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Cenários de educação para o manejo de pacientes com insuficiência cardíaca

Resumos

A insuficiência cardíaca congestiva (ICC) apresenta, além da magnitude dos dados epidemiológicos, características relevantes, incluindo hospitalizações freqüentes devidas à exacerbação dos sinais e sintomas, que devem ser mais amplamente abordados para reduzir o impacto negativo da doença sobre o sistema público de saúde. Com o advento dos vários ensaios clínicos na área de ICC, o tratamento da doença passou a ser mais complexo, necessitando de uma estrutura organizada para o atendimento de pacientes por ela acometidos. A educação, nesse contexto, é considerada essencial para reduzir a morbimortalidade. O cenário, para o início ou a continuidade do processo educativo, pode ser hospitalar (internação), ambulatorial, domiciliar, hospital-dia ou, ainda, ser uma combinação desses ambientes. Os principais pesquisadores nessa área reconhecem e estimulam a investigação de outros caminhos, que melhorem os resultados no tratamento farmacológico e não-farmacológico. Neste artigo, revisaremos dados contemporâneos, abordando os diversos cenários da educação para o manejo de pacientes com ICC.

insuficiência cardíaca congestiva; enfermagem; educação; autocuidado


Congestive heart failure (CHF) presents, besides the magnitude of epidemiological data, relevant characteristics, including frequent hospitalizations caused by severe signs and symptoms, which should be studied to reduce the negative impact of the disease on the public health system. With the advent of several clinical trials in the area of CHF, the treatment has become more complex, with the need of a more organized structure to assist these patients. Education is considered essential to reduce morbidity and mortality. The setting, to begin or to continue the educational process, can be a hospital (hospitalization), outpatient clinic, home, a day-hospital or yet, a combination of these. The main researches in this area recognize and motivate an investigation of other paths to get better results in the pharmacological and non-pharmacological treatments. In this study we review recent data, approaching several educational settings in the management of patients with CHF.

heart failure, congestive; nursing; education, self care


La insuficiencia cardiaca congestiva (ICC) además de la magnitud epidemiológica, presenta características relevantes, entre las que se incluyen hospitalizaciones frecuentes debidas a la exacerbación de signos y síntomas, los cuales deben ser ampliamente abordados para reducir el impacto negativo de la enfermedad en el sistema público de salud. Con la aparición de nuevos ensayos clínicos en el área de ICC, el tratamiento pasó a ser más complejo, surgiendo la necesidad de una estructura más organizada para la atención de los pacientes afectados. En este contexto, la educación es considerada esencial para reducir la morbimortalidad, siendo el escenario ideal para dar continuidad en el proceso educativo, el ambiente hospitalario (internación), el ambiente de ambulatorio, el domiciliar, en la rutina diaria del hospital, o en la combinación de éstos. Investigadores del área reconocen y estimulan a la investigación, de tal modo que sea posible mejorar los resultados en el tratamiento farmacológico y no-farmacológico. En este artículo revisaremos información contemporánea, abordando los diversos escenarios de educación para el manejo del pacientes con ICC.

insuficiencia cardiaca congestiva; enfermería; educación; autocuidado


ARTIGO DE REVISÃO

Cenários de educação para o manejo de pacientes com insuficiência cardíaca

Graziella Badin AlitiI; Eneida Rejane RabeloII; Fernanda Bandeira DominguesIII ; Nadine ClausellIV

ICardiologista, Mestre em Ciências Cardiovasculares

IIDoutor em Ciências Biológicas, Coordenador de Enfermagem, Professor Adjunto da Escola da Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

IIIEnfermeira, Mestranda em Ciências Cardiovasculares

IVCardiologista, Doutor em Cardiologia, Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador, e-mail: clausell@portoweb.com.br. Clínica de Insuficiência Cardíaca do Hospital de Clínicas de Porto Alegre

RESUMO

A insuficiência cardíaca congestiva (ICC) apresenta, além da magnitude dos dados epidemiológicos, características relevantes, incluindo hospitalizações freqüentes devidas à exacerbação dos sinais e sintomas, que devem ser mais amplamente abordados para reduzir o impacto negativo da doença sobre o sistema público de saúde. Com o advento dos vários ensaios clínicos na área de ICC, o tratamento da doença passou a ser mais complexo, necessitando de uma estrutura organizada para o atendimento de pacientes por ela acometidos. A educação, nesse contexto, é considerada essencial para reduzir a morbimortalidade. O cenário, para o início ou a continuidade do processo educativo, pode ser hospitalar (internação), ambulatorial, domiciliar, hospital-dia ou, ainda, ser uma combinação desses ambientes. Os principais pesquisadores nessa área reconhecem e estimulam a investigação de outros caminhos, que melhorem os resultados no tratamento farmacológico e não-farmacológico. Neste artigo, revisaremos dados contemporâneos, abordando os diversos cenários da educação para o manejo de pacientes com ICC.

Descritores: insuficiência cardíaca congestiva; enfermagem; educação; autocuidado

INTRODUÇÃO

A insuficiência cardíaca (ICC) é uma síndrome clínica crônica e progressiva que impõe importante limitação funcional, comprometendo a qualidade de vida, acometendo freqüentemente pacientes portadores de outras enfermidades (1). A ICC é considerada problema de saúde pública no mundo inteiro. Nas últimas três décadas, tanto a incidência quanto a prevalência da ICC têm aumentado. Com a elevação da expectativa de vida, projeções indicam que, em 2025, o Brasil terá a sexta maior população de idosos e que a ICC será a primeira causa de morte por doença cardiovascular no mundo(2).

Hospitalizações freqüentes causadas pela exacerbação dos sinais e sintomas da ICC constituem um desafio para o manejo dos pacientes. Dados na literatura demonstram índices elevados de readmissões nos primeiros seis meses após a alta hospitalar, sendo considerados os primeiros 30-90 dias como os períodos mais críticos, com taxas de readmissões variando de 29 a 47%, acarretando custos elevados para o sistema de saúde(1). Dentro desse panorama, inúmeros estudos têm procurado investigar as causas e os fatores precipitantes envolvidos nesse cenário que parece ser semelhante em vários países(3).

Em um estudo prospectivo com 101 pacientes, a má adesão ao tratamento farmacológico e não-farmacológico foi identificada como sendo um dos fatores precipitantes mais freqüentes de readmissões entre os pacientes. Entre os readmitidos (64%), 22% apresentaram má adesão relacionada à dieta, 6% relacionada ao não uso ou ao uso irregular das medicações e 37% a ambos, dieta e medicação (4). Esse foi o primeiro estudo que apontou a não-adesão como fator precipitante de readmissões, o que também foi confirmado posteriormente por outros investigadores(1, 5-6).

Com o advento dos vários ensaios clínicos na área de ICC, o tratamento da doença passou a ser mais complexo e, portanto, necessitar de uma estrutura mais organizada para o atendimento desses pacientes(5). Além da otimização do tratamento farmacológico, principalmente com o uso de drogas com benefícios comprovados sobre a mortalidade (inibidores da enzima de conversão da angiotensina-IECA e betabloqueadores), (5) outras estratégias têm sido estabelecidas, por meio de ensaios clínicos randomizados, com abordagens multidisciplinares no seguimento de pacientes com ICC(7-8).

O primeiro estudo randomizado abordando esse aspecto, publicado na década de 90, incluiu 282 pacientes. O grupo intervenção (n=142) recebeu da enfermeira educação intensiva sobre ICC. O principal desfecho analisado foi a sobrevida livre de readmissões com 90 dias de seguimento. Embora sem significância estatística, houve melhora da sobrevida livre de readmissões no grupo intervenção. Além disso, readmissões por qualquer causa, custos e qualidade de vida foram significativamente melhorados no grupo intervenção(1). A partir desse estudo, ampliaram-se as intervenções multidisciplinares no acompanhamento de pacientes portadores de ICC(7).

Reiterando essa mensagem, recentemente uma subanálise do estudo CHARM (Candesartan in Heart failure: Assessment of Reduction in Mortality and Morbidity) demonstrou que, independentemente do manejo farmacológico adotado - associação ou não de IECA com antagonistas de receptores da angiotensina -, a adesão ao manejo preconizado foi o que determinou, em cada grupo, o melhor desfecho de morbimortalidade em pacientes com ICC(9).

Neste artigo, revisaremos dados contemporâneos, abordando os diversos cenários de educação para o manejo de pacientes com insuficiência cardíaca. Para a realização da revisão bibliográfica, foi conduzida uma pesquisa na base de dados BIREME e MEDLINE, no período de 1988-2005, usando os seguintes descritores: enfermagem (nursing), insuficiência cardíaca congestiva (congestive heart failure), autocuidado (self care) e educação (education).

ESTRATÉGIAS DE EDUCAÇÃO PARA O AUTOCUIDADO NA ICC

A educação para saúde pode ser definida como um processo que melhora o conhecimento e as habilidades que influenciam as atitudes requeridas do paciente para que mantenha um comportamento adequado de saúde. A educação na ICC, que envolve um tratamento complexo e alterações no estilo de vida, traz um impacto importante sobre a qualidade de vida dos seus portadores e de sua família, exigindo um acompanhamento permanente por parte da equipe de saúde(10). A educação do paciente pelo enfermeiro segue duas orientações: uma, de ação instrumental, que influencia a atitude e o comportamento desse paciente; outra, de proteção, que tem o sentido de minimizar a apreensão do paciente com o tratamento. Nesse processo, o fornecimento de informação (orientação) é a essência, mas, por si só, não garante uma mudança de comportamento. Assim, a educação deve ser dirigida para 'o que o paciente precisa fazer para ter saúde', e não apenas para o que ele deve saber(11). O cenário, para dar início ou continuidade ao processo educativo, pode ser hospitalar (durante a internação), ambulatorial, domiciliar; pode se dar, ainda, no hospital-dia, ou ser a combinação desses ambientes(3, 8,12).

O processo de educação pode ser descrito em cinco passos(13), a saber: avaliação do conhecimento prévio, da cognição, das atitudes, da motivação e dos enganos cometidos pelos pacientes, no que se refere ao seu tratamento para a saúde; identificação do que ensinar, considerando as potenciais barreiras para o aprendizado; planejamento do conteúdo da educação, com a participação do paciente, para definir objetivos individuais e escolher as melhores intervenções para alcançá-los; planejamento do modo como a educação será dispensada; e, por fim, realização de uma avaliação criteriosa do processo de educação instituído.

No entanto, individualizar as necessidades de educação não é tarefa fácil. Em um estudo descritivo com 30 pacientes, em que foram avaliadas as suas principais necessidades educacionais, sob a óptica dos próprios pacientes, do médico e da enfermeira, o grupo dos pacientes listou as questões relacionadas ao conhecimento da doença como sendo as mais importantes. Já os médicos listaram as questões referentes ao que é ICC, ao prognóstico da síndrome e ao tratamento farmacológico; as enfermeiras, por sua vez, listaram todas as opções citadas pelos pacientes e incluíram a questão "como eu saberei quando devo procurar o médico". Os primeiros atribuíram pouca prioridade a tópicos como dieta, exercício e verificação diária do peso, enquanto os médicos e as enfermeiras selecionaram-nos como sendo de importância moderada(14). Esses achados vêm ao encontro da discutida falta de adesão ao tratamento não farmacológico na ICC e reforçam a necessidade da atuação da enfermeira na educação desses indivíduos.

EDUCAÇÃO NO CONTEXTO HOSPITALAR

Os estudos realizados em âmbito hospitalar utilizam tradicionalmente um plano de educação que é iniciado durante a internação hospitalar e seguido posteriormente por meio de consultas ambulatoriais em busca da ocorrência dos desfechos previamente estabelecidos. Num dos primeiros estudos sobre educação e suporte à saúde, foram randomizados 179 sujeitos internados por ICC, e o grupo intervenção (n=84) recebeu, ainda durante a internação, educação intensiva por uma enfermeira, além de seguimento com visita domiciliar, após sete dias da alta. Os resultados mostraram que a educação e o apoio dispensados pela enfermeira na transição do ambiente hospitalar para o domiciliar melhoraram significativamente o comportamento para o autocuidado(7).

Outro estudo investigou se a intervenção educacional realizada por uma enfermeira especialista, apenas durante a internação hospitalar, melhoraria as taxas de morte por todas as causas ou admissões, em doze meses de seguimento. A intervenção consistia na educação sobre a ICC e no seu tratamento (medicação, dieta, exercícios e detecção precoce de descompensação). Os resultados obtidos demonstraram redução da mortalidade ou das admissões, quando comparado ao grupo controle(15).

Em outra investigação, que incluiu 88 pacientes internados por ICC, foi avaliado o efeito da intervenção educacional, iniciada na internação e intensificada após a alta hospitalar, sobre as readmissões e/ou mortalidade e sobre os custos com as hospitalizações por ICC. Os pacientes foram alocados para receber a intervenção de educação e apoio (n=44) ou então para receber o cuidado de saúde padrão oferecido pelo seu médico assistente (n=44). Esse estudo de intervenção de enfermagem puramente educacional, sem outro manejo que envolvesse algum componente médico, alcançou resultados significativos na diminuição de readmissões, no tempo de permanência durante a hospitalização, e gerou uma economia de U$ 7.515 por paciente não hospitalizado(16).

Os estudos relacionados acima confirmam que estratégias que envolvam educação intensiva e abrangente nas questões que permeiam o tratamento da ICC são fundamentais em qualquer programa de manejo dessa síndrome(5). Seguindo a proposta de avaliar a educação para o autocuidado, nos vários cenários em que a ICC pode ser manejada, partindo do ambiente hospitalar em direção ao ambulatorial, revisaremos a seguir alguns estudos realizados num ambiente caracterizado como sendo de assistência intermediária, o hospital-dia.

EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DE HOSPITAL-DIA

O conceito de hospital-dia, em cardiologia e, especificamente, na ICC, ainda é pouco explorado na literatura nacional e internacional. Consiste em uma forma de atendimento de curta duração e de caráter intermediário destinada aos indivíduos que necessitem de acompanhamento médico e de enfermagem diários, mas que não preencham critérios para internação hospitalar.

Embora a literatura contemple ainda poucos resultados com seguimento de pacientes em hospital-dia, um estudo italiano comparou a eficácia e a relação custo/utilidade entre sujeitos randomizados para um programa multidisciplinar, desenvolvido em uma clínica de ICC que coordenava um hospital-dia (n=112) ou para o cuidado padrão (n=122), na comunidade. A educação e o aconselhamento para a saúde eram realizados por quatro enfermeiras e pelos demais membros da equipe. Ao final dos doze meses de seguimento, observou-se que o grupo controle apresentou mais readmissões e morte de origem cardíaca quando comparado ao grupo do hospital-dia; e que o modelo de hospital-dia mostrou-se mais custo-efetivo(3).

No contexto atual da ICC, a opção de hospital-dia demonstra o impacto significativo em desfechos como readmissões, morte e custos. Ainda não está claramente descrito e estabelecido nesse cenário o papel da educação direcionada aos pacientes e a seus familiares/cuidadores. Por outro lado, a literatura oferece uma farta publicação de artigos que demonstram os benefícios da terapia não-farmacológica baseada na educação e no apoio de indivíduos com ICC, na alta hospitalar, ou seja, na fronteira entre o ambiente hospitalar e o ambiente extra-hospitalar(16).

EDUCAÇÃO NO CONTEXTO EXTRA-HOSPITALAR

Monitorização Ambulatorial

No ambiente ambulatorial, o processo de educação inicia-se com a determinação do perfil do conhecimento sobre a insuficiência cardíaca e do autocuidado praticado - requisitos básicos para o planejamento do cuidado. Em estudo recente do nosso grupo, demonstramos resultados semelhantes aos da literatura com relação ao conhecimento limitado dos pacientes sobre a doença e também sobre o autocuidado, aspectos esses diretamente envolvidos nas readmissões hospitalares(17).

Sublinhe-se que o cenário ambulatorial é ideal para a educação intensiva, tanto dos indivíduos que ainda não apresentaram internação por ICC quanto daqueles que retornam de hospitalizações por descompensação clínica. A melhora do conhecimento para o autocuidado é a chave para o sucesso na redução da morbidade e dos custos com saúde na ICC(7,18). As intervenções de enfermagem dispensadas individualmente devem reforçar repetidamente os cuidados considerados essenciais no manejo não-farmacológico da ICC(17). No entanto, a efetividade da intervenção será alcançada quando o principal raciocínio envolvido na gênese da instabilização clínica dos portadores de ICC for assimilada pelos doentes, ou seja, o entendimento de que a prevenção ou a detecção precoce de um estado hipervolêmico, que acarreta aumento do peso corporal, formação de edema, surgimento de dispnéia e ortopnéia, pode evitar crises de descompensação e, conseqüentemente, visitas à emergência ou internações hospitalares(18).

Outras estratégias, como visita domiciliar e monitorização por telefone, focadas na educação extra-hospitalar, também têm demonstrado resultados satisfatórios no manejo de pacientes portadores de ICC (6,12).

Visita domiciliar

As visitas domiciliares constituem instrumento facilitador na abordagem dos pacientes e familiares. Por meio desse recurso, podemos compreender melhor a dinâmica familiar e verificar o grau de envolvimento da família no tratamento oferecido(19). Programas comunitários que dispensam o cuidado primário para portadores de ICC na própria residência são oferecidos àqueles que não apresentam condições de freqüentarem uma clínica especializada(5). Dentro desse contexto de manejo domiciliar, foi investigado o efeito da intervenção domiciliar sobre as readmissões e morte em doentes de alto risco, recém-saídos de cuidados hospitalares agudos. Os pacientes foram randomizados para o grupo controle, de cuidado usual (n=48) ou para o grupo que recebia o cuidado domiciliar (n=49) na primeira semana após a alta. Depois de seis meses de seguimento, foi observada uma redução das readmissões não planejadas e de morte extra-hospitalar nos sujeitos do grupo intervenção(12).

Portanto, a visita domiciliar vem demonstrando ser a nova fronteira dos serviços de saúde, um passo importante para o desenvolvimento de uma política de prevenção primária eficaz. Essa modalidade propicia um intenso trabalho de educação dos cuidadores e/ou familiares, tornando-os aptos e seguros para a continuidade do cuidado(19). Um outro recurso disponível para o acompanhamento extra-hospitalar de portadores de ICC é a monitorização por telefone, conforme apresentaremos a seguir.

Monitorização por telefone

A monitorização por telefone pode ser considerada um método adjuvante no seguimento de indivíduos com ICC, uma vez que a sua utilidade está voltada ao reforço de um plano de cuidados e de um processo educativo já iniciado anteriormente, em algum dos cenários já descritos. É freqüentemente encontrada no acompanhamento de pacientes pós-alta hospitalar e como método auxiliar nas intervenções realizadas por meio de visitas domiciliares(6,20).

Em uma tentativa de investigar novos caminhos para melhorar os resultados no manejo da ICC, considerando a efetividade já comprovada de outras estratégias, foi desenvolvido um estudo randomizado para avaliar a efetividade de uma intervenção padronizada por telefone, orientada no sentido da diminuição do uso de recursos em saúde. Pacientes recém-saídos de uma internação hospitalar (n=130) foram alocados para o grupo intervenção. O acompanhamento era realizado por meio de telefonemas padronizados conforme um programa de computador. Os sujeitos alocados do grupo controle (n=228) receberam o cuidado usual de orientação pré-alta hospitalar e seguimento com seus respectivos médicos assistentes. No grupo intervenção houve uma redução significativa das taxas de readmissões por ICC em relação ao grupo controle, nos primeiros três meses e também ao final de seis meses. Os autores reforçam que a monitorização por telefone e todas as formas de manejo da ICC enfatizam o uso correto e sistemático de todas as medicações prescritas e desfazem enganos sobre efeitos adversos relacionados erroneamente ao tratamento farmacológico(6). Similarmente, um estudo norte-americano que, além do contato telefônico, incluiu visitas domiciliares apresentou resultados semelhantes(15).

Investigadores argentinos publicaram um ensaio clínico randomizado com 1.518 sujeitos, e o objetivo foi determinar se uma central telefônica de intervenções conduzidas por enfermeiras reduziria a incidência de morte por todas as causas ou admissão por piora da ICC. A proposta de intervenção incluía melhora da adesão à dieta e ao tratamento medicamentoso, monitorização de sintomas, principalmente de dispnéia e de fadiga, controle de sinais de sobrecarga hídrica por meio da verificação do peso e do edema, e a realização de atividade física. Os resultados não demonstraram impacto sobre a mortalidade, mas houve redução significativa nas readmissões por ICC (Redução do Risco Relativo= 29%, P=0,005)(20). Em síntese, a monitorização por telefone realizada isoladamente ainda é pouco estudada. No entanto, o uso do telefone como componente da terapia não-farmacológica reforça a intensidade da intervenção e assegura um controle mais rápido nas situações críticas e de exacerbação da ICC.

PERSPECTIVAS FUTURAS

Em 2005, foi publicada a primeira revisão sistemática para determinar o impacto das intervenções multidisciplinares hospitalares sobre esses principais desfechos. Os resultados obtidos mostraram uma significativa redução na mortalidade, com taxas semelhantes às obtidas com o uso de IECA. O risco de admissão por todas as causas foi reduzido em 13%; a mortalidade diminuiu cerca de 20%; as readmissões por ICC caíram para 30%; e, em dez ensaios que descreveram a média dos dias de internação hospitalar, foi evidenciada uma diminuição de 1,9 dias em favor do grupo intervenção. O estudo evidencia o impacto do manejo multidisciplinar sobre os principais desfechos negativos da ICC e ressalta o benefício, em especial da estratégia de cuidado domiciliar, sobre as readmissões por todas as causas, da telemonitorização e do seguimento por telefone sobre a mortalidade, além do benefício similar do cuidado domiciliar e das intervenções por telefone nas admissões(21).

A literatura já demonstra benefícios quanto às intervenções de educação e apoio à saúde obtidos por equipes multidisciplinares nos vários ambientes onde a ICC pode ser manejada(22). No entanto, algumas questões permanecem pouco esclarecidas, pois vários estudos têm encontrado resultados negativos ou inconclusos com relação aos desfechos das intervenções educacionais realizadas(7). Por exemplo, qual seria o programa de educação mais efetivo e qual deveria ser o nível de intensidade de educação no seguimento dos pacientes com ICC?

Esse cenário incerto motivou um estudo multicêntrico, denominado COACH (Coordinating study evaluating Outcomes of Advising and Counselling in Heart failure), que avaliará 1.050 sujeitos randomizados para 3 grupos: a) consultas com o médico cardiologista; b) educação básica e apoio; e c) educação intensiva e apoio. Os resultados desse estudo poderão orientar a equipe de saúde a escolher quais intervenções deverão ser acrescentadas ou retiradas dos programas de manejo e controle de ICC(22).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A complexidade do manejo de indivíduos com ICC constitui-se um desafio para a equipe de saúde envolvida. Nesse sentido, a atuação da enfermeira como parte integrante das equipes multidisciplinares especializadas no manejo de ICC é de fundamental importância. Perspectivas futuras devem, possivelmente, explorar ainda alternativas de atuação, como a orientação em grupo, a exemplo do que tem sido estudado em outros contextos, como o do manejo de pacientes diabéticos(23).

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Recebido em: 20.3.2006

Aprovado em: 13.9.2006

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Abr 2007

Histórico

  • Aceito
    13 Set 2006
  • Recebido
    20 Mar 2005
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