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Doação organizacional em face ao mercado de órgãos: uma análise do modelo brasileiro de transplantação

Organizational donation in the face of organ market: an analysis of Brazilian transplant model

Resumo

A doação organizacional é o modelo de coordenação econômica da transplantação de órgãos no Brasil. O objetivo deste estudo é avaliar a atuação do Sistema Nacional de Transplantes para ampliar o número de doadores e, consequentemente, diminuir a contestação moral imputada em razão da existência da lista de espera. A metodologia seguiu o enfoque qualitativo com análise documental das leis, portarias, normas técnicas disponíveis. A análise mostrou que esse sistema opera com três estratégias: a) criação de uma “economia de incitação”; b) estruturação jurídica e gerencial do sistema em um continuum organizacional e; c) estímulo ao altruísmo como base do modelo de solidariedade social. No balanço crítico dessas estratégias, o estudo sugere a mudança da legislação em relação ao consentimento informado e a reorganização do sistema para promover a ação das comissões intra-hospitalares e otimização da logística de transporte dos órgãos.

Palavras-chave
doação de órgãos; transplantação; doação organizacional; mercados contestados; Sistema Nacional de Transplantes

Abstract

Organizational donation is the model of economic coordination of organ transplantation in Brazil. The objective of this study is to evaluate the performance of the National Transplant System to increase the number of donors and, consequently, to reduce the moral challenge imputed due to the existence of the waiting list. The methodology followed the qualitative approach with documentary analysis of laws, ordinances, available technical standards. The analysis showed that the System operates with three strategies: a) creation of an "incentive economy"; b) legal and managerial structuring of the system in an organizational continuum; c) stimulus to altruism as the basis of the model of social solidarity. In the critical balance of these strategies, the study suggests the change of the legislation regarding informed consent and the reorganization of the system to promote the action of the in-hospital commissions and optimization of the transport logistics of the organs.

Keywords
organ donation; transplantation; organizational donation; contested markets; National System of Transplants

1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento científico e tecnológico, especialmente após a segunda metade do século XX, impulsionou a prática da transplantação de órgãos. O marco dessa nova era da medicina foi a realização, em 1950, do primeiro transplante de rins nos EUA. Em 1954 foi a vez de a França realizar seu primeiro procedimento e nos anos de 1970 a prática já estava consideravelmente difundida no restante do mundo.

A doação de órgãos é regida pelo modelo de coordenação econômica baseada no altruísmo como fundamento da solidariedade social. Significa dizer que sua “produção”, circulação e utilização estão condicionadas pela existência de relações sociais e técnicas particulares, dado que são classificadas como recursos raros, não reproduzíveis e somente acessíveis a partir da morte de um indivíduo ou da sua mutilação, no caso dos doadores vivos.

O segundo aspecto para compreensão da doação de órgãos é a noção de que estas são mercadorias contestadas (Radin, 1996RADIN, M. J. Contested Commodities. The Trouble with Trade in Sex, Children, Body Parts and Other Things. Cambridge, MA: Harvard University, 1996.), semelhante a outras, como cigarros, organismos geneticamente modificados (OGMs), pornografia, jogos de azar, cadáveres e cannabis sativa. Essa contestação, de ordem moral, ocorre porque o comércio dessas mercadorias afeta a intimidade das pessoas ou ameaça a ordem pública, gerando discussões que dividem a opinião de cientistas, juristas e legisladores (Steiner; Trespeuch, 2014STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2014.).

Para que a transplantação ocorra é necessária uma estrutura organizacional, denominada continuum organizacional (Steiner, 2010STEINER, P. La transplantation d’organes: un commerce nouveau entre les êtres humains. Paris: Gallimard, 2010.; 2014STEINER, P. Les organes humaines: du bannissement do marché au don contesté. In: STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses universitaires du Mirail, 2014.). Suas características operacionais básicas são a retirada de órgãos, que deve respeitar os critérios éticos e políticos; circulação e transporte, segundo os critérios da eficácia e; alocação, de acordo com os critérios da eficácia médica e justiça social. Considera-se, ainda, a necessidade de uma coordenação geral que faça funcionar esse continuum, agindo especialmente no estímulo à “produção” de órgãos e assegurando a justiça na sua alocação. Sendo assim, a organização central atua em duas direções: para o grande público, desenvolve campanhas de conscientização e incentivo à doação e, para os profissionais e suas organizações, cria uma economia de incitação através do pagamento de taxas para mobilizar cirurgiões e suas equipes na intensificação das práticas de transplantação.

Com esse pano de fundo, o objetivo deste estudo é avaliar o desenvolvimento de um continuum a partir do caso brasileiro, evidenciando a criação e legitimação dos dispositivos legais e organizacionais e enfatizando seus esforços para afastar a contestação moral sobre a doação de órgãos. Para isso, será realizada uma análise do Sistema Nacional de Transplantes (SNT), procurando avaliar as estratégias de legisladores, gestores públicos e hospitais para criação de um ambiente favorável à doação. O roteiro do estudo parte da discussão acerca da contestação moral sobre a eficiência da doação, mostrando que o funcionamento do continuum está condicionado à diminuição dessa contestação, uma vez que ela pode bloquear o sistema. No segundo momento, serão apresentados dispositivos que conformam o sistema, bem como os problemas sociais associados ao seu desenvolvimento. Nesse ponto, a discussão seguirá uma linha crítica para apoiar alternativas de melhoria do atual modelo, tanto no plano legal, quando na esfera organizacional. Em termos práticos, a intenção é propor um balanço crítico das estratégias do sistema brasileiro para gerenciar essa contestação, rebatendo, por outra via, os argumentos que sugerem que a única alternativa é a criação de um mercado para resolver a questão.

A literatura disponível sobre o assunto nas ciências sociais e econômicas está majoritariamente focada na análise das leis e documentais que normatizam o tema, mostrando suas repercussões no campo da bioética, com poucos estudos nas áreas de logística, finanças e organizacional. Este estudo pretende localizar as lacunas legais e gerenciais sobre o enfoque da sociologia econômica na medida em que avalia a repercussão social das atividades econômicas do modelo. A metodologia do estudo propõe uma análise documental das informações disponíveis no que diz respeito à doação de órgãos, especialmente leis, portarias, discursos legislativos e medidas que instituíram o SNT.

2. BASE TEÓRICA

2.1.Coordenação econômica e a construção social da doação

O objeto analítico deste estudo é a doação organizacional. A doação é uma forma de comércio bastante vigorosa nas sociedades contemporâneas, e sua compreensão somente é possível dentro da complexidade social moderna, caracterizada pela emergência de uma multiplicidade de organizações que regulamentam as relações sociais em um mundo cada vez mais populoso. No caso do comércio de órgãos, a doação funciona como modelo de coordenação econômica, materializado por meio de dispositivos que regram a produção, circulação e alocação desses bens.

A tradição sociológica sobre a temática da doação, que tem sua origem nas obras Ensaio sobre o dom, de Marcel Mauss (1923), e Argonautas do pacífico ocidental, de Bronislaw Malinowski (1922), foi sintetizada por Alain Caillé a partir de quatro características básicas: 1) a doação permite compreender a “fábrica da solidariedade” em uma determinada sociedade, seja ela arcaica ou moderna; 2) a doação ocupa o lugar de destaque na modernidade na medida em que é deslocada para a dimensão primária da vida social, isto é, aquela que concerne à dimensão afetiva ou à vizinhança, onde se mobilizam as três funções clássicas propostas por Marcel Mauss: “doar, receber e doar”; 3) o espaço da solidariedade secundária, regido pelas normas burocráticas e mercantis da eficácia e do utilitarismo, está apoiado sobre as práticas de doação típicas da socialidade primária, abrindo a dimensão política da doação, segundo a qual a solidariedade está ancorada no mundo das associações e da filantropia, por fim, 4) a doação moderna produz inovação na medida em que possibilita a “doação para estranhos”, permitindo aos indivíduos escapar do modo fechado das relações interpessoais característicos das sociedades pré-modernas (Steiner, 2014STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2014.).

Nesse espectro, a doação organizacional é uma doação para a organização. São as organizações que permitem articular indivíduos antes atomizados. Essa condição alterou significativamente a morfologia social da doação, uma vez que a atmosfera moderna da doação precisa da organização para acontecer. A organização joga um duplo papel: de um lado, ela separa os indivíduos para preservar sua autonomia, de outro, conecta-os através de vínculos frágeis e efêmeros suficientes para garantir a doação. No entanto, vínculos frágeis não significam vínculos precários ou ausência de solidariedade. É por esse motivo que a doação moderna passa a ser compreendida no quadro de um modelo de solidariedade que procura a autonomia do indivíduo na sua tentativa de escapar do modelo fechado de relações sociais típico das sociedades arcaicas.

No plano econômico, a morte de um indivíduo pode gerar três bens que são transmitidos em forma de doação: o seguro de vida, a herança e os órgãos. Enquanto a doação do seguro de vida e a transmissão da herança convivem com práticas de mercado, a questão dos órgãos apresenta complexidade maior, dado que sua precificação dependeria de um conjunto de variáveis que serão desenvolvidas a seguir. A doação, feita efetivamente pela família do falecido e para uma organização (o hospital), tem uma repercussão social, uma vez que esses “bens” são “doados”, em última instância, para a sociedade. Isso torna a “produção” de órgãos uma questão pública, estruturada em três bases: o indivíduo, portador da liberdade de decisão sobre os critérios de decisão de cada um desses bens; a família, que no caso da morte do indivíduo assume a responsabilidade de transferências dos bens e; da sociedade, que fabrica os dispositivos legais da doação e o seu financiamento através do sistema de saúde, gerando uma solidariedade. Há, portanto, entre o indivíduo e a sociedade uma estreita relação de doação, mediada por organizações, na medida em que vários dispositivos atuam para criação da atmosfera da doação.

Há, ainda, outra diferença significativa da doação de órgãos em relação à herança e ao seguro de vida: para ser efetivada, ela depende de equipamentos, técnicas e ação de profissionais qualificados que atuam nas instituições que recebem esses bens. Nesse ambiente, o valor de um órgão depende dos custos operacionais envolvidos e, obviamente, do sucesso da transplantação que, em caso de fracasso, fica invalidada em razão da materialidade frágil do bem. É por esse motivo que emerge a necessidade de coordenação do sistema para atuação sincronizada, rápida e transparente. Nesse contexto, a coordenação da espera possui alta relevância em razão do tempo que envolve a oferta desse bem raro e da urgência para quem dele depende. Além disso, não é só a disponibilidade de um órgão que garante o emparelhamento entre oferta e demanda, mas uma série de critérios médicos e de organização logística.

A coordenação do Sistema é feita por uma instituição central, hierarquicamente superior, que atua na perspectiva do emparelhamento entre oferta e demanda. Para isso, elabora políticas de incentivo à doação, destinadas à população em geral, e uma economia de incitação para os profissionais e suas organizações. É por essa razão que a produção de órgãos assume uma dimensão política através da atuação do Estado em três frentes para ampliação da “produção” desses bens: a) incentivos financeiros, isto é, pagamento de serviços por meio de tarifas, aos hospitais; b) qualificação da abordagem feita pelas equipes intra-hospitalares às famílias para diminuição da recusa em doar e; c) organização jurídica e gerencial do Sistema em um continuum para permitir a circulação e efetivação da transplantação.

Segue-se a ideia de que órgãos, por terem o status de bens raros, não têm preço, mas tem um custo (Steiner, 2010STEINER, P. La transplantation d’organes: un commerce nouveau entre les êtres humains. Paris: Gallimard, 2010.). Considera-se que órgãos são bens econômicos que movimentam cifras financeiras elevadas e essas cifras põem o sistema, efetivamente, em funcionamento. Em resumo, o modelo de orientação econômica da doação depende de uma organização central que dinamiza um sistema interligado de organizações com o objetivo de conferir eficácia à prática da doação. Para isso, cria dispositivos legais e de gestão, procurando diminuir a contestação moral imputada pelos defensores do mercado de órgãos.

2.2. A contestação moral da doação e a alternativa de mercado

Os dados sobre a eficácia dos transplantes e o aumento gradual do número de doadores seriam animadores não fosse a persistência da lista de espera. Esse problema tem alimentado as discussões entre transplantadores, bioeticistas, legisladores e juristas sobre a criação de um mercado de órgãos (ou biomercado) como alternativa para ampliação da captação. Nesse espectro, surgem propostas em formas de incentivos financeiros ou compensação monetária pelos custos de deslocamento, tempo gasto para realizar exames e idas ao hospital, prêmios em dinheiro, em forma de títulos de mérito ou até mesmo a possibilidade de autorizar a compra e venda de órgãos em um sistema convencional de mercado, regulado pelas leis de oferta e demanda (Matas, 2004MATAS, A. The Case for Living Kidney Sales: Rationale, Objections and Concerns. American Journal of Transplantation, n. 4, p. 2007-2017, 2004.; Taylor, 2005TAYLOR, J. Stakes and Kidneys: Why Markets in Human Body Parts are Morally Imperative. Aldershot: Ashgate, 2005.; Goodwin, 2006GOODWIN, M. Black Markets: The Supply and Demand of Body Parts. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.; Becker; Elias, 2007BECKER, G.; ELIAS J. Introducing Incentives in the Market for Live and Cadaveric Organ Donations. The Journal of Economic Perspectives, v. 21, n. 3, p. 3-24, 2007.). Em geral, os estudos tentam responder às seguintes questões: Quais as condições para o desenvolvimento de um mercado de órgãos e quais as consequências da regulamentação desse mercado? Quais os argumentos favoráveis à regulamentação desse biomercado? O mercado evitaria o tráfico de órgãos?

Os estudos favoráveis à criação de um mercado de órgãos baseiam-se, fundamentalmente, em dois argumentos: mercados são morais porque estão baseados na liberdade individual e porque são mais eficazes. Os estudos sobre eficácia dos mercados têm como um dos principais expoentes Artur Matas (2006)MATAS, A. The Case for Living Kidney Sales: Rationale, Objections and Concerns. American Journal of Transplantation, n. 4, p. 2007-2017, 2004., que fez uma simulação para mostrar os benefícios econômicos do mercado de órgãos com a não necessidade de diálise e com a melhoria da qualidade de vida dos transplantados. Para estimular o comportamento interessado de doadores, o preço de um rim poderia chegar perto de 48 mil dólares.

Priorizando argumentos de ordem moral, Taylor (2005)TAYLOR, J. Stakes and Kidneys: Why Markets in Human Body Parts are Morally Imperative. Aldershot: Ashgate, 2005. ampara sua adesão ao mercado de órgãos a partir da autonomia do indivíduo. Para o autor, a doação está fundada no paternalismo aristocrático e é anacrônica com o desenvolvimento da liberdade e independência modernas, pois se o indivíduo tem liberdade para doar a mesma liberdade lhe deve ser facultada para venda. Para o autor, a sociedade não pode impor ao indivíduo a obrigação, moral, em doar. Como alternativa, a proposição de Taylor é que a venda seria regulada por um “consentimento esclarecido” como forma de evitar que uma condição de depressão ou pressão financeira influencie no desejo de vender. Além disso, os patologistas cumpririam um papel central na medida em que a destinação do órgão comprado obedeceria aos exames clínicos de tipagem sanguínea e compatibilidade, bem como a garantia da saúde do vendedor pós-retirada.

Matas (2004)MATAS, A. The Case for Living Kidney Sales: Rationale, Objections and Concerns. American Journal of Transplantation, n. 4, p. 2007-2017, 2004. também avança para critérios sociais com vistas à demarcação do biomercado. Na sua proposição, a venda seria permitida apenas para pessoas acima dos 18 anos, com limitação de zonas geográficas de pobreza, verificação plena do estado de saúde e perspectiva de saúde pós-retirada. Além disso, apenas rins poderiam ser vendidos, uma vez que fígado e pulmões têm taxas muito altas de morte no pós-operatório. Por fim, o autor sugere que o pagamento não seria feito em dinheiro, mas em compensações, como seguro de saúde, direito de prioridade em caso de necessidade futura por um órgão, assistência mortuária etc.

A partir desses argumentos dos defensores do mercado de órgãos observa-se que descartam o spot market pelos riscos que ele comporta, especialmente por fazer emergir uma lógica de formação de preços em que “vence o que pagar mais”. Suas proposições misturam práticas mercantis com altruísmo e regulação estatal, o que não pode ser configurado com um mercado “ao termo” (Steiner, 2010STEINER, P. La transplantation d’organes: un commerce nouveau entre les êtres humains. Paris: Gallimard, 2010.). No entanto, se não é a capacidade de pagamento que fará movimentar o mercado e, de outro lado, o interesse monetário por parte do vendedor é desencorajado, quem em perfeitas condições de saúde venderia órgãos? A conclusão é de que as soluções de mercado não fundamentam dispositivos capazes para fazer esse mercado funcionar e dependem, em última instância, do altruísmo.

Para avançar na discussão sobre a contestação moral imputada sobre o mercado de órgãos, Steiner (2014)STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2014. defende que o comércio de seres humanos apresenta algumas particularidades: a) diferente da venda da força de trabalho, moralizada no contexto da revolução industrial moderna, esta é uma forma de comércio “por partes” do corpo humano; b) órgãos estão na categoria de “bens raros” e por isso questiona-se se seu mercado poderia ser regido pela lei da oferta e demanda; c) está em jogo uma situação de vida e morte em que a vida de um depende da morte de alguém.

Por essas razões, o debate sobre as consequências do mercado de órgãos precisa considerar seu status de mercadoria contestada, diferenciando-os das demais mercadorias contestadas. Steiner e Trespeuch (2014)STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2014. sugerem que existem três tipos de mercados onde são compradas e vendidas as mercadorias contestadas : efetivos, potenciais e banidos. Os mercados efetivos são aqueles que alargaram as barreiras morais que impediam a livre circulação de mercadorias contestadas, liberando sua conversão em valores monetários e submetendo sua circulação às regras do mercado, tais como a eficácia e livre concorrência através do sistema de oferta e demanda. A liberação do mercado de organismos geneticamente modificados é um exemplo desse tipo de mercado, liberado na maioria dos países. Já os mercados chamados de “potenciais” são aqueles em que o debate moral ergue barreiras que impedem sua liberação. O exemplo da legalização da cannabis sativa ilustra essa modalidade de mercado, liberado em alguns países e proibido em outros. Por fim, os mercados “banidos” são aqueles em que há dispositivos legais chancelados em convenções internacionais que evitam que ele exista, especialmente para proteger populações frágeis das consequências negativas que esses mercados poderiam causar. A venda de órgãos é um exemplo desse mercado banido, uma vez que o comportamento mercantil pode provocar efeitos deletérios sobre as populações frágeis, nesse caso, os pobres.

Considera-se, para a definição de mercados banidos, que a proibição do mercado de órgãos é ratificada por uma convenção internacional, a Declaração de Istambul (ONU, 2008ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Istambul sobre o Tráfico de Órgãos e Turismo de Transplantação. 2008. Disponível em <http://www.declarationofistanbul.org/>. Acesso em: 13 maio 2015.
http://www.declarationofistanbul.org/...
). E as respostas legislativas da comunidade internacional desde os anos de 1970 refletem uma reação social que considera a especificidade do mercado de órgãos acima apresentadas para inibir o tráfico ou mesmo a liberação do mercado de órgãos (Cf. Steiner, 2014STEINER, P.; TRESPEUCH, M. Marchés contestés: quand le marché reencontre la morale. Toulouse: Presses Universitaires du Mirail, 2014.). Essa reação está estruturada em dois pontos: Primeiro, as propostas de legalização se opõem aos preceitos morais que fundamentam as constituições dos países que seguem parâmetros éticos universais como a noção de que o ser humano não pode ser um meio e sempre um fim. Com efeito, as formas de contrato previstas pelos defensores do biomercado supõem a existência de um direito de propriedade que transforma corpos em bens fungíveis, o que é rejeitado tanto pela Common Law quanto pelo direito romano. Em segundo lugar, a dignidade humana é incompatível com a venda de órgãos porque não protege populações frágeis, especialmente os pobres. Para estes, vender os órgãos é uma oferta irresistível, especialmente se estiverem passando por um estresse financeiro (dívidas). Nessas condições, alguém aviltado pela pobreza certamente não deixaria passar uma “rara” chance de sair da miséria. Portanto, é a miséria que permite o mercado de órgãos.

3. MATERIAIS E MÉTODO

Este estudo baseia-se em procedimentos qualitativos de coleta e análise dos dados, e as informações foram coletadas a partir da organização de um corpus1 1 Corpus é “uma coleção finita de materiais, determinada de antemão pelo analista com (inevitável) arbitrariedade, e com a qual ele irá trabalhar, o que acentua a natureza proposital da seleção, e não apenas de textos, mas também de qualquer material com funções simbólicas” (Bauer; Gaskell, 2002, p. 44-45). . Para análise dos dados foi utilizada a análise documental (Vergara, 2011VERGARA, S. C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2011., p. 47) das informações disponíveis sobre doação no Brasil, especialmente acerca da legislação e sobre o SNT. Justifica-se o uso dessas técnicas pela sua flexibilidade em permitir uma análise mais interpretativa da relevância das expressões no contexto da sua produção. Em termos práticos, foram examinadas a gênese e a evolução do SNT para um continuum organizacional, bem como os dispositivos legais para redução da contestação moral e criação de uma “atmosfera” propícia para doação.

As fontes foram divididas em grupos: 1) dados secundários sobre transplantes realizados, incluindo valores pagos, quantidade de procedimentos etc., disponibilizados pelo sistema informatizado de dados do Sistema Único de Saúde (SUS), o DATASUS; 2) informações e campanhas dirigidas à população em geral, disponibilizadas pelo Ministério da Saúde (MS); 3) leis, portarias, medidas provisórias e manuais técnicos; 4) produção de organizações sociais e de cientistas que reúnem argumentos e análises sobre a transplantação no Brasil.

A sistematização dos dados seguiu a análise de quatro categorias: debate em torno do consentimento presumido; estabelecimento de uma estrutura hierárquica e das regras de funcionamento do SNT; criação de uma economia de incitação através do reajuste dos valores pagos aos hospitais e; adequações logísticas para captação, distribuição e alocação dos órgãos.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. Dispositivos legais e organizacionais do comércio de órgãos e tecidos

Do ponto de vista legal, o modelo brasileiro de transplantes está organizado em torno de dois pilares: 1) a regulamentação das questões morais que envolvem a transplantação de órgãos, especialmente em torno do conceito de morte encefálica, gratuidade da doação, criminalização das práticas de tráfico e debate em torno do consentimento presumido e; 2) organização do SNT, especialmente sua estrutura de gestão, as taxas de remuneração dos procedimentos e os esforços para melhoria da produção/captação na logística de distribuição e na alocação/transplantação dos órgãos.

O marco legal recente da transplantação de órgãos no Brasil é a Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, chamada de Lei dos Transplantes. Em termos gerais, essa lei criou um novo modelo, mais centralizado, de organização e gestão do sistema, criminalizou as práticas de compra e venda de órgãos e regulamentou o consentimento presumido. Do ponto de vista normativo, a lei procurou criar uma articulação entre as questões públicas (necessidade de órgãos) com a liberdade individual. No entanto, sua publicação causou grande polêmica por duas razões: primeiro porque obrigava os indivíduos que não desejassem ser doadores a manifestar sua vontade na Carteira de Identidade (CI) ou Carteira Nacional de Habilitação (CNH). O resultado dessa decisão foi catastrófico: em um ano, 88% das carteiras emitidas eram de “não doadores”.

Em segundo lugar, a Lei nº 9.343 causou polêmica por ter adotado o consentimento presumido sem necessidade de consulta aos familiares. O artigo 4º dessa lei afirmava que "salvo manifestação de vontade em contrário, nos termos desta lei, presume-se autorizada a doação de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano, para finalidade de transplantes ou terapêutica post mortem." Com a reação social negativa, a lei foi alterada por uma Medida Provisória, a 1.718/98, passando a exigir a autorização expressa dos familiares para autorização da doação. Essa revisão foi confirmada com a aprovação da Lei nº 10.211 de 2001, que atualmente regula a transplantação no Brasil. De acordo com a nova lei, a retirada de órgãos dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau, inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte.”

Segundo Maynard et al. (2016)MAYNARD, L. O. D. et al. Os conflitos do consentimento acerca da doação de órgãos post mortem no Brasil.Revista de Direito Sanitário,16(3), p. 122-144, 2016., o modelo de consentimento explícito (ou informado) adotado no Brasil apresenta taxas entre 25% e 30% mais baixas de doação em relação aos países que adotaram o consentimento presumido. Além disso, mesmo com a vontade expressa do doador, a família tem o direito de recusar, dado que juridicamente o corpo do defunto, após ser devolvido à família, passa a ser propriedade desta. Portanto, a Lei nº 10.211 não protege a vontade do doador, criando um dilema entre dois princípios jurídicos: a centralidade da decisão familiar versus a autonomia da vontade.

Discussões doutrinárias, como a de Pereira (2014)PEREIRA, W. A. (Org.). Diretrizes Básicas para Captação e Retirada de Múltiplos Órgãos e Tecidos da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. São Paulo: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) -, 2009., sugerem a aplicação do Art. 14 do código civil de 2002, cujo argumento-base é o da inviolabilidade da vontade individual.

Com a nova lei, o direito de doar voltou a recair sobre a família do potencial doador, evidenciando um monopólio da decisão familiar (Maynard et al., 2013MAYNARD, L. O. D. et al. Os conflitos do consentimento acerca da doação de órgãos post mortem no Brasil.Revista de Direito Sanitário,16(3), p. 122-144, 2016.). O resultado dessa reforma legal contribuiu para o aumento da recusa familiar que atualmente no Brasil é de 44% dos casos aptos para doação (ABTO, 2016ABTO. Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada Estado: 2008-2015. Disponível em: <http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2015/anual-n-associado.pdf>. Acesso em 01 mar 2017.
http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/fi...
). Constata-se que embora essa lei tenha a pretensão de preservar a esfera familiar para doação, há diversas questões de ordem cultural que incidem na recusa, mesmo nos casos em que o paciente tenha declarado em vida seu interesse em doar.

Diversos estudos vêm demonstrando que os principais motivos de recusa familiar no Brasil relacionados estão relacionados à não compreensão do diagnóstico de morte encefálica, religiosidade, luto e percepção do corpo, desconhecimento da vontade do potencial do doador por parte da família, tempo longo do processo de retirada dos órgãos (Pessoa; Schirmer; Roza, 2013PESSOA, J. L. E.; SCHIRMER, J.; ROZA, B. D. A. Avaliação das causas de recusa familiar a doação de órgãos e tecidos.Acta Paulista de Enfermagem, 2013.; Roza et al., 2010; Rech; Rodrigues, 2007RECH, T. H.; RODRIGUES FILHO, E. M. Entrevista familiar e consentimento. Rev. Bras. Ter. Intensiva,19(1), p. 85-89, 2007.; Rosário et al., 2013ROSARIO, E. N. do et al. Recusa familiar diante de um potencial doador de órgãos. Cad. Saúde Colet., Rio de Janeiro, v. 21, n. 3, p. 260-266, 2013.; Bendassolli, 2001BENDASSOLLI, P. F. Percepção do corpo, medo da morte, religião e doação de órgãos.Psicologia: reflexão e crítica,14(1), p. 225-240, 2001.; Bittencourt; Quintana; Velho, 2011BITTENCOURT, A. L. P.; QUINTANA, A. M.; VELHO, M. T. A. C. A perda do filho: luto e doação de órgãos.Estud. Psicol. Campinas, p. 435-442, 2011.; Moraes; Massarollo, 2009MORAES, E. L.; MASSAROLLO, M. C. K. B. Recusa de doação de órgãos e tecidos para transplante relatados por familiares de potenciais doadores. Acta Paulista de Enfermagem[on-line], v. 22, n. 2, p. 131-135, 2009.). Outros estudos apontam que a desinformação sobre o processo de doação é a principal causa da recusa (Galvão et al., 2007BECKER, G.; ELIAS J. Introducing Incentives in the Market for Live and Cadaveric Organ Donations. The Journal of Economic Perspectives, v. 21, n. 3, p. 3-24, 2007.; Duarte et al., 2002DUARTE, P. S. et al. Brazilian’s Attitudes Toward Organ Donation and Transplantation. Transplantation Proceedings, v. 34, n. 2, p. 458-459, 2002.), ou mesmo sugerem a qualificação contínua da equipe médica responsável pela abordagem da família do potencial do doador (Bousso, 2008BOUSSO, R. S. O processo de decisão familiar na doação de órgãos do filho: uma teoria substantiva.Texto Contexto Enferm,17(1), p. 45-54, 2008.; Lira et al., 2012LIRA, G. G. et al. Ponderações de familiares sobre a decisão de recusar a doação de órgãos.Acta Paulista de Enfermagem,25(2), p. 140-145, 2012.; Ojo et al., 2004OJO, A. O. et al. Organ Donation and Utilization in the USA.American Journal of Transplantation, 4(s9), p. 27-37, 2004.; Dalbem; Caregnatto, 2010DALBEM, G. G.; CAREGNATO, R. C. A. Doação de órgãos e tecidos para transplante: recusa das famílias.Texto Contexto Enfermagem, v. 19, n. 4, p. 728, 2010.; Arcanjo; Oliveira; Silva, 2013ARCANJO, R. A.; OLIVEIRA, L. D.; SILVA, D. Reflexões sobre a Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes. Rev. Bioética,21(1), 119-25, 2013.).

A cronologia das leis brasileiras oferece elementos importantes para a compreensão do problema deste estudo. Enquanto leis anteriores à 9.934/97, como a 8.489/92, tratavam a doação como um ato voluntário, isto é, os órgãos post mortem só poderiam ser retirados nos casos em que os indivíduos tivessem manifestado em vida o desejo de doar, a Lei nº 9.434 introduziu o consentimento presumido, transferindo à sociedade a decisão sobre a retirada de órgãos post mortem. Por fim, a Lei nº 20.211/01, embora considere a ideia de consentimento informado, deixando dúvidas sobre a quem recai a decisão final pela doação. O Quadro I, a seguir, resume o desenvolvimento dos dispositivos jurídicos do modelo brasileiro de transplantação de órgãos.

Quadro 1
Comparativo das leis brasileiras

Este quadro apresenta elementos importantes para entender não só a evolução, mas também o debate social subjacente à criação dos dispositivos legais e organizacionais. Em relação ao consentimento presumido, percebe-se que as formulações seguem os princípios da Constituição Federal (CF) de 1988 no que tange aos seus significativos avanços na questão da liberdade individual. Nota-se que as leis sobre transplantes pós-CF reconhecem as manifestações em vida, mesmo que ratificada pela anuência expressa da família. As leis anteriores não previam a manifestação em vida dos potenciais doadores. A ideia de liberdades individuais pode ser entendida no contexto da doação organizacional na medida em que as organizações se apresentam como condição de possibilidade para a efetivação da doação.

Outro aspecto importante da evolução da legislação brasileira é a referência à criminalização das práticas de venda de órgãos, na inserção textual do caráter gratuito da doação post mortem e intervivos e da regulação da morte encefálica. Embora essa questão já esteja na Lei nº 5.479/68, as penas previstas eram relativamente brandas e não previam, por exemplo, sanções administrativas. Nesse sentido, o contexto da Lei nº 9.434/97 já é uma reação frente às denúncias de tráfico de órgãos e, ao prever reclusão entre 8 e 20 anos, multas e perda do direito de exercer a profissão aos profissionais envolvidos, a lei claramente indica a necessidade de conter não só a venda, mas responsabilizar criminalmente todos os que forem coniventes ou tiverem participação na prática. No mesmo sentido, a gratuidade da doação post mortem, que já estava prevista na lei de 1968, é referendada pelas seguintes, enquanto a gratuidade da doação intervivos é mencionada apenas na lei de 1992. Outro tema sensivelmente controverso, a regulação da morte encefálica, somente reconheceu os critérios médicos para o seu diagnóstico na legislação de 1997. Até então, as leis não mencionavam critérios, tampouco os métodos para o seu diagnóstico.

Nesse cenário, a evolução dos dispositivos legais mostra que as leis estruturam um continuum organizacional, expresso não somente pela criação do SNT, mas pelo conjunto de portarias, normas técnicas e medidas provisórias propostas para dinamizar e corrigir imperfeições do sistema. Destacam-se a construção da ideia da coordenação do Sistema pelo MS e a criação de um fluxograma de gestão e de mecanismos de controle sobre os transplantes realizados.

4.1.1. A doação e o estabelecimento de um continuum organizacional

O SNT foi criado pela Lei nº 9.934 e regulamentado pelo Decreto nº 2.268, de 30 de junho de 1997. Esse decreto detalhou a organização e o funcionamento do sistema e das Centrais Estaduais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDOs). Entretanto, a regulamentação técnica do SNT só ocorreu com a Portaria nº 2.600 de 21 de outubro de 2009 do MS, regrando, entre outros aspectos, a doação intervivos, a criação das Comissões Intra-Hospitalares de Captação de Doadores de Órgãos e Tecidos (CIHDOTTs) e as Organizações de Procura de Órgãos (OPOs).

Em termos operacionais, o SNT funciona por meio de uma Central Nacional de Notificação Captação e Doação de Órgãos (CNNCDO), que comanda as Centrais de Notificação, Captação e Doação de Órgãos (CNCDO), espalhadas em 24 Estados e no Distrito Federal. Nos mais de 5 mil municípios brasileiros há 555 estabelecimentos credenciados como aptos a realizar transplantes, envolvendo mais de 1.376 equipes médicas. Além disso, o Sistema registra o funcionamento de 626 Coordenações Intra-Hospitalares de Doações de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTTS) e 43 Organizações de Procura de Órgãos (OPO), que são compostas por profissionais que atuam nos hospitais à procura de órgãos (Ministério da Saúde, 2014).

Figura 1
Organização do Sistema Nacional de Transplantes

A criação de dispositivos organizacionais tem sua base na noção de continuum organizacional, isto é, a formalização de um conjunto de características que estruturam uma organização com o objetivo de viabilizar a transplantação. Para Steiner (2010)STEINER, P. La transplantation d’organes: un commerce nouveau entre les êtres humains. Paris: Gallimard, 2010. são três as características desse continuum: 1) a organização funciona como um sistema e mantém gestão centralizada e hierarquizada para assegurar a confiabilidade e a circulação de informações em todos os níveis; 2) as organizações pertencentes ao Sistema atuam permanentemente sob o regime de urgência, dado o tempo limitado para aproveitamento dos órgãos e; 3) as organizações estão ligadas entre si para assegurar a continuidade logística entre doadores e receptores desconhecidos entre si.

Em relação ao primeiro aspecto, do ponto de vista funcional, o SNT coordena a atuação dos três níveis federativos (Federação, Estados e Municípios). No nível nacional, o MS comanda uma Central Nacional de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos. Já no segundo nível, o administrativo, cada Secretaria Estadual de Saúde mantém e coordena uma Central Estadual de Notificação Captação e Distribuição de Órgãos. São essas Centrais que intermediam a relação entre os municípios, responsáveis pelo controle sobre as instituições hospitalares credenciadas ao SNT e que mantêm a chamada Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT).

Em termos práticos, o MS atua como coordenador do SNT e acumula, entre outras funções, o direito de registrar ou interditar equipes e hospitais para realização de transplantes, autoriza as cirurgias, realiza os pagamentos, coordena a lista de espera e mantém o registro das informações sobre os pacientes, enviadas anualmente pelos hospitais credenciados. São essas atribuições que fazem o MS desempenhar um papel de centralidade e de articulação, ao mesmo tempo que atua no plano simbólico em favor da integridade e confiabilidade do Sistema. Com isso, o Ministério espera estimular socialmente a prática altruísta da doação, fundamentando-a na justiça e na solidariedade.

Em relação à organização logística do Sistema, o ponto de partida para entender esse aspecto é que, no Brasil, todo transporte de órgãos e tecidos está subordinado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Essa prerrogativa, concedida pela resolução RDC/ANVISA n° 101, de 6 de junho de 2006, define, no seu artigo 1º, que “o ambiente físico, os recursos materiais, as condições de trabalho e as atividades e procedimentos relacionados diretamente ao ciclo do transplante de células, tecidos e órgãos, exercidos pelas Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos, estão sujeitos ao regime de vigilância sanitária”.

Na sequência, dois dispositivos legais procuram assegurar a “produção” e distribuição de órgãos e tecidos: A primeira, a Resolução RDC nº 06/2009, possui caráter técnico e foi emitida pela ANVISA para estabelecer as condições sanitárias para o transporte no território nacional de órgãos humanos. Essa resolução apresenta três características básicas: estabelece os aspectos técnicos de acondicionamento, rotulagem e informações para transporte; designa ao Sistema Nacional de Transplantes (SNT) e suas organizações como legítimos para envio e recebimento dos órgãos e; detalha as qualificações das equipes técnicas que podem manusear os órgãos, em atenção às regras de biossegurança.

O segundo dispositivo dá suporte à “produção” de órgãos foi a Portaria n° 2.933, de 27 de setembro de 2010, do MS, que criou o Programa Nacional de Qualificação para a Doação de Órgãos e de Tecidos para Transplantes (QUALIDOTT). A função desse programa é oferecer formação aos profissionais envolvidos com os diagnósticos de morte encefálica, especialmente, os médicos, enfermeiros, biomédicos, psicólogos e assistentes sociais, com o objetivo de “aumentar a doação de órgãos, tecidos e células (...) com o consequente aumento do número de transplantes realizados”. A responsabilidade de implantar o programa é delegada à Coordenação-Geral do Sistema Nacional de Transplantes, do Departamento de Atenção Especializada, da Secretaria de Atenção à Saúde/MS.

O terceiro aspecto crucial do continuum organizacional é o regime de urgência sob o qual o SNT está submetido. O prazo de validade dos órgãos humanos, após a retirada, é bastante curto e isso é um elemento crucial para a organização do sistema de transplantes. Coração, pulmões, rins, fígado pâncreas precisam ser retirados antes da parada cardíaca e transplantados em poucas horas. Por exemplo, o tempo de isquemia fria suportado por um coração é de apenas 4 horas, dos pulmões é de 11, do pâncreas de 12, do fígado 18 e dos rins é de 24 horas. Além disso, em razão das questões éticas envolvidas, quatro equipes hospitalares precisam atuar de forma coordenada com as centrais estaduais para garantia do êxito de um transplante. Após a constatação da morte encefálica, as equipes de cuidados intensivos informam a Central no seu Estado, que designa uma equipe para fazer o diagnóstico e a abordagem da família. A confirmação da morte é feita em duas sessões com intervalos de 12 horas (exame clínico por meio de arteriografia/angiografia e exame feito com injeção de contraste nas artérias) e com a participação de um médico externo, de confiança da família. Após essa etapa, uma terceira equipe faz a retirada dos órgãos e encaminha para distribuição. Por fim, entram em cena os cirurgiões e clínicos transplantadores, que não participam do diagnóstico e da abordagem das famílias.

Cabe considerar que no Brasil a distribuição dos órgãos é regionalizada por estados, cabendo às Centrais Estaduais (CNCDOS) realizarem os testes de tipagem sanguínea e de compatibilidade anatômica e imunológica. Mesmo que a regionalização favoreça a logística, em razão das grandes distâncias no território, os transplantadores correm contra o tempo para aproveitamento desse bem escasso. Recentemente, também foram firmados acordos entre o MS e as principais companhias aéreas nacionais prevendo prioridade em pousos e decolagens para aeronaves que estiverem transportando órgãos.

Entretanto, um balanço crítico da organização do SNT pode ser feito em três direções. Ressalta-se, primeiramente, que a estrutura do Sistema é bastante verticalizada e expõe as dificuldades de logística em um país com dimensões continentais e infraestrutura ainda precária para evitar a perda de órgãos. Essa perda, ocasionada por dificuldades de logística e má armazenagem, é seguramente um dos principais fatores que explicam o decréscimo de doações efetivadas na maioria dos estados brasileiros (ABTO, 2016ABTO. Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada Estado: 2008-2015. Disponível em: <http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2015/anual-n-associado.pdf>. Acesso em 01 mar 2017.
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; Ratz, 2006RATZ, W. Indicadores de desempenho da logística do Sistema Nacional de Transplantes: um estudo de caso. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de São Carlos, São Paulo, 2006.). Uma alternativa possível poderia ser a adoção de um modelo descentralizado para operar de acordo com as especificidades regionais. O modelo espanhol, reconhecido pela sua eficácia, conta com uma estrutura descentralizada, baseada nas comissões intra-hospitalares, em que o órgão é transplantando, preferencialmente, no mesmo hospital em que é coletado (Navidad; Domingo; Viedma, 1997NAVIDAD, A. L; DOMINGO, P; VIEDMA, M. A. Professional Characteristics of the Transplant Coordinator. Transplantation Proceedings, v. 29, Issue 1, p. 1607-1613, p. 1997.; Rocha, 1998ROCHA, E. O modelo espanhol de transplantes: uma ideia a ser copiada pelos brasileiros? Medicina Online - Revista Virtual de Medicina, v. 1, n. 2, 1998.).

Na direção de um sistema mais descentralizado, o segundo aspecto crítico parece ser o pouco investimento do Sistema no fortalecimento de Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos (CIHDOTTs), obrigatórias para hospitais com mais de 80 leitos desde a Portaria nº 1.752 do MS, publicada em 23 de setembro de 2005. Embora existam programas como o QUALIDOT, a revisão documental deste estudo encontrou poucos esforços para o fortalecimento dessas comissões, tampouco justificativas plausíveis para não estimular a criação das comissões em hospitais com menos de 80 leitos, que é a capacidade instalada da maioria dos hospitais brasileiros.

Outro aspecto a salientar é que os dispositivos legais existentes parecem distanciar-se da realidade das famílias dos potenciais doadores. De fato, parece haver lacunas de informação para explicar a alta taxa de recusa familiar. Nesse sentido, as políticas de qualificação para abordagem das famílias, bem como as campanhas informativas para incentivo à doação parecem surtir efeito muito aquém do esperado, dado que não dialogam com as crenças e tabus culturais que envolvem a questão.

4.1.2. A criação de uma economia de incitação

Uma vez constituído o continuum organizacional, é importante considerar os dispositivos econômicos que atravessam o Sistema. Nesse ponto merece destaque a tentativa de dinamizar a transplantação com a criação de uma economia de incitação. Para isso, o Estado promove o reajuste periódico do valor pago à transplantação, objetivando que os hospitais invistam na ampliação do número de procedimentos. A estratégia do MS foi de reajustar a tabela de pagamentos dos custos diretos e indiretos da transplantação como forma de incentivo, buscando criar um “comportamento interessado” nas equipes médicas e nos hospitais credenciados ao Sistema. Dessa forma, a taxa ativa o continuum em um sistema híbrido de comércio que mantém a doação no plano individual, mas prevê a circulação de expressivas somas em dinheiro no plano organizacional.

Em termos práticos, são as tarifas que permitem a coordenação das organizações submissas e em contrato de financiamento. O MS reajustou, por meio da Portaria nº 845, de 2 de maio de 2012, o custeio dos procedimentos de transplantação e estabeleceu critérios para tentar incentivar o aumento da transplantação. Para isso, definiu um reajuste de 60% para hospitais que realizam até quatro transplantes, 50% para hospitais que realizam três modalidades de transplantes, e 40% e 30% para hospitais que realizam dois ou um procedimento, respectivamente. O valor pago aos hospitais por um rim de pessoa viva, transplantado passou para R$ 21.238,82 e R$ 27.622,67 para um rim de pessoa falecida. Para um pulmão unilateral, R$ 44.485,10; pâncreas R$ 68.803,27; fígado de pessoa viva, R$ 68.803,27; fígado de pessoa falecida, R$ 68.838,89 e de R$ 37.052,69 para um coração. Além disso, são pagas taxas de coleta e exames, avaliação de morte encefálica, ações relacionadas à doação, processamento de tecidos e acompanhamento e intercorrências no pré- e pós-transplantes (Ministério da Saúde, 2016MINISTÉRIO DA SAÚDE (BR). Portaria nº 1.752, de 23 de setembro de 2005. Determina a constituição de Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante em todos os hospitais públicos, privados e filantrópicos com mais de 80 leitos [on-line]. Brasília, 2005. Disponível em: <http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2005/GM/GM-1752.htm>. Acesso em 20 fev. 2017.
http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIA...
).

A Portaria nº 845 também reajustou os valores pagos aos profissionais envolvidos na transplantação: R$ 6.224,57 para transplante de coração (16,79% do total pago ao hospital), 7.182,33 para o transplante de fígado (10,43%), R$ 8.259,56 para rim de pessoa falecida (30%) e 6.373,77 para rim de doador vivo (29,04%). Para avaliação de morte encefálica de maior de 2 anos de idade o avaliador recebe R$140,00, e R$ 150,00 para doador com menos de dois anos (Ministério da Saúde, 2016MINISTÉRIO DA SAÚDE (BR). Portaria nº 1.752, de 23 de setembro de 2005. Determina a constituição de Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante em todos os hospitais públicos, privados e filantrópicos com mais de 80 leitos [on-line]. Brasília, 2005. Disponível em: <http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2005/GM/GM-1752.htm>. Acesso em 20 fev. 2017.
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).

Em relação aos demais profissionais envolvidos, considera-se que a remuneração dos membros efetivos das CIHDOTTs é regrada pela já citada Portaria nº 2.600, de 2009. Segundo a portaria, cada comissão deverá ter pelo menos três integrantes, sendo obrigatório o pagamento de 20 horas semanais (08 horas/mês) ao coordenador, que deverá ser, necessariamente, um médico. Aos demais integrantes é facultado o pagamento por integrarem a comissão. Estudos como o de Silva et al. (2025) sugerem a viabilidade custo-efetivo do pagamento de um médico e de um profissional de enfermagem nessas comissões. Com base nas informações do faturamento dos procedimentos de doação de órgãos pela Tabela SUS do Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS (SIGTAP), os autores avaliaram a viabilidade da proposta com expectativa de retorno de investimento em 275% no curto prazo.

A série histórica mostra que os gastos públicos com transplantes vêm aumentando de forma significativa nos últimos anos. Em 2008, o MS transferiu R$ 453 milhões aos hospitais, e esse valor chegou a 869 milhões em 2014, representando uma variação de 77% no período. Para as cirurgias de pulmão o reajuste foi de 69% no período, seguido dos reajustes com transplantação de coração (58%) e fígado (41%) (Ministério da Saúde, 2016MINISTÉRIO DA SAÚDE (BR). Portaria nº 1.752, de 23 de setembro de 2005. Determina a constituição de Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante em todos os hospitais públicos, privados e filantrópicos com mais de 80 leitos [on-line]. Brasília, 2005. Disponível em: <http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2005/GM/GM-1752.htm>. Acesso em 20 fev. 2017.
http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIA...
).

Entretanto, um balanço crítico após quatro anos da Medida Provisória nº 1.718/98 permite questionar se a estratégia de premiação de hospitais que investem na realização de mais tipos de transplantes, bem como os reajustes dos valores pagos aos hospitais e às equipes profissionais envolvidas com a transplantação, surtiu o efeito desejado. Os números mostram que o crescimento de doadores se mostrou tímido e abaixo do esperado. Em 2012 o país contava com 12,6 doadores efetivos por milhão de habitantes, enquanto em 2016, esse número ficou em 14,6, isto é, crescimento de menos de um ponto percentual por ano, ou seja, em 2016, o número de doadores ficou 0,5% abaixo da meta prevista e cada vez mais distante da meta de 24 doadores efetivos por milhão, prevista para 2021. Ainda, segundo o relatório anual da ABTO, o ano de 2016 foi um “ano de dificuldades”, especialmente em razão da crise econômica, com a diminuição do número de transplantes, o que fez aumentar ainda mais a lista de espera, atualmente com mais de 42.523 mil pacientes (ABTO, 2016ABTO. Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada Estado: 2008-2015. Disponível em: <http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2015/anual-n-associado.pdf>. Acesso em 01 mar 2017.
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).

5. Considerações Finais: A resposta do Sistema à contestação da doação

A análise do caso brasileiro ajuda a evidenciar que leis são reações sociais que criam um continuum, alicerçado na institucionalização da articulação de um conjunto de organizações com o objetivo de afastar a contestação moral sobre a doação. Esses dispositivos articulam os três estágios básicos da transplantação: na produção, definem o direito de intervir e sob quais condições éticas os órgãos podem ser retirados; na circulação, autorizam a criação de circuitos de informação sobre pacientes e potenciais doadores e; na alocação, estabelecem as regras de escolha dos pacientes em conformidade com a justiça e equidade social. Em sentido mais amplo, os dispositivos estabelecem fronteiras no mundo médico e na população em geral. No mundo médico, definem quem pode intervir e quem não tem autorização para realizar transplantes, além de designar quais as instituições que podem participar dos circuitos. Na população, os dispositivos definem quem pode doar e sob quais condições.

Nesse contexto, as taxas desempenham um papel central na ativação do continuum a partir de uma lógica relativamente simples: o pagamento é feito pelo Estado, que por sua vez recolhe tributos para garantir esses repasses, fechando o ciclo da solidariedade social. É por essa razão que a produção de órgãos assume uma dimensão política através da atuação do Estado em três frentes para ampliação da “produção” desses bens: a) incentivos financeiros, isto é, pagamento de serviços por meio de tarifas, aos hospitais; b) qualificação da abordagem feita pelas equipes intra-hospitalares às famílias para diminuição da recusa em doar e; c) organização de campanhas para informar e diminuir o efeito das crenças na recusa da doação.

Essas conclusões teóricas ajudam a demonstrar que os objetivos do estudo foram alcançados, uma vez que se buscou dar importância à descrição da organização e ao funcionamento do modelo brasileiro. Por outro lado, um balanço crítico do SNT foi proposto, apresentando três sugestões: A primeira é a revisão legal do modelo de consentimento informado na direção do consentimento presumido, uma vez que países que adotam esse modelo têm acrescimento em pelo menos 25% no número de doadores. Nesses termos, caberia à comunidade científica e aos governos o papel de promover um amplo debate sobre a potencial contribuição dessa mudança legislativa. Considera-se toda polêmica gerada com a publicação da Lei dos Transplantes no final dos anos de 1990, mas passados vinte anos, o tema poderia ser recolocado para apreciação social.

Uma segunda sugestão é a revisão da estratégia de incentivo econômico, por meio de uma readequação dos valores pagos a hospitais e equipes médicas. Considera-se, evidentemente, que a tecnologia envolvida eleva os custos e que os recursos públicos são escassos. Entretanto, estudos poderiam aprofundar e sugerir correções pontuais para corrigir distorções, sem que o volume total de gastos para transplantação seja afetado de forma a comprometer outras prioridades governamentais. Estudos futuros poderiam, também, avaliar a criação de um sistema de compensações aos doadores vivos e às famílias dos doadores falecidos. Essas compensações, diferentemente de pagamentos ou indenizações em dinheiro, poderiam considerar abatimento de impostos, prioridade no acesso a serviços públicos ou participação em programas governamentais diversos.

Uma terceira conclusão é a revisão da estrutura organizativa do modelo, atualmente bastante centralizada e verticalizada. A sugestão do estudo é que o núcleo dinamizador do modelo passe a ser as comissões intra-hospitalar, responsáveis pela procura, identificação e abordagem aos familiares. Na mesma direção, a logística do SNT também precisa ser revista, dado que os esforços recentes não têm surtido efeito para mitigar a perda da qualidade dos órgãos coletados. De fato, as dificuldades de infraestrutura e de condicionamento dos órgãos para transporte oferecem risco de perda excessivamente alto diante da escassez do bem. Sugere-se realizar mais estudos para rever os critérios atuais de distribuição e permitir, por exemplo, que o órgão seja transplantado na região ou hospital onde foi coletado.

Entre as limitações deste estudo, e que podem alimentar discussões futuras está um aprofundamento sobre a confiança percebida pela população no SNT e seu efeito na predisposição em doar. De fato, esse tema não foi desenvolvido nesta discussão, mas considera-se que a doação organizacional precisa ser avaliada sob o prisma da confiabilidade das suas ações a partir da percepção da população em geral. Estudos quantitativos poderiam trazer dados interessantes para discutir esse tema.

  • 1
    Corpus é “uma coleção finita de materiais, determinada de antemão pelo analista com (inevitável) arbitrariedade, e com a qual ele irá trabalhar, o que acentua a natureza proposital da seleção, e não apenas de textos, mas também de qualquer material com funções simbólicas” (Bauer; Gaskell, 2002BAUER, M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002., p. 44-45).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    12 Jul 2016
  • Aceito
    10 Abr 2017
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