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Adoção de medidas de precaução diante dos riscos no uso das inovações tecnocientíficas

RESUMO

Identifico medidas de precaução que devem ser adotadas para prevenir ou reduzir o risco dos efeitos danosos possivelmente ocasionados pelos usos das inovações científicas. Meu argumento se vale em especial de situações em que há incerteza a respeito dos riscos envolvidos. Sustenta que medidas eticamente adequadas precisam ser informadas pelos resultados das pesquisas científicas empreendidas (sob as estratégias metodológicas apropriadas) com o fim de identificar, tanto quanto possível, os efeitos danosos possíveis e a variedade dos mecanismos que levem à sua efetiva ocorrência, bem como as condições em que eles atualmente ocorreriam, e com qual magnitude e probabilidade, bem como descobrir como prevenir a ocorrência deles ou reduzir o seu impacto a níveis aceitáveis por meio de regulamentos apropriadamente fiscalizados. Assim, ao final, discuto as responsabilidades dos cientistas e suas instituições na condução da pesquisa necessária para informar as medidas de precaução.

PALAVRAS-CHAVE:
Princípio de Precaução; Riscos; Responsabilidades dos cientistas; Estratégias metodológicas

ABSTRACT

I identify precautionary measures that ought to be adopted to prevent or reduce the risk of harmful effects possibly occasioned by the uses of scientific innovations. My argument pays special attention to situations in which there is uncertainty about the risks involved. It maintains that ethically adequate measures need to be informed by the results of scientific research conducted (under appropriate methodological strategies) with the aim of identifying, as far as possible, not only the potential harmful effects and the various mechanisms that may lead to their actual occurrence, but also the conditions by which they would actually occur and their magnitude and probability, as well as discovering how to prevent them or reduce their impact to acceptable levels by means of appropriately enforced regulations. Then, in the final section, I discuss the responsibilities of scientists and their institutions when conducting the research needed to inform the precautionary measures.

KEYWORDS:
Precautionary principle; Risks; Responsibilities of scientists; Methodological strategies

O Princípio de Precaução é reconhecido em vários acordos internacionais, tais como a Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento (1992) e o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (2002), e também em várias leis nacionais.1 1 Reichardt (ver neste dossiê) discute sumariamente a história e alcance da adoção do Princípio de Precaução e detalhes do seu lugar na lei brasileira. Azevedo (2007) elabora o papel do princípio nos acordos internacionais e as suas tensões com as políticas da Organização Mundial de Comércio (OMC). Enquanto uma resposta tanto às ameaças aos direitos humanos quanto aos efeitos ambientais e sociais danosos, ocasionados ou assumidos enquanto risco por algumas inovações e projetos tecnocientíficos de grande visibilidade, tal princípio representa esforços para incorporar, diante desses efeitos e ameaças, salvaguardas adequadas nos marcos legais, que orientem as deliberações das comissões responsáveis pela promulgação das políticas a respeito da ciência e tecnologia. A sua relevância é incontestável hoje no contexto do aquecimento global e das mudanças climáticas, dos desastres de Fukushima e do Rio Doce, e de outras consequências da política econômica baseada na procura interminável dos lucros e do crescimento econômico, que são ocasionadas quando as inovações tecnocientíficas são introduzidas na vida cotidiana, e nas instituições e práticas sociais, com o mínimo de precaução e sem reflexão adequada de como reconciliar os seus usos com a proteção dos direitos humanos. De acordo com o Princípio de Precaução, as salvaguardas adequadas requerem a adoção de medidas de precaução pelos cientistas, instituições científicas e autoridades públicas responsáveis pela pesquisa, desenvolvimento e implementação das inovações tecnocientíficas. Além disso, o princípio prescreve que essas medidas devem incorporar valores éticos tais como respeito aos direitos humanos, equidade dentre e entre gerações e sustentabilidade ambiental; devem também levar em conta todos os tipos de riscos que surjam nos contextos humanos, socioeconômicos e ecológicos do uso atual das inovações, inclusive nas situações em que existem incertezas acerca da magnitude e probabilidade da ocorrência dos danos assumidos enquanto risco. Neste artigo, não discutirei a literatura ampla sobre o Princípio de Precaução, os assuntos legais e políticas relacionados, ou questões pertinentes à melhor maneira para incorporar as medidas de precaução em um princípio sucinto com força legal.2 2 Para uma interpretação original e convincente do Princípio de Precaução, bem como para uma refutação de muitas objeções contra a sua adoção e uma ampla discussão da literatura filosófica acerca dele, ver Steel (2015). A Comissão Mundial para a Ética da Ciência e Tecnologia ofereceu uma versão do Princípio, que é mais detalhada do que as formulações fornecidas nos acordos e leis, e que tenta evitar as críticas feitas delas e as fraquezas, que elas têm, derivadas das suas origens em negociações que necessitam compromissos baseados politicamente (COMEST, 2005). A minha análise neste artigo, e em Lacey (2006), foi influenciada pelas propostas da COMEST, e tenta aproveitá-las. Meu objetivo é apenas o de esclarecer algumas das implicações dessas medidas de precaução para a investigação científica e a organização das instituições científicas e suas prioridades.

Riscos dos usos das inovações tecnocientíficas: investigações científicas relevantes

As inovações tecnocientíficas estão penetrando cada vez mais domínios da vida cotidiana e da experiência humana, em arranjos sociais, atividades produtivas e práticas institucionais. Muitas delas, introduzidas em áreas tais como comunicações, medicina, agricultura, energia e transporte, são amplamente valorizadas por sua contribuição para melhorar a qualidade da vida e para tornar a ação humana mais efetiva e responsiva aos desejos das pessoas. Ao mesmo tempo, os interesses econômicos e políticos atualmente dominantes - que fornecem os recursos para uma grande parte da pesquisa, desenvolvimento e implementação social das inovações tecnocientíficas e para a sua disponibilidade nessas áreas e outras - valorizam as inovações e as mudanças socioeconômicas que o uso amplo delas fez possível, porque elas contribuem para o crescimento econômico nacional e internacional, o lucro das corporações, e (algumas vezes) os interesses militares. Geralmente, sem deixar de lado o valor das inovações para as áreas mencionadas, as inovações tecnocientíficas servem a esses interesses de maneira privilegiada. Além disso, esses interesses são também satisfeitos, algumas vezes à custa de interesses competidos, pela maneira de que muito da pesquisa científica, conduzida nas principais instituições científicas contemporâneas, faz parte da Tecnociência Comercialmente-orientada (TC) (Lacey; Mariconda, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.a; Lacey, 2014). A TC tem o objetivo de obter conhecimento que pode informar (mais ou menos diretamente) o desenvolvimento de inovações tecnocientíficas, com as quais se podem contar para gerar, eficazmente e fidedignamente, efeitos específicos desejados que contribuam simultaneamente para novos desenvolvimentos nas áreas mencionadas (outras também) e para o crescimento econômico contínuo.

Contudo, o uso das inovações tecnocientíficas em práticas sociais não só produz os efeitos que são planejados e desejados nas áreas mencionadas, vinculados ao crescimento econômico, mas também ocasiona “efeitos colaterais” na saúde, na sustentabilidade ecológica, nos arranjos sociais e nas práticas culturais. Alguns desses efeitos podem ser danosos (ou benéficos) e, portanto, são de saliência ética. Segue-se que as corporações, instituições científicas e autoridades reguladoras, responsáveis pela introdução de uma inovação tecnocientífica nas práticas sociais, também têm responsabilidade em assegurar que medidas adequadas sejam adotadas para prevenir ou minimizar o impacto dos efeitos danosos, ocasionados pelo seu uso. Tal responsabilização se dá necessariamente assim, pois sem a adoção de tais medidas de precaução a introdução da inovação carece de legitimidade ética.3 3 A legitimidade ética depende também (além da eficácia da inovação) tanto de que os seus benefícios possam ser compartilhados equitativamente (ou pelo menos sem ocasionar retrocesso para os setores empobrecidos e marginalizados da sociedade), como que não haja melhoras alternativas. Para discussão da questão da legitimidade da introdução e uso dos transgênicos nas práticas agrícolas, ver Lacey (2010, Parte 2; 2017a; 2017b). A determinação das medidas adequadas de precaução precisa ser informada pelos resultados das pesquisas científicas empreendidas, visando identificar tanto quanto possível os efeitos danosos potenciais e a variedade dos mecanismos que levem à sua efetiva ocorrência, bem como as condições nas quais eles atualmente ocorrem, e com qual magnitude e probabilidade. Além disso, faz-se necessário descobrir como prevenir a ocorrência deles ou reduzir o seu impacto a níveis aceitáveis por meio de regulamentos apropriadamente fiscalizados. Quais dos muitos e variados efeitos potencialmente danosos (riscos) devem ser priorizados nessas pesquisas científicas e quais estratégias metodológicas seriam adequadas para a sua investigação?

Estratégias metodológicas para investigar os riscos

É importante lembrar que as estratégias de pesquisa utilizadas na TC tipicamente não são adequadas, por si mesmas, para a pesquisa de todos os efeitos colaterais dos usos das inovações tecnocientíficas. A pesquisa empreendida na TC utiliza estratégias descontextualizadoras, i.e., estratégias que possibilitam a investigação da ordem física/molecular subjacentes dos objetos e fenômenos, bem como os seus processos e interações, sem levar em consideração dimensões e contextos humanas, sociais, culturais, ambientais e ecológicas dos objetos investigados (para elaboração, ver Lacey e Mariconda, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.a; Lacey, 2014). Segue-se que as teorias empregadas nessa pesquisa carecem das categorias necessárias para descrever e entender adequadamente os impactos do uso das inovações tecnocientíficas nos objetos e fenômenos que não podem ser separados dos seus contextos sociais e ecológicos: por exemplo, as mudanças climáticas, a poluição, a extensão da perda dos recursos naturais e da biodiversidade, a contaminação de solos e águas, as consequências do uso dos agrotóxicos nos agroecossistemas e sob as condições socioeconômicas dos seus usos atuais, e a distribuição desigual dos benefícios e efeitos danosos dos usos das inovações. Em âmbito geral, essas teorias não podem tratar adequadamente dos impactos dos usos dos objetos tecnocientíficos, quando considerados como objetos que incorporam valores do progresso tecnológico e do capital e do mercado (Lacey; Mariconda, 2014a, p.657; Lacey, 2017); ou fornecer orientação para investigar a reivindicação (feita em argumentos para legitimar a hegemonia da TC) de que os avanços da tecnociência poderiam cuidar e responder a todos os problemas que possam surgir nos domínios humanos, sociais e ecológicos.

Entretanto, esses assuntos podem ser investigados empiricamente, mas só se interpretar-se a ciência como Pesquisa Multi-estratégica (P-MS) (em contraste à TC). Na P-MS podem-se adotar não só estratégias descontextualizadoras, mas também estratégias sensíveis ao contexto (por exemplo, as estratégias da pesquisa na agroecologia: Lacey, 2015a_______. (Org.) Ciência, valores e alternativas II. Estudos Avançados, v.29, n.83, p.175-259, 2015.; 2015b), que permitem que teorias empreguem categorias que possibilitam a descrição e compreensão adequada dos objetos e fenômenos inseparáveis de seus contextos sociais e ecológicos (Lacey; Mariconda, 2014a). Portanto, medidas de precaução abrangente exigem acesso aos resultados das pesquisas relevantes conduzidas sob algumas estratégias sensíveis ao contexto, bem como estratégias descontextualizadoras.

Incertezas

Decisões sobre a legitimidade da introdução de uma inovação tecnocientífica em práticas sociais não podem ser adiadas indefinitivamente. Assim, não é surpreendente que existam situações em que, no momento de tomar a decisão, permaneçam incertezas sobre os riscos envolvidos, tendo em conta que todas as pesquisa relevantes não poderiam ser conduzidas a tempo e com os recursos disponíveis. Essas situações incluem aquelas em que suficientes recursos financeiros não eram disponíveis para conduzir (ou completar) a pesquisa e outras em que os meios científicos necessários (teóricos, observacionais, experimentais, instrumentais) para conduzir as pesquisas ainda não tivessem sido desenvolvidos. Às vezes, a complexidade e a variabilidade dos contextos humanos, sociais e ecológicos, nos quais o uso de uma inovação seja projetado, são tão grandes que todos os fatores relevantes não podem ser levados em conta nas pesquisas, e até mesmo alguns poderiam ser desconhecidos; então, por exemplo, nos casos das mudanças climáticas e a tragédia do Rio Doce, será só com a sua factual ocorrência que um efeito danoso possível terá alta probabilidade.

Como adotar medidas de precaução diante desse tipo de incerteza acerca dos riscos?

Medidas de precaução

Medidas adotadas nas comissões reguladoras oficiais

Os resultados científicos, pertinentes aos riscos, que informam as deliberações de muitas das comissões reguladoras oficiais, tipicamente são limitados aos que informam as avaliações de risco padrão [ou, análises de risco “científicas”]. Esses resultados são produtos das investigações conduzidas sob estratégias descontextualizadoras dos efeitos potenciais (que têm sido identificadas como danosas) para a saúde ou para o meio ambiente em que se dá o uso das inovações tecnocientíficas, que podem ser ocasionadas por mecanismos físicos/químicos/biológicos. Essas investigações tratam da magnitude desses efeitos potenciais, a probabilidade e as condições da sua ocorrência, e as possibilidades para conter o seu impacto por meio de introduzir regulamentos (Lacey, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.). Normalmente, para essas comissões, a única medida de precaução necessária, antes de introduzir uma inovação tecnocientífica eficaz em práticas sociais, é de submeter as inovações às avaliações de risco padrão; e, então, (quando apropriado) de propor regulamentos para o seu uso; ou, nos casos relativamente raros, em que as investigações produzem evidência convincente da alta probabilidade da ocorrência de dano difícil de regular adequadamente, de proibir o seu uso. Tais comissões não levam em consideração medidas adicionais, porque pressupõem que a eficácia de uma inovação tecnocientífica basta para a legitimidade do seu uso apropriadamente regulado4 4 Nos contextos sociais e ecológicos dos usos atuais da inovação, cujo número das variá- veis operante é muito maior do que nas condições limitados do laboratório, podem ocorrer efeitos que não estiveram presentes ou foram observados nas investigações das avaliações de risco. À luz disso, os regulamentos geralmente requerem monitoramento dos seus usos práticos e da possibilidade, e se houver evidência de um efeito danoso, de conduzir novas avaliações de risco, que possam levar à reconsideração da legitimidade do seu uso. Geralmente, porém, desde que a reconsideração envolva perdas para os investidores na inovação, as decisões de permitir a introdução duma inovação nas práticas sociais, ceteris paribus, não permitem reconsideração até que um período especificado (por exemplo, dez anos) se passe. - contanto que, de acordo com o juízo de especialistas técnicos de estudos dos risco, suficientes avaliações de risco padrão apropriadas e bem feitas tenham sido compridas, e as investigações ligadas a elas não produzam evidência convincente que algum dano sério seria ocasionado pelo seu uso.

Segue-se que as deliberações da legitimidade do uso de uma inovação não precisam ter em conta os riscos que não podem ser investigados adequadamente sem a utilização de algumas estratégias sensíveis ao contexto (por exemplo, os riscos resultantes da ação de mecanismos socioeconômicos) e, também, aqueles que surjam nas situações em que há incerteza a respeito deles. Consequentemente, a inovação pode ser introduzida em práticas sociais legitimamente (do ponto da vista das comissões), sem nenhuma consideração desses riscos ou esforços para conter o seu impacto potencial. Isso reflete que aqueles que aderem à TC têm pouco interesse em efeitos potenciais que caem fora do âmbito das avaliações de risco padrão e das investigações conduzidas sob as estratégias descontextualizadoras (e, assim, de acordo à concepção da ciência da TC, que caem fora do âmbito da investigação científico). Eles mantêm que, geralmente, os riscos desse tipo têm relevância ética mínima comparada aos riscos - ambos econômicos e nas áreas do esperado uso (como medicina) - de não introduzir uma inovação eficaz logo que possível; e eles têm confiança que, não importando qual efeito não desejado surja, que esse poderá ser tratado adequadamente, quando necessário, pelos desenvolvimentos da própria tecnociência. Entretanto, essa confiança parece precária quando lembramos que o aquecimento global e os seus efeitos ficam sem tratamento adequado nas pesquisas da TC. Efetivamente, na TC, a relevância dos riscos, que não podem ser investigados nas avaliações de riscos padrão, ou onde há incerteza acerca dos riscos, é negada - uma postura que não serviria para conter os efeitos do aquecimento global e outros riscos de danos sérios, que caem fora do âmbito dessas análises.5 5 Para discussão dos riscos dos usos dos transgênicos, que caem fora do âmbito das avaliações de risco padrão - tais como os danos para a saúde ocasionados por contato com agrotóxicos nos campos agrícolas e o aumento da insegurança alimentar, especialmente para trabalhadores rurais deslocados pela difusão dos usos dos transgênicos nas práticas agrícolas -, ver Lacey (2017b).

Medidas de precaução nas situações de incerteza

Quais são as medidas de precaução que devem ser tomadas diante de situa- ções em que há incerteza a respeito de riscos eticamente sérios? Mais especificamente, quais medidas tomar nas situações em que (a) existirem razões para se acreditar na séria possibilidade de que o uso duma inovação poderia ocasionar efeitos danosos às pessoas, aos arranjos sociais, às práticas culturais ou à natureza; mas (b) os resultados da pesquisa até então disponíveis não sejam suficientes para permitir a determinação da magnitude e reversibilidade dos riscos, a estimativa de suas probabilidades, bem como o tempo e lugar exato de sua ocorrência? As medidas de precaução, pressupostas nas várias formulações do Princípio de Precaução, aplicam-se nas situações onde condições (a) e (b) prevalecem. Quais seriam as medidas que podem ser adotadas para responder, por exemplo, aos riscos ligados aos efeitos possíveis do aquecimento global (por exemplo, o risco do aumento no nível do oceano), de acidentes possíveis em usinas nucleares e da emissão consequente de grandes quantidades de radiação, de doenças possivelmente causadas pelos usos de certos herbicidas no campo agrícola, e das ameaças para a segurança alimentar possivelmente causadas pela dominação da agricultura pelas empresas de agronegócio?

As razões, referidas em (a), têm a sua base em investigação científica. Existem somente quando a hipótese (H), “é possível que os usos duma inovação ocasionem efeitos danosos de tipos específicos”, for apoiada em algum grau por evidência empírica ou teórica disponível, embora a evidência não seja conclusiva, desde que (b) prevaleça e a hipótese fique aberta a mais investigações. Elas não representam simplesmente possibilidades lógicas ou casos imaginários. Porém, a identificação englobando das situações em que (a) e (b) prevalecem depende de um inquérito preliminar - baseado da experiência anterior dos investigadores e dos praticantes nos espaços onde as implementações de uma inovação estejam planejadas - dos efeitos potenciais que seriam importantes para investigar cuidadosamente. Uma situação importante é quando as condições seguintes estão satisfeitas: uma correlação for identificada entre usos da inovação e efeitos danosos; a instância relevante de H for consistente com todas as reivindicações do corpo do conhecimento científico atualmente estabelecido; a preponderância da evidência disponível não sustentar qualquer hipótese oposta; e nenhuma outra explicação plausível da correlação ficar disponível. Uma outra é quando as teorias científicas, atualmente sendo utilizadas para orientar os projetos da pesquisa (não importa se forem desenvolvidas sob estratégias descontextualizadoras ou sensíveis ao contexto), identificam ou permitirem a existência de mecanismos que poderiam ocasionar esses efeitos danosos a partir dos usos da inovação.

Vários dos riscos que ocorram nessas situações, como mudanças climáticas e outros riscos mencionados acima, são eticamente sérios. Ademais, a incerteza, que existe a respeito deles, não diminui a sua seriedade ou elimina a obrigação de tomar medidas de precaução a respeito deles (e não apenas dos riscos identificados nas avaliações de risco padrão). Não há fundamento no princípio ético de “evitar causar dano” para o pressuposto das comissões oficiais, discutido acima, que nega a necessidade de introduzir intervenções a fim de evitar a ocorrência ou diminuir os impactos dos riscos possíveis dos usos de uma inovação tecnocientífica nos casos em que as condições (a) e (b) prevaleçam. Em vez daquele pressuposto, proponho que:

Nas situações em que as condições (a) e (b) prevalecem, é legítimo eticamente (e, às vezes, obrigatório) incluir, entre as medidas de precaução, intervenções que afetem a introdução e os usos da inovação nas práticas sociais. Tais intervenções - geralmente informadas em parte importante pelos resultados de pesquisas conduzidas sob estratégias sensíveis ao contexto, e não apenas as estratégias descontextualizadoras - podem incluir a imposição de regulamentos, a recusa do financiamento público, as restrições no uso, o monitoramento ou rotulagem obrigatório, os impostos, e o adiamento da sua implementação nas práticas.

Essa proposta aplica-se só onde as condições (a) e (b) prevaleçam. Não tem nada a ver com questões acerca da qualidade científica das avaliações de risco padrão. A adoção dela não implica que avaliações dos riscos padrão da alta qualidade científica não seja importante;6 6 A adoção da proposta também não conduz à rejeição dos resultados que ficam bem confirmados na pesquisa conduzida sob as estratégias descontextualizadoras acerca do funcionamento e a eficácia das inovações tecnocientíficos, ou do fato de que existem benefícios amplamente valorizados produzidos a partir da pesquisa conduzida sob essas estratégias na TC. mas, à luz do fato de que muitos dos resultados que informam as avaliações de risco feitas pelas comissões oficiais são produtos da pesquisa dos cientistas empregados pelas corporações e insensíveis à avaliação e crítica de outros - e, portanto, que frequentemente não se pode excluir a possibilidade de distorção, resultando de conflitos de interesses - pode-se esperar que a proposta seria acompanhada pela recomendação de submeter os juízos dos especialistas em avaliação de risco padrão a um escrutínio cuidadoso. Entretanto, a proposta é relevante e importante só porque as avaliações de risco padrão (mesmo aquelas da alta qualidade científica) não tratem dos riscos ocasionados em situações onde as condições (a) e (b) obtém e dos riscos que não podem ser investigados adequadamente sob as estratégias descontextualizadoras.

Esclarecimentos da proposta sobre as medidas de precaução

Essa proposta é formulada de maneira bem sucinta. Para evitar (ou reduzir) potenciais ambiguidades e indeterminações da sua interpretação, anexo os seguintes esclarecimentos a respeito da introdução das intervenções eticamente legítimas que afetam o uso da inovação, e dos fatores que determinam a intervenção apropriada para uma inovação particular e as restrições e limitações dela.7 7 A proposta junto com os esclarecimentos pode ser vista como uma tentativa para expressar o raciocínio ético que motiva o Princípio de Precaução; mas, neste artigo, não estou tentando produzir uma formulação breve que possa ser usada em políticas públicas e documentos legais.

  • (1) Nas deliberações que conduzem à decisão de fazer uma intervenção de certo tipo (por exemplo, imposição de regulamentos) pelo fim de precaução devem ser levados em conta não só a seriedade do dano potencial do uso da inovação, mas também as possíveis consequências danosas das próprias intervenções, inclusive do dano de perder os benefícios esperados da introdução da inovação. Não há regras ou algoritmos para ajudar essa deliberação. Uma vez que tudo tenha sido considerado, quando for avaliado que o potencial dano dos usos da inovação seja suficientemente sério e não compensado pelos benefícios esperados, então as intervenções apropriadas podem incluir o adiamento das decisões finais acerca de se, e sob quais condições e regulamentos, a inovação poderia ser implementada nas práticas sociais.

  • (2) Qualquer adiamento, cumprido como parte das medidas de precaução,8 8 Podem ser várias outras razões para adiar (ou criar obstáculos para) a implementação de uma inovação tecnocientífica nas práticas sociais, que têm pouco a ver com medidas de precaução: por exemplo, para proteger um investimento num outro produto, ou para consolidar espaço para o desenvolvimento de uma preferida prática alternativa. é feito a fim de permitir que haja o tempo necessário para realizar pesquisas planejadas para reduzir as incertezas prevalecentes, ou para designar e implementar regulações baseadas nessas pesquisas, ou (em situações em que um adequado inquérito preliminar não tenha sido feito) para expandir a gama dos efeitos que poderiam ser antecipados ou previstos. Tais pesquisas incluem aquelas acerca dos potenciais efeitos ecológicos e socialmente danosos de longo prazo que podem ser ocasionados pelos usos das inovações nos contextos do seu uso atual nas práticas sociais, levando em conta todos os mecanismos (não só físicos, químicos e biológicos, mas também socioeconômicos) que poderiam estar envolvidos na geração dos efeitos, bem como aquelas acerca das medidas regulamentares que poderiam ajudar a evitar ou reduzir a probabilidade da ocorrência efetiva deles. Ademais, desde que a estimativa da seriedade dos riscos dependa em grau significativo da disponibilidade de alternativas com benefícios comparáveis ou melhores, também incluem pesquisas acerca das possibilidades e riscos das abordagens e práticas alternativas - no contexto de considerar as questões: “Qual seria o alcance das alternativas que poderiam estar disponíveis, caso pesquisas apropriadas fossem conduzidas? E qual é o conjunto das alternativas, variadas e combinadas apropriadamente, que constituiria a melhor abordagem de implementação em práticas sociais?9 9 Para discussão dessas questões no caso dos transgênicos, ver Lacey (2010, Parte 2; 2017a). Ao fim do período de adiamento, à luz dos resultados das pesquisas, as autoridades competentes podem decidir que é legitimo introduzir a inovação nas práticas sociais, sob a condição de ser usada de acordo com regulamentos estipulados ou com outras medidas de precaução motivadas pela pesquisa conduzida - ou que as incertezas ainda permanecem problemáticas e precisam de mais investigação, ou que uma alternativa seria preferível, ou que a implementação da inovação deve ser proibida porque a evidência indica que os riscos seriam gravíssimos.10 10 A proposta em discussão não mantém que o prevalecimento das condições (a) e (b) seja suficiente para legitimar a proibição do uso de uma inovação. Porém, as pesquisas, motivadas pelas medidas de precaução, podem produzir resultados que apoiem a não existência de condições para o uso seguro de uma inovação, ou que - toda considerada, depois de investigar as perdas que possivelmente seriam incorridas como consequência de não implementá-la - seria preferível desenvolver e priorizar uma prática alternativa (por exemplo, a agroecologia, em vez do uso dos transgênicos).

  • (3) Quando uma inovação for introduzida para uso nas práticas sociais de acordo com as medidas de precaução apropriadas, deve haver monitoramento sistemático, de longo prazo e amplo dos seus efeitos. Se, apesar das medidas de precaução, o uso da inovação atualmente estiver causando efeitos danosos ou os seus riscos forem maiores do que se pensava anteriormente, torna-se necessário revisar ou reverter o juízo da legitimidade do seu uso (pelo menos em certas condições - cf. nota 4).

  • (4) A avaliação da seriedade do dano potencialmente ocasionado pelo uso da inovação, e a comparação dela com a do dano antecipado devido às próprias intervenções - e decisões sobre a ordenação dos valores éticos e sociais envolvidos nesta avaliação -, deve ser feita no percurso de deliberações democráticas (Lacey, 2016_______. Science, respect for nature, and human well-being: democratic values and the responsibilities of scientists today. Foundations of Science, v.21, n.1, p.883-914, 2016.), nas quais participem representantes de todas as perspectivas de valores representadas na sociedade,11 11 Quais seriam as instituições apropriadas para engajamento nesse tipo de discussão democrático, sob quais condições poderiam as suas decisões ganhar autoridade, e como poderiam ser as atuais comissões regulamentares transformadas nelas são questões dignas da atenção urgente das organizações científicas e dos movimentos sociais. não só os valores do capital e do mercado, mas também valores da justiça social, sustentabilidade e participação democrática (Lacey; Mariconda, 2014a) - e quanto mais sério o dano potencial, maior deve ser a probabilidade de que ele não venha a ocorrer, ou de que seja adequadamente regulado.

  • (5) Decisões sobre outras questões controversas, que refletem valores éticos e sociais, também devem ser feitas no percurso dessas deliberações democráticas - inclusive questões sobre os possíveis efeitos danosos (e benefícios/riscos das praticas alternativas) que precisam ser investigadas, com quais prioridades, e sob quais estratégias; o grau da confirmação empírica que uma hipótese sobre riscos deve atingir para justificar o seu uso em informar intervenções que afetam a introdução de uma inovação;12 12 Para discussão do papel dos valores éticos e sociais na determinação do grau da confirmação empírica que uma hipótese sobre riscos deve atingir para justificar tais intervenções no caso dos transgênicos, ver Lacey (2017b). a adequação do inquérito preliminar; a duração do período de adiamento para permitir pesquisa antes da tomada das decisões finais sobre a implementação; e quando seria desejável a interrupção do uso nas práticas sociais duma inovação cujo uso já havia sido permitido.

As medidas de precaução e responsabilidades para a pesquisa científica

A adoção das medidas de precaução adequadas depende do empreendimento da pesquisa científica, cujos resultados informam a tomada de decisões sobre a implementação e os usos das inovações tecnocientíficas e o regulamento deles. Há, entre outras, implicações quanto às estratégias que devem ser adotadas nas pesquisas exigidas para fornecer a informação relevante para as deliberações de legitimidade, tanto as prioridades de instituições e organizações científicas; e, também, a respeito das responsabilidades dos cientistas, como participantes em instituições e organizações científicas. Em particular, a adoção das medidas de precaução é acompanhada pelo juízo ético que seria irresponsável participar nas pesquisas da TC - por exemplo, na eletrônica, inteligência artificial, transporte, energia, biotecnologia, nanotecnologia, geoengenharia, biologia sintética, novas tecnologias genéticas, biocombustíveis - a não ser que pesquisas rigorosas e sistemáticas (apoiadas por recursos adequados) também fossem conduzidas, primeiro, sobre os riscos e incertezas, inclusive de longo prazo, da implementação das inovações para a vida cotidiana, o meio ambiente, arranjos sociais, atividades produtivas, e práticas institucionais e culturais, levando em conta as condições socioeconômicas das implementações planejadas e as condições atuais do seu uso; e, segundo, que sejam pertinentes para a avaliação dos benefícios dos usos das inovações em comparação com os das alternativas possíveis, que talvez (como a agroecologia - Lacey, 2015a_______. (Org.) Ciência, valores e alternativas II. Estudos Avançados, v.29, n.83, p.175-259, 2015.; 2015b) não fossem baseadas no uso de inovações tecnocientíficas, mas informadas em parte pelos resultados de pesquisas conduzidas sob algumas estratégias sensíveis ao contexto.

O impacto da adoção das medidas de precaução dependerá da aceitação pelas organizações e instituições científicas da responsabilidade para assegurar que essas pesquisas serão conduzidas, e do reconhecimento que elas devem ter um lugar indispensável no dia a dia das instituições científicas públicas e universitárias. Dependerá, também, da concessão pelas comissões regulamentares da saliência dos resultados dessas pesquisas nas suas deliberações, inclusive resultados obtidos a partir da pesquisa conduzida na P-MS sob as estratégias sensíveis ao contexto, que podem informar práticas que incorporam os valores da justiça social, sustentabilidade e participação democrática (Lacey; Mariconda, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.b; 2015).

Transformação institucional

É frequentemente dito em criticismo à proposta das medidas de precaução, que acabei de caracterizar, que ela é incompatível, não só com os modos de operação e financiamento das instituições científicas contemporâneas, que abrem espaço predominante para a pesquisa na TC, mas também com os interesses dominantes (ambos científicos e econômicos) na implementação rápida (com poucos obstáculos) das inovações eficazes novas em práticas sociais. Esses interesses, que tendem a considerar as pesquisas da P-MS como apenas um empreendimento marginal não fornecem as condições institucionais e financeiras exigidas para o desenvolvimento maduro das pesquisas que são requeridas pelas medidas de precaução.

Sem a transformação das nossas universidades e instituições científicas e reguladoras permanecerá difícil engajar pesquisa científica necessária para a adoção das medidas de precaução e, assim, para o exercício das responsabilidades indicadas. Mas a transformação só será possível se utilizamos todas as oportunidades disponíveis hoje para nos engajamos nesse tipo de pesquisa. Nesse contexto, é importante lembrar, por um lado, que é um erro identificar a ciência com as suas formas institucionalizadas, e igualmente errôneo identificar o potencial do seu desenvolvimento com aquele da sua trajetória nas instituições atuais - especialmente porque a sua trajetória atual é baseada na adoção na pesquisa quase que exclusiva de estratégias descontextualizadoras, e deixa as estratégias sensíveis ao contexto marginalizadas; e, por outro lado, que atualmente as formas institucionalizadas da ciência servem especialmente bem os interesses do capital e do mercado (às vezes em detrimento dos interesses da justiça social, participação democrática e sustentabilidade), e que isso é contrário aos ideais tradicionais da ciência moderna, como aquele que atribui à ciência o status de patrimônio de toda humanidade (Lacey; Mariconda, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.a).

Podemos achar hoje algum espaço em nossas universidades para conduzir pesquisa que usa as estratégias sensíveis ao contexto - em, por exemplo, agroecologia e tecnologia social - que responda aos interesses da justiça social, sustentabilidade e participação democrática (Lacey, 2014_______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.; 2016; artigos publicados no dossiê em Estudos Avançados, organizado por Lacey e Mariconda, 2014b; 2015). É importante defender esse espaço, e tentar ampliá-lo, em nome não só desses valores, mas também dos ideais da tradição da ciência moderna da imparcialidade, inclusão e igualdade (Lacey, 2014). Isso exigirá uma luta - não só nos domínios de ideais e pesquisa, mas também nas áreas institucionais e políticas (Lacey, 2016) - para assegurar que as inovações tecnocientíficas introduzidas nas práticas sociais serão não só eficazes, mas também legítimas eticamente, sem consequências como o aquecimento global, a destruição do ambiente e de organismos conhecidos e não conhecidos, todas condições para desastres como os de Fukushima e do Rio Doce, e outra ameaças a justiça social.

Referências

  • AZEVÊDO, M. N. F. A OMC e a Reforma agrícola. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2007.
  • BENSAUDE-VINCENT, B.; LOEVE, S.; NORDMANN, A.; SCHWARZ, A. (Org.) Research Objects in their Technological Setting. London: Routledge, 2017. p.150-65.
  • COMEST - World Commission on the Ethics of Science and Technology. The Precautionary Principle. Paris: Unesco. 2005. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001395/139578e.pdf>. Acesso em: 14 set. 2017.
    » http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001395/139578e.pdf
  • DECLARAÇÃO DO RIO SOBRE AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. 1992. Disponível em: <https://www.apambiente.pt/_zdata/Politicas/DesenvolvimentoSustentavel/1992_Declaracao_Rio.pdf>. Acesso em: 14 set. 2017.
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  • LACEY, H. O Princípio de Precaução e a autonomia da ciência. Scientiae Studia, v.4, n.3, p.373-92, 2006.
  • _______ . Valores e atividade científica 2. São Paulo: Associação Filosófica Scientiae Studia; Editora 34, 2010.
  • _______. Tecnociência comercialmente orientada ou pesquisa multiestratégica? Scientiae Studia, v.14, n.4, p.669-95, 2014.
  • _______. A agroecologia: uma ilustração da fecundidade da pesquisa multiestratégica. Estudos Avançadas, v.29, n.83, p.175-81, 2015a.
  • _______. Agroécologie: la science et les valeurs de la justice sociale, de la démocratie et de la durabilité. Ecologie et Politique, n.51, p.27-40, 2015b.
  • _______. Science, respect for nature, and human well-being: democratic values and the responsibilities of scientists today. Foundations of Science, v.21, n.1, p.883-914, 2016.
  • _______. The life and times of transgenics. In: BENSAUDE-VINCENT, B.; LOEVE, S.; NORDMANN, A.; SCHWARZ, A. (Org.) Research Objects in their Technological Setting. London: Routledge, 2017a. p.150-65.
  • _______. The safety of using genetically engineered organism: empirical evidence and value judgments.Public Affairs Quarterly, v.31, n.4, 2017, p.261-81, 2017b.
  • LACEY, H.; MARICONDA, P. R. O modelo da interação entre as atividades científicas e os valores na interpretação das práticas científicas contemporâneas. Estudos Avançadas, v.28, n.82, p.181-99, 2014a.
  • _______. (Org.) Ciência, valores e alternativas I. Estudos Avançados, v.28, n.82, p.177-275, 2014b.
  • _______. (Org.) Ciência, valores e alternativas II. Estudos Avançados, v.29, n.83, p.175-259, 2015.
  • PROTOCOLO DE CARTAGENA SOBRE BIOSSEGURANÇA DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA. 2002. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf>. Acesso em: 14 set. 2017.
    » http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/prot_biosseguranca.pdf
  • REICHARDT, F. V. O princípio da precaução e a incorporação dos compromissos assumidos pelo Brasil nos acordos internacionais. (Ver neste dossiê)
  • STEEL, D. Philosophy and the Precautionary principle: Science, evidence and environmental policy. Cambridge: Cambridge University Press, 2015.
  • 2
    O autor agradece a Orlando Lima Pimentel a revisão do português do artigo e algumas sugestões úteis.

Notas

  • 1
    Reichardt (ver neste dossiê) discute sumariamente a história e alcance da adoção do Princípio de Precaução e detalhes do seu lugar na lei brasileira. Azevedo (2007) elabora o papel do princípio nos acordos internacionais e as suas tensões com as políticas da Organização Mundial de Comércio (OMC).
  • 2
    Para uma interpretação original e convincente do Princípio de Precaução, bem como para uma refutação de muitas objeções contra a sua adoção e uma ampla discussão da literatura filosófica acerca dele, ver Steel (2015). A Comissão Mundial para a Ética da Ciência e Tecnologia ofereceu uma versão do Princípio, que é mais detalhada do que as formulações fornecidas nos acordos e leis, e que tenta evitar as críticas feitas delas e as fraquezas, que elas têm, derivadas das suas origens em negociações que necessitam compromissos baseados politicamente (COMEST, 2005). A minha análise neste artigo, e em Lacey (2006), foi influenciada pelas propostas da COMEST, e tenta aproveitá-las.
  • 3
    A legitimidade ética depende também (além da eficácia da inovação) tanto de que os seus benefícios possam ser compartilhados equitativamente (ou pelo menos sem ocasionar retrocesso para os setores empobrecidos e marginalizados da sociedade), como que não haja melhoras alternativas. Para discussão da questão da legitimidade da introdução e uso dos transgênicos nas práticas agrícolas, ver Lacey (2010, Parte 2; 2017a; 2017b).
  • 4
    Nos contextos sociais e ecológicos dos usos atuais da inovação, cujo número das variá- veis operante é muito maior do que nas condições limitados do laboratório, podem ocorrer efeitos que não estiveram presentes ou foram observados nas investigações das avaliações de risco. À luz disso, os regulamentos geralmente requerem monitoramento dos seus usos práticos e da possibilidade, e se houver evidência de um efeito danoso, de conduzir novas avaliações de risco, que possam levar à reconsideração da legitimidade do seu uso. Geralmente, porém, desde que a reconsideração envolva perdas para os investidores na inovação, as decisões de permitir a introdução duma inovação nas práticas sociais, ceteris paribus, não permitem reconsideração até que um período especificado (por exemplo, dez anos) se passe.
  • 5
    Para discussão dos riscos dos usos dos transgênicos, que caem fora do âmbito das avaliações de risco padrão - tais como os danos para a saúde ocasionados por contato com agrotóxicos nos campos agrícolas e o aumento da insegurança alimentar, especialmente para trabalhadores rurais deslocados pela difusão dos usos dos transgênicos nas práticas agrícolas -, ver Lacey (2017b).
  • 6
    A adoção da proposta também não conduz à rejeição dos resultados que ficam bem confirmados na pesquisa conduzida sob as estratégias descontextualizadoras acerca do funcionamento e a eficácia das inovações tecnocientíficos, ou do fato de que existem benefícios amplamente valorizados produzidos a partir da pesquisa conduzida sob essas estratégias na TC.
  • 7
    A proposta junto com os esclarecimentos pode ser vista como uma tentativa para expressar o raciocínio ético que motiva o Princípio de Precaução; mas, neste artigo, não estou tentando produzir uma formulação breve que possa ser usada em políticas públicas e documentos legais.
  • 8
    Podem ser várias outras razões para adiar (ou criar obstáculos para) a implementação de uma inovação tecnocientífica nas práticas sociais, que têm pouco a ver com medidas de precaução: por exemplo, para proteger um investimento num outro produto, ou para consolidar espaço para o desenvolvimento de uma preferida prática alternativa.
  • 9
    Para discussão dessas questões no caso dos transgênicos, ver Lacey (2010, Parte 2; 2017a).
  • 10
    A proposta em discussão não mantém que o prevalecimento das condições (a) e (b) seja suficiente para legitimar a proibição do uso de uma inovação. Porém, as pesquisas, motivadas pelas medidas de precaução, podem produzir resultados que apoiem a não existência de condições para o uso seguro de uma inovação, ou que - toda considerada, depois de investigar as perdas que possivelmente seriam incorridas como consequência de não implementá-la - seria preferível desenvolver e priorizar uma prática alternativa (por exemplo, a agroecologia, em vez do uso dos transgênicos).
  • 11
    Quais seriam as instituições apropriadas para engajamento nesse tipo de discussão democrático, sob quais condições poderiam as suas decisões ganhar autoridade, e como poderiam ser as atuais comissões regulamentares transformadas nelas são questões dignas da atenção urgente das organizações científicas e dos movimentos sociais.
  • 12
    Para discussão do papel dos valores éticos e sociais na determinação do grau da confirmação empírica que uma hipótese sobre riscos deve atingir para justificar tais intervenções no caso dos transgênicos, ver Lacey (2017b).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2018
  • Aceito
    25 Abr 2018
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