Acessibilidade / Reportar erro

Situações estressantes de vida, uso e abuso de álcool e drogas em idosos de Monterrey, México

Resumos

Estudo descritivo correlacional e abordagem qualitativa dos dados, realizado com 112 adultos maiores de 60 anos com o objetivo de identificar as diferenças no consumo de álcool por sexo e estado civil, identificar as diferenças do consumo de drogas médicas por sexo, determinar os eventos estressantes da vida que se associam com o uso e abuso de álcool e drogas médicas, e conhecer as percepções dos idosos sobre o que consideram eventos estressantes na vida. Os resultados mostraram diferenças significativas do consumo de álcool de acordo com sexo (U=154.0, p< 0,001), consumo foi muito maior para os homens. Reportou-se que o consumo de drogas médicas (Ç2=5.95, p<0,015) e os índices de estresse (U=1038.5, p =.010) são maiores nas mulheres. Os eventos na vida que perceberam mais estressantes foram; seus problemas de saúde ou de seus familiares, problemas familiares e econômicos.

idosos; consumo de bebidas alcoólicas; estresse


This is a descriptive, qualitative, and correlation study with 112 elderly aged 60 years or older. This study aimed to identify differences in alcohol consumption according to gender and marital status, and differences in the consumption of medical drugs by gender. It also aims to determine differences in stressful life events by gender, and differences in stressful life events associated to alcohol and medical drugs use and abuse, as well as to know their perceptions on the most stressful life events they have experienced. The results showed significant differences in alcohol consumption by gender (U=154.0, p <0.01), in which the consumption was higher for men. It was reported that the medical drugs consumption (Ç2 =5.95, p <0.15) and life stress indexes (U=1038.5, p =0.10) are higher for women. The most stressful life events reported were: their health problems or those of their relatives, family and economic problems.

aged; alcohol drinking; stress


Estudio descriptivo correlacional con aproximación cualitativa de los datos en 112 adultos mayores de 60 años, con objeto de identificar las diferencias en el consumo de alcohol por sexo y estado marital y las diferencias en el consumo de drogas médicas por sexo, determinar los eventos de la vida estresantes que se asocian con el uso y abuso de alcohol y drogas médicas, y conocer las percepciones sobre los eventos de la vida que han experimentado como más estresantes. Los resultados mostraron diferencias significativas del consumo de alcohol de acuerdo al sexo (U=154.0, p< .001), donde el consumo fue mayor para los hombres. Se reportó que el consumo de drogas médicas (Ç2=5.95, p<.015) y los índices de estrés de la vida (U=1038.5, p =.010) son mayores en las mujeres. Los eventos de la vida que percibieron más estresantes fueron; sus problemas de salud o de sus familiares, problemas familiares y económicos.

anciano; consumo de bebidas alcohólicas; estrés


ARTIGO ORIGINAL

Situações estressantes de vida, uso e abuso de álcool e drogas em idosos de monterrey, México

Bertha Alicia Alonso CastilloI; Maria Helena Palucci MarzialeII; Maria Magdalena Alonso CastilloI; Francisco Rafael Guzmán FacundoI; Marco Vinicio Gómez MezaI

IProfessora, Universidade Autônoma de Nuevo León, Faculdade de Enfermagem, México, e-mail: posgrado_enfermeria@terra.com.mx

IIProfessora Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil, e-mail: marziale@eerp.usp.br

RESUMO

Estudo descritivo correlacional e abordagem qualitativa dos dados, realizado com 112 adultos maiores de 60 anos com o objetivo de identificar as diferenças no consumo de álcool por sexo e estado civil, identificar as diferenças do consumo de drogas médicas por sexo, determinar os eventos estressantes da vida que se associam com o uso e abuso de álcool e drogas médicas, e conhecer as percepções dos idosos sobre o que consideram eventos estressantes na vida. Os resultados mostraram diferenças significativas do consumo de álcool de acordo com sexo (U=154.0, p< 0,001), consumo foi muito maior para os homens. Reportou-se que o consumo de drogas médicas (χ2=5.95, p<0,015) e os índices de estresse (U=1038.5, p =.010) são maiores nas mulheres. Os eventos na vida que perceberam mais estressantes foram; seus problemas de saúde ou de seus familiares, problemas familiares e econômicos.

Descritores: idosos; consumo de bebidas alcoólicas; estresse

INTRODUÇÃO

O abuso de álcool se converteu em um problema de saúde entre os idosos devido ao crescimento do consumo e aos efeitos em sua saúde e qualidade de vida. Estima-se que o uso e abuso do álcool nesta população variam de 15% a 72% em residentes da comunidade, 2% em adultos do México que demandam atendimento de primeiro nível e 25% de pacientes hospitalizados(1-3.). Também foi reportado o uso de drogas médicas como sedativos e hipnóticos em 16%, psicotrópicos em 33% e a combinação destas drogas com o álcool em 12% da população de idosos. 20% utilizam um tranqüilizante diariamente(4-6).

O idoso é mais vulnerável ao uso de álcool e drogas que os jovens. Entre os fatores que explicam estas diferenças se encontram a diminuição da massa muscular, da água corporal e da filtração glomerular do idoso, uma vez que os níveis de substâncias e drogas solúveis em água, como o álcool, aumentam seu nível no sangue. Além disso, há um aumento da interação do álcool com múltiplos medicamentos(3).

Espera-se um aumento neste segmento da população nos próximos anos devido ao aumento da expectativa de vida, e isto poderia derivar em um problema que tomaria maiores proporções. Entretanto, a ênfase na literatura, assim como o diagnóstico e tratamento, é dirigida em sua grande maioria aos adolescentes e adultos jovens. Por sua vez, este problema tende a ser subestimado e minimizado no idoso, não sendo, portanto, diagnosticado. Existem diversas razões pelas quais a família e os profissionais de saúde não detectam ou reportam este problema: os sinais e sintomas que se apresentam são atribuídos a outras doenças crônicas ou ao envelhecimento, confundindo-se com demência ou depressão. Além disso, o profissional de saúde pode considerar constrangedor perguntar ao idoso sobre o consumo de álcool e drogas.

Alguns estudos recentes observaram diferenças no consumo de álcool e drogas médicas de acordo com o sexo em populações de idosos. Reporta-se que os homens tendem a consumir álcool em maior quantidade e freqüência que as mulheres. Em relação a drogas médicas, as mulheres são as que mais consomem. Além disso, os eventos estressantes da vida foram associados ao consumo de álcool e drogas médicas(7-10).

Os eventos estressantes da vida são derivados do conceito unificado sobre o estresse, onde se concorda que há uma adaptação ou ajuste por parte da pessoa às mudanças que esta vive a sua volta. O argumento é que existem múltiplas mudanças geradas na vida pela etapa de desenvolvimento ou amadurecimento das pessoas, assim como aquelas que surgem na interação com outras pessoas que são significativas e pelo ambiente. Estes são avaliados cognitivamente como provocações, ameaças, danos ou perdas, que são confrontados porque requerem ser superados, obtendo com isso o ajuste ou a acomodação da pessoa(11). O enfoque com base em eventos da vida permite conhecer a percepção do idoso sobre os fatos e acontecimentos ocorridos nos últimos doze meses que lhe foram ameaçadores, angustiantes, preocupantes ou estressantes.

Estes fatos, acontecimentos ou eventos da vida podem ameaçar a pessoa. Entre eles se incluem a viuvez, o divórcio, a aposentadoria, os problemas econômicos, o abandono e a solidão, onde provavelmente se consome álcool como forma de enfrentamento(11). Alguns estudos(7-10) reportaram relações fortes e significativas, enquanto outros estudos não documentaram estas relações. Por sua vez, os autores do presente estudo assinalam a necessidade de se seguir analisando o comportamento destas variáveis.

Por outro lado, existem estudos escassos que se refiram à magnitude e possíveis fatores associados ao consumo de álcool e drogas médicas por idosos no México. Os estudos localizados até o momento mostram inconsistências entre as variáveis de estresse da vida e consumo de álcool e drogas médicas, e, por esta razão, acredita-se que exista um vazio de conhecimentos nesta temática. Neste sentido, este conhecimento pode servir de base para o esboço de intervenções de prevenção primária e secundária para a redução do consumo de álcool e drogas médicas entre idosos.

OBJETIVOS

-Identificar as diferenças do consumo de álcool por sexo e estado civil em idosos.

-Identificar as diferenças do consumo de drogas médicas por sexo em idosos.

-Determinar as diferenças dos eventos estressantes da vida por sexo.

-Determinar os eventos estressantes da vida de idosos que se associam ao uso e abuso do álcool e drogas médicas.

-Conhecer as percepções do idoso sobre os eventos mais estressantes ou preocupantes que viveram nos últimos doze meses e o papel do consumo de álcool nestes momentos.

MÉTODOS

Um estudo quantitativo sob um esboço descritivo e correlacional foi desenvolvido. Considerou-se que este esboço seria apropriado porque permitiria observar, descrever e documentar aspectos de uma situação que ocorre de forma natural, e foi correlacional porque se associaram duas variáveis: os eventos da vida com o consumo de álcool e de drogas médicas. Desta forma, utilizou-se uma aproximação qualitativa através de uma entrevista semi-estruturada e análise de conteúdo. A amostra estudada foi formada por 112 pacientes, homens e mulheres, com mais de 60 anos que foram à consulta em um período de três meses. Utilizou-se uma amostragem probabilística sistemática de um em três e a amostra foi obtida através dos arquivos da clínica. O tamanho da amostra foi calculado para um limite de erro estimado em 8%, utilizando um enfoque conservador. Ao deparar-se com o principal parâmetro sendo uma proporção, trabalhou-se com 95% de confiança.

O critério de inclusão foi que os participantes se encontrassem localizados em tempo, espaço e pessoa através de três perguntas: Que dia é hoje? Qual é seu nome? Como você veio até a clínica?. Posteriormente se aplicou o instrumento Pfeiffer (SPMSQ-VE)(12), que consta de dez reativos, tendo como objetivo principal detectar uma possível deterioração cognitiva e avaliar a memória de curto prazo. Os idosos que liam e escreviam deveriam ter um máximo de dois erros na prova Pfeiffer, e os analfabetos incluídos deveriam ter um máximo de três erros.

Aplicaram-se três instrumentos, uma Cédula de Dados Pessoais e uma entrevista semi-estruturada. O primeiro instrumento que se utilizou foi o Inventário de Estresse da Vida de Idosos (Elders Life Stress Inventory [ELSI])(11,13). Este tem como propósito medir o estresse da vida por meio dos eventos que o idoso viveu nos últimos doze meses. O segundo instrumento utilizado para medir o consumo de álcool em idosos foi o Exame de Análise de Alcoolismo Michigan - Versão Geriátrica (Michigan Alcoholism Screening Test - Geriatric [MAST-G])(14). O terceiro instrumento foi um Questionário de Avaliação de Consumo de Drogas Médicas (Cuestionario de Valoración de Consumo de Drogas Médicas - CVCDM).

Finalmente, se realizou uma entrevista semi-estruturada para conhecer a percepção do idoso quanto aos eventos ou acontecimentos de sua vida que foram estressantes, preocupantes ou que mais lhe mortificaram nos últimos doze meses e o papel do consumo de álcool nestes. Para isso, se construiu uma entrevista com duas perguntas:

1) Nos últimos doze meses, quais são os eventos que foram mais estressantes, preocupantes ou que lhe mais mortificaram?

2) O que fez para seguir adiante ou para enfrentar esses acontecimentos ou eventos?

O estudo se ateve ao disposto pelo Regulamento da Lei Geral de Saúde no Âmbito de Pesquisas para a Saúde da Secretaria de Saúde do México. Contou-se com o parecer favorável da Comissão de Ética e Pesquisa da Faculdade de Enfermagem da UANL. Antes de se iniciar a coleta de dados, se obteve o consentimento informado do idoso, tanto para a aplicação dos três instrumentos como para a entrevista semi-estruturada.

Os dados foram processados com o pacote estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 11.0 para Windows. Utilizou-se estatística descritiva e inferencial; a estatística descritiva obteve freqüências, proporções, medidas de tendência central e de variabilidade para descrever as variáveis do estudo. Para a estatística inferencial, aplicou-se primeiro a prova de normalidade das variáveis de Kolmogorov-Smirnov e, com base nisto, decidiu-se pelo uso de provas não-paramétricas. Para o primeiro objetivo foram utilizadas freqüências, proporções, o teste Chi-Quadrado de Pearson e o teste U de Mann-Withney; para o segundo, se aplicou o teste Chi-Quadrado de Pearson; para o terceiro objetivo se utilizou o teste U de Mann-Whitney; e por último, para o quarto objetivo, se aplicou a Correlação de Spearman e o teste U de Mann-Whitney.

Finalmente, para o objetivo número cinco, um documento em Word foi elaborado a partir das entrevistas semi-estruturadas, colocando as narrativas dos idosos de acordo com cada pergunta. Posteriormente, se realizou uma codificação aberta, para identificar as categorias iniciais a partir dos códigos vivos. Em seguida, retornou-se ao documento, e então os códigos e as categorias iniciais foram comparados novamente. Finalmente, a codificação seletiva foi realizada, deixando estabelecidas nesta última análise os temas finais. O conteúdo derivado das entrevistas foi apresentado, em um primeiro momento, por meio de tabelas de freqüências e proporções das categorias ou temas mais freqüentes assinalados pelos participantes.

RESULTADOS

Dentre os 112 idosos estudados, 59,8 % foram de sexo feminino. Uma parcela de 67,9% dos participantes conta com nível básico de escolaridade, o que equivale ao nível primário. Em sua maioria, estes eram casados ou viviam em união livre (68,8%). A média de idade foi de 68 anos (DE=5,81); e, com relação à ocupação, a maioria se dedica ao lar (51,8%) ou em uma percentagem menor, são pensionistas ou aposentados (31,3%).

Um total de 37,5% (49 sujeitos) dos participantes disse consumir bebidas alcoólicas atualmente. Obteve-se uma diferença de proporções do consumo de álcool atual, onde se observam diferenças significativas segundo o sexo (χ2 = 10,43 p < ,001). Em meio às mulheres, 31,3% consomem álcool, enquanto 62,2% dos homens reportaram consumir bebidas alcoólicas atualmente.

A Tabela 1 mostra o consumo de álcool atual entre idosos, por sexo, de acordo com o número de copos consumidos por ocasião. Destacam-se diferenças de proporções em consumo de álcool, de acordo com o sexo, através do teste Chi-Quadrado de Pearson (χ2=18,61; p <,001). Além disso, observa-se que as mulheres mostram maior proporção na classificação de consumo sensato, enquanto os homens tendem a mostrar maior proporção em consumo arriscado de álcool.

Para ampliar a explicação do primeiro objetivo, utilizou-se o instrumento MAST-G. Este tem um ponto de corte de 5 pontos, o que implica que, a partir desta pontuação, há abuso de álcool. Neste instrumento, as pontuações classificam o consumo em sensato (0 a 1 ponto), arriscado (2 a 4 pontos) e abusivo (mais de 5 pontos). De acordo com a Tabela 2, observam-se diferenças na classificação do consumo de álcool de acordo com o sexo (χ2=10,8; p = ,004), sendo que as mulheres mostram maior proporção no consumo sensato, enquanto os homens tendem a mostrar maior proporção no consumo abusivo de álcool.

A Tabela 3 mostra o teste U de Mann-Whitney para o consumo de álcool (MAST-G) por sexo, indicando uma diferença significativa do consumo de álcool atual quanto ao sexo. Com relação ao consumo de álcool, a média e a mediana mais altas foram encontradas para o sexo masculino. Aplicou-se, então, o teste de Chi-Quadrado de Pearson para o tipo de consumo de álcool (MAST-G) com estado civil; entretanto, os resultados não mostraram diferenças significativas.

Quanto ao consumo de drogas médicas por sexo em idosos, foi constatado que mais de 20% das mulheres as consomem, enquanto apenas 4,4% dos homens reportaram tal consumo - proporções estas que se mostraram significativamente diferentes (χ2= 5,95, p= ,015). Com relação ao tipo de droga médica reportado, destacam-se os tranqüilizantes (ansiolíticos) com 83,5% e os antidepressivos com 16,5%. O que chama a atenção é que, em mais de 30% das vezes, se consegue esta classe de medicamentos sem receita médica.

O teste U de Mann-Whitney para o estresse da vida por sexo indicou uma diferença significativa. As médias e medianas de estresse indicam que as mulheres têm maior índice de estresse da vida que os homens. De acordo com a matriz de Correlação de Spearman, não se encontrou relação significativa (r= -,166, p= ,255) dos eventos estressantes da vida com o consumo de álcool. Além disso, o teste U de Mann-Whitney não mostrou diferenças dos eventos estressantes (ELSI) com o consumo de drogas médicas (Ou= 670,0, p= ,711). Por outro lado, a idade de início de consumo de álcool se relacionou positivamente (r= ,290, p= ,011) com o índice de estresse; ou seja, quanto maior a idade de início de consumo de álcool, maior é o índice de estresse da vida.

Os eventos de vida mais estressantes percebidos com maior freqüência pelos idosos foram: os problemas de saúde deles ou de algum familiar (7 casos estão relacionados ao consumo de álcool), seguidos de problemas familiares, tais como separações, divórcios, discussões e problemas de comunicação entre membros de família; problemas econômicos, a morte de algum familiar e problemas de trabalho.

O estudo revela que as atividades que os idosos realizaram a fim de enfrentar as situações estressantes foram a busca de apoios sociais, entre os quais se destacam o apoio familiar (60%), o apoio de profissionais (35,6%) e o apoio da igreja (4,4%). Além disso, estes realizam principalmente atividades de religiosidade, tais como; rezar, orar, pedir e ter fé em Deus, além de ter pensamentos positivos, atividades pró-ativas, a fim de resolver a situação, e também atividades recreativas e de entretenimento, tais como; passear, assistir TV e ler para tratar de esquecer. O consumo de álcool não foi uma prática assinalada como recurso de enfrentamento aos eventos de vida estressantes.

DISCUSSÃO

O perfil sócio-demográfico dos idosos mostrou que a maior proporção dos que receberam atendimento médico oftalmológico e participaram do estudo foram de mulheres; a escolaridade foi de nível primário, e em sua maioria os idosos viviam com seu parceiro. Com relação à ocupação, mais de 50% se dedicavam ao lar. Estas características são comuns à população de idosos no México, onde estes não contam com pensão por questões históricas estruturais da sociedade, sendo que apenas 31% deles têm este direito ou uma previdência social que os proteja nesta etapa da vida. Esta situação se faz evidente pelo fato de dependerem economicamente de seus filhos e viver com eles, limitando assim sua independência(15-16).

Com relação ao primeiro objetivo, observou-se que os idosos do sexo masculino consomem álcool em maior quantidade e freqüência que as mulheres, sendo estas diferenças significativas, o que coincide com o reportado por estudos realizados na mesma população(2,7-9). Estes achados são similares aos encontrados em outros grupos de idade no México, visto que se aceita socialmente e se justifica culturalmente o consumo de álcool em homens e as práticas de alcoolização masculina são mais abertas e manifestas, enquanto as práticas de alcoolização feminina, por sua vez, são ocultas e moderadas. Além disso, o consumo de álcool excessivo se estigmatiza nas mulheres, e isto também se reproduz socialmente nesta etapa da vida(16-18).

Por outro lado, também se observaram diferenças significativas por tipo de consumo de álcool onde a maior proporção de quem consumia álcool, no caso das mulheres, o fazia de forma sensata, enquanto os homens também reportaram maior proporção de sensatez, mas inferior às mulheres, seguido por consumo abusivo. Estes dados coincidem com outros estudos(2,16), que indicam que, nesta etapa da vida, existe uma tendência a diminuir a ingestão de álcool. Este dado de abuso de álcool chama a atenção, visto que neste estudo se encontrou maior abuso de álcool que o reportado por um estudo com idosos de classe alta(9) e com idosos que requerem um atendimento primário de saúde na Cidade do México(2).

Não se encontrou uma diferença significativa do tipo de consumo de álcool por estado civil, ainda que o consumo sensato fosse mais alto naqueles idosos que viviam sozinhos do que entre os que tinham um parceiro. Além disso, o consumo arriscado e abusivo foi mais alto em quem tinha um parceiro, comparado com quem não o tinha. Tais dados não coincidem com o estudo em idosos de classe alta(9). Provavelmente algumas explicações a estas diferenças ocorram em função da situação econômica da amostra de estudo, que são de classe baixa e média-baixa, e ao fato de que o consumo possa ter explicações em termos da convivência com familiares e filhos, com quem o idoso vive e de quem depende economicamente .

De acordo com o segundo objetivo, descobriu-se neste estudo que o consumo de drogas médicas foi mais alto em idosos do sexo feminino que do masculino. Isto coincide com o que foi reportado em estudos realizados no México(9, 16). Entre as drogas médicas mais consumidas estão os tranqüilizantes (ansiolíticos) e antidepressivos, o que provavelmente se relaciona com a cultura da saúde das mulheres, que por seu papel de cuidadoras da família têm maior inclinação ao consumo de medicamentos que os homens.

Tal consumo de drogas médicas em idosos ainda pode relacionar-se com a presença de insônia e estados emocionais de depressão, ansiedade, angústia e estresse, sintomas característicos nesta etapa da vida(9-16). O que chama a atenção é que mais de 30% deles consegue ou compra esta droga sem receita médica, o que é regulado pelo Setor da Saúde. Este dado indica que provavelmente existe uma falta de supervisão e vigilância no controle destes medicamentos controlados.

A maior prevalência de doenças crônicas entre os idosos, tais como a hipertensão arterial sistêmica, implica no crescimento do consumo de medicamentos. Como conseqüência, aumenta-se a incidência de problemas relacionados aos medicamentos, deixando esta população vulnerável a vários problemas de saúde(17).

Com relação ao terceiro objetivo, é importante destacar que existem diferenças significativas nos eventos de vida estressantes de acordo com o sexo, sendo mais alta a percepção destes eventos no sexo feminino que no masculino. Isto coincide com residentes de classe alta(9), onde as mulheres reportaram maior percepção de estresse da vida que os homens. Este fato tem ainda suas explicações no sentido de que, culturalmente, no México e em outras sociedades ocidentais e tradicionais, a mulher tem um papel muito importante como mediadora de problemas familiares e fonte de apoio social dos filhos, do parceiro e demais familiares, aumentando com isso a percepção dos eventos da vida que lhe são potencialmente preocupantes.

Neste mesmo sentido, entre os eventos da vida que os idosos reportaram com maior freqüência e como mais estressantes,(11) encontram-se, em primeiro lugar, a deterioração da memória, seguido pela deterioração da situação financeira, e posteriormente, alterações da saúde ou conduta de um familiar, a presença de doença ou lesão nestes e a impossibilidade de realizar atividades que gostavam muito. Como se pode observar, alguns destes eventos se relacionam com as mudanças próprias do envelhecimento(18), que os limita em sua vida, em suas capacidades e os torna dependentes de familiares e amigos, com o agravante de não contarem com meios ou mecanismos governamentais de amparo social e econômico, que poderiam ajudar-lhes a enfrentar esta etapa da vida com dignidade.

Quanto ao quarto objetivo, não se encontrou uma relação significativa dos eventos estressantes da vida com o consumo de álcool atual. Este achado é similar aos de estudos realizados no México e EUA(7,9,13), mas contrário ao estabelecido por quem reportou efeito dos eventos estressantes e consumo de álcool. Este achado provavelmente se explica no sentido de que as médias de consumo de álcool e de eventos estressantes foram baixas, e os idosos provavelmente estão utilizando outras formas mais saudáveis de enfrentamento ao estresse(8).

Da mesma forma, não se encontrou diferença significativa do consumo de drogas médicas e os eventos estressantes, achado similar a um estudo(9), mas contrário ao reportado por outros(10). Provavelmente não se reportou uma diferença significativa neste estudo porque a média de consumo de drogas médicas foi baixa. Este achado pode se explicar, em parte, pelo custo dos medicamentos controlados e pelo fato de que menos da metade dos idosos contam com uma previdência social que lhes permita obter tais medicamentos.

No entanto, houve uma associação positiva e significativa do índice de estresse da vida e a idade de início do consumo de álcool, o que indica que, quanto maior a idade de início do consumo da substância, mais alta foi a percepção dos eventos estressantes da vida. Este achado mostra que os idosos que começaram a se envolver com esta prática mais tarde em sua juventude tiveram mais probabilidade de perceber um maior estresse nesta etapa da vida. Isto provavelmente indica que o sujeito aprendeu habilidades sociais desde sua juventude, ou que formas mais saudáveis de enfrentar a vida se reforçaram nele, o que mostra a necessidade de maior análise e estudo para se conhecer a subjetividade do idoso, o significado dos eventos de vida estressantes e do consumo de álcool.

A fim de responder o objetivo cinco, documentou-se qualitativamente que a percepção dos idosos sobre os eventos de sua vida que consideraram como mais estressantes nos últimos doze meses foi muito similar ao identificado no questionário ELSI(11). Entre os eventos mais estressantes ou preocupantes definidos qualitativamente estão, em primeiro lugar, os problemas de saúde dos idosos, como por exemplo, padecer de diabetes mellitus tipo 2, mal de Parkinson, hipertensão arterial, acidente vascular cerebral, doenças que diminuam sua acuidade visual e problemas cardíacos, assim como a doença de algum familiar, destacando-se entre estes os problemas de alcoolismo de algum de seus filhos.

Em segundo lugar destacaram-se os problemas familiares, onde se salientam os divórcios, discussões e problemas de comunicação dos casais e de seus filhos. Em terceiro lugar se identificaram problemas econômicos, como dificuldades para contar com o básico, necessidade de sair para trabalhar ou procurar alguma atividade para contar com um pouco de dinheiro e subsistir ou ter a responsabilidade de sustentar economicamente seus netos, ante o abandono dos filhos. Como se pode observar, os idosos continuam confrontando múltiplas preocupações e problemas derivados de seu papel familiar nesta etapa da vida, visto que na maioria dos casos os problemas são de seus filhos ou netos, com o agravante de estarem doentes e não terem meios econômicos para atender tais problemas.

Para ampliar as explicações sobre como o idoso confronta os eventos estressantes da vida e o papel do consumo de álcool, eles indicaram que usam mecanismos distintos, como procurar apoios sociais semelhantes aos outorgados por ONGs tais como a Fundação de Olhos Vidaurri, o Lions Club Internacional, Caritas de Monterrey e algumas organizações governamentais. Outra estratégia que utilizam é o apoio em suas crenças religiosas, orando, rezando e tendo fé em Deus. Finalmente, assinalaram que intencionalmente tratam de ter pensamentos positivos que os ajudem a enfrentar seus problemas. Entretanto, o consumo de álcool não foi indicado como um recurso de enfrentamento.

Estes achados permitem ampliar as explicações do porque não se encontrou relação destes eventos com o consumo de álcool. Provavelmente o consumo de álcool esteja associado à prática de socialização e de outros estados emocionais negativos que requerem estudo. Conforme indicado anteriormente, os idosos utilizam diversos mecanismos de enfrentamento, os quais a sua experiência e a vida lhes permitiram desenvolver. Por isso, o consumo de álcool tem um significado distinto que deve ser estudado.

CONCLUSÕES

O consumo de álcool por sexo foi significativamente diferente, sendo mais alto o consumo em idosos do sexo masculino. Não se encontraram diferenças significativas do consumo de álcool segundo o estado civil.

O consumo de drogas médicas foi significativamente diferente, revelando-se mais alto entre as participantes do sexo feminino. As drogas de maior consumo foram os tranqüilizantes (ansiolíticos) e antidepressivos.

Destaca-se a presença de diferenças significativas dos eventos de vida estressantes por sexo, sendo mais alta a percepção destes eventos no sexo feminino.

Os eventos estressantes mais importantes foram a deterioração da memória, seguido pela deterioração da situação financeira e pelas alterações da saúde ou conduta de um familiar. Não se encontrou relação significativa dos eventos estressantes da vida com o consumo de álcool. Entretanto, houve uma relação positiva e significativa do índice de estresse da vida com a idade de início do consumo de álcool. Não foram encontradas diferenças significativas dos eventos da vida estressantes e o consumo de drogas médicas.

Os eventos mais estressantes ou preocupantes assinalados qualitativamente pelos idosos foram similares àqueles já identificados. Em primeiro lugar, seus problemas de saúde, tais como a doença de algum familiar, destacando-se aqui os problemas de alcoolismo de algum de seus filhos. Em segundo lugar, sobressaem os problemas familiares, destacando-se os divórcios, discussões e problemas de comunicação dos casais e de seus filhos. Em terceiro lugar, foram identificados os problemas econômicos, tais como as dificuldades em contar com o necessário para subsistir e ter a responsabilidade de sustentar economicamente a netos, ante o abandono dos filhos.

As atividades que os idosos reconhecem fazer para enfrentar estes eventos da vida estressantes foram: buscar apoio social, ater-se à suas crenças religiosas e ter pensamentos positivos. O consumo de álcool não foi referido como atividade ou recurso de enfrentamento aos eventos estressantes.

Recomenda-se continuar estudando o consumo de álcool e drogas médicas em idosos, incorporando outros estados emocionais como depressão, angústia e ansiedade, assim como aprofundar qualitativamente na construção do significado de consumo de álcool neste grupo de idade e realizar estudos de intervenção sobre a manipulação de habilidades sociais como mecanismos de enfrentamento ao estresse em idosos.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas/CICAD da Subsecretaria de Segurança Multidimensional da Organização dos Estados Americanos/OEA, a Secretaria Nacional Antidrogas/SENAD, aos docentes da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da pesquisa em enfermagem, a população da amostra dos estudos e aos representantes dos oito países Latinoamericanos que participaram do I e II Programa de Especialização On-line de Capacitação e Investigação sobre o Fenômeno das Drogas - PREINVEST oferecido no biênio 2005/2006 pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, na modalidade de ensino a distância.

REFERÊNCIAS

  • 1. Castro MA. El adulto mayor y los riesgos de adicción. Higiene: Rev de Salud Pública 1997; 5(2):41-5.
  • 2. Solís LR, Vélez A, Berúmen D. Prevalencia del consumo de bebidas alcohólicas y problemas asociados en personas de la tercera edad que acuden a los servicios de atención primaria de la ciudad de México. Salud Mental 2000; 23(3):38-45.
  • 3. Levin SM, Kruger L. Substance abuse among older adults: A guide for social service providers. In: Rockville MD. Substance abuse and Mental Health Services Administration; 2000.
  • 4. Zisserson RN, Oslin DW. Alcoholism and at-risk drinking in the older population. Geriatric Times 2003; 4(5):128-35
  • 5. Hulse GK. Alcohol, drugs and much more in later life. Rev Bras Psiquiatría 2002: 24(1):34-41.
  • 6. Connell H, Ai-Vym C, Cunninghan C, Lawlor B. Alcohol use disorders in elderly. People-redefining age old problem old Age. Br Med Journal 2003; 327(7,416): 664-9.
  • 7. La Greca AJ, Akers RL, Dwyer JW. Life Events and Alcohol Behavior among Older Adults. Gerontolo Soc Am 1988; 28(4):552-8.
  • 8. Glass TA, Prigerson H, Kasl SV, Mendes de Leon CF. The effects of negative life events on alcohol consumption among older men and women. Geronto 1995; 50(Health Modules):S205-S16.
  • 9. Garza RI. Estrés de la vida y su relación con el consumo de alcohol y drogas médica en adultos mayores[Tesis de maestría]. Monterrey (N.L): Universidad Autónoma de Nuevo León, México; 2005.
  • 10. Frone M, Cooper ML, Russel M. Situaciones Estresantes de la Vida y Uso de Substancias, Psycholo Addictive Behav 1994; 8(2):59-69.
  • 11. Aldwin CM. The Elders Life Stress Inventory (ELSI): Egocentric and non egocentric stress. Stress Later-Life Families 1990:49-694.
  • 12. Martínez J, Dueñas R, Onis MC, Aguado C, Albert C, Luque R. Adaptación y validación al castellano del cuestionario de Pfeiffer (SPMSQ) para detectar la existencia de deterioro cognitivo en personas mayores de 65 años. Med Clín 2001; 117(4):129-34.
  • 13. Welte JW, Mirand AL. Drinking, problem drinking and life stressors in the elderly general population. Studies Alcohol 1993; 56:67-73.
  • 14. Blow FC, Brower KJ, Schulenberg JE, Demo-Dananberg LM, Young JP, Beresford TP. (). The Michigan alcoholism screening test-geriatric version (MAST-G): A new elderly-specific screening instrument. Alcoholism: Clin Exp Res 1992; 16: 372.
  • 15
    Instituto Nacional de Estadística, Geografía e Informática [INEGI] (MX) .Estratificación por AGEB del área metropolitana de Monterrey según nivel de bienestar. Nuevo León; 2005
  • 16. Tapia R. Las adicciones: dimensión, impacto y perspectivas. 2a ed. México (D.F): Manual Moderno; 2001.
  • 17. Lyra DP Júnior, Amaral RT, Veiga EV, Cárnio EC, Nogueira MS, Pelá IR. A farmacoterapia no idoso: revisão sobre a abordagem multiprofissional no controle da hipertensão arterial sistêmica. Rev. Latino-am. Enferm. [periódico na Internet]. 2006 Jun; 14(3): 435-441. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php
  • 18. Ravelo BP. Representaciones y prácticas de alcoholización femenina: experiencias de un grupo de obreras del vestido en Análisis Cualitativo en Salud. Teoría, Método y Practica. México (D.F): Plaza Valdés Editores; 2000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2008
  • Data do Fascículo
    Ago 2008

Histórico

  • Aceito
    10 Jan 2008
  • Recebido
    21 Maio 2007
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
E-mail: rlae@eerp.usp.br