deviam ser de congratulações, por ser a primeira vez em que uma mulher participa de uma Câmara de Vereadores”, mas que precisava usar aquele espaço para denunciar os governos municipal e brasileiro:

Quero reafirmar as palavras do nobre colega M. B. Gastal [Partido Libertador], em que diz que é um governo de reação. Foi visitar as malocas um Prefeito desse governo, para sentir, como dizia, o que sentem os moradores na sua própria carne. No entretanto, até hoje, são palavras vazias, porque as medidas que quer tomar, são para desmanchar as casinhas dos maloqueiros. Portanto, diz muito bem o colega, que diz que deve levantar uma onda de reação contra esta reação. É o povo organizado que deve levantar-se para fazer parar a chamada ditadura em nossa pátria. Para isso, lançou um manifesto o grande líder dos trabalhadores que é Luiz Carlos Prestes e que eu vou ter o prazer de ler, aqui na tribuna (Anais da Câmara Municipal…, 1949ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1948; Volume II, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1949. , p. 159).

Após relacionar a situação de Porto Alegre com a do Brasil, Julieta passou a ler na íntegra um longo manifesto de Prestes, no qual apareciam os temas mais sensíveis ao PCB naquele momento: frases contra o imperialismo, a Guerra da Coreia e o aumento do custo de vida. Antes que pudesse terminar sua leitura, o vereador Bonorino Buttelli, do PTB, pediu um aparte e iniciou uma série de questionamentos:

O SR. BONORINO BUTTELLI - Este manifesto lançado ao público, em função de que foi lançado?

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Em função de dar ao povo o que merece, porque só ele poderá resolver a sua situação, uma vez organizado.

O SR. BONORINO BUTTELLI - Qual a função do PCB perante a nação? E o Tribunal de Justiça?

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Perante o Tribunal de Justiça foram cassados os mandatos [dos Deputados e Senadores], mas perante o povo é ele legal, por isso este manifesto foi publicado na imprensa comunista.

O SR. BONORINO BUTTELLI - No ponto que fala de liberdade de imprensa, o que diz V. Ex.ª sobre o fato da Tribuna Gaúcha publicar este manifesto?

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Acho que está usando um direito que a Constituição lhe garante. O Nobre Colega não pode negar o que tem feito nos nossos jornais (Anais da Câmara Municipal..., 1949ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1948; Volume II, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1949. , p. 160).

Julieta tentou terminar sua leitura, mas foi novamente interrompida:

O SR. BONORINO BUTTELLI - Que partido representa V. Ex.ª neste plenário?

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Fui inscrita pelo PSP4 4 O PCB já estava na ilegalidade desde o início de 1947, o que fez com que quase todas as candidaturas comunistas no final daquele ano ocorrem sob a legenda do Partido Social Progressista, de Adhemar de Barros. Ver Nunes, 2021; Sena Júnior, 2009. .

O SR. BONORINO BUTTELLI - Fala em nome de que partido?

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Quando me inscrevi, eles sabiam, perfeitamente, que eu era comunista.

O SR. BONORINO BUTTELLI - Obrigado. Era para que constasse nos anais desta casa (Anais da Câmara Municipal…, 1949ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1948; Volume II, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1949. , p. 161).

Julieta enfim conseguiu terminar sua leitura quando o vereador trabalhista a aparteou, questionando-a sobre qual a interpretação que ela dava àquele documento, o que pensava de tudo aquilo. Enquanto Julieta se defendia, Marino dos Santos também entrou em cena e, após afirmar que Buttelli estava “com muita gana, muita vontade de humilhar uma operária”, o Presidente dos trabalhos interveio e devolveu a palavra a Julieta, que terminou assim sua intervenção:

Sr. Presidente, de fato eu sou uma vereadora eleita pelo povo, uma mulher operária, uma mulher sem cultura, mas que tem a coragem política de defender, nesta Câmara, o interesse do povo, deste povo que me conferiu os votos, porque este povo quer que dentro desta casa seus defensores defendam os seus interesses, não com palavras que não entenda, mas com palavras simples e modestas, mas enérgicas, palavras que saibam se levantar não quando o PCB estava na legalidade, mas também quando está na ilegalidade. Para o povo ele continua a ser legal e por este partido eu fui eleita. […].

Portanto, Sr. Presidente, é isso o que o povo sente e sobre isso eu sei falar; sei defender os seus direitos na sua linguagem simples (Anais da Câmara Municipal…, 1949ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1948; Volume II, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1949. , p. 165).

Nesse espaço, Julieta ao mesmo tempo em que reforçava as impressões implícitas de seu interlocutor (“sou uma mulher sem cultura”), afirmava que era justamente esse traço que lhe garantia legitimidade e clareza para falar com e pelos setores mais desfavorecidos da sociedade.

Um mês depois do ocorrido, Julieta voltou a ocupar a Câmara, dessa vez por um motivo desagradável: seu colega Marino dos Santos havia sido preso. No dia 6 de março de 1948, o Jornal do Dia (A Polícia desvenda extenso..., 1948A POLÍCIA DESVENDA EXTENSO plano comunista. Jornal do Dia, Porto Alegre, Ano II, n. 336, p. 8, 6 mar. 1948., p. 8) noticiava que o “ousado integrante da camarilha de Prestes” havia sido encontrado pela polícia em posse de “comprometedores documentos” às 22:30, na rua 7 de setembro, no Centro de Porto Alegre. Indignada, Julieta afirmou na tribuna “que para cada lutador da causa do proletariado que a reação consegue atingir e golpear surgem novos lutadores”, para, em seguida, apontar os responsáveis: “A fim de lançar-se a fundo contra todos os patriotas que nesta hora defendem a integridade da nação brasileira, o governo vende-pátria de Dutra, Jobim e sua camarilha cria um clima de terror policial e de total insegurança para todos.” (Anais da Câmara Municipal…, 1949ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1948; Volume II, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1949. , p. 797-798).

Em julho de 1949, Julieta subiu à tribuna para anunciar a convocatória para o Congresso Continental de Luta pela Paz, que se realizaria no México a convite de Lázaro Cárdenas. Foi a primeira intervenção na Câmara Municipal na qual fez uso da retórica “padrão” das mulheres comunistas naquele momento, afirmando que “As mães, as esposas, as irmãs, as jovens, todas enfim têm o dever de aceitar esta convocação e de se organizar na luta pela paz, pelo progresso do Brasil e do mundo inteiro.” Julieta seguiu:

As jovens, principalmente, que sonham com um mundo melhor, que têm seus noivos, que sonham com um lar, tem o dever de se organizar e defender-se da ameaça de guerra, principalmente a mulher operária. Quando digo, Sr. Presidente, mulher operária, digo-o pelo seguinte: porque somos mães, somos donas de casa e além de tudo, vendemos nosso produto aos nossos patrões por um salário miserável, de fome, e criamos nossos filhos, criados no anonimato, criados na miséria, com fome, sem roupa, sem lar e muitas vezes até sem cama para dormir, como tenho visto nestas casinhas denominadas malocas. Mas, quando moços esses nossos filhos são lembrados pelo governo para irem guerrear em defesa não sabem de quê (Anais da Câmara Municipal…, 1950ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1949; Volume IV, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1950., p. 251).

Antes que pudesse concluir, o vereador Landell de Moura pediu um aparte e recebeu uma resposta pouco usual: “V. Ex.ª com seus apartes só viria a abrilhantar o que estou dizendo, mas V. Ex.ª terá tempo para falar depois à vontade.” (Anais da Câmara Municipal…, 1950ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1949; Volume IV, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1950., p. 252).

Há ainda outra participação sua no ano de 1949 que merece destaque. Diante de um aumento na conta de luz da cidade, a Câmara Municipal convocou Germano Petersen, diretor da Diretoria de Eletricidade e Transportes Coletivos de Porto Alegre, para questioná-lo acerca dos novos valores. Após longas explicações e apartes de seus colegas, quase no “apagar das luzes”, Julieta Battistioli pediu a palavra:

É o seguinte, Sr. Presidente: eu não sei se na minha condição de operária, com pouco estudo e pouca inteligência, eu não compreendi bem a explicação de S. S.ª o Diretor Fiscal da Energia e Transporte, mas, pergunto se não temos, então, uma tabela fixa para o pagamento do preço do kilowatt? É isso que preciso saber.

O SR. GERMANO PETERSEN - Eu respondo a V. Ex.ª. A tabela fixa, eu declarei no início, é de noventa centavos, que sofreu oscilações pela Lei n.º 27 de 5 centavos. Foi criado uma taxa toda especial pelo Governo Federal.

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Prevalecem os 90 centavos?

O SR. GERMANO PETERSEN - Prevalecem, mas, sofrem oscilações quando é para indústrias; quando se trata de energia para força ou para luz, o preço básico é noventa centavos.

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Eu, me parece, que nós pagamos muito mais do que noventa centavos por kilowatt. Não sei se compreendi, quando o carvão é mais caro, sobe o kilowatt; quer isto dizer que a Energia tem o direito de cobrar mais. Se eu paguei Cr$ 20,00, vou pagar Cr$ 60,00, por ser o carvão mais caro, ela assim o justifica; e a prova disso, para quem é que ela faz? O carvão vai lá para dentro e para quem ela deu a prova? É uma cousa que é preciso esclarecer.

O SR. GERMANO PETERSEN - Peço licença para explicar. O preço do carvão é estabelecido pelo Governo Federal e a Prefeitura, apenas, controla o consumo. Sobre o preço a Prefeitura não tem controle, tanto é que, quando houve a greve, que levou 36 dias, com prejuízo para a luz em Porto Alegre, faltou força, de vez que desejavam paralisar completamente o parque industrial em Porto Alegre. Porém, vencemos, após dura luta. Em consequência, devido ao aumento então pleiteado de Cr$ 5,00, o Governo Federal aumentou em Cr$ 15,00 a tonelada de carvão, imediatamente repercutindo no preço do Kilowatt hora de todas as atividades.

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Agradeço a explicação. A minha compreensão é a seguinte: quer dizer que naquele tempo o culpado foi o operário que fez greve para aumento de salário em uma companhia de carvão que é de americanos que tem toda a administração e todo o poder dentro daquelas minas. E se isto é lei do Governo? Então quem tem que arcar daqui por diante é o povo e não adianta ele reclamar, porque que paga, que paga mesmo 20, 30, 40, 60, 80 e cento e tantos cruzeiros, pois que a lei é federal e esse Governo Federal que está aí é americano também (Anais da Câmara Municipal…, 1950ANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1949; Volume IV, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1950., p. 360).

Julieta se apresenta como a operária humilde, “com pouca inteligência”, que não compreende os preços e pede explicações para, no final, chegar à conclusão - que provavelmente já havia chegado anteriormente - de que a culpa era do governo Dutra, e que seus colegas operários eram vítimas de uma política “entreguista”. Ela voltaria a ocupar a tribuna somente em junho de 1951 - a partir de então, participou de quase todas as sessões até o final do mandato, em dezembro.

Em uma dessas intervenções, a vereadora novamente trouxe à tona o tema da violência policial, lamentando que seiscentos novos investigadores estivessem entrando na ativa. Tasso Vieira de Faria, vereador do PTB, perguntou se ela achava que a cidade estava bem policiada, diante do que Julieta não titubeou: “Acho que estão bem policiadas as portas das fábricas, os comícios… e os vendedores de jornais; estes são bem policiados…” (Anais da Câmara Municipal..., 1952aANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume III, Porto Alegre, Selbach. Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952ª., p. 286). Depois disso, a atuação de Julieta se pautou cada vez mais por pedidos de calçamentos de ruas, ligação de luz em moradias populares e extensão da rede de água e esgoto, sempre no 4º Distrito; até que, no mês de julho de 1951, com a crescimento dos rumores de que o Brasil poderia enviar tropas à Coreia e com uma forte campanha a nível nacional (via FMB) e internacional (via FDIM) contra a dita Guerra, Julieta passou a conferir muita importância àquela situação, sempre colocando o tema em seus discursos. Em um deles, por exemplo, a vereadora afirmava que era apenas na guerra que os filhos das classes populares eram lembrados pelo Governo Vargas:

Um governo que não se lembra nunca do trabalhador, que não se lembra nunca do filho do pobre, do filho do povo, este que os pais e as mães criam com tanta dificuldade. Não se lembra nunca de que estas crianças precisam de boa alimentação, de escolas, mas, se lembra delas para vender o seu sangue ao imperialismo americano. É por isso, Sr. Presidentes, Srs. Vereadores, que se reúnem e se organizam todas as mulheres do Brasil para discutir sérios problemas que agravam a nossa classe trabalhadora, que é a garantia de vida e, em primeiro lugar, o mais fundamental, que é de não consentirmos, de maneira alguma, que os filhos das mulheres brasileiras vão para a Coreia matar os filhos das mulheres coreanas (Anais da Câmara Municipal…, 1952bANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume IV, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952b., p. 63).

Julieta, então, leu na íntegra uma carta da União Democrática das Mulheres Coreanas, na qual são descritos todos os horrores da guerra. Após a leitura do texto - que além de descrever imagens chocantes também confere muita ênfase ao fato de as autoras serem mães preocupadas com seus filhos, assim como fazia o PCB -, ela afirma que “de maneira nenhuma nós podemos permitir que nossos filhos saiam de nossa Pátria para matar os filhos das mulheres coreanas” (Anais da Câmara Municipal…, 1952bANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume IV, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952b., p. 68), para em seguida denunciar a prisão de Elisa Branco, mencionada anteriormente. Julieta Battistioli se lembra com muito pesar da experiência parlamentar, afirmando que não tinha jeito para aquilo, mas chama a atenção não apenas como ela conseguia reagir rapidamente às constantes interrupções de seus colegas como, em momentos de maior “paz”, era capaz de concatenar ideias gerais como as condições específicas de vida do operariado: salários, violência policial, imperialismo e Guerra da Coreia compunham um discurso coerente - e tudo isso em 15 minutos, tempo regimental para que cada parlamentar se manifestasse na tribuna.

Algumas semanas depois, Marino dos Santos e o médico Alfredo Hoffmeister (PSD) travaram longo debate sobre os atestados médicos e a assiduidade do operariado na capital, quando Julieta pediu a palavra para, em tom jocoso, acusar os médicos da Renner de “espíritas”, pois receitavam remédios sem sequer examinar seus pacientes (Anais da Câmara Municipal…, 1952bANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume IV, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952b., pp. 268-269) - nem seu local de trabalho, portanto, escapava de suas críticas.

Todos esses embates e contratempos não a impediam de seguir atuando de maneira a tentar fazer valer os objetivos do Partido e de sua bancada. Mesmo o recém-citado Alfredo Hoffmeister e o udenista Ludolfo Boehl se uniram aos comunistas para elaborar um pedido de informações à Companhia Gravataiense acerca do aumento do preço das passagens de ônibus. Durante o pedido de informações, Julieta traçou um breve quadro do custo de vida na zona norte da capital. Segundo ela, o aluguel no Navegantes custava em média Cr$ 700,00 diante de um salário-mínimo de Cr$ 600,00. Ela não nomeia o fenômeno nesses termos, mas morar perto do local de trabalho se tornou caro, quase um luxo, intensificando-se o surgimento e expansão das “cidades-dormitório”. Gravataí, município vizinho ao norte da capital, se tornou um desses destinos. Julieta denunciou que a passagem havia subido para Cr$ 1,20, o que nos possibilita fazer a seguinte conta: Cr$ 2,40 por dia, cinco vezes por semana ao longo de um mês resultaria, em média, em Cr$ 480,00 - 80% do salário-mínimo (Anais da Câmara Municipal…, 1952bANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume IV, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952b., p. 551).

No segundo semestre de 1951, ganhou proeminência na Câmara o vereador trabalhista Tasso Vieira de Faria, figura que já apareceu por aqui defendendo o aumento do efetivo policial. Seus apartes e suas interrupções à sua colega de vereança se tornam uma constante até o final da legislatura, em dezembro. Polêmicas antigas eram “requentadas”, como o fato de o Partido Comunista ser russo, “importado do estrangeiro”. A isto Julieta respondeu prontamente: “O Partido Trabalhista de onde veio?… Da Inglaterra” (Anais da Câmara Municipal…, 1952bANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume IV, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952b., p. 553). Posteriormente, ao denunciar o desemprego, Julieta recebeu o seguinte questionamento de Faria: “Mas, V. Ex.ª estudou as estatísticas anteriores sobre o desemprego? […] Se V. Ex.ª estudasse iria ver que não é tão grande.” (Anais da Câmara Municipal…, 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, p. 67). A provocação deu início a um longo debate, que foi envolvendo cada vez mais parlamentares. Enquanto Julieta denunciava a demissão de 47 operários na fábrica Di Primo Beck, Faria a interrompia constantemente, perguntando qual a razão dessas demissões:

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Alega que não tem serviço. Dizem que o Sr. Di Primio Beck está na fazenda marcando os bois e por isto não pode estar cuidando de sua indústria.

O SR. TASSO VIEIRA DE FARIA - Mas, isto é uma afirmação graciosa.

Não foi isso que ouvi de S. Ex.ª que nos informou do que tem feito em abono da classe operária que trabalha em seu estabelecimento; ele possui a melhor boa vontade e faz para ela o que muita gente boa não faz. Entretanto, V. Ex.ª está dizendo o contrário.

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - Faço um convite a V. Ex.ª para irmos à porta da fábrica do Sr. Di Primio Beck e conversar com os seus operários a fim de saber se é verdade ou não que 47 operários foram postos na rua.

O SR. TASSO VIEIRA DE FARIA - Não estou dizendo não ser verdade, V. Ex.ª é quem está afirmando.

A SRA. JULIETA BATTISTIOLI - O Nobre Vereador acha que salário de 30, 28 e 40 cruzeiros é bom trato para um operário? Como ele vai sustentar a sua família?

O SR. TASSO VIEIRA DE FARIA - V. Ex.ª sabe as razões primárias dos motivos que levaram o Sr. Di Primio Beck a dispensar estes operários? V. Ex.ª alega que é falta de serviço, mas, V. Ex.ª não traz provas. Veja que V. Ex.ª está virando o feitiço contra o feiticeiro. (Anais da Câmara Municipal…, 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, pp. 67-68).

Julieta seguiu no ataque enquanto Faria continuou defendendo o industrial porto-alegrense. Quando a palavra enfim retornou para Julieta, a vereadora retomou o ponto principal de sua fala, afirmando sua preocupação com as “47 famílias que foram lançadas à miséria”, para ser interrompida novamente por Tasso Vieira de Faria, o qual lançou mão de um tradicional estereótipo de gênero: “V. Ex.ª deixa-se levar pela parte sentimental” (Anais da Câmara Municipal…, 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, pp. 67-68). Julieta respondeu que “só não poderá ter sentimento uma pessoa desumana, uma pessoa que quando come, que quando está com a barriga cheia não se lembra da maioria do povo que está com fome”, e encerrou assim a discussão:

Sr. Presidente e Srs. Vereadores. Não é só a fábrica do Sr. Di Primio Beck que botou operários para rua, como a Cia. Souza Cruz, em número de 60 e a Camisaria Tannhauser que botou 10 operários para rua; despachou dez operários única e simplesmente porque o sindicato dos alfaiates pleiteou aumento de salário, de dez ou quinze por cento. Provavelmente os que estão em férias quando voltarem estarão ameaçados de ser despedidos e depois então ele adquire novos operários pelo preço antigo. Mas, as camisas e as gravatas do Sr. Tannhauser subiram de preço, enquanto os operários ficam nas mesmas condições. Esta é a verdade que deve ser dita, doa a quem doer (Anais da Câmara Municipal…, 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, p. 68).

Julieta seguia denunciando na tribuna a prisão de pessoas que distribuíam panfletos e coletavam assinaturas pela paz - sempre, é claro, com as interrupções do vereador Tasso Vieira de Faria. Em uma das poucas vezes em que ele, de fato, pediu um aparte, Julieta não concedeu, respondendo o seguinte: “Eu não vou ceder o aparte a V. Ex.ª porque V. Ex.ª costuma, quando uso minha tribuna, falar mais do que eu e nunca fala nada a favor do povo. V. Ex.ª, depois, ocupe sua tribuna e defenda os ‘Tubarões’.” (Anais da Câmara Municipal..., 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, p. 254). Contrariado, o vereador acusou Julieta de ir “contra a ética parlamentar”, pedindo mais uma vez um aparte. Dessa vez, Julieta ignorou e seguiu com seu discurso, relembrando dos 47 demitidos da Fábrica Di Primio Beck e afirmando que o desemprego chegara também à Fábrica Renner (Anais da Câmara Municipal…, 1952cANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VI, Porto Alegre, Selbach . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952c, pp. 255-256).

Para concluir, nos interessa sua última manifestação, acerca do abono de Natal. Muitas das justificativas patronais para suas políticas paternalistas ao longo do século XX eram a suposta incapacidade do operariado de cuidar de si próprio. Se recebesse férias, dinheiro “a mais” ou se morasse longe do local de trabalho poderia gastar com bebidas, jogo, etc. (Fortes, 2004FORTES, Alexandre. Nós do Quarto Distrito: a classe trabalhadora porto-alegrense e a Era Vargas. Caxias do Sul: EDUCS; Rio de Janeiro: Garamond, 2004.; Nunes, 2017NUNES, Guilherme Machado. Ócio e lazer na regulamentação das férias operárias: a OIT e o caso brasileiro na primeira metade do século XX. Anuario del Instituto de Historia Argentina, v. 17, n. 1, pp. 1-18, jun. 2017. ). Julieta direcionou um de seus discursos em dezembro de 1951 justamente a este tipo de pensamento:

Sr. Presidente e Srs. Vereadores. A minha vinda à tribuna, hoje, é para falar do dia de Natal. Estamos às vésperas do Natal e passando nas principais ruas, nós deparamos com vitrinas cheias de brinquedos e bonecas. Deparamos, também, com crianças olhando, espantadas, para essas vitrinas e nunca poderá a maioria delas obter uma boneca que seja para o dia de Natal. Vendo este panorama, Sr. Presidente, Sr. Vereadores, vemos que a maioria do povo, que é a classe operária, os trabalhadores, homens e mulheres que trabalham o ano inteiro produzindo, dando lucros extraordinários a seus patrões, ao chegar a época do Natal tem que dizer a seus filhos que o Papai Noel não vem a eles porque não se comportaram durante o ano. É isto, Sr. Presidente e Srs. Vereadores, que os pais costumam dizer a seus filhos e que nós devemos abolir. Devemos de nossa Tribuna dizer aos pais que se não podem comprar um presente de Natal para os seus filhos nunca lhes digam que o “Papai Noel” não veio porque não se comportaram durante o ano e sim, que lhes digam a verdade: “Papai Noel” não veio porque teus pais são operários, trabalham o ano inteiro, dando lucros extraordinários para os seus patrões e estes não se lembram que, às vésperas de Natal, devem dar aos pais das crianças, seus operários, um mês de salário.

O abono de Natal não é para o operário, como costumam dar todos os patrões, um barril de chopp e uma bandeja de doces ou convidar os operários a ir tomar esse chopp. Isso não é o abono de Natal. Também não é o abono de Natal o que dão esses patrões como o Sr. A. J. Renner, que às vésperas de Natal costuma dar aos seus operários uma cesta como um rancho e que hoje já passou a dar um vale, somente, para ser gasto dentro das suas lojas. O abono de Natal que deve ser dado é um mês de salário para todos os trabalhadores, para que eles possam ter, pelo menos, um dia feliz com sua família (Anais da Câmara Municipal…, 1952dANAIS DA CÂMARA MUNICIPAL de Porto Alegre. 1951; Volume VII. Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado . Porto Alegre (Biblioteca da Câmara Municipal de Porto Alegre). 1952d., p. 255).

Novamente, Julieta lançava mão da retórica de valorização da família e da criança, apontados como os verdadeiros beneficiários do 13º - mais uma vez, a maternidade rompia a esfera da domesticidade e virava instrumento de luta por direitos e de legitimidade no espaço público. Ao término de sua fala, Julieta leu o balanço e o lucro das principais indústrias de Porto Alegre, conforme publicado no Diário Oficial, e encerrou lendo um documento que marcava a criação da “Comissão Pró-salário mínimo vital e pagamento do abono de Natal.”.

É possível perceber esse momento e essas iniciativas como muito importantes para a politização da maternidade. Mary Dietz (1985DIETZ, Mary G. Citizenship with a Feminist Face: The Problem with Maternal Thinking. Political Theory, v. 13, n. 1, pp. 19-37, feb. 1985., pp. 19-20) identificou como feministas maternais ou feministas pró-família um conjunto de feministas que defendiam a maternidade como sendo fundamental para a identidade de gênero e a consciência política contra o patriarcado. Abril Zarco (2011ZARCO, Abril. Maternalismo, identidad colectiva y participación política: las Madres de la Plaza de Mayo. Revista Punto Género, n. 1, pp. 229-247, abr. 2011., p. 233) identificou como o maternalismo teve forte influência “na inserção de mulheres no âmbito político latino-americano”, usando Eva Perón como exemplo. A autora analisou também outros dois movimentos de mulheres importantes no subcontinente: as Madres da Plaza de Mayo, durante a ditadura argentina, e a resistência das mulheres mexicanas às investidas neoliberais contra as comunidades tradicionais, nos anos 1980. Zarco (2011ZARCO, Abril. Maternalismo, identidad colectiva y participación política: las Madres de la Plaza de Mayo. Revista Punto Género, n. 1, pp. 229-247, abr. 2011., p. 234) afirma que estas mulheres “politizaram a maternidade”. A vida e a militância de mulheres como Julieta Battistioli sugere que esse fenômeno aconteceu também em outros lugares ao longo dos anos 1940 e 1950.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao cunhar a expressão “jogos de gênero”, Luc Capdevila (2001CAPDEVILA, Luc. Resistance civile et jeux de genre. Annales de Bretagne et des Pays de L’Ouest, v. 108, n. 2, pp. 103-128, 2001., p. 6) explica como em regimes de exceção e ditaduras as mulheres “saem” do ambiente privado para o espaço público justamente “jogando”, consciente ou inconscientemente, com o discurso existente sobre quais seriam suas condutas e seus comportamentos legítimos. As mulheres comunistas brasileiras também deram sua contribuição nesse sentido. A prisão da líder comunista Elisa Branco em 1950, após desfraldar um cartaz com os dizeres “Os soldados nossos filhos não irão para a Coreia”, é muito significativa nesse sentido. A maternidade se tornou uma bandeira.

Julieta Battistioli, por sua vez, ao ocupar a Câmara Municipal de Porto Alegre, deu maior visibilidade a esse discurso e, consciente ou inconscientemente, instrumentalizou as falas com imagens a respeito da maternidade, relacionando-a com a luta contra o imperialismo e o custo de vida, por exemplo. Identificar outras protagonistas, bem como os espaços por onde elas circularam fazendo uso dessa estratégia, são ações que podem nos ajudar a compreender outros prismas da história das mulheres brasileiras em geral, e das comunistas em particular.

REFERÊNCIAS

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  • 1
    Em artigo recente, Céli Pinto (2017PINTO, Céli Regina Jardim. Elas não ficaram em casa. As primeiras mulheres deputadas na década de 1950 no Brasil. Varia Historia, Belo Horizonte, v. 33, n. 62, pp. 459-490, mai.-ago. 2017., p. 488) também busca reforçar “a diversidade - e não a excepcionalidade” na trajetória de doze mulheres eleitas para o parlamento brasileiro nos anos 1950.
  • 2
    A partir de 1950, a União Feminina Gaúcha passaria a se chamar Federação de Mulheres do Rio Grande do Sul, entrando em uniformidade com as Federações dos outros estados (Cf. Atividades femininas, 1950ATIVIDADES FEMININAS, Momento Feminino, Rio de Janeiro n. 77, p. 2, 20 out. 1950., p. 2).
  • 3
    Ao se referir às campanhas de mães de presos e desaparecidos políticos nas Ditaduras de Segurança Nacional, Benito Schmidt mostra como, ao mesmo tempo que essas mulheres “investia[m] em representações tradicionais sobre a maternidade”, também “subvertia[m] fronteiras de gênero”, de modo a “ganhar o espaço público e afirmarem-se enquanto agentes políticos.” (Schmidt, 2017SCHMIDT, Benito Bisso. Flávio Koutzii: biografia de um militante revolucionário - de 1943 a 1984. Porto Alegre: Libretos, 2017., p. 418).
  • 4
    O PCB já estava na ilegalidade desde o início de 1947, o que fez com que quase todas as candidaturas comunistas no final daquele ano ocorrem sob a legenda do Partido Social Progressista, de Adhemar de Barros. Ver Nunes, 2021NUNES, Guilherme Machado. Mulheres Comunistas no Brasil: Elisa Kauffmann Abramovich, Julieta Battistioli e Júlia Santiago da Conceição (1935-1965). Tese (Doutorado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2021.; Sena Júnior, 2009SENA JÚNIOR, Carlos Zacarias de. Os impasses da estratégia: os comunistas, o antifascismo e a revolução burguesa no Brasil. 1936-1948. São Paulo: Annablume, 2009. .

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    09 Out 2021
  • Aceito
    30 Set 2022
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