Acessibilidade / Reportar erro

Estudo de avaliabilidade da segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde

Patient safety assessment study in Primary Health Care

RESUMO

A segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde (APS) preocupa-se em reduzir erros e eventos adversos relacionados a assistência à saúde, porém há poucos estudos elaborados com aplicação de modelos avaliativos sobre a temática neste contexto. Este trabalho objetivou desenvolver e propor um modelo avaliativo da segurança do paciente na APS. Realizou-se um estudo de avaliabilidade por meio da análise documental, revisão de literatura, proposição dos modelos e validação dos modelos por meio da conferência de consenso. Idealmente, a teoria do programa, apresentada no Modelo Teórico, evidencia que os recursos, a cultura de segurança, os processos assistenciais e a educação permanente são componentes que viabilizam a implantação do programa, que precisam ser discutidos e aprimorados com envolvimento da gestão, dos profissionais e dos próprios pacientes/familiares e cuidadores, sendo, portanto, explorados no Modelo Lógico e assumidos como fundamentais para a oferta de cuidados mais seguros na APS quando interagem articuladamente. Na Matriz de Análise e Julgamento, esses quatro componentes assumem o mesmo peso no cálculo que determinará o grau de implantação da segurança do paciente na APS. A modelização apresentada pode ser utilizada por diversos atores, de diferentes contextos, para explorar e aprimorar a segurança do paciente na APS.

PALAVRAS-CHAVES
Segurança do paciente; Atenção Primária à Saúde; Avaliação em saúde

ABSTRACT

Patient safety in Primary Health Care (PHC) is concerned with reducing errors and adverse events related to health care, but there are few studies developed with the application of evaluative models on the subject in this context. This study aimed to develop and propose an evaluation model of patient safety in PHC. An evaluability study was carried out through document analysis, literature review, proposition of models and validation of models through consensus conference. Ideally, the theory of the program, presented in the Theoretical Model, shows that resources, safety culture, care processes and permanent education are components that enable the implementation of the program, which need to be discussed and improved with the involvement of management, professionals and the patients/family members and caregivers themselves, being, therefore, explored in the Logical Model and assumed as fundamental for the provision of safer care in PHC when they interact articulately. In the Analysis and Judgment Matrix, these four components assume the same weight in the calculation that will determine the degree of implementation of patient safety in PHC. The modeling presented can be used by different actors, from different contexts, to explore and improve patient safety in PHC.

KEYWORDS
Patient safety; Primary Health Care; Health evaluation

Introdução

A segurança do paciente preocupa-se em reduzir riscos, erros e danos evitáveis relacionados ao cuidado em saúde11 World Health Organization. Global Patient Safety Action Plan 2021-2030: towards eliminating avoidable harm in health care. 2020. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: https://www.who.int/teams/integrated-health-services/patient-safety/policy/global-patient-safety-action-plan.
https://www.who.int/teams/integrated-hea...
e tornou-se fonte de preocupação a partir da publicação do relatório ‘To Err is Human’, que expôs à sociedade os erros que envolvem o cuidado em saúde e os danos que podem causar aos pacientes22 Konh LT, Corrigan JM, Donaldson MS. Errors in health care: a leading cause of death and injury. In: Konh LT, Corrigan JM, Donaldson MS. To err is human: building a safer health care system. Washington, DC: Institute of Medicine; 2000. p. 26-48..

Na tentativa de promover a segurança do paciente e reduzir as consequências físicas e sociais relacionadas aos erros vinculados à assistência à saúde, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e seus países membros lançaram, em 2004, a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente33 World Health Organization. The Launch of the World Alliance for Patient Safety: “Please do me no harm”. 2004. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: https://www.who.int/patientsafety/en/brochure_final.pdf.
https://www.who.int/patientsafety/en/bro...
. No Brasil, a Política Nacional de Segurança do Paciente foi instituída em 1º de abril de 2013, como parte da agenda de comprometimento global com a temática44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
.

A implantação de uma política ou programa demonstra o quanto essa intervenção se encontra adequadamente operacionalizada, enquanto a avaliação possibilita identificar o nível de adequação dessa operacionalização, validando a execução das intervenções e os possíveis fatores que distanciam o planejamento da execução55 Figueiredo TA, Angulo-Tuesta A, Hartz Z. Avaliabilidade da Política Nacional de Regulação no SUS: uma proposta preliminar. Physis. 2019; 29(2):e290215..

As pesquisas que avaliam a segurança do paciente no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS) têm seu escopo direcionado aos aspectos relacionados à cultura de segurança do paciente. Recentemente, no Brasil, foi produzido um estudo metodológico que elaborou e validou um instrumento autoavaliativo da segurança do paciente na APS por meio das seguintes etapas: elaboração do instrumento, validação de conteúdo, validação de conteúdo de consistência e coerência e análise fatorial66 Togashi GB. Construção e validação de um instrumento de avaliação da segurança do paciente para os serviços de atenção primária à saúde. [dissertação]. Botucatu: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”; 2020.. Todavia, diferentemente do presente estudo, não desenvolveu os modelos avaliativos.

Antes de iniciar a avaliação de uma política ou programa, recomenda-se desenvolver o estudo de avaliabilidade que, por meio da modelização, permite conhecer a teoria que fundamenta sua elaboração, a lógica que o estrutura, sua operacionalização e os aspectos envolvidos, evidenciando as justificativas e recomendações para a avaliação propriamente dita77 Baratieri T, Natal S, Hartz ZA. Cuidado pós-parto às mulheres na atenção primária: construção de um modelo avaliativo. Cad. Saúde Pública. 2020; 36(7):e00087319..

Na APS, apontam-se estimativas de incidentes de segurança em 12,6%, sendo 55,6% destes evitáveis88 Madden C, Lydon S, Curran C, et al. Potential value of patient record review to assess and improve patient safety in general practice: A systematic review. Eur. J. Gen. Pract. 2018; 24(1):192-201.. No entanto, o enfoque das discussões segue direcionado ao contexto hospitalar99 Pai SD, Alves DB, Pluta P, et al. Avaliação da cultura de segurança do paciente na atenção primária à saúde. Rev. baiana enferm. 2020; (34):e34849:1-12., com poucos estudos que elaboraram e aplicaram modelos avaliativos sobre a segurança do paciente na APS.

Estudos de avaliabilidade da segurança do paciente na APS oportunizam o desenvolvimento de avaliações na temática e a produção de novos e importantes conhecimentos que permitam indicar ações e mudanças que tornem os cuidados prestados na APS mais seguros. Nesta perspectiva, este estudo tem o objetivo de desenvolver e propor um modelo avaliativo da segurança do paciente na APS.

Material e métodos

Trata-se de um estudo de avaliabilidade, desenvolvido no período de janeiro a agosto de 2022, de abordagem exploratória e qualitativa, segundo os elementos recomendados por Thurston e Ramaliu1010 Thurston WE, Ramaliu, A. Evaluability assessment of survivors of torture program: lessons learned. The Canadian J. Prog. Evaluat. 2005; 20(2):1-25., quais sejam: (1) análise documental; (2) revisão de literatura; (3) proposição dos modelos; (4) conferência de consenso; e (5) recomendações para a avaliação. A análise documental explorou 26 produções técnicas e normativas (inter)nacionais envolvendo a temática da segurança do paciente na APS, que serviram como fonte de evidência para definir os elementos fundamentais para segurança do paciente na APS (quadro 1).

Quadro 1
Fontes de evidências para modelização da segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde, Florianópolis, 2023

A revisão integrativa da literatura foi realizada nas bases de dados BVS (Biblioteca Virtual em Saúde), Cinahl, SciELO, Scopus, PubMed, e Web of Science, sem restrição temporal, utilizando os descritores: Segurança do Paciente, Atenção Primária à Saúde e Avaliação em Saúde. Resultaram 32 estudos que atenderam a seguinte questão norteadora: Quais os aspectos fundamentais para garantir a segurança do paciente na APS1111 Macedo TR, Calvo MCM, Possoli L, et al. Segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde: um olhar sobre a literatura. Revista de APS. 2022; 25(3):691-712.?

A partir dos resultados teóricos encontrados, foi realizada a proposta inicial para avaliação da segurança do paciente na APS – Modelo Teórico (MT), Modelo Lógico (ML) e Matriz de Análise e Julgamento (MAJ) – que foi submetida à validação por meio da técnica mista denominada de conferência de consenso1212 Souza LEPF, Silva LMV, Hartz ZMA. Conferência de consenso sobre a imagem-objetivo da descentralização da atenção à saúde no Brasil. In: Hartz ZMA, Silva LMV. Avaliação em saúde: dos modelos teóricos à prática na avaliação de programa e sistemas de saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 65-102..

A conferência de consenso contou com dez especialistas vinculados aos serviços de saúde e/ou academia, selecionados a partir da expertise relacionada à temática, análise de publicações e currículo lattes, que consentiram em participar.

O consenso aconteceu em três etapas virtuais assíncronas, sendo que a cada rodada os participantes tiveram a oportunidade de se posicionarem em concordância total, parcial ou nula aos itens apresentados, contribuindo descritivamente com as discordâncias identificadas.

A cada rodada da conferência de consenso, os retornos recebidos foram consolidados e os ajustes foram feitos conforme as recomendações dos participantes e as questões teóricas vinculadas. Nova apreciação e manifestação dos especialistas era solicitada e os itens eventualmente não acatados nas sucessivas versões dos modelos, eram justificados nos retornos e apreciados novamente, até que não houvesse mais contestações. O consenso entre os especialistas foi alcançado na terceira rodada da conferência de consenso.

As recomendações para as futuras avaliações foram evidenciadas a partir da construção do MT, ML e MAJ consensualizados neste estudo.

O projeto de pesquisa obedeceu à Resolução nº 422/2016 do Conselho Nacional de Ética e Pesquisa com Seres Humanos1313 Brasil. Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. 2012. [acesso em 2023 mar 15]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina sob o parecer 5.172.176/2021.

Resultados

A análise documental e a revisão da literatura apontaram como componentes fundamentais para a segurança do paciente os aspectos estruturais, processos assistenciais, treinamento e cultura, que precisam ser discutidos e aprimorados envolvendo a gestão, os profissionais e os próprios pacientes/ familiares e cuidadores1111 Macedo TR, Calvo MCM, Possoli L, et al. Segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde: um olhar sobre a literatura. Revista de APS. 2022; 25(3):691-712..

O MT (figura 1) construído e validado evidencia os fatores contextuais externos e internos que podem atuar sobre a segurança do paciente na APS. A magnitude dos eventos adversos acarreta impactos de ordem econômica e social1414 Auraaen A, Slawomirski L, Klazinga N. The economics of patient safety in primary and ambulatory care: flying blind. OECD Health. Working Pap. 2018 [acesso em 2021 ago 3]; (106):1-57. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/baf425ad-en.pdf?expires=1628017673&id=id&accname=guest&checksum=95B6F3815B58926F1E56483E10C733F8.
https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/...
, que exigem dos sistemas de saúde, influenciados pelo cenário econômico que os cerceiam, organização de políticas públicas que estabeleçam ações direcionadas à segurança do paciente, inclusive na APS1515 World Health Organization. Quality of care: patient safety: report by the Secretariat. 2002 mar 23. [acesso em 2021 jul 3]. Disponível em: http://apps.who.int/gb/archive/pdf_files/WHA55/ea5513.pdf.
http://apps.who.int/gb/archive/pdf_files...
.

Figura 1
Modelo Teórico da segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde, Florianópolis/SC, 2021

A APS é porta de entrada preferencial do sistema de saúde, executa a maioria dos cuidados prestados à população, e enfrenta os impactos relacionados à transição demográfica e perfil epidemiológico. Uma população mais envelhecida e com multimorbidades exige cuidados mais complexos e sujeitos a riscos de segurança1616 Avery AJ, Sheehan C, Bell B, et al. Incidence, nature and causes of avoidable significant harm in primary care in England: retrospective case note review. BMJ Qual. Saf. 2021; 30(12):961-976.,1717 Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880.,1818 Souza MM, Ongaro JD, Lanes TC, et al. Cultura de segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde. Rev. Bras. Enferm. 2019; 72(1):32-9..

No contexto interno da segurança do paciente na APS, a implantação de políticas públicas, como a Política Nacional da Atenção Básica (PNAB)1919 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017. e o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP)44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
, normatizam ações que viabilizam a organização, qualificação e melhoria da segurança na APS. As políticas públicas reforçam a participação da APS na Rede de Atenção à Saúde e promovem a articulação dos envolvidos – gestão, profissionais e pacientes – com consequente redução de riscos e de eventos adversos44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
,1919 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

Os elementos fundamentais para a implantação da Segurança do Paciente na APS são: os recursos (financeiro, físico, humano, material, tecnológico e de apoio aos processos); a cultura de segurança; os processos assistenciais; e a educação permanente. A articulação desses elementos deve viabilizar o alcance de cuidados mais seguros na APS.

O ensino e a pesquisa são influenciados e são influenciadores da APS, uma vez que compõem a formação dos profissionais que atuam na APS, além de produzir conhecimento que estimula a percepção de risco e a oferta de cuidados de saúde seguros e de qualidade2020 Brasil. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Coleção COVID-19. Principais elementos. Brasília, DF: CONASS; 2021. 338 p. (v. 1).,2121 Grabois V, Duarte SCM. O Papel da Gestão para a Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde. In: Dalcin TC, Daudt CG. Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde: teoria e prática. Porto Alegre: Associação Hospitalar Moinhos de Vento; 2020..

O processo de formação dos profissionais estimula o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes diante da segurança do paciente, estabelecendo a importância de uma força de trabalho que promova os cuidados centrados no paciente2222 World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
.

Quando as ações de segurança do paciente na APS não ocorrem de forma efetiva para reduzir as falhas e tornar o cuidado prestado mais seguro, os eventos adversos seguem acontecendo e produzindo impacto para além da APS, atingindo o nível secundário e terciário1414 Auraaen A, Slawomirski L, Klazinga N. The economics of patient safety in primary and ambulatory care: flying blind. OECD Health. Working Pap. 2018 [acesso em 2021 ago 3]; (106):1-57. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/baf425ad-en.pdf?expires=1628017673&id=id&accname=guest&checksum=95B6F3815B58926F1E56483E10C733F8.
https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/...
,2222 World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
,2323 World Health Organization. Patient engagement. 2016. 26 p. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
,2424 Woodward S. Seven Steps to patient safety for primary care. Reino Unido: National Patient Safety Agency; 2006..

O ML (quadro 2) apresenta a organização e o funcionamento da segurança do paciente na APS, identificando as atividades necessárias para que os resultados sejam alcançados. Neste modelo, as questões de ensino e pesquisa não foram investigadas.

Quadro 2
Modelo Lógico da segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde. Florianópolis (SC), 2022

O ML é composto por quatro componentes (recursos, cultura de segurança, processos assistenciais e educação permanente) com atividades, produtos e resultados específicos, assumidos como fundamentais para a redução dos eventos adversos e cuidados mais seguros na APS.

  • O provimento de recursos financeiro, físico, humano, material, tecnológico e de apoio aos processos remetem para a estrutura necessária ao desenvolvimento de cuidados seguros na APS2424 Woodward S. Seven Steps to patient safety for primary care. Reino Unido: National Patient Safety Agency; 2006.,2525 Kingston-Riechers J, Ospina M, Jonsson E, et al. Patient Safety in Primary Care. Vancouver: Canadian Electronic Library; 2010. [acesso em 2023 mar 15]. Disponível em: https://bcpsqc.ca/wp-content/uploads/2018/03/Primary_Care_2010_english_FINAL.pdf.
    https://bcpsqc.ca/wp-content/uploads/201...
    ;

  • A cultura de segurança trata do “conjunto de valores, atitudes, competências e comportamentos que determinam o comprometimento da instituição diante da segurança do paciente, substituindo a culpa e a punição pela oportunidade de aprender com as falhas e melhorar a atenção à saúde”44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
    http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
    , evidenciando o comportamento dos profissionais e da gestão em relação à segurança do paciente;

  • Os processos assistenciais exploram como os profissionais seguem os aspectos prescritivos para organizar o seu trabalho e sua prática com vistas a segurança do paciente2626 Siman AG, Braga LM, Amaro MOF, et al. Desafios da prática na segurança do paciente. Rev. Bras. Enferm. 2019; 72(6):1581-1588., bem como a maneira como inserem o paciente/familiar/cuidador nos cuidados prestados;

  • A educação permanente surge como uma oportunidade de desenvolver continuamente os profissionais da APS por meio do treinamento em serviço2222 World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
    https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
    , uma vez que os profissionais necessitam de formação adequada para fortalecer a consciência situacional, a percepção de riscos e a oferta de cuidados de saúde seguros e de qualidade2020 Brasil. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Coleção COVID-19. Principais elementos. Brasília, DF: CONASS; 2021. 338 p. (v. 1).,2121 Grabois V, Duarte SCM. O Papel da Gestão para a Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde. In: Dalcin TC, Daudt CG. Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde: teoria e prática. Porto Alegre: Associação Hospitalar Moinhos de Vento; 2020.. Da mesma forma, os pacientes, familiares e cuidadores precisam estar capacitados para poderem desenvolver uma postura de liderança em sua segurança2727 Chaneliere M, Koehler D, Morlan T, et al. Factors contributing to patient safety incidents in primary care: a descriptive analysis of patient safety incidents in a French study using CADYA (categorization of errors in primary care). BMC Fam. Pract. 2018; 19(1):121..

De maneira articulada, estes componentes interagem por meio de suas atividades na busca por cuidados mais seguros na APS, como prevê a meta estabelecida pelo programa.

A MAJ consensualizada determina o grau de implantação da segurança do paciente na APS. É composta por quatro componentes de análise de igual peso no cálculo: recursos (nove indicadores), cultura de segurança (cinco indicadores), processos assistenciais (quatro indicadores) e educação permanente (quatro indicadores) (quadro 3).

Quadro 3
Matriz de Análise e Julgamento da segurança do paciente na atenção primária. Florianópolis (SC), 2023

A MAJ estabelece que, o serviço terá um grau de implantação satisfatório quando obtiver 75% ou mais de respostas positivas no instrumento que avalia a segurança do paciente na APS, implantação parcial quando receber entre 25% e 75% das respostas positivas, implantação incipiente quando auferir 25% ou menos de respostas positivas.

As medidas são aferidas em um checklist da segurança do paciente na APS, com itens específicos para cada dimensão, aplicado a informantes chaves das unidades de saúde que compõem o contexto a ser avaliado.

A elaboração do MT, ML e MAJ deixou algumas recomendações para a avaliação e conduziu a algumas perguntas para futuros estudos avaliativos, que viabilizarão discussões e alinhamentos permanentes das ações de segurança do paciente na APS, quais sejam: Qual o grau de implantação da segurança do paciente na APS? Quais os elementos facilitadores e barreiras interferem no processo de implementação da segurança do paciente na APS?

Discussão

A ausência de uma articulação explícita que apresente claramente as mediações necessárias para a oferta de cuidados primários mais seguros e o fortalecimento da segurança do paciente na APS orientou e justificou o desenvolvimento deste modelo avaliativo.

A APS provê o maior volume de cuidados de saúde à população e possui uma estimativa de incidentes de segurança do paciente – eventos que podem ou não causar danos aos pacientes – de 2 a 3% nas consultas realizadas2828 Panesar SS, Silva D, Carson-Stevens A, et al. How safe is primary care? A systematic review. BMJ Qual. Saf. 2016; 25(7):544-53.. O Brasil executou 78 milhões de consultas médicas em 20192929 Brasil. Ministério da Saúde, Datasus. Produção ambulatorial do SUS - Brasil - por local de atendimento, 2019. [acesso em 2022 set 1]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sia/cnv/qauf.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
. Conforme a estimativa de incidente de 2 a 3%, acarretou cerca de 1,5 milhões de incidentes de segurança apenas naquele ano. Neste sentido, é necessário ampliar as discussões sobre a segurança do paciente na APS, qualificando o cuidado ofertado.

O processo de imersão e revisão dos documentos subsidiou a definição do objetivo do programa, que envolve a redução de eventos adversos por meio de cuidados primários mais seguros, bem como dos fundamentos que norteiam o desenvolvimento da teoria do programa e da sua operacionalização lógica, neste estudo validada pelos especialistas, por meio da conferência de consenso.

O MT busca expor o problema que demandou a criação da intervenção, o contexto/cenário em que a política se desenvolve e os atores envolvidos no seu planejamento e execução, evidenciando as etapas que motivaram o debate sobre a problemática da segurança do paciente na APS anteriormente a sua operacionalização55 Figueiredo TA, Angulo-Tuesta A, Hartz Z. Avaliabilidade da Política Nacional de Regulação no SUS: uma proposta preliminar. Physis. 2019; 29(2):e290215..

O ML deve possibilitar que a plausibilidade no alcance de determinados resultados relacionados a um programa sejam verificadas3030 Souza EC, Guimarães JMX, Silva MRF. Estudos de avaliabilidade de políticas e programas de saúde no Brasil: revisão integrativa. SANARE, Sobral. 2017; 16(2):85-92.. Portanto, o ML elaborado apresenta a operacionalização das conexões necessárias para que os componentes – recursos, cultura de segurança, processos assistenciais e educação permanente – que estruturam a segurança do paciente na APS se desmembrem em atividades, produtos e alcancem os resultados idealmente esperados.

Referente à dimensão recursos, que trata de todo o arcabouço estrutural necessário para a efetivação da segurança do paciente na APS, a literatura evidencia que a infraestrutura das unidades de saúde3131 Marchon SG, Mendes Junior WV. Patient safety in primary health care: a systematic review. Cad. Saúde Pública. 2014; 30(9):1815-1835., disponibilidade de insumos3131 Marchon SG, Mendes Junior WV. Patient safety in primary health care: a systematic review. Cad. Saúde Pública. 2014; 30(9):1815-1835., composição das equipes3232 Macedo LL, Haddad MCFL, Silva AMR, et al. Culture of patient safety in primary health care in a large municipality in the perception of workers. Texto & Contexto Enferm. 2020; (29):e20180410., inclusive com a presença do Núcleo de Segurança44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
, uso de tecnologias3131 Marchon SG, Mendes Junior WV. Patient safety in primary health care: a systematic review. Cad. Saúde Pública. 2014; 30(9):1815-1835., incluindo sistemas de notificações de incidentes1717 Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880. e normativas que norteiam o trabalho desenvolvido na APS como o Plano de Segurança do Paciente44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
, diretrizes clínicas e protocolos institucionais2727 Chaneliere M, Koehler D, Morlan T, et al. Factors contributing to patient safety incidents in primary care: a descriptive analysis of patient safety incidents in a French study using CADYA (categorization of errors in primary care). BMC Fam. Pract. 2018; 19(1):121., são condições sine qua non para o alcance de cuidados primários mais seguros, sendo, portanto, os indicadores utilizados nesta dimensão.

A cultura de segurança é uma dimensão bem consolidada dentro da temática da segurança do paciente, sendo recentemente também explorada no contexto da APS. Instrumentos já validados, como o Medical Office Survey on Patient Safety Culture – MOSPSC (Pesquisa de Consultório Médico sobre Cultura de Segurança na Atenção Primária)1717 Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880.,3232 Macedo LL, Haddad MCFL, Silva AMR, et al. Culture of patient safety in primary health care in a large municipality in the perception of workers. Texto & Contexto Enferm. 2020; (29):e20180410. e o Hospital Survey on Patient Safety Culture – HSOPSC (Pesquisa Hospitalar sobre a Cultura de Segurança do Paciente)3333 Tlili MA, Aouicha W, Ben Dhiab M, et al. Assessment of nurses’ patient safety culture in 30 primary health-care centres in Tunisia. East Mediterr Health J. 2020; 26(11):1347-1354., avaliam por meio de escala Likert a cultura de segurança, explorando dimensões como trabalho em equipe, seguimento da assistência ao paciente, aprendizagem organizacional, treinamento de equipe, apoio da gestão para a segurança do paciente, abertura de comunicação, padronização de processos de trabalho, dentre outras1717 Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880.,3232 Macedo LL, Haddad MCFL, Silva AMR, et al. Culture of patient safety in primary health care in a large municipality in the perception of workers. Texto & Contexto Enferm. 2020; (29):e20180410.,3333 Tlili MA, Aouicha W, Ben Dhiab M, et al. Assessment of nurses’ patient safety culture in 30 primary health-care centres in Tunisia. East Mediterr Health J. 2020; 26(11):1347-1354..

Como a própria literatura já sinaliza, o fortalecimento da cultura de segurança se inicia com a avaliação da cultura presente na instituição3232 Macedo LL, Haddad MCFL, Silva AMR, et al. Culture of patient safety in primary health care in a large municipality in the perception of workers. Texto & Contexto Enferm. 2020; (29):e20180410.,3333 Tlili MA, Aouicha W, Ben Dhiab M, et al. Assessment of nurses’ patient safety culture in 30 primary health-care centres in Tunisia. East Mediterr Health J. 2020; 26(11):1347-1354., oportunizando a identificação de fortalezas e fragilidades que viabilizem intervenções no contexto explorado. Dentre as características presentes na cultura de segurança, destaca-se a necessidade de reduzir os gradientes de hierarquia, por meio de uma comunicação respeitosa e confiante, o trabalho em equipe, a liderança, e a promoção da cultura justa, na qual a culpa e a punição oportunizam o aprendizado e as melhorias na atenção à saúde1717 Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880.,3434 Webair HH, Al-Assani SS, Al-Haddad RH, et al. Assessment of patient safety culture in primary care setting, Al-Mukala, Yemen. BMC Fam. Pract. 2015; (16):136..

Para além da cultura de segurança, a segurança do paciente recebe influência dos fatores organizacionais e dos fatores humanos3434 Webair HH, Al-Assani SS, Al-Haddad RH, et al. Assessment of patient safety culture in primary care setting, Al-Mukala, Yemen. BMC Fam. Pract. 2015; (16):136.. Por isso, a dimensão processos assistenciais, buscou na literatura e transpôs para seus indicadores a premissa de que a segurança apenas será implantada se os profissionais estiverem envolvidos com a causa, seguindo as normativas que conduzem as questões clínicas e de segurança, os conhecidos protocolos assistenciais, institucionais ou de segurança2727 Chaneliere M, Koehler D, Morlan T, et al. Factors contributing to patient safety incidents in primary care: a descriptive analysis of patient safety incidents in a French study using CADYA (categorization of errors in primary care). BMC Fam. Pract. 2018; 19(1):121., notificando os incidentes de segurança3535 Lawati MHA, Dennis S, Short SD, et al. Patient safety and safety culture in primary health care: a systematic review. BMC Family Practice. 2018; 19(1):104., envolvendo e empoderando o paciente, familiar e/ou cuidador no processo de cuidado2727 Chaneliere M, Koehler D, Morlan T, et al. Factors contributing to patient safety incidents in primary care: a descriptive analysis of patient safety incidents in a French study using CADYA (categorization of errors in primary care). BMC Fam. Pract. 2018; 19(1):121., qualificando a coordenação1616 Avery AJ, Sheehan C, Bell B, et al. Incidence, nature and causes of avoidable significant harm in primary care in England: retrospective case note review. BMJ Qual. Saf. 2021; 30(12):961-976. e a continuidade do cuidado1616 Avery AJ, Sheehan C, Bell B, et al. Incidence, nature and causes of avoidable significant harm in primary care in England: retrospective case note review. BMJ Qual. Saf. 2021; 30(12):961-976. na rede de atenção à saúde.

Tanto os profissionais de saúde, como os pacientes/familiares/cuidadores precisam estar capacitados para guiar sua segurança2222 World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
. Por isso, a dimensão educação permanente destaca o potencial da educação continuada e permanente envolvendo a participação do paciente/familiar/cuidador e dos profissionais, desenvolvendo inclusive as ações que abordem a saúde dos próprios trabalhadores, uma vez que possui relação direta com a segurança do paciente11 World Health Organization. Global Patient Safety Action Plan 2021-2030: towards eliminating avoidable harm in health care. 2020. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: https://www.who.int/teams/integrated-health-services/patient-safety/policy/global-patient-safety-action-plan.
https://www.who.int/teams/integrated-hea...
,2222 World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/2...
.

O ML não é um produto estanque, mas sujeito a ajustes a cada nova necessidade identificada. Por isso, aspectos não previstos na proposta apresentada ou que surjam no processo de implementação do programa devem ser acrescentados, ajustando e aperfeiçoando o modelo inicial55 Figueiredo TA, Angulo-Tuesta A, Hartz Z. Avaliabilidade da Política Nacional de Regulação no SUS: uma proposta preliminar. Physis. 2019; 29(2):e290215.. O ML exposto é composto por itens fundamentais para segurança do paciente na APS, foi validado por especialistas e, portanto, é um instrumento importante para explorar e discutir o objeto em questão. Ele não tem o intuito de negligenciar as questões que envolvem a pesquisa, mas sim dar ênfase ao trabalho desenvolvido no âmbito da APS, orientando a condução de ações assertivas para o fortalecimento da segurança do paciente.

A MAJ apresenta uma possibilidade metodológica para condução de futuros estudos avaliativos, estabelecendo critérios/indicadores com parâmetros e juízo de valor para parametrização dos resultados encontrados. Diferente dos parâmetros utilizados neste estudo, a Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ) estabelece em seu julgamento que as “áreas forte da segurança do paciente” são aquelas que recebem 75% ou mais de respostas positivas no contexto explorado, sendo as “áreas frágeis para a segurança do paciente” aquelas que recebem na avaliação até 50% de respostas positivas3636 Sorra J, Gray L, Streagle S, et al. AHRQ Hospital Survey on Patient Safety Culture: user’s guide. Rockville, MD: Agency for Healthcare Research and Quality; 2018. [acesso em 2022 set 18]. Disponível em: https://www.ahrq.gov/sites/default/files/wysiwyg/professionals/quality-patient-safety/patientsafetyculture/hospital/userguide/hospitalusersguide.pdf.
https://www.ahrq.gov/sites/default/files...
.

Já Togashi66 Togashi GB. Construção e validação de um instrumento de avaliação da segurança do paciente para os serviços de atenção primária à saúde. [dissertação]. Botucatu: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”; 2020., construiu e validou um instrumento de autoavaliação da segurança do paciente na APS composto por uma escala Likert que avalia cinco domínios da segurança do paciente na APS: estrutura (6 itens), equipe e treinamento (6 itens), gestão e liderança (6 itens), processo assistencial (12 itens) e cultura (4 itens), mas não apresentou parâmetros de julgamento para a avaliação, mencionando, apenas, que o propósito avaliativo do instrumento é que quanto mais respostas se aproximarem da opção ‘concordo totalmente’, mais adequado está o serviço em relação à segurança do paciente.

A proposta avaliativa apresentada é inovadora e visa colaborar com o desenvolvimento de ações que fortaleçam a segurança do paciente na APS, no entanto, dependendo da necessidade e do interesse de informação, outros métodos avaliativos podem ser utilizados considerando as condições existentes para sua execução, como recursos, tempo e oportunidade55 Figueiredo TA, Angulo-Tuesta A, Hartz Z. Avaliabilidade da Política Nacional de Regulação no SUS: uma proposta preliminar. Physis. 2019; 29(2):e290215..

Considerações finais

O estudo construiu e apresentou a teoria da segurança do paciente na APS, estabelecendo as conexões necessárias entre atividades, produtos e resultados para alcance das metas estabelecidas pelo programa, qual seja, alcançar cuidados mais seguros neste contexto de atenção à saúde.

Para solidificar a construção da modelização, os especialistas foram envolvidos em todas as etapas, sendo fonte de informações e contribuições para o desenvolvimento do estudo de avaliabilidade. Apesar de tratar-se de uma forte recomendação para os futuros estudos, envolvê-los e mantê-los ativos com as suas participações nos diferentes momentos do estudo é um desafio.

As estratégias utilizadas para oportunizar e potencializar a participação dos especialistas foram a construção das etapas da conferência de consenso de modo virtual e assíncronas, tentando adequar-se às disponibilidades individuais dos participantes e a flexibilidade dos prazos de retorno conforme a necessidade apresentada.

Como potencialidade destaca-se o uso de diferentes técnicas para validação e confiabilidade dos resultados: análise documental, revisão de literatura e a conferência de consenso, com a participação dos especialistas na temática. Por isso, a modelização da segurança do paciente na APS apresentada pode ser utilizada por diversos atores, de diferentes contextos, para explorar e aprimorar a segurança do paciente na APS.

O estudo originou-se de uma demanda acadêmica, constituindo uma produção teórica e a sua utilização extensiva pode estar limitada por não ter sido uma necessidade sentida pelo próprio serviço. Outra limitação foi a dificuldade em incluir um número maior de especialistas e trabalhadores dos serviços nas etapas da conferência de consenso.

Sugere-se que novos estudos avaliativos sejam desenvolvidos, explorando a implantação da segurança do paciente na APS, contextos e elementos facilitadores e dificultadores do processo de implantação e implementação da segurança do paciente na APS.

  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).
  • Suporte financeiro: não houve

Referências

  • 1
    World Health Organization. Global Patient Safety Action Plan 2021-2030: towards eliminating avoidable harm in health care. 2020. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: https://www.who.int/teams/integrated-health-services/patient-safety/policy/global-patient-safety-action-plan
    » https://www.who.int/teams/integrated-health-services/patient-safety/policy/global-patient-safety-action-plan
  • 2
    Konh LT, Corrigan JM, Donaldson MS. Errors in health care: a leading cause of death and injury. In: Konh LT, Corrigan JM, Donaldson MS. To err is human: building a safer health care system. Washington, DC: Institute of Medicine; 2000. p. 26-48.
  • 3
    World Health Organization. The Launch of the World Alliance for Patient Safety: “Please do me no harm”. 2004. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: https://www.who.int/patientsafety/en/brochure_final.pdf
    » https://www.who.int/patientsafety/en/brochure_final.pdf
  • 4
    Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 529, de 1º de abril de 2013. Institui a Política Nacional de Segurança do Paciente (PNSP). 2013. [acesso em 2022 ago 10]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html
  • 5
    Figueiredo TA, Angulo-Tuesta A, Hartz Z. Avaliabilidade da Política Nacional de Regulação no SUS: uma proposta preliminar. Physis. 2019; 29(2):e290215.
  • 6
    Togashi GB. Construção e validação de um instrumento de avaliação da segurança do paciente para os serviços de atenção primária à saúde. [dissertação]. Botucatu: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”; 2020.
  • 7
    Baratieri T, Natal S, Hartz ZA. Cuidado pós-parto às mulheres na atenção primária: construção de um modelo avaliativo. Cad. Saúde Pública. 2020; 36(7):e00087319.
  • 8
    Madden C, Lydon S, Curran C, et al. Potential value of patient record review to assess and improve patient safety in general practice: A systematic review. Eur. J. Gen. Pract. 2018; 24(1):192-201.
  • 9
    Pai SD, Alves DB, Pluta P, et al. Avaliação da cultura de segurança do paciente na atenção primária à saúde. Rev. baiana enferm. 2020; (34):e34849:1-12.
  • 10
    Thurston WE, Ramaliu, A. Evaluability assessment of survivors of torture program: lessons learned. The Canadian J. Prog. Evaluat. 2005; 20(2):1-25.
  • 11
    Macedo TR, Calvo MCM, Possoli L, et al. Segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde: um olhar sobre a literatura. Revista de APS. 2022; 25(3):691-712.
  • 12
    Souza LEPF, Silva LMV, Hartz ZMA. Conferência de consenso sobre a imagem-objetivo da descentralização da atenção à saúde no Brasil. In: Hartz ZMA, Silva LMV. Avaliação em saúde: dos modelos teóricos à prática na avaliação de programa e sistemas de saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005. p. 65-102.
  • 13
    Brasil. Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. 2012. [acesso em 2023 mar 15]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
    » https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
  • 14
    Auraaen A, Slawomirski L, Klazinga N. The economics of patient safety in primary and ambulatory care: flying blind. OECD Health. Working Pap. 2018 [acesso em 2021 ago 3]; (106):1-57. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/baf425ad-en.pdf?expires=1628017673&id=id&accname=guest&checksum=95B6F3815B58926F1E56483E10C733F8
    » https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/baf425ad-en.pdf?expires=1628017673&id=id&accname=guest&checksum=95B6F3815B58926F1E56483E10C733F8
  • 15
    World Health Organization. Quality of care: patient safety: report by the Secretariat. 2002 mar 23. [acesso em 2021 jul 3]. Disponível em: http://apps.who.int/gb/archive/pdf_files/WHA55/ea5513.pdf
    » http://apps.who.int/gb/archive/pdf_files/WHA55/ea5513.pdf
  • 16
    Avery AJ, Sheehan C, Bell B, et al. Incidence, nature and causes of avoidable significant harm in primary care in England: retrospective case note review. BMJ Qual. Saf. 2021; 30(12):961-976.
  • 17
    Antonakos I, Souliotis K, Psaltopoulou T, et al. Patient Safety Culture Assessment in Primary Care Settings in Greece. Healthcare. 2021; 9(7):880.
  • 18
    Souza MM, Ongaro JD, Lanes TC, et al. Cultura de segurança do paciente na Atenção Primária à Saúde. Rev. Bras. Enferm. 2019; 72(1):32-9.
  • 19
    Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017.
  • 20
    Brasil. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Coleção COVID-19. Principais elementos. Brasília, DF: CONASS; 2021. 338 p. (v. 1).
  • 21
    Grabois V, Duarte SCM. O Papel da Gestão para a Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde. In: Dalcin TC, Daudt CG. Segurança do Paciente na Atenção Primária à Saúde: teoria e prática. Porto Alegre: Associação Hospitalar Moinhos de Vento; 2020.
  • 22
    World Health Organization. Education and training. 2016. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269
    » https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269
  • 23
    World Health Organization. Patient engagement. 2016. 26 p. [acesso em 2021 nov 6]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269
    » https://apps.who.int/iris/handle/10665/252269
  • 24
    Woodward S. Seven Steps to patient safety for primary care. Reino Unido: National Patient Safety Agency; 2006.
  • 25
    Kingston-Riechers J, Ospina M, Jonsson E, et al. Patient Safety in Primary Care. Vancouver: Canadian Electronic Library; 2010. [acesso em 2023 mar 15]. Disponível em: https://bcpsqc.ca/wp-content/uploads/2018/03/Primary_Care_2010_english_FINAL.pdf
    » https://bcpsqc.ca/wp-content/uploads/2018/03/Primary_Care_2010_english_FINAL.pdf
  • 26
    Siman AG, Braga LM, Amaro MOF, et al. Desafios da prática na segurança do paciente. Rev. Bras. Enferm. 2019; 72(6):1581-1588.
  • 27
    Chaneliere M, Koehler D, Morlan T, et al. Factors contributing to patient safety incidents in primary care: a descriptive analysis of patient safety incidents in a French study using CADYA (categorization of errors in primary care). BMC Fam. Pract. 2018; 19(1):121.
  • 28
    Panesar SS, Silva D, Carson-Stevens A, et al. How safe is primary care? A systematic review. BMJ Qual. Saf. 2016; 25(7):544-53.
  • 29
    Brasil. Ministério da Saúde, Datasus. Produção ambulatorial do SUS - Brasil - por local de atendimento, 2019. [acesso em 2022 set 1]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sia/cnv/qauf.def
    » http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sia/cnv/qauf.def
  • 30
    Souza EC, Guimarães JMX, Silva MRF. Estudos de avaliabilidade de políticas e programas de saúde no Brasil: revisão integrativa. SANARE, Sobral. 2017; 16(2):85-92.
  • 31
    Marchon SG, Mendes Junior WV. Patient safety in primary health care: a systematic review. Cad. Saúde Pública. 2014; 30(9):1815-1835.
  • 32
    Macedo LL, Haddad MCFL, Silva AMR, et al. Culture of patient safety in primary health care in a large municipality in the perception of workers. Texto & Contexto Enferm. 2020; (29):e20180410.
  • 33
    Tlili MA, Aouicha W, Ben Dhiab M, et al. Assessment of nurses’ patient safety culture in 30 primary health-care centres in Tunisia. East Mediterr Health J. 2020; 26(11):1347-1354.
  • 34
    Webair HH, Al-Assani SS, Al-Haddad RH, et al. Assessment of patient safety culture in primary care setting, Al-Mukala, Yemen. BMC Fam. Pract. 2015; (16):136.
  • 35
    Lawati MHA, Dennis S, Short SD, et al. Patient safety and safety culture in primary health care: a systematic review. BMC Family Practice. 2018; 19(1):104.
  • 36
    Sorra J, Gray L, Streagle S, et al. AHRQ Hospital Survey on Patient Safety Culture: user’s guide. Rockville, MD: Agency for Healthcare Research and Quality; 2018. [acesso em 2022 set 18]. Disponível em: https://www.ahrq.gov/sites/default/files/wysiwyg/professionals/quality-patient-safety/patientsafetyculture/hospital/userguide/hospitalusersguide.pdf
    » https://www.ahrq.gov/sites/default/files/wysiwyg/professionals/quality-patient-safety/patientsafetyculture/hospital/userguide/hospitalusersguide.pdf

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Set 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    11 Nov 2022
  • Aceito
    03 Maio 2023
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde Av. Brasil, 4036, sala 802, 21040-361 Rio de Janeiro - RJ Brasil, Tel. 55 21-3882-9140, Fax.55 21-2260-3782 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br