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Antidepressivos: uso e conhecimento entre estudantes de enfermagem

Resumos

Este estudo teve como objetivos analisar o nível de conhecimento de estudantes universitários de enfermagem que usam antidepressivos e propor ações para que os enfermeiros contribuam para a farmacoterapia antidepressiva segura e efetiva. Trata-se de estudo transversal e descritivo, realizado em uma Escola de Enfermagem pública do Estado de São Paulo, entre março e novembro de 2008. Dos 273 estudantes entrevistados, 52 (19%) participantes utilizam ou já utilizaram antidepressivos. A orientação do uso dessa classe medicamentosa foi realizada majoritariamente pelo médico. Mesmo com a orientação pré-administração do antidepressivo, a maioria dos usuários (cII1=0,07; p>0,05) tem dúvida a respeito do uso de antidepressivos. A fluoxetina foi o medicamento antidepressivo mais utilizado. Ações para produzir maior conhecimento quanto ao uso, efeitos colaterais e terapêuticos dos antidepressivos, por parte dos enfermeiros, parecem ser necessárias e oportunas.

Antidepressivos; Psicotrópicos; Enfermagem Psiquiátrica; Estudantes de Enfermagem


This study examined the knowledge of nursing students in regard to using antidepressant medication and proposes actions such that nurses contribute to a safe and effective antidepressant therapy. This cross-sectional and descriptive study was conducted in a public nursing school in the state of São Paulo, Brazil, between March and November 2008. Fifty-two (19%) out of the 273 participants were using or had used antidepressants. Instruction concerning the use of antidepressants was provided by physicians. Even after receiving instruction concerning the antidepressant treatment before its administration, the majority of users (cII1=0.07, p> 0.05) still had doubts about its use. Fluoxetine was the most prevalent antidepressant. Actions to improve knowledge concerning the use of antidepressant medications, their side and therapeutic effects, seem to be necessary and relevant.

Antidepressive Agents; Psychotropic Drugs; Psychiatric Nursing; Students, Nursing


Este estudio tuvo como objetivo examinar los conocimientos de los estudiantes que utilizan los antidepresivos y proponer acciones que contribuyan para que los enfermeros realicen una terapia segura y eficaz. Este es un estudio descriptivo transversal realizado en una Escuela de Enfermería pública en el estado de Sao Paulo entre marzo y noviembre de 2008. De los 273 participantes del estudio, 52 (19%) participantes utilizan o han utilizado antidepresivos. La orientación se realizó principalmente por el médico. Incluso, con la orientación previa a la administración de antidepresivos, la mayoría de los estudiantes (cII1 = 0,07, p> 0,05) tiene dudas sobre el uso de antidepresivos. La fluoxetina es el fármaco más utilizado. Acciones para generar mayor conocimiento sobre el uso y efectos terapéuticos de los antidepresivos por parte de las enfermeras, parecen necesarias y apropiadas.

Agentes Antidepresivos; Psicotrópicos; Enfermería Psiquiátrica; Estudiantes de Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Antidepressivos: uso e conhecimento entre estudantes de enfermagem

Plínio Tadeu IstilliI; Adriana Inocenti MiassoII; Cláudia Maria PadovanIII; José Alexandre CrippaIV; Carlos Renato TirapelliV

IAluno do curso de graduação em enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: pstilli@hotmail.com

IIEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: amiasso@eerp.usp.br

IIIPsicóloga, Doutor em Farmacologia, Professor Doutor, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: cpadovan@ffclrp.usp.br

IVMédico Psiquiatra, Professor Doutor, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, Brasil. E-mail: jcrippa@fmrp.usp.br

VFarmacêutico, Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: crtirapelli@eerp.usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este estudo teve como objetivos analisar o nível de conhecimento de estudantes universitários de enfermagem que usam antidepressivos e propor ações para que os enfermeiros contribuam para a farmacoterapia antidepressiva segura e efetiva. Trata-se de estudo transversal e descritivo, realizado em uma Escola de Enfermagem pública do Estado de São Paulo, entre março e novembro de 2008. Dos 273 estudantes entrevistados, 52 (19%) participantes utilizam ou já utilizaram antidepressivos. A orientação do uso dessa classe medicamentosa foi realizada majoritariamente pelo médico. Mesmo com a orientação pré-administração do antidepressivo, a maioria dos usuários (cII1=0,07; p>0,05) tem dúvida a respeito do uso de antidepressivos. A fluoxetina foi o medicamento antidepressivo mais utilizado. Ações para produzir maior conhecimento quanto ao uso, efeitos colaterais e terapêuticos dos antidepressivos, por parte dos enfermeiros, parecem ser necessárias e oportunas.

Descritores: Antidepressivos; Psicotrópicos; Enfermagem Psiquiátrica; Estudantes de Enfermagem.

Introdução

A depressão é um transtorno crônico e recorrente que se caracteriza por um ou mais episódios depressivos, com pelo menos duas semanas de humor deprimido ou perda de interesse na maior parte das atividades, acompanhados de, ao menos, quatro sintomas adicionais de depressão(1). Esses sintomas incluem: pessimismo persistente, sentimentos de culpa, dificuldade de concentração, desamparo, diminuição do desejo sexual, aumento da irritabilidade, insônia e perda de apetite(1-2). Sabe-se que a prevalência da depressão entre jovens com idade inferior a 20 anos de idade aumentou em todo o mundo(2). Descreveu-se, previamente, que a prevalência da depressão entre uma população de jovens pode chegar até a 8,3%(3) e que a frequência dos quadros depressivos é maior na população jovem estudantil do que na geral(4-5). Nesse sentido, os estudantes universitários têm sido alvo de muitos estudos sobre transtornos mentais. Estudo realizado com alunos de enfermagem mostra que 55% dos estudantes apresentam elevados níveis de sintomatologia depressiva(6). Em acordo com esse achado, recente estudo verificou que 41,4% de estudantes de enfermagem apresentaram grau de depressão variando de leve até grave(7).

Dois tipos de tratamento têm sido usados para tratar essa população: psicoterapia e terapia medicamentosa com antidepressivos (AD). Não obstante, aumento na prescrição de antidepressivos para jovens tem ocorrido nos últimos anos(2). O tratamento da depressão é realizado com a administração de medicamentos que pertencem a uma das seguintes classes: antidepressivos tricíclicos (ADTs), inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRSs), inibidores seletivos da recaptação da serotonina e noradrenalina (ISRSNs), inibidores da monoaminooxidase (iMAOs) e os antidepressivos atípicos(2). Dentre as diferentes classes de antidepressivos, os ISRSs são os medicamentos mais utilizados no tratamento de jovens com depressão, devido ao seu perfil com menores efeitos colaterais(2). Vários estudos trazem como questão central o importante papel do profissional de saúde na adesão ao tratamento. Esses estudos mostram que um dos fatores decisivos para a adesão ao tratamento é a confiança depositada pelo paciente na prescrição, na equipe de saúde e/ou no médico, pessoalmente(8-9). O enfermeiro desempenha, em seu trabalho, várias funções, sendo uma das mais tradicionais a função técnica, na qual a responsabilidade pela administração de medicação ocupa lugar de destaque. Esse encargo inclui: conhecimentos farmacológicos sobre as drogas; planejamento de estoque e armazenamento; orientação de funcionários, pacientes e familiares; avaliação do paciente antes e após ser medicado; cuidados com o preparo e administração do fármaco; avaliação e promoção dos efeitos terapêuticos; redução de efeitos adversos; redução de interações adversas e controle da toxicidade(10-11). Considerando o aumento da prevalência de depressão entre a população jovem e o fato de que há grande incidência desse transtorno entre universitários, o objetivo deste estudo foi avaliar a opinião do usuário de antidepressivo em relação à orientação sobre o uso do medicamento, verificar o conhecimento do usuário sobre o medicamento antidepressivo e caracterizar o padrão de consumo dos antidepressivos. Além disso, com base nos principais problemas identificados, são propostas ações que devem ser tomadas pelo profissional de enfermagem para que a terapia medicamentosa com antidepressivos seja feita de maneira segura e efetiva.

Metodologia

Realizou-se um estudo transversal e descritivo, em uma Escola de Enfermagem pública do Estado de São Paulo, entre os meses de março e novembro de 2008. Essa instituição possuía, na ocasião da coleta dos dados, quatro turmas do curso de bacharelado (80 alunos cada) e três turmas do curso de licenciatura (50 alunos cada), perfazendo o total de 470 alunos. Dos 390 alunos contatados, 273 manifestaram interesse em participar da pesquisa, dos quais 52 disseram fazer uso de antidepressivos e constituíram a amostra deste estudo. Os dados foram coletados por meio de um questionário fechado composto por quatro partes. Na primeira parte do questionário foram coletados dados de identificação dos sujeitos, na segunda parte o objetivo foi avaliar a opinião do usuário de antidepressivo em relação à orientação sobre o uso do medicamento, na terceira parte foram coletados dados a respeito do conhecimento do usuário sobre o medicamento antidepressivo e na última parte foi caracterizado o padrão de consumo dos antidepressivos (tipo de antidepressivo, dose, frequência de consumo, acompanhamento médico e motivo do consumo). Para a coleta dos dados foi empregada a técnica de autorrelato estruturada, utilizando como instrumento um questionário. As informações eram registradas pelos sujeitos (autopreenchimento), mas eles tinham a oportunidade de esclarecer dúvidas com o entrevistador(12). Não era obrigatório o preenchimento, mostrando-se a opção de devolvê-lo em branco. Para análise dos dados, foi utilizada abordagem quantitativa. Após a codificação de cada uma das variáveis, criou-se um dicionário de dados para a construção de um banco de dados eletrônico no programa Excel (Windows®). Os dados foram analisados estatisticamente no programa SPSS, versão 15.0. Análise de correlação dos dados foi realizada utilizando-se o teste de correlação de Pearson. Foram investigadas associações estatísticas entre as variáveis estudadas usando o teste qui-quadrado (cII), sendo a hipótese de associação aceita quando p<0,05. Foram investigadas correlações estatísticas entre as diferentes variáveis que compuseram o questionário, sendo elas: orientação quanto aos efeitos colaterais, interações medicamentosas, tempo para início da ação do antidepressivo, tipo (quem orientou) de qualidade da orientação (adequada ou não) e dúvidas quanto ao uso do medicamento. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Humanos da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (Protocolo n.0843/2007). Os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS 196/96).

Resultados

A frequência de participantes que utilizam ou já utilizaram medicamento antidepressivo foi de 52 estudantes, perfazendo o total de 19% dos 273 participantes da pesquisa. Dos 52 participantes usuários de antidepressivos, 25 eram do curso de bacharelado e 27 do curso de licenciatura. Os dados de identificação e socioeconômicos dos participantes são apresentados na Tabela 1.

A maioria dos participantes do estudo (96,1%) recebeu orientação quanto aos efeitos colaterais, interações medicamentosas e tempo para início da ação do antidepressivo (cII1=44,30; p<0,05). A orientação foi realizada majoritariamente pelo médico (cII1=46,10; p<0,05) sendo citada uma única vez o psicólogo (Tabela 2). A maioria dos participantes (98,1 %) considera a orientação importante (cII1=48,10; p<0,05) para aumentar a confiança, segurança e efetividade da terapia, minimizar os efeitos colaterais e interações medicamentosas. Ainda que ocorra a orientação pré-administração, no uso de antidepressivos, não há diferença significativa (cII1=0,07; p>0,05) entre usuários que apresentam dúvidas (51,9%) e aqueles que não apresentam dúvidas (48,9%) (Tabela 2).

Na Tabela 3, que se refere ao conhecimento sobre as ações dos antidepressivos, verificou-se que 44,2% dos participantes não sabem qual o tempo para início da ação dos antidepressivos. Além disso, a maioria dos usuários de antidepressivos acredita que esses medicamentos possam causar tolerância e dependência. Observou-se que os participantes não aumentam a dose do antidepressivo sem consentimento médico. No entanto, não houve diferença significativa (cII1=0,49; p>0,05) entre o número de participantes que interrompeu o tratamento sem consultar o médico e aqueles que não interromperam.

Dos 52 participantes que utilizam ou utilizaram o medicamento, 31 (59,6%) não apresentam efeitos colaterais e apenas 17 (32,7%) relataram sofrer com esses efeitos (4 náusea, 2 vômito, 6 ansiedade, 2 diarreia, 4 dor de cabeça, 4 insônia, 3 ganho de peso, 2 tontura, 6 redução do interesse sexual, 10 relataram outros efeitos). Praticamente metade dos participantes que fazem uso de antidepressivos (48,1%) utiliza outro medicamento em conjunto com o antidepressivo, sendo o diazepam o medicamento mais utilizado (9,6%). Outros medicamentos como a amitriptilina (5,8%), alprazolan (3,8%), propranolol (3,8%), lorazepam (1,9%) e carbamazepina (1,9%) foram citados.

Houve correlação positiva entre dúvidas a respeito do tratamento e o fato de os participantes terem interrompido o tratamento sem consultar o médico. Observou-se, ainda, correlação positiva entre o uso de outros medicamentos e o aparecimento de efeitos colaterais. No entanto, não houve correlação positiva entre dúvidas quanto ao tratamento e orientação sobre o uso de antidepressivo. Também não foi observada correlação entre o período para início dos efeitos dos antidepressivos e a interrupção do tratamento sem conhecimento do médico. Do mesmo modo, não houve correlação positiva entre a presença de efeitos colaterais e o aumento da dose sem consulta prévia ao médico (Tabela 4).

A fluoxetina foi o medicamento mais utilizado no tratamento da depressão na população em estudo (Figura 1). A idade em que foi utilizado o medicamento pela primeira vez variou de 14 a 35 anos, e a dose utilizada variou de 10 a 60mg. Constatou-se um dado alarmante de que 42,3% dos participantes utilizam o medicamento sem a prescrição médica e não realizam acompanhamento médico. Os motivos pelos quais o medicamento era usado incluem ansiedade, angústia, depressão, cefaleia tensional, insônia, alteração de humor, nervosismo, infelicidade, distimia, distúrbios alimentares, estresse, síndrome do pânico, falta de concentração, desânimo excessivo, hospitalização e depressão pós-acidente.


Discussão

A utilização de medicamentos antidepressivos por jovens, em geral, pode chegar a 8,3%(3) e, de acordo com os resultados do presente estudo, observou-se que a utilização desses medicamentos é maior em jovens universitários estudantes de enfermagem, uma vez que 19% dos participantes utilizam medicamentos antidepressivos. Tais resultados estão de acordo com dados da literatura que descrevem maior prevalência de depressão entre jovens universitários, sendo que, de 40 a 55% dos estudantes de enfermagem, apresentam elevados níveis de sintomatologia depressiva(6-7). Entretanto, os resultados do presente estudo devem ser interpretados com cautela, uma vez que a grande maioria da amostra estudada era do sexo feminino e se sabe que depressão e ansiedade (condições que mais requerem a prescrição de ADs) têm prevalência maior em mulheres do quem em homens. Neste estudo, a maioria dos usuários de antidepressivos realizou o acompanhamento médico e seguiu a prescrição médica, demonstrando confiança no tratamento e nas orientações recebidas do médico. Essa observação é corroborada pelo fato de que não houve correlação positiva entre a presença de efeitos colaterais e o aumento da dose do medicamento sem consulta prévia ao médico. Vários estudos trazem como questão central o importante papel do profissional de saúde na adesão ao tratamento. Esses estudos mostram que um dos fatores decisivos para a adesão ao tratamento é a confiança depositada pelo paciente na prescrição, na equipe de saúde ou no médico, pessoalmente(8-9). Este estudo confirma esses dados ao revelar que grande percentual dos usuários acredita que a orientação feita pelo profissional de saúde, quanto ao uso adequado de medicamentos, aumenta a segurança e confiança na terapia. O enfermeiro tem papel fundamental na orientação e criação de vínculo com o paciente para aumentar a confiança, segurança e efetividade da terapia medicamentosa(10). Mesmo com toda essa responsabilidade no processo de implantação e manutenção da terapia medicamentosa, não se observou a participação do enfermeiro na orientação pré-administração do medicamento, ficando essa responsabilidade quase totalmente restrita ao médico. Com base nos dados deste estudo, não é possível afirmar a razão pela qual o enfermeiro não participou da instrução do paciente quanto ao uso do medicamento antidepressivo. Entretanto, isso deve ter ocorrido pelo fato de que, no nosso meio, a maioria dos atendimentos de casos de depressão e ansiedade (diagnósticos que mais demandam a prescrição de antidepressivos) está centrada na dualidade médico/paciente, o que, normalmente, ocorre em nível ambulatorial. A maior participação do enfermeiro ocorre, mais frequentemente, no contexto de internação ou semi-internação, em serviços nos quais a participação multidisciplinar é mais valorizada. A orientação médica mostrou-se eficiente em relação à dose do medicamento e à etapa final do tratamento, onde a maioria dos usuários evidenciou saber que o medicamento deve ser retirado de maneira gradual. No entanto, é importante ressaltar que, apesar de quase a totalidade dos participantes ter recebido orientação médica sobre o uso do antidepressivo, muitos apresentaram dúvidas e conceitos errados acerca desses medicamentos. Nesse sentido, observou-se que houve correlação positiva entre o surgimento de dúvidas a respeito do tratamento com antidepressivos e o fato de os participantes terem interrompido o tratamento sem consultar o médico. Esse aspecto é importante, pois a interrupção do tratamento sem consultar o médico pode levar ao reaparecimento dos sintomas depressivos(10). O fato de que grande parte dos participantes deste estudo não saber que há um período de latência, superior a duas semanas, para observação do efeito antidepressivo do medicamento, pode interferir diretamente na terapia medicamentosa, uma vez que os usuários de antidepressivos, por não observarem melhoria imediata no quadro, após início do tratamento, podem interrompê-lo ou, ainda, aumentar a dose do medicamento a fim de observar os efeitos desejados. Além disso, a educação, quanto ao período para observação dos primeiros efeitos antidepressivos do medicamento, não gera falsas expectativas no paciente, fato que pode aumentar a adesão do mesmo ao tratamento(10). Constatou-se, também, que grande parte dos usuários de antidepressivos acredita que o medicamento possa causar tolerância e/ou dependência, fatos que não estão associados ao uso desse tipo de medicamento. Essa constatação é preocupante, uma vez que a maioria dos estudantes usuários de antidepressivos já possui conhecimento em relação à ação farmacológica desses medicamentos. O desconhecimento em relação à ação farmacológica de medicamentos por estudantes de enfermagem foi previamente descrito, e esse fato foi atribuído à pouca relação entre a teoria e a prática profissional, fato que gera dificuldades em compreender e aplicar os princípios farmacológicos na prática cotidiana(13).

A prescrição de múltiplas medicações é realidade que requer atenção e cuidado constantes. Há correlação positiva entre o uso de outros medicamentos e o aparecimento de efeitos colaterais, e grande parte dos participantes faz uso de outros medicamentos além dos antidepressivos. O cuidado com a prescrição de múltiplas medicações inclui a revisão dos medicamentos em uso e o conhecimento extensivo desses, sempre tentando minimizar o número de substâncias utilizadas, monitorando e valorizando efeitos colaterais e tóxicos(14). A base para a identificação e compreensão das interações medicamentosas está no conhecimento de fisiologia, fisiopatologia, mecanismos de ação dos fármacos, mas, também, de atenção voltada à observação clínica do paciente, caracterizando sintomas e sua evolução ao longo do tratamento. A fluoxetina é o antidepressivo mais utilizado e alguns usuários fazem uso conjunto de antidepressivos e do ansiolítico diazepam, associação potencialmente perigosa uma vez que o diazepam é substrato da enzima CYP 2C19(15) que promove metabolização hepática desse composto. A fluoxetina pode aumentar as concentrações plasmáticas de diazepam por inibição de seu metabolismo(16), o que poderia levar a prejuízos psicomotores e na atenção. O conjunto de dados apresentados identifica vários pontos onde existem dúvidas acerca da terapia medicamentosa com antidepressivos. As ações de enfermagem, frente a tal quadro, devem incluir a estruturação de um plano educacional pré-administração, onde sejam fornecidas informações sobre o tempo para início do efeito do medicamento e possíveis efeitos colaterais associados ao uso de antidepressivos. O enfermeiro deve, ainda, providenciar lista, por escrito, dos principais medicamentos que apresentam interação medicamentosa com antidepressivos e instruir o paciente a nunca utilizar outro medicamento sem conhecimento prévio do médico. Essas ações aumentam a adesão do paciente ao tratamento, uma vez que não cria falsas expectativas em relação à terapia com antidepressivos(10).

Estudos recentes mostram que é alta a incidência de depressão(17) e de consumo de psicofármacos entre alunos de enfermagem(18). Este estudo corrobora esses dados e mostra, ainda, que há desconhecimento por parte dos estudantes usuários de antidepressivos em relação à ação desses medicamentos.

Conclusões

Dezenove por cento dos estudantes de enfermagem entrevistados utilizam ou já utilizaram medicamento antidepressivo, sendo a fluoxetina o medicamento mais prescrito. Na população do presente estudo, o enfermeiro não participou na orientação do paciente na fase que antecede a administração do medicamento, ficando esse papel restrito ao médico. A maioria dos usuários de antidepressivos acredita que a orientação feita pelo profissional de saúde, quanto ao uso adequado de medicamentos, aumenta a segurança e confiança na terapia. Apesar das orientações, grande percentual de usuários ainda tem dúvidas quanto ao uso de antidepressivos, destacando-se o desconhecimento em relação ao tempo de início para observação do efeito antidepressivo, capacidade do medicamento em causar tolerância e/ou dependência e as possíveis interações medicamentosas. É importante ressaltar que a amostra deste estudo é composta por estudantes de enfermagem que deveriam estar preparados para orientar pacientes em uso de antidepressivos. A razão para tal desconhecimento não está clara, mas pode incluir pouca relação entre a teoria e a prática profissional. Ações futuras com o objetivo de produzir maior conhecimento quanto ao uso, efeitos colaterais e terapêuticos dos antidepressivos, por parte dos enfermeiros em formação, parecem ser, particularmente, necessárias e oportunas.

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  • Corresponding Author:
    Carlos Renato Tirapelli
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Ago 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      01 Dez 2009
    • Recebido
      06 Jun 2009
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