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A ‘leitura’ segundo estudantes do ensino médio integrado ao ensino técnico no nordeste brasileiro

‘Reading’ according to technical high school students in the northeast of Brazil

RESUMO

Neste trabalho temos por objetivo analisar representações leitoras compartilhadas por estudantes da Escola Agrícola de Jundiaí/Universidade Federal do Rio Grande do Norte, depreendidas a partir de entrevista semiestruturada, de modo a refletir acerca das injunções sociais, culturais, históricas que determinam as formas legítimas de ser e de se apresentar como leitor, que se encontram conservadas, eventualmente questionadas, no que enunciam esses jovens em relação a si, como bons ou não tão bons leitores, e no que enunciam, de modo geral, acerca da leitura. Nesta análise, de base qualitativa, apoiamo-nos em princípios da Análise de discurso, da História Cultural e dos Novos Estudos sobre Letramento. Entre as constatações, vimos que embora sejam leitores nem todos assim se reconhecem. A melhor compreensão do funcionamento desses discursos sobre a leitura, no âmbito do ensino, permite lidar com seu impacto sobre os processos de identificação desses jovens com essa prática, logo, com seu exercício.

Palavras-chave:
discursos sobre a leitura; leitor jovem; EAJ/UFRN; formação leitora

ABSTRACT

In this paper we aim to analyze reader representations of students from the Agricultural School of Jundiaí/Federal University of Rio Grande do Norte. They were identified through semi-structured interviews, to reflect on the social, cultural, and historical aspects that determine legitimate ways of being a reader as well as on the act of reading in general. Such ways are manifested and occasionally questioned through what these young people say about themselves as good or not so good readers. The readers are characterized by their spontaneous participation in a project that encourages reading and which is coordinated and developed by teachers in this institution. The qualitative analysis relies on the principles of discourse analysis, cultural history, and new literacy studies. Based on our analysis, we found that although they are indeed readers, not all of them see themselves as such. A better understanding of these discourses on reading, in the context of teaching, will help teachers deal with the impact of such discourses on the processes of identification of these young people with the reading practice.

Keywords:
discourses on reading; young reader; EAJ/UFRN; reader training

Leitura, classe social e poder

A leitura e a escrita são indissociáveis de questões de classe e de poder. No Brasil isso não é diferente. Nossa história fez dessas práticas símbolos de distinção social (Bourdieu, 2015Bourdieu, P. (2015). A distinção: crítica social do julgamento. Zouk.), graças a sua distribuição estritamente regrada e rarefeita. Em função disso, seu domínio, seu uso e sua ostentação gozam de um valor simbólico em nada negligenciável.

Não sem razão, a compreensão desse papel que a escrita e a leitura desempenham em nossa sociedade é ainda muito imprecisa para a maioria daqueles que delas foram alijados e que delas dependem cotidianamente. Assimiladas como técnicas e definidas como resultantes do interesse e esforço individual, sua carência “endêmica” junto às populações pauperizadas e negligenciadas pelo poder público no Brasil é contornada com atitudes individuais, benevolentes ou proselitistas com vistas a seu incentivo e ensino, em geral para fins pragmáticos.

É sintomático, como sociedade, essa nossa percepção mais imediata da dimensão técnica da leitura e de sua finalidade mais pragmática. Com essa percepção, a referência à leitura é destituída de sua dimensão política, que permitiria observar que nem todos no Brasil podem ser leitores, i) porque histórica e socialmente muitos foram (e ainda o são) alijados do direito à alfabetização; ii) e porque, mesmo tendo aprendido a ler e a escrever, à grande maioria ainda é negado o acesso efetivo aos bens culturais e às práticas de prestígio. Grande parte dos brasileiros não dispõe de livros nem de uma conjuntura propícia à leitura de modo precoce, regular e perene, como deveria ser. As razões vão desde a possibilidade de aquisição ou não dos objetos culturais que essa prática implica, passando pela limitação do tempo necessário para que se possa ler de modo regular e adequado, até, enfim, a impossibilidade de poder se identificar como leitor, em função da ampla difusão que encontra a representação idealizada dessa posição. 4 4 Nos valemos aqui do conceito de “representação”, tal como definido por Chartier (2002).

A resposta de um jovem estudante à pergunta “O que a leitura significa para você?” reflete esse cenário de desigualdade social e cultural no Brasil, que perdura entre nós ainda hoje:

Eu nunca fui uma pessoa que gostei muito de leitura, mas sempre a minha família ficava dizendo “você tem que ler, você tem que ler, tem que ler, tem que ler”. Na minha vida a leitura significa uma forma de ajudar o outro, porque minha vó, ela é analfabeta [...]. Então, para onde ela vai, eu tenho que ir com ela, porque eu tenho que estar sempre ajudando “Vó, você pega tal ônibus. Vó, aquele nome ali é o que a senhora tem que pegar.” [...]. Enfim, [a leitura] é uma forma que eu tenho como ajudar o outro”. (E11)5 5 “E” significa Entrevistado seguido por um número aleatório. Todos os dados foram obtidos no âmbito da proposta de pesquisa submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos, da Universidade Federal de São Carlos (número do parecer: 2.804.953; CAAE: 92752218.7.0000.5504).

Essa resposta reflete ainda a divisão, no plano simbólico, do representável sobre a leitura, ou seja, aquela responsável pelo que cada um, em função de seu universo de socialização, experiencia acerca dessa prática. Nessa resposta, o jovem se lembra da falta que ela faz para quem não aprendeu a ler. No entanto, em sua sinceridade, enuncia de tal modo como se expiasse uma culpa ou revelasse um pecado ao revelar que “nunca foi uma pessoa que gostasse muito de ler”. Isso por si só indicia uma certa inadequação quanto aos discursos que, ainda na atualidade, definem o que se pode e se deve dizer sobre a leitura.

O funcionamento desses discursos não interdita tacitamente que o entrevistado se expresse do modo como fez. Esses discursos, na verdade, operam outorgando maior ou menor prestígio, sancionando positiva ou negativamente aqueles que enunciam sobre a leitura, seja em função da posição que esse sujeito ocupa socialmente, seja em função da adequação (ou não) do seu dizer ao discurso oficial, consensual e dominante. Afinal, é pelo dizer que o sujeito atesta sua familiaridade com o universo letrado e sua propriedade como leitor.

Em sua resposta, este aluno também nos informa de uma recomendação relativa à leitura que lhe foi dirigida reiteradas vezes por parte de seus responsáveis: “você tem que ler!”. Esse enunciado injuntivo indicia, em sua repetição enfática e em sua forma modal, o efeito de sentido de uma ordem, de um conselho, mas também de um apelo. Apesar de sua formulação modal de efeito polivalente, o valor que se atribui à leitura em nossa sociedade, e sobretudo para aqueles que foram vítimas de sua falta, ecoa nesse enunciado sob a forma do apelo.

O analfabeto, assim como aqueles que não dispõem de outras formas dominantes de letramento, ao longo de toda sua existência, têm consciência do quanto essa ausência lhes castra, inibe e restringe, como também lhes aprisiona em sua pertença social. Ser privado da leitura não apenas limita o sujeito no plano intelectual, artístico e político, e o condena a lidar com o sentimento de culpa individual, de vergonha cultural. Simultaneamente, privações culturais como esta atuam sobretudo como justificativa para sua miséria socioeconômica, tal como observado por Bourdieu (1999Bourdieu, P. (1999). Os três estados do capital cultural. In M.A. Nogueira, & A. Catani (Eds.), Escritos de educação (pp. 71-79). Vozes.) e Souza (2009Souza, J. (2009). A ralé brasileira: quem são e como vivem. Editora UFMG. ).

Representadas nessa simples resposta do aluno, essas duas gerações distintas, em sua relação com a leitura, sintetizam nossa história de formação de leitores que se constitui de fatores muito peculiares:

um processo de alfabetização, de início, extremamente elitizado e, em seguida, de uma alfabetização em massa muito recente e precária; da emergência, concorrência e predomínio de formas audiovisuais de massa como forma de informação e entretenimento, em detrimento do livro ou outros impressos; da falta e da demora na constituição de políticas públicas de Estado (e por isso perenes), não condicionadas às políticas de governo (que se alteram a cada novo mandato), voltadas para a formação leitora e para a garantia de acesso ao livro e a outros bens culturais a ele relacionados; de profissionalização de mediadores e incentivadores da leitura, entre outros. (Curcino, 2011Curcino, L. (2011). O leitor brasileiro: mutações técnicas e práticas de leitura na atualidade. Devenir Revista Chiapaneca de Investigación Educativa. 19 (1), 141-150., p. 144)

O acesso ao ensino formal pelas camadas mais pobres no Brasil se dará somente no final da primeira metade do século XX, portanto, há menos de 100 anos. Ainda assim, ele se deu de forma muito errática e seletiva, sobretudo se considerarmos que até os anos 70 a maioria da população brasileira vivia no campo e a migração para o espaço urbano se fará de maneira rápida e inapropriada. Seduzidos pela promessa de emprego e de escola para seus filhos, muitos brasileiros fazem essa transição, sem planejamento nem proteção estatal, criando e ampliando os bolsões de pobreza que darão origem às favelas.

Nessa conjuntura, ocorre um choque cultural entre formas de letramento mobilizadas pela população urbana de então e aquela dos migrantes do campo para a cidade ou dos migrantes de uma região do país para outra, em busca de trabalho e sobrevivência. Um sistema de distinções culturais e hierarquias sociais se recrudesce, com base na valorização, e em sua distribuição desigual, dos letramentos historicamente dominantes (Street, 2001Street, Br. (2001). Literacy events and literacy practices: theory and practice in the New Literacy Studies. In M. Martin-Jones, & J. Kathryn (Eds.), Multilingual Literacies: reading and writing different words (pp. 17-30). John Benjamins. e 2014Street, B. (2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. Parábola Editorial.), institucionalizados e consagrados, que constituem para uma dada sociedade o capital cultural de prestígio (Bourdieu, 1999Bourdieu, P. (1999). Os três estados do capital cultural. In M.A. Nogueira, & A. Catani (Eds.), Escritos de educação (pp. 71-79). Vozes.). A rarefação do acesso a essa cultura se faz, entre outras coisas, também por esse processo de ensino formal inadequado, precário e ideologicamente gestor da reprodução de desigualdades (Bourdieu & Passeron, 2014Bourdieu, P., & Passeron, J.C. (2014). A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Vozes.). Os gestos e gostos de leitura que têm prestígio, e que por isso o outorgam aos sujeitos que os atualizam, continuam restritos a poucos, e essa restrição em grande medida é invisibilizada graças ao funcionamento das representações discursivas dominantes sobre essa prática.

Sem compreender essa conjuntura sociopolítica e os meios simbólicos de sua naturalização, viceja entre nós a aposta no esforço individual, na hegemonia do discurso meritocrático, segundo o qual convenientemente as classes mais favorecidas esquecem das vantagens que contam de saída, de modo a não reconhecê-las como privilégios dos quais poucos se beneficiam. Em pesquisas junto a alunos em fase de alfabetização, e a seus pais, referidas por Soares (2001Soares, M. (2001). As condições sociais da leitura: uma reflexão em contraponto. In R. Zilberman, E. Silva, & Ezequiel. T. (Eds.), Leitura: perspectivas interdisciplinares (pp. 19-29). Ática. ), a autora observa que as respostas para a mesma pergunta variavam em função da origem social desses sujeitos. Ao serem perguntados sobre as razões de “por que estavam aprendendo a ler?”, e aos pais sobre “a importância da leitura”, ela constatou que:

Crianças e pais das camadas mais populares veem a aprendizagem da leitura como um instrumento para obtenção de melhores condições de vida - a leitura é avaliada em função de interesses utilitários. Já crianças e pais das classes favorecidas veem a leitura como mais uma alternativa de expressão, de comunicação, nunca como uma exigência do e para o mundo do trabalho. (Soares, 2001Soares, M. (2001). As condições sociais da leitura: uma reflexão em contraponto. In R. Zilberman, E. Silva, & Ezequiel. T. (Eds.), Leitura: perspectivas interdisciplinares (pp. 19-29). Ática. , p. 22)

Constatações semelhantes são aquelas observadas por Chartier (2019Chartier, R. (2019). Ler sem livros. Linguasagem, 32 (spe), 6-17. (Accessed 13 August, 2021). Disponível em: Disponível em: http://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/655/396
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), ao se referir a similitudes nas narrativas de intelectuais e autores em entrevistas nas quais eram instados a falar de como se tornaram leitores, de suas memórias de leitura, na infância e adolescência. Valendo-se da categoria de herdeiros, tal como definida por Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (1964Bourdieu, P., & Passeron, J.C. (1964). Les héritiers: les étudiants et la culture. Minuit.), ele depreende certos traços em comum presentes nas narrativas daqueles que se enquadram neste perfil, a saber, o da precocidade, o da autonomia na escolha, o da individualidade e exclusividade do que se leu, o da finalidade prazerosa da leitura.

Em contraposição, nas narrativas daqueles que nasceram em um “mundo sem livros”, aquelas dos não-herdeiros, são outros os traços em comum que sobressaem. O historiador afirma que se destaca nesses relatos a descrição da leitura como uma “conquista” e não como “herança”, e para essa conquista a escola desempenha papel fundamental.

Esses autores, assim como outros dedicados aos estudos da leitura, da escrita e de seu ensino, têm como ponto decisivo de suas abordagens dessas práticas as condições sociais e históricas de sua emergência, fomento e possibilidade de atualização. Para eles, é fundamental remontar às relações de poder que regem de antemão nossas práticas, entre elas a leitura e a escrita. Para isso, é preciso compreender o funcionamento dos discursos sobre essas práticas a partir dos quais se instituem as representações consensuais e hegemônicas sobre os sujeitos que as exercem.

Dentre esses estudos históricos e discursivos seguimos os Novos Estudos sobre Letramento (NEL)6 6 Do inglês “New Literacy Studies” (NLS). . Nesses estudos se problematiza o que se considera “como letramento em dado tempo e lugar, questionando ‘de quem’ são os letramentos dominantes e ‘de quem’ são os letramentos marginalizados” (Street, 2013Street, B. (2013). Políticas e práticas de letramento na Inglaterra: uma perspectiva de letramentos sociais como base para uma comparação com o Brasil. Cadernos CEDES, 33(1), 51-71. https://doi.org/10.1590/S0101-32622013000100004
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, p. 53). Esse ponto de vista assemelha-se ao adotado em Análise do discurso e em História Cultural, relativos à leitura. Essas abordagens questionam o funcionamento dos discursos hegemônicos que instauram as hierarquias entre as práticas, além de essencializá-las, ao estabelecer uma identidade entre as representações idealizadas, seletivas e hierarquizantes de uma prática, como sendo equivalentes à própria prática. A naturalização desse espelhamento entre a imagem idealizada e as práticas efetivas elimina e estigmatiza suas variantes.

Em geral, instituições como a mídia, as instâncias públicas e administrativas decisórias e a escola incorporam e se tornam arautos desses discursos hegemônicos, contribuindo para sua hegemonia junto à sociedade. Em relação aos discursos sobre a leitura, viceja e predomina a sua representação idealizada e essencializada: se reconhece como leitor aquele que lê com fluência e sempre e que, mais do que isso, pode se dar ao luxo da leitura ficcional, por prazer, de livros e autores de preferência canônicos, além de ser aquele considerado capaz de mobilizar, com propriedade e desenvoltura, o protocolo discursivo das coisas a dizer sobre a leitura e sobre si como leitor (Abreu, 2006Abreu, M. (2006). Cultura letrada: literatura e leitura. Editora UNESP.; Borges, 2020Borges, R. (2020). Representações do professor leitor em língua espanhola e de suas práticas com a leitura em sala de aula. Caracol, 19, 734-764. https://doi.org/10.11606/issn.2317-9651.v0i19p734-765.
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; Curcino, 2018Curcino, L. (2018). Imprensa e discursos sobre a leitura: representações dos presidentes FHC, Lula e Dilma como leitores. EID&A - Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, 16, 223-243. https://doi.org/10.17648/eidea-16-2223.
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).

Tendo em vista a importância de se compreender o funcionamento dos discursos e seu impacto sobre práticas como a leitura e seu ensino, nossa proposta neste artigo consiste em depreender as representações discursivas sobre essa prática compartilhadas por jovens estudantes de ensino médio de uma instituição pública localizada no Nordeste brasileiro, de modo a identificar as regularidades e eventuais especificidades quanto ao que enunciam a esse respeito.

Jovens e estudantes: uma breve caracterização de seu perfil

As declarações sobre a leitura que são, neste artigo, objeto de nossa análise foram obtidas em 2018, por meio de entrevista semiestruturada, junto a alunos de Ensino Médio integrado ao Ensino Técnico da Escola Agrícola de Jundiaí (EAJ) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), campus localizado em Macaíba, região metropolitana de Natal. Trata-se de uma instituição pública de ensino gratuito que goza de condições de funcionamento e de prestígio distintos de suas equivalentes, contando com um quadro de docentes cuja atuação e remuneração também diferem da de seus pares. Em geral, seus professores dispõem de melhor formação inicial, contam com condições de formação contínua mais adequadas ao longo da carreira e sua atuação pressupõe tanto a prática docente quanto o desenvolvimento de pesquisas e atividades de extensão, semelhante ao que ocorre no ensino superior.

Seu alunado também se diferencia daquele das demais escolas públicas. Eles são selecionados por meio de uma prova de caráter seletivo e eliminatório. Muitos candidatos provêm de boas escolas privadas da região e fazem parte da classe média brasileira. Visam além da formação de qualidade, com sua entrada na EAJ, ao benefício de poder concorrer como “cotistas” às vagas das universidades públicas do país destinadas a alunos que tenham cursado integralmente os três últimos anos do Ensino Básico em instituições públicas. Metade do total das 160 vagas anuais, ofertadas pelos 4 cursos técnicos da instituição (Agropecuária, Agroindústria, Informática e Aquicultura), é reservada a alunos advindos de escolas públicas. Dessas 80 vagas, metade é reservada a alunos com renda familiar bruta de até 1,5 salário per capita e 27,84% delas a alunos autodeclarados pretos, pardos e indígenas e/ou pessoas com deficiência)7 7 Essa porcentagem é estabelecida conforme número percentual desses grupos no Estado, baseado no senso da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, tais informações estão dispostas no edital de seleção nº 09/2019, que segue modelo semelhante ao dos anos anteriores, disponível em http://www.comperve.ufrn.br/conteudo/cursostecnicos/escolaagricola/2020/documentos/edital_092019_20190909.pdf. .

Graças a essas regras e condições de acesso relativamente recentes no país, os alunos da instituição apresentam perfis étnicos e econômicos mais plurais do que antes. No entanto, por se tratar de processo seletivo altamente concorrido, mesmo os alunos cotistas são uma minoria de eleitos em relação a seus grupos de origem8 8 Segundo dados disponibilizados pela Comissão Permanente de Processos Seletivos (Comperve) da UFRN, tendo por base exame seletivo para ingresso no ano de 2020, e a título de amostragem, considerados apenas os números de alunos que optaram pela reserva de vagas destinadas a alunos provenientes de escola pública, em Agroindústria foram 436 inscritos e 30 aprovados (6,8%), Agropecuária 419 inscritos e 35 aprovados (8,3%), Aquicultura 325 inscritos e 35 aprovados (10,7%) e Informática 529 inscritos e 35 aprovados (6,6%). Dos aprovados não sabemos efetivamente quantos se matricularam. . Nos termos do sociólogo Jessé Souza, eles e suas famílias seriam caracterizados como fazendo parte da parcela dos “batalhadores”, aqueles que, distintamente da “ralé”, possuem certas condições para fugir de seu destino social.

São pessoas que fizeram escola pública ou universidade particular (no melhor dos casos) tendo de trabalhar paralelamente muitas vezes em mais de um emprego. Muitos trabalham entre 10 e 14 horas por dia e não possuem o recurso mais típico das classes do privilégio que é o “tempo” para incorporação de conhecimento valorizado e altamente concorrido [condições] distintas das classes médias estabelecidas entre nós. (Souza, 2011Souza, J. (2011). Ralés, batalhadores e uma nova classe média. Entrevista especial com Jessé Souza. Revista IHU on-line - Instituto Humanitas Unisinos (spe.), 1-10. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/40345-rales-batalhadores-e-uma-nova-classe-media-entrevista-especial-com-jesse-de-souza
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, s.p.)

Ainda que se trate de uma instituição pública federal de ensino gratuito, para muitos destes “batalhadores” sua dedicação exclusiva à escola e sua permanência em tempo integral são um desafio, tendo em vista custos com transporte, alimentação e materiais escolares, e a impossibilidade de exercerem simultaneamente algum trabalho remunerado para complementação da renda familiar. Não raro, aqueles que vivem em regiões mais precárias e com menos possibilidades de transporte, precisam acordar antes das 5h da manhã e retornam para casa por volta das 20h da noite.

Além das atividades fixas da grade de disciplinas, os alunos contam ainda com atividades extracurriculares promovidas por equipes de professores e grupos de pesquisa. A geração de dados que apresentamos neste artigo foi realizada no âmbito de uma dessas atividades, junto ao Grupo de Leitura, cujos encontros semanais se iniciaram em março de 2018 com o objetivo de fomentar a leitura e a reflexão coletiva sobre essa prática e de compartilhar impressões, gostos e sugestões de títulos e autores por parte de seus participantes.

Dos 35 participantes, em média a cada encontro, 20 se dispuseram a participar da entrevista, sob a forma de roda de conversa, gravada em áudio e parcialmente transcrita, conduzida a partir de um questionário semiestruturado, composto de nove perguntas9 9 Questionário disponível no apêndice. . Foram compostos 5 grupos, 2 deles com 5 alunos, 2 outros com 4 alunos, e uma dupla, em função de sua disponibilidade de horário. Desses 20 entrevistados, 14 fazem parte do grupo de alunos classificados pela instituição como em situação de vulnerabilidade social10 10 Conforme disposto na resolução da UFRN nº 229/2018-CONSEPE (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão), em 04 de dezembro de 2018, e publicado no boletim de serviços da UFRN, nº 243, em 27 de dezembro de 2018, fls. 14, capítulo VI, art. 25: “Considera-se estudante em vulnerabilidade socioeconômica aquele que possua renda familiar per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio e/ou comprove situação de carência por meio de avaliação socioeconômica a partir de análise de documentos comprobatórios apresentados pelo estudante”. .

No momento de geração dos dados, as questões socioeconômicas não foram um critério de seleção para a participação desses estudantes na pesquisa. Posteriormente, constatamos haver uma participação significativamente maior de alunos em situação de vulnerabilidade social do que de alunos de classe média. Isso se deve, possivelmente, pela crença em uma diferença em relação aos demais quanto a certos saberes valorizados institucionalmente, e que por isso a sua participação em circunstâncias como esta dos grupos de leitura seriam oportunidades para sanar o que creem ser um déficit.

Discursos sobre a leitura e os jovens leitores:

É recorrente entre nós a ideia de que se vive uma crise da leitura. Em geral, essa afirmação emerge em referência às práticas dos mais jovens. O que leem, o quanto leem, como leem são constantemente evocados sob o signo da crítica e da depreciação, alimentando constantemente essa representação duradoura e equivocada, na maioria das vezes, que é compartilhada em sociedades como a nossa, sobre a degradação das práticas de leitura das gerações anteriores.

A avaliação depreciativa e crítica acerca das práticas leitoras dos jovens responde à comparação de uma representação genérica e pré-concebida que se faz de seus hábitos, maneiras e gostos de leitura, com uma representação também genérica, mas muito idealizada, dos hábitos, maneiras e gostos de leitura do leitor-ideal. Essa representação idealizada da leitura é expressa tanto por aqueles que se sentem representantes legítimos do que creem ser as práticas do ‘leitor ideal’, quanto por aqueles a quem foi negado o direito à leitura, que não se reconhecem como leitores, apesar de saberem ler e lerem. Estes últimos, aprenderam qual era o lugar que lhes havia sido reservado na hierarquia cultural em relação à leitura, e o aprenderam de tal modo que, ainda que esta hierarquia os desprestigie, limite, humilhe e lhes impeça de poder ‘vir a ser’ leitor, ainda assim, a respeitam e a afiançam, reconhecendo sua legitimidade e reproduzindo seus discursos. Esse é o aspecto mais perverso do funcionamento da ideologia dominante: tornar os dominados porta-vozes dos discursos daqueles que os dominam (Bourdieu & Passeron, 2014Bourdieu, P., & Passeron, J.C. (2014). A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Vozes.).

Os julgamentos que em geral circulam a respeito dos jovens e suas práticas de leitura se baseiam nesse sistema de comparações, artificial e falseador, seja com as versões mais institucionalizadas e escolares de exercício da leitura, seja com uma versão nostálgica de um não necessariamente vivido (Curcino, 2019Curcino, L. (2019). Das emoções nos discursos sobre a leitura: uma análise dos modos de expressão da ‘nostalgia’, do ‘orgulho’ e da ‘vergonha’ na voz de leitores. [Projeto de Pesquisa 2019-2022]. [mimeo]. ), nem testemunhado relativo ao modo como se leria antigamente. Assim, as diferenças do que se vê atualmente, se é que elas de fato se sustentam em uma comparação racional de dados, são sempre vistas em benefício de uma sua versão no passado. Nessa alusão nostálgica ignora-se por completo o quanto, mais do que hoje em dia, o acesso à leitura e o direito de ser leitor no Brasil, no passado nem tão distante, era rarefeito, desigual e hierarquizado. Como observa a autora, essa visão nostálgica faz esquecer que, até os anos 70, poucos podiam aprender a ler, poucos tinham acesso aos textos de prestígio, e quanto menos leitores e menor fosse o acesso à leitura e aos livros, mais valorizada era essa prática desses ‘seletos’ sujeitos leitores, mais reconhecidas eram suas escolhas e práticas de leitura, e mais fetichizados eram os livros.

É, portanto, o cotejamento genérico, enviesado e nostálgico com uma representação idealizada da leitura e do ‘leitor ideal’ o que sustenta a impressão prenhe de pré-concebidos, e que é frequentemente reproduzida nessas críticas segundo as quais os jovens de hoje em dia ‘já não leem mais como antigamente’, ‘não gostam de ler como antes’, ‘não leem os clássicos e os autores canônicos como se fazia antes na escola’, ‘só leem o que lhes chega pelo celular’, ‘só leem textos fúteis e curtos’ etc.

Tal imaginário tem sido frequentemente questionado nas últimas décadas por diversos pesquisadores11 11 Cf. entre outros pesquisadores que constataram essa depreciação desarrazoada e genérica, assumida sem critérios, acerca do perfil dos jovens leitores da atualidade e das especificidades de suas práticas de leitura, Canclini (2016) na Argentina e no México; Petit (2013) em relação ao cenário francês, Aliagas et al. (2009) na Espanha, Ceccantini (2016) no Brasil. . Em traços gerais, as críticas desses autores baseiam-se na análise criteriosa e no cotejamento necessário entre as práticas efetivas dos sujeitos e as representações dominantes a partir das quais seu ‘valor’ é estabelecido.

A perspectiva em comum adotada por esses pesquisadores propõe que se redimensione o que se enuncia segundo o senso-comum sobre a leitura e os jovens leitores. É preciso, segundo eles, atentar i) para os equívocos dos parâmetros de julgamento norteadores dessas apreciações compartilhadas; ii) para o ‘esquecimento’, por parte desses que as compartilham, das condições materiais desiguais entre uma minoria que tem condições e pode ler e uma maioria que não; iii) para o silenciamento acerca da demora e da precariedade no estabelecimento de políticas públicas mais democratizantes do acesso a essa cultura letrada e de prestígio. Assim, é contra a cegueira e a surdez produzidas em relação às práticas e formas de ler efetivas dos jovens leitores, ambas resultantes de uma visão idealizada do leitor, muitas vezes inatingível, que esses pesquisadores se voltam, apoiando-se em dados muito variados e em perspectivas teóricas distintas.

É preciso compreender que os jovens e suas práticas de leitura não podem ser tomados como “álibis”, nem como “bodes expiatórios” nesses discursos dominantes. É preciso, ao contrário, ampliar nossa escuta em relação ao modo como efetivamente leem, o que eles de fato leem, quando o fazem, porque motivações e meios realizam essa prática e que discursos emergem quando se pronunciam a respeito da leitura.

“Eu não me considero um bom leitor”

Ao se expressarem, alguns jovens estudantes entrevistados se afirmaram leitores, diferentemente do que de antemão se poderia crer tendo em vista a incidência dos discursos depreciativos sobre os jovens em sua relação com a leitura. Em sua afirmação, reiteraram algumas características que se atribui geralmente ao ‘leitor ideal’: leem com regularidade e de forma espontânea, não apenas motivados por exigências/recomendações escolares ou familiares.

Essa coincidência, no entanto, apresenta algumas nuances. É especialmente sensível a diferença relativa à finalidade da leitura, declarada pelos alunos, ao serem questionados sobre “Qual o espaço da leitura no seu dia a dia?”, tanto por aqueles que dispõem de condições socioeconômicas mais privilegiadas (06) como por aqueles mais vulneráveis socialmente (14). Estes últimos, aludem com mais frequência à leitura como uma atividade que realizam “por necessidade e obrigação” (71,4%), ou seja, 10 dos 14 que compõem esse grupo. Já entre os primeiros, apenas 33,3% (02) evocam tal representação da leitura.

De maneira relativamente aproximada do que constatou Chartier (2019Chartier, R. (2019). Ler sem livros. Linguasagem, 32 (spe), 6-17. (Accessed 13 August, 2021). Disponível em: Disponível em: http://www.linguasagem.ufscar.br/index.php/linguasagem/article/view/655/396
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) em relação às diferentes narrativas assumidas por intelectuais e autores de origens sociais distintas sobre suas práticas de leitura na infância e adolescência, entre os jovens entrevistados, aqueles de origem mais humilde tendem a se referir às leituras de viés mais pragmático, ligadas às obrigações escolares e a suas necessidades cotidianas, enquanto aqueles provenientes de famílias de classe média mais bem estabelecidas socialmente tendem a se referir às leituras empreendidas como tendo sido de sua escolha e como uma atividade mais ligada ao entretenimento e ao prazer, silenciando em certa medida as leituras que eles também têm de realizar com finalidades escolares ou ligadas a seu cotidiano.

Dentre os aspectos em comum de suas declarações, entrevistados de ambos os grupos afirmam ler bem menos do que liam antes de ingressarem na EAJ. Diante das injunções das atividades escolares intensas no Ensino Médio e Técnico, em regime de tempo integral, alegam não disporem mais de tempo para a leitura. Essa mudança por eles declarada indicia a partilha comum de um aspecto do discurso sobre a leitura bastante recorrente: entende-se em geral que há certos tipos de textos que são mais dignos de serem afirmados como objeto de ‘leitura’, assim como são consideradas mais dignas certas formas e finalidades de realização dessa prática. Os textos dignos de nota, ao se declararem como sendo leitores, são aqueles mais vinculados ao universo ficcional, de preferência literário, sob a forma de livro impresso, de autores que gozem de relativa consagração, venha ela da escola (cânones escolares), venha ela do mercado (bestsellers). Os textos a que se referem esses alunos seriam aqueles lidos espontaneamente, em especial para entretenimento e prazer (incluindo entre estes HQ’s e mangás), mesmo quando se trata daqueles de viés mais especulativo e não prioritariamente ficcionais (filosóficos ou biográficos etc.).

Ao afirmarem lerem menos frequentemente, em função do volume de demandas da escola, eles indiciam a força dessa representação da leitura como atividade que se deve empreender espontaneamente e por prazer. Quando é feita alguma alusão à leitura de textos com finalidade pragmática e próprios do contexto escolar, isso é apresentado de forma mais naturalizada pelos estudantes em situação de vulnerabilidade (6 dos 14 participantes desse grupo - 42,9%), do que por aqueles pertencentes à classe média (2 dos 6 entrevistados - 33,4%), em enunciados como “Sempre estamos lendo, sempre, sempre, na escola, em casa, à noite, no final de semana, sempre.” (E20).

Esses jovens alunos, ainda que afirmem ler frequentemente, ainda que leiam de forma espontânea e por prazer, ainda que leiam textos de diferentes gêneros e para diferentes finalidades, ao serem questionados se se consideram como “um bom leitor e o que caracterizaria [ser] um bom ou não tão bom leitor”, em geral, a maioria não se considera como sendo bom leitor (71,4% (10) entre os alunos de origem mais humilde e de 83,3% (5) entre os mais abastados). Aqui se constata o impacto de uma maior relativização, por parte dos mais humildes, do valor atribuído às práticas e aos objetos de leitura, como podemos observar no que declara E15 ao justificar as razões porque se crê ser um bom leitor:

“[...] eu não vejo que a questão de ser um bom ou mal leitor tem a ver com a frequência ou então com a quantidade de livros. Eu acho que um bom leitor tem a ver com o seu envolvimento com o livro [...] independente de ser um suspense ou uma ficção como Harry Potter”.

Ainda assim, mesmo entre esses que se consideram bons leitores, não é raro essa autorrepresentação vir acompanhada de alguma ressalva, como a que enuncia E04:

Eu não me acho um excelente leitor, mas também não o pior. É que às vezes, quando eu chego em casa e tenho um livro lá pra ler, eu digo “será que eu vou ler, eu tô tão cansado”, então desisto, e vou logo desmaiando na cama, e não leio aquele livro, naquele dia. Mas, quando eu pego um livro e eu digo pra mim “Eu vou ler você hoje, todinho, nem que eu passe a noite acordado, mas eu leio você todinho hoje”, então, eu consigo. Quando eu digo “eu vou fazer isso!”, eu consigo.

Esse jovem aluno empreende um verdadeiro malabarismo argumentativo para se descrever como leitor. Ele joga com valores semânticos modais escalares, do ‘excelente’ ao ‘pior’, colocando-se em uma posição intermediária (nem ‘excelente’, nem ‘pior’). O efeito de relativização explorado nessa sua modalização visa a proteger sua face diante do outro e de seu julgamento, uma vez que tanto o aluno que enuncia quanto aquele(s) a quem se dirige compartilham uma representação coletiva e idealizada do que é ser leitor. Entre “excelente” e “pior”, não seria inadequado que ele se autorrepresentasse como “bom” leitor. Dada a imagem genérica e idealizada do que é ser “bom leitor”, o enunciador busca não se comprometer, nem ostentando nem também menosprezando sua conduta face à leitura. A força da representação idealizada intimida, mas nesse caso não silencia.

Esse jovem, ao se descrever como capaz de ler, apesar do cansaço, todo um livro de um único fôlego, atribui como características do “bom” leitor, ler incansavelmente ou ler mesmo estando cansado, ler sempre e ler os textos em sua totalidade. Esforço, dedicação, perseverança e determinação são assim evocados como qualidades que ele, neste caso, compartilha com a representação comum do que é ser leitor, do que é ser “bom” leitor. Dadas essas características, E04 conclui:

Então, acho que não me considero um mau leitor. Eu leio. É certo que eu não leio, assim, de tudo. Por exemplo, se eu tiver de ler um romance, eu não leio jamais. Não gosto de romance, não gosto de livro de fofocas e essas coisas. Não é todo livro que eu gosto. [Do que você gosta, então? (pesquisador)] Eu só gosto de livro de história, sociologia. Agora o resto eu não gosto. Por isso que eu não me vejo, assim, [como um bom leitor]. Eu não exploro muito além [desses gêneros]. Só aquilo que eu gosto. Eu sei que não é certo. Eu sei que eu deveria explorar outras fontes além daquelas que eu gosto, porque eu posso descobrir um novo ‘eu’ que existe dentro de mim, alguma coisa que eu não sabia que eu tinha, algum dom, alguma vocação...

Ao enunciar fazendo apelo a uma negação “não ser mau em X”, o enunciador opta por uma estrutura sintática alternativa à autoafirmação “ser bom em X”, que pode soar pedante. É com vistas a não correr riscos simbólicos que o enunciador se vale dessa estrutura modalizadora, muito comum, visando um efeito de modéstia. Como se trata de uma entrevista concedida a um professor e com a participação de outros colegas, isso interfere não apenas nas respostas, como também no modo como elas são formuladas. Em outro contexto e diante de outros interlocutores, o entrevistado talvez não se abstivesse de se afirmar como sendo um “bom leitor”. Neste contexto, ele o fez com modalização, além de se ver na obrigação de fornecer uma justificativa de sua resposta.

Ele explicita que há certos gêneros de que ele não gosta e por isso não os lê. Sua seletividade e sistematicidade quanto ao gênero e tipo de texto que habitualmente lê (livros de história e sociologia) são em sua opinião qualidades do “bom leitor”, manifestas também em sua recusa de outros gêneros que ele considera de menor prestígio e muito ligados ao universo feminino (romances). Em sua justificativa, ele não precisaria ter explicitado aquilo que não lê porque não gosta, nem expressado sua avaliação a respeito deles. Mas ele o faz, não sem certo orgulho ou sentimento de adequação, e isso porque pressupõe os benefícios simbólicos que a escolha de certos gêneros e não outros poderia lhe trazer. Em sua justificativa, o entrevistado reproduz estereótipos de gênero de longa data, que participam em conjunto das formas de (des)qualificação dos sujeitos. Ao se referir aos “romances”, que na sua origem foram identificados como gênero menor, fútil em grande parte em função de seu público leitor prioritariamente feminino, o enunciador o qualifica e o relaciona com textos que conteriam “fofocas”, sendo este um outro gênero equivocada e preconceituosamente atribuído às práticas femininas (Curcino, 2020Curcino, L. (2020). La femme qui lit: stéréotypes sexistes dans les représentations de Dilma Rousseff en tant que lectrice dans les médias au Brésil. Textes et contextes. 15(2). 1-9. (Accessed 13 August, 2021). Disponível em: Disponível em: https://preo.u-bourgogne.fr/textesetcontextes/index.php?id=2935 .
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). Ouvimos em suas palavras esse eco precoce e perene, que atravessa a história e vários campos, e que nos subjetiva constituindo nossas crenças e valores ainda hoje e desde cedo, sem que nos demos conta disso. Ele ainda, ao reiterar essa divisão de viés sexista, reafirma a hierarquia existente entre os gêneros discursivos, uns tidos como mais letrados, outros como menos.

No entanto, sua própria autoavaliação quanto à importância de ampliar seu rol de escolhas de textos a ler indicia a convivência de discursos em disputa sobre a leitura. Parte deles são aqueles que circulam entre nós com mais regularidade e que são também validados institucionalmente pela escola (Borges, 2017Borges, R. (2017). Formando leitores no ensino de outra língua - uma análise de representações de leitura compartilhadas por professores de língua espanhola [Dissertação de mestrado]. Universidade Federal de São Carlos. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/9056/DissRBRS.pdf?sequence=1&isAllowed=y (Accessed 13 August, 2021).
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). Outra parte, no entanto, disputa com a escola o enunciável sobre a leitura, assumindo um relativismo segundo o qual seria legítimo ler “de tudo”. Este último se somaria ao que em geral é consensual dizer sobre a leitura, dentro e fora da escola: ler muito, ler sempre, ler o que se deve e o que goza de prestígio simbólico entre nós. É justamente em relação a este ler “de tudo”, inclusive aquilo de que não se gosta justamente por não se considerar adequado, que se pode observar a maior modificação quanto aos discursos sobre a leitura no que em geral enunciam os jovens leitores. Talvez contribua para essa percepção mais generalista e integradora dos objetos declaráveis quando o tema é a leitura, o fato de a escola, com seus cânones escolares, ser mais frequentemente cobrada quanto à necessária incorporação de novos títulos, tipos de textos, formas de ler, e vir buscando progressivamente rever ou ampliar os objetos de leitura e formas de ler, ou pelo menos fazer disso tema de discussão.

Seja por boas razões, seja por outras não necessariamente esclarecidas e muito relativistas, o rol de textos lidos, indicados e estudados pelos jovens se alterou em nome da crescente força do discurso que valoriza o ecletismo, a expansão e a variedade dos gêneros a serem lidos. Também priorizam, quanto ao número de títulos e tipos de textos, a extensividade, ou seja, ler muitos e de vários tipos, em detrimento da intensidade, ou seja, ler poucos e várias vezes.

Valendo-se da metáfora do casamento, esse jovem entrevistado conclui sua argumentação acerca de sua autoimagem como a de um bom leitor, mas com ressalvas. Ele se apresenta como quem não dispõe de certas características do bom leitor, que se assemelham à de cônjuges, como a “fidelidade”, “constância” e “resiliência”:

Não acho que eu seja ruim [leitor], não... eu não sou ruim. Começo a ler e desisto, canso assim, mas depois.... pronto, sou ruim! Um bom leitor para mim é aquele que tem um comprometimento fiel, assim como um casamento com o mundo da leitura... [...] que se compromete de verdade, que não fica com esses vacilos, que tenha uma leitura, assim, mesmo firme e forte, diária, assim, sem pausa.

O entrevistado recorre a essa metáfora para compartilhar uma concepção muito difundida da leitura: a da leitura como um hábito. Ela é aqui representada como uma prática que exige dedicação diária, que não pode ser preterida ou postergada, nem realizada paulatinamente ou simultaneamente a outras atividades. A metáfora por ele empregada visa a enfatizar a obstinação como traço de um leitor que, em seu compromisso com a leitura, não “vacila”.

Nesses dois enunciados de um mesmo entrevistado se pode observar uma valorização da leitura de textos de vertente mais especulativa, científica, e não ficcionais (história e sociologia), e mais em sintonia com o tipo de texto escolar, de caráter didático pedagógico, que se lê cotidianamente nas aulas. Essa declaração é interessante na medida em que, de modo geral, esse tipo de leitura por demanda das atividades escolares não é levado em conta quando os alunos são perguntados sobre ‘o que gostam de ler’ ou ‘o que estão lendo’, ou ‘o que normalmente leem’. Exemplos desse funcionamento discursivo que atua sob a forma de esquecimento do que se lê para fins escolares emerge em 57,1% (8) nas respostas fornecidas pelos entrevistados em situação de vulnerabilidade social e em 66,6% (4) dos demais à pergunta “Qual o espaço da leitura no seu dia a dia?”,

Eu queria, pessoalmente, que a leitura ocupasse bem mais parte do meu dia [...] Mas não tenho muito tempo aqui na escola [...]. Na verdade, ultimamente tem sido meio raro a leitura no meu dia, [...], mas, queria que fosse mais. (E14, grifos nossos)

[...] o lugar que eu mais leio, acho que é no ônibus. Eu tenho uma mania muito grande de ler no ônibus. Às vezes, até faço questão de andar mais do que o normal no ônibus, porque assim eu leio mais, porque este é o lugar em que eu mais leio, por causa da rotina da escola [...]. Este é o lugar em que eu leio mais por prazer. (E02, grifos nossos)

Apesar de estarem boa parte do seu dia na escola, vivenciando uma rotina de leituras e aprendizagens, em constante interação com colegas e professores, ainda assim declaram que não leem, ou ao menos não leem o quanto gostariam, em função de seu tempo ser todo ocupado pela rotina e pelas atividades escolares. No primeiro exemplo, segundo a declaração de E14, a rotina escolar é o empecilho responsável pela falta de tempo para ler. No segundo exemplo, em E02, nessa economia rarefeita do tempo disponível, o ônibus se torna o espaço e a circunstância possíveis para leitura, de modo geral, e para a leitura dos textos de sua escolha.

A representação mais imediata e difundida dessa prática diz respeito, assim, à leitura feita espontaneamente, por prazer, para entretenimento e como atividade própria de um tipo de ócio ilustrado. Essa representação atua de forma encobridora (Bayard, 2007Bayard, P. (2007). Como falar dos livros que não lemos? Objetiva.), a ponto de se sobrepor a várias práticas de leitura efetivamente realizadas com frequência, mas que não se identificam, em todas essas características, com essa imagem idealizada do que é ser leitor.

Nesses enunciados dos jovens sobre a leitura predomina o sentimento de uma certa inadequação ou inibição frente à imagem idealizada do que é ser leitor. Tímidos, indecisos ou autoconfiantes com ressalvas, esses jovens ponderam e buscam fornecer em suas respostas uma autodescrição mais apropriada, menos suscetível à crítica, mais balizada nos discursos consensuais. Para isso, monitoram com cuidado o que informam a esse respeito, em especial aqueles alunos provenientes das camadas mais humildes de nossa sociedade.

Eles se representam quase sempre em déficit quanto ao tipo de saber valorizado institucionalmente, e por isso tendem a otimizar seu tempo e a canalizar seus interesses com vistas a suprir o que acreditam ser um problema em sua formação. Não tendo gozado de uma infância cercada de livros, não tendo ouvido as referências leitoras de prestígio nas recomendações ou conversas familiares, eles são assim levados a compreender muito cedo o que acreditam ter lhes faltado em comparação com colegas provenientes de outros meios sociais, de modo a visarem a recuperar o ‘tempo perdido’.

Conclusão

Constatamos ser um consenso entre esses alunos, independentemente de sua formação pregressa, a admissão de que não são tão ‘bons leitores’, ainda que afirmem ler e ler muito. As exceções a essa autorrepresentação são, ainda assim, seguidas por justificativas de que precisam melhorar, de que gostariam de ser leitores melhores, de que não leem o quanto deveriam, nem o que deveriam. Em suas declarações também é consensual, quando perguntados o que significa a leitura e se eles se consideram bons leitores, referirem-se sistemática e quase exclusivamente ao objeto livro e ao gênero ficcional, sejam aqueles que fazem parte do cânone escolar, sejam aqueles best-sellers contemporâneos. Por se tratar de livros ficcionais literários, observamos haver também um consenso quanto ao modo como devem ser lidos e os efeitos que sua leitura deve produzir: devem fazer da leitura um hábito e empreendê-la espontaneamente e por prazer. A leitura deve ser uma constante, realizada de forma intensiva, dedicada, de um texto em sua totalidade, e de forma extensiva, de vários textos e gêneros.

Esses jovens são depositários e reprodutores dessas representações consensuais e hierarquizantes da leitura. Eles também são aqueles que rompem e que podem produzir maiores rompimentos com essas e outras representações a que estão expostos.

Em geral, em função da força da representação dominante acerca da leitura são formuladas generalizações frequentes tais como “o brasileiro não lê”, “o jovem brasileiro não lê”. Essas representações em geral compartilham um outro pressuposto, segundo o qual essa generalização refere-se ao “povo”, ou seja, à esmagadora maioria economicamente vulnerável, o que se poderia traduzir em paráfrases como “o povo não lê”, e sendo o “povo” sinônimo de “pobre”, “o pobre não lê”. Embora seja esta a insinuação frequente, a de que “o povo/os pobres não leem”, em geral ela não vem acompanhada das razões que, em sendo isso verdade, explicariam essa condição. Não se ouve com a mesma frequência da crítica generalizante segundo a qual seríamos um povo ‘não leitor’ a denúncia consequente da total ausência de condições de ordem material e socioeconômica necessárias para que alguém possa se tornar e permanecer leitor, ao longo da vida.

Não sem razão, o povo, e em especial o jovem de origem humilde é frequentemente o ‘bode expiatório’ do preconceito social e dos estigmas culturais de longa data. Por isso, é fundamental depreendermos as representações dos leitores, os discursos sobre a leitura que circulam entre nós e que perduram historicamente e são sistematicamente difundidas e incorporadas, principalmente por quem delas é vítima.

Nosso papel nesse cenário, como pesquisadores dos discursos sobre a leitura e de seu funcionamento social e como professores e formadores de professores e de leitores, é o de contribuir com a depreensão sistemática dessas representações e discursos dominantes, de esclarecer esse funcionamento dos discursos responsáveis pela objetivação e subjetivação dos sujeitos, e elaborar conjuntamente com nossos alunos uma “metalinguagem da emancipação” (Piovezani, 2020Piovezani, C. (2020). A voz do povo: uma longa história de discriminação. Vozes.), a partir da qual não apenas possam vir a compreender a lógica perversa que sustenta a desigualdade de acesso e de direitos, que fundamenta as hierarquias, que as naturaliza e garante a sua perpetuação, como também possam denunciar sistematicamente esse funcionamento emancipando-se e contribuindo para a emancipação de seus pares em situação de vulnerabilidade semelhante.

Agradecimentos

Agradecemos pelo apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, processo 88887.369629/2019-00.

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  • 4
    Nos valemos aqui do conceito de “representação”, tal como definido por Chartier (2002Chartier, R. (2002). À beira da falésia: a história entre certezas e inquietude. Editora UFRGS. ).
  • 5
    “E” significa Entrevistado seguido por um número aleatório. Todos os dados foram obtidos no âmbito da proposta de pesquisa submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos, da Universidade Federal de São Carlos (número do parecer: 2.804.953; CAAE: 92752218.7.0000.5504).
  • 6
    Do inglês “New Literacy Studies” (NLS).
  • 7
    Essa porcentagem é estabelecida conforme número percentual desses grupos no Estado, baseado no senso da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, tais informações estão dispostas no edital de seleção nº 09/2019, que segue modelo semelhante ao dos anos anteriores, disponível em http://www.comperve.ufrn.br/conteudo/cursostecnicos/escolaagricola/2020/documentos/edital_092019_20190909.pdf.
  • 8
    Segundo dados disponibilizados pela Comissão Permanente de Processos Seletivos (Comperve) da UFRN, tendo por base exame seletivo para ingresso no ano de 2020, e a título de amostragem, considerados apenas os números de alunos que optaram pela reserva de vagas destinadas a alunos provenientes de escola pública, em Agroindústria foram 436 inscritos e 30 aprovados (6,8%), Agropecuária 419 inscritos e 35 aprovados (8,3%), Aquicultura 325 inscritos e 35 aprovados (10,7%) e Informática 529 inscritos e 35 aprovados (6,6%). Dos aprovados não sabemos efetivamente quantos se matricularam.
  • 9
    Questionário disponível no apêndice Apêndice 1 .
  • 10
    Conforme disposto na resolução da UFRN nº 229/2018-CONSEPE (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão), em 04 de dezembro de 2018, e publicado no boletim de serviços da UFRN, nº 243, em 27 de dezembro de 2018, fls. 14, capítulo VI, art. 25: “Considera-se estudante em vulnerabilidade socioeconômica aquele que possua renda familiar per capita igual ou inferior a um salário mínimo e meio e/ou comprove situação de carência por meio de avaliação socioeconômica a partir de análise de documentos comprobatórios apresentados pelo estudante”.
  • 11
    Cf. entre outros pesquisadores que constataram essa depreciação desarrazoada e genérica, assumida sem critérios, acerca do perfil dos jovens leitores da atualidade e das especificidades de suas práticas de leitura, Canclini (2016Canclini, N. (2016). O mundo inteiro como lugar estranho. Editora da Universidade de São Paulo. ) na Argentina e no México; Petit (2013Petit, M. (2013). Leituras: do espaço íntimo ao espaço público. Editora 34.) em relação ao cenário francês, Aliagas et al. (2009Aliagas, C., Lidon, J. M. C., & Cassany, D. (2009). “Aunque lea poco, yo sé que soy listo”: estudio de caso sobre un adolescente que no lee literatura. Ocnos, 5, 97-112. https://doi.org/10.18239/ocnos_2009.05.07.
    https://doi.org/10.18239/ocnos_2009.05.0...
    ) na Espanha, Ceccantini (2016Ceccantini, J. (2016). Mentira que parece verdade: os jovens não leem e não gostam de ler. In F. Zoara (Ed.), Retratos da leitura no Brasil 4: Instituto pró-livro (pp. 83-97). Sextante.) no Brasil.

Apêndice 1

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    27 Maio 2020
  • Aceito
    01 Dez 2021
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