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Desenvolvimento e validação de conteúdo da nova versão de um instrumento para classificação de pacientes

Resumos

Este estudo teve como propósito reconstruir o instrumento de classificação de pacientes, proposto por Perroca, e avaliar a validade de conteúdo da nova versão. A apreciação do instrumento foi realizada por um grupo de especialistas, constituídos por dez enfermeiros, mediante aplicação da técnica Delphi. A coleta de dados ocorreu no período de março de 2008 a fevereiro de 2009, por meio de questionários estruturados, enviados por correio eletrônico. A nova versão passou a ser constituída por nove áreas de cuidados. Houve concordância >90% em relação à estrutura do instrumento e de 80 a 96% nas áreas de cuidados. O refinamento de instrumentos de classificação é de fundamental importância para geração de dados válidos e confiáveis, embasando a tomada de decisão gerencial relativa ao planejamento da assistência e mensuração de carga de trabalho da equipe de enfermagem.

Pacientes Internados; Carga de Trabalho; Estudos de Validação; Avaliação em Enfermagem


The purpose of this study was to reconstruct Perroca's patient classification instrument; and to assess the content validity of the new version. A group of experts comprising ten nurses appraised the instrument, using the Delphi technique. Data collection took place from March 2008 to February 2009 by means of structured questionnaires sent by electronic mail. The new version contained nine nursing care areas. Agreement levels on the instrument structure amounted to > 90%, and ranged between 80 and 96% in the nursing care areas. The refinement of classification instruments is of great importance to generate valid and reliable data, supporting management decision making on nursing care planning as well as nursing workload measurement.

Inpatients; Workload; Validation Studies; Nursing Assessment


Este estudio tuvo como propósito reconstruir el instrumento de clasificación de pacientes propuesto por Perroca y evaluar la validez de contenido de la nueva versión. La apreciación del instrumento fue realizada por un grupo de expertos constituidos por diez enfermeros mediante aplicación de la Técnica Delphi. La recolección de datos ocurrió en el período de marzo de 2008 a febrero de 2009 a través de cuestionarios estructurados enviados por correo electrónico. La nueva versión pasó a ser constituida por nueve áreas de cuidados. Hubo concordancia > 90% en relación a la estructura del instrumento y de 80 a 96% en las áreas de cuidados. El refinamiento de instrumentos de clasificación es de fundamental importancia para generación de datos válidos y confiables en los cuales se puede basar la toma de decisiones de administración relativa a la planificación de la asistencia y mensuración de carga de trabajo del equipo de enfermería.

Pacientes Internos; Carga de Trabajo; Estudios de Validación; Evaluación en Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Desenvolvimento e validação de conteúdo da nova versão de um instrumento para classificação de pacientes1

Marcia Galan Perroca

Enfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Adjunto, Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, SP, Brasil. E-mail: marcia.perroca@famerp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Este estudo teve como propósito reconstruir o instrumento de classificação de pacientes, proposto por Perroca, e avaliar a validade de conteúdo da nova versão. A apreciação do instrumento foi realizada por um grupo de especialistas, constituídos por dez enfermeiros, mediante aplicação da técnica Delphi. A coleta de dados ocorreu no período de março de 2008 a fevereiro de 2009, por meio de questionários estruturados, enviados por correio eletrônico. A nova versão passou a ser constituída por nove áreas de cuidados. Houve concordância >90% em relação à estrutura do instrumento e de 80 a 96% nas áreas de cuidados. O refinamento de instrumentos de classificação é de fundamental importância para geração de dados válidos e confiáveis, embasando a tomada de decisão gerencial relativa ao planejamento da assistência e mensuração de carga de trabalho da equipe de enfermagem.

Descritores: Pacientes Internados/Classificação; Carga de Trabalho; Estudos de Validação; Avaliação em Enfermagem.

Introdução

Nos últimos anos, é possível perceber que a introdução do modelo da prática sustentada em evidências e a importância dada à obtenção de resultados, no serviço de enfermagem, têm levado à utilização cada vez maior de ferramentas de gestão. Para atender essa demanda, pesquisadores têm se preocupado em desenvolver instrumentos específicos, em realizar adaptação transcultural ou aprimorar os já existentes, disponibilizando escalas válidas e confiáveis para os usuários.

Validade e confiabilidade constituem-se em critérios essenciais para avaliação da qualidade de um instrumento. Validade é conceituada como o grau em que o instrumento se mostra apropriado para mensurar aquilo que supostamente deveria medir, em outras palavras, o propósito pelo qual está sendo usado. A confiabilidade refere-se ao seu grau de precisão, ou seja, quando suas medidas conseguem refletir, de forma precisa, as medidas reais do atributo investigado(1).

Sistema de classificação de pacientes (SCP) tem sido implementado, por muitas décadas, em diferentes países, para monitoraramento contínuo da carga de trabalho da equipe de enfermagem, por meio da identificação da complexidade assistencial do paciente. As variações captadas nas necessidades de cuidados possibilitam ajuste quanti/qualitativo de pessoal, de forma a se obter relação equilibrada entre carga de trabalho e capital humano disponível, favorecendo a qualidade e custo/efetividade do cuidado proporcionado. O conhecimento das necessidades de atenção dos pacientes também permite planejamento eficaz da assistência e de alta, alocação de pacientes nas unidades, avaliação da qualidade da assistência e fortalece a argumentação sobre necessidades adicionais de pessoal de enfermagem(2-3).

No Brasil, a classificação de pacientes, segundo o SCP, é recomendada pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), através da Resolução 293/04(4); como uma das variáveis para instrumentalizar decisões sobre pessoal. Contudo, parece que a aplicação desse instrumento vem sendo lentamente incorporada à prática diária do enfermeiro.

O instrumento de classificação

No final da década de noventa, Perroca(5) desenvolveu um instrumento para identificar as necessidades de cuidados do paciente em relação à enfermagem e, consequentemente, mensurar a carga de trabalho da equipe. O instrumento original(5-6) está baseado nas necessidades individualizadas dos cuidados de enfermagem e se destina a pacientes adultos. É composto por 13 áreas de cuidados: estado mental e nível de consciência, oxigenação, sinais vitais, nutrição e hidratação, motilidade, locomoção, cuidado corporal, eliminações, terapêutica, educação à saúde, comportamento, comunicação e integridade cutâneo-mucosa. Cada um dos indicadores varia de pontuação de 1 (menor nível de atenção de enfermagem) a 5 (nível máximo de complexidade assistencial). A pontuação mínima é de 13 e a máxima de 65 pontos. Através do instrumento, o paciente pode ser classificado em uma das quatro categorias de cuidados: mínimos (13-26 pontos), intermediários (27-39 pontos), semi-intensivos (40-52 pontos) e intensivos (53-65 pontos).

Estudos conduzidos para avaliar as propriedades psicométricas desse instrumento(6) mostraram que ele apresentava evidências de confiabilidade e validade. A utilização do instrumento, nas diversas instituições hospitalares, fez emergir comentários, por parte de alguns enfermeiros, de que ele não estimaria, adequadamente, a categoria de cuidados do paciente. A fim de examinar essa questão, foram realizados estudos: comparação com um instrumento internacional(7); obtenção da opinião dos usuários sobre a estrutura, aplicabilidade e confiabilidade dos dados gerados(8) e análise dos indicadores de cuidados mais relevantes inter e intracategorias de cuidados(8).

Os resultados dessas investigações evidenciaram moderado nível de concordância entre os instrumentos nas diferentes categorias de cuidados(7) e, ainda, que os usuários investigados mostravam-se satisfeitos com o instrumento de classificação proposto, exceto por certa tendência em subestimar a categoria de cuidados a que o paciente pertencia(8). Também, sugeriram o acréscimo de outros fatores que impactam a carga de trabalho da equipe de enfermagem(8).

Diante desses resultados, iniciou-se revisão do instrumento, contemplando atualização de seu conteúdo e renovação de sua estrutura, para estar em conformidade com os avanços nas ciências da saúde e incorporar as novas tendências da prática assistencial e gerencial do enfermeiro, na última década. Este estudo abordou as etapas iniciais do processo de desenvolvimento e validação da nova versão de um SCP e objetivou: 1. reconstruir o instrumento de classificação de pacientes proposto por Perroca(5-6) e 2. avaliar a validade de conteúdo da nova versão.

Método

Delineamento da Pesquisa

A nova versão do instrumento foi desenvolvida em duas fases. Para geração dos itens (áreas de cuidados) foram consideradas a opinião dos usuários do instrumento original(8); resultados de investigação quanto à contribuição dos indicadores para a classificação dos pacientes nas diferentes categorias de cuidados(8); revisão de literatura e visitas a instituições hospitalares no exterior. O referencial utilizado relacionou-se a conceitos básicos de SPC(2,9); carga de trabalho em enfermagem(10-11); necessidades de cuidados dos pacientes(12-13); desenvolvimento de instrumentos(14) e análise de instrumentos internacionais(3,15-17).

Subsequentemente, a validade de conteúdo, ou seja, a verificação da relevância dos itens propostos e sua representatividade em captar adequadamente o conceito que se deseja medir(1); foi avaliada mediante aplicação da técnica Delphi. Essa técnica procura obter consenso na opinião de especialistas sobre um assunto, através de uma série de questionários estruturados, referidos como fases. As respostas de cada questionário são consideradas para reformulação dos subsequentes. Dessa forma, cada fase é construída sobre as respostas da fase anterior e o processo continua até que se obtenha concordância entre os participantes (consenso)(18).

Consideraram-se como critérios de seleção para a composição do painel de especialistas ter experiência mínima de cinco anos na assistência direta ao paciente e/ou na gerência de enfermagem, ensino e pesquisa. Dessa forma, fizeram parte do painel dez enfermeiros, sendo cinco docentes e cinco que atuavam na função docente e assistencial. Os juízes eram do sexo feminino, apresentando idade média de 48,9±4,9 anos, com tempo médio de atuação profissional de 23,8±8,3 anos. Oito eram doutores em enfermagem e dois eram mestres. No que se refere à trajetória profissional, as áreas de atuação predominantes foram gerenciamento do serviço de enfermagem, enfermagem médico-cirúrgica, unidade de terapia intensiva, ginecologia e obstetrícia e pediatria e neonatologia.

Procedimento para coleta de dados

A coleta de dados ocorreu no período de março de 2008 a fevereiro de 2009, após parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa (Protocolo nº3262/2006) e consentimento dos juízes. Foram considerados como validadas as áreas de cuidados que obtiveram índice de concordância, nas respostas dos juízes, maior ou igual a 80%. O critério de consenso foi definido previamente.

Os questionários, enviados por correio eletrônico, consistiram em uma escala Likert de cinco pontos, contendo, na primeira parte, dez afirmações sobre a estrutura do instrumento e, na segunda, sete afirmações relacionadas a cada área de cuidado. As afirmações consideraram os aspectos relevância, clareza, objetividade, nível de complexidade assistencial e aplicabilidade do instrumento. Foram atribuídos escores de cinco às respostas "concordo totalmente" e de um para aquelas "discordo totalmente". Quando a afirmativa foi formulada negativamente (afirmativas 5 e 6 na avaliação da estrutura e afirmativas 4 e 5 na avaliação das áreas de cuidados), o escore foi invertido, conforme recomendação da literatura(1); ou seja, o valor um foi atribuído aos que concordaram totalmente e o valor cinco àqueles que discordaram totalmente. Solicitou-se, também, que fossem assinaladas se as áreas de cuidados deveriam ser mantidas, excluídas ou modificadas. Perguntas abertas do questionário permitiram aos participantes tecer outras considerações sobre a estrutura e áreas de cuidados. Junto ao primeiro questionário, foi solicitado aos juízes o preenchimento de dados referentes às características pessoais e profissionais.

Análise dos dados

A análise estatística foi realizada mediante a utilização do programa Minitab Statistical Software (Minitab), versão 12.22. Os dados descritivos estão apresentados como porcentagens, médias e desvio padrão. Considerou-se a escala Likert como nível de mensuração ordinal e foram calculados mediana e quartis (Q1 e Q3). Os dados subjetivos foram agrupados, categorizados e relacionados, segundo o objetivo do estudo.

Resultados

Reconstrução do instrumento

Na proposta da nova versão, algumas áreas de cuidados do instrumento original foram excluídas ou fundidas em seu conteúdo e outras acrescentadas, para permitir mensuração mais acurada da complexidade assistencial dos pacientes e dos recursos de enfermagem utilizados pelos mesmos. Dessa forma, foram consideradas as seguintes áreas de cuidados: 1- planejamento e coordenação do processo de cuidar; 2- investigação e monitoramento; 3- cuidado corporal e eliminações; 4- nutrição e hidratação; 5- locomoção ou atividade; 6- terapêutica; 7- suporte emocional e 8- educação à saúde. Cada uma das áreas possui gradação de 1 a 4, apontando a intensidade crescente de complexidade assistencial. Os intervalos de pontuação ficaram estabelecidos como: 8-11 pontos (cuidados mínimos), 12-18 (cuidados intermediários), 19-25 (cuidados semi-intensivos) e 26-32 (cuidados intensivos).

Considerou-se, para elaboração dos intervalos dos escores, que o paciente permaneceria em uma dada categoria se obtivesse o valor mínimo de uma gradação em todas as áreas de cuidados, até cerca de 40% de áreas de cuidados na gradação posterior.

Apreciação dos juízes

A técnica Delphi foi aplicada em três fases para se alcançar consenso sobre a estrutura e o conteúdo da nova versão do instrumento de classificação.

Fase Delphi 1

As respostas do primeiro questionário mostraram que, no que se refere à estrutura do instrumento, houve concordância superior a 80%, exceto na afirmativa 2, relativa à existência de clareza nos enunciados (74% - mediana -Md 4,0) e na afirmativa 8 concernente à observação de nível de complexidade assistencial crescente nas gradações das áreas de cuidados (78% - Md 4,0). O mais baixo nível de concordância foi encontrado nas afirmativas 5 (extensão) e 6 (complexidade do instrumento), com percentuais, cada uma, de 38% - Md 2,0 (Tabela 1).

O percentual de concordância nas diferentes áreas de cuidados variou de 82% (Md 4,5-5,0) a 96% (Md 5,0). A afirmativa 4 (extensão) apresentou percentuais de concordância variando entre 34% (Md 2,0) e 46% (Md 2,0) e a afirmativa 5 (complexidade do instrumento) variações de 38% (Md 2,0) a 44% (Md 2,0) (Tabela 2).

Contudo, embora os juízes tivessem concordado sobre a manutenção das áreas de cuidados apresentadas, houve sugestão para modificação da estrutura e conteúdo de algumas delas em relação à forma de quantificação das atividades, ordenação das gradações e uso de terminologias mais apropriadas. Argumentou-se que medidas de prevenção de úlcera por pressão seriam mais bem classificadas como cuidado e não monitoramento e também sobre o elevado número de variáveis na área de cuidado investigação e monitoramento, dificultando sua avaliação. Sugeriu-se a separação das variáveis, nessa área, em dois domínios ou categorias.

Fase Delphi 2

As apreciações dos juízes embasaram a construção do segundo questionário. A área de cuidado investigação e monitoramento foi desdobrada, originando nova área, denominada cuidado com pele e mucosas. Dessa forma, o instrumento passou a contar com nove áreas de cuidados e houve revisão dos escores para classificação do paciente, observando-se os mesmos critérios citados anteriormente. Foram retirados os termos que denotavam subjetividade e melhor explicados os enunciados que não apresentavam clareza. Algumas gradações das áreas de cuidados foram associadas ou sofreram alterações para evidenciar a complexidade assistencial crescente.

As respostas do segundo questionário mostraram que, no que se refere à estrutura do instrumento, o grau de concordância variou de 80% (Md 4,0) a 94% (Md 5,0). O aspecto clareza nos enunciados apresentou o menor percentual: 80% (Md 4,0) (Tabela 1). A área de cuidado planejamento e coordenação do processo de cuidar (AC1) apresentou percentual de concordância abaixo de 80%, nos seguintes aspectos: clareza nos enunciados 70% (Md 4,0), estabelecimento de linguagem comum entre profissionais 78% (Md 4,5) e representatividade das atividades que consomem maior quantidade de tempo 76% (Md 4,0). A área cuidado com pele e mucosas (AC4) mostrou percentual de 80% (Md 4,0) de concordância, no aspecto representatividade das atividades que consomem maior quantidade de tempo. Os percentuais de concordância das demais áreas de cuidados variaram de 88% (Md 5,0) a 98% (Md 5,0) e foram considerados validados (Tabela 3). Foi assinalado por alguns dos juízes que o aspecto mudança de decúbito estava sendo duplamente pontuado, na área de cuidados locomoção e atividade e cuidado com pele e mucosas.

Fase Delphi 3

Dessa forma, foi elaborada a versão 3 do instrumento, incorporando as alterações solicitadas pelos juízes. Planejamento e coordenação do processo de cuidar foi amplamente reestruturado, procurando-se obter maior clareza e concisão. Na área cuidado com pele e mucosas foram alteradas algumas terminologias e acrescentou-se a complexidade técnica do curativo e algumas medidas preventivas. A atividade mudança de decúbito passou a fazer parte do conteúdo da área cuidado com pele e mucosas. Foram realizadas alterações nos escores para contemplar situações em que os pacientes não pontuam em algumas áreas de cuidados.

O grau de concordância na área planejamento e coordenação do processo de cuidar (AC1) variou de 80% (Md 4,0) a 96% (Md 5,0). Alguns juízes discordaram da não inclusão de atividades administrativas realizadas pelo enfermeiro, nessa área de cuidado. Obteve-se concordância de 92% (Md 4,0) a 96% (Md 5,0) (Tabela 4) em cuidado com pele e mucosas. A versão final do instrumento não pode ser apresentada neste artigo devido à sua extensão, contudo, pode ser disponibilizada pela autora aos interessados.

Discussão

O refinamento de um instrumento é processo trabalhoso e longo. É preciso definir claramente o conceito sobre investigação (constructo). No caso de SCP, o constructo constitui-se das necessidades de cuidados dos pacientes. Uma vez que elas são inúmeras e multidimensionais, não podem ser representadas em sua totalidade. O objetivo do instrumento não é ser uma listagem completa de todas as atividades de cuidados realizadas pela enfermagem, pois, dessa forma, se tornaria extenso e exaustivo; mas, sim, conter as dimensões representativas do cuidar que mais impactam na carga de trabalho da equipe de enfermagem.

Dessa forma, questões relativas ao desenho estrutural, tais como extensão e forma de apresentação dos itens, tornam-se de fundamental importância. Procurou-se tornar o instrumento mais curto em comparacão à versão original, sem comprometer a informação coletada. Algumas características de instrumentos de classificação têm sido preconizadas na literatura como forma de favorecer sua utilização como norteador de decisões e sua aceitabilidade. Simplicidade, clareza, objetividade e não consumir muito tempo para seu preenchimento têm sido critérios enfatizados(9). A apreciação dos juízes, neste estudo, evidenciou que ele parece preencher esses requisitos.

Nesta nova versão do instrumento, o número de áreas de cuidados foi reduzido para nove, em comparação às 13 do instrumento original. Algumas áreas foram mantidas, houve fusão de conteúdo e, ainda, acréscimo de outras para retratar com mais fidelidade as reais necessidades do paciente. Muitos aspectos que não faziam parte do instrumento anterior e que consomem tempo da equipe de enfermagem foram contemplados, tais como planejamento da assistência, auxílio em exames diagnósticos e terapêuticos, avaliação clínica do enfermeiro, atendimento de urgências e emergências, medidas preventivas de úlcera de pressão, dentre outras.

Em pesquisa anterior(8); usuários relataram a percepção de que o instrumento parecia não retratar a complexidade do paciente, conforme ela era observada por eles. Isso significa que o julgamento clínico do enfermeiro e a avaliação objetiva, obtida por meio do instrumento, pareciam não estar congruentes. Assim, na nova estrutura, além das alterações no conteúdo das áreas de cuidados, a padronização do escore foi revisada. Substitui-se o método anteriormente utilizado de intervalo de classe igual entre as diversas categorias por intervalos diferenciados, considerando-se que os pacientes que apresentam mais de 40% de características da gradação seguinte devem pertencer, também, a essa categoria de cuidados.

Outra alteração importante foi a exclusão da participação do acompanhante em algumas áreas de cuidados (nutrição e hidratação, motilidade, locomoção, cuidado corporal, eliminações). Apesar de se reconhecer a importante contribuição do familiar/acompanhante na recuperação do paciente ele não pode ser obrigado a assumir responsabilidade pelo ato de cuidar, responsabilidade essa que sempre será da enfermagem. Uma vez que sua presença influencia nas horas de assistência, por necessitarem de orientação e supervisão pelo enfermeiro, esse aspecto foi considerado nas áreas de cuidados suporte emocional e educação à saúde. Assim, o instrumento passou a contar com quatro gradações para direcionar a complexidade do cuidado.

A sistematização da assistência de enfermagem (SAE) é de fundamental importância para instrumentalizar e humanizar as ações do enfermeiro. Sua realização e documentação, em todas as fases, demandam tempo e impactam a carga de trabalho. Alguns estudos(19-20) têm se preocupado em mensurar o tempo gasto nessa atividade e encontrado valores diferenciados. Embora tenham sido realizados em hospital de ensino, torna-se importante ressaltar que utilizam diferentes métodos (tempo estimado e tempo observado), mensuram diferentes fases do processo, alguns têm linguagem padronizada e usam sistema informatizado, o que dificulta a comparação dos achados.

Buscando atender à necessidade de operacionalização da SAE e contemplar sua influência sobre a carga de trabalho do enfermeiro, foi incorparada à nova versão a área de cuidados planejamento e coordenação do processo de cuidar. Para elaboração de seu conteúdo, foram considerados aspectos referentes ao acesso à informação sobre o paciente, comunicação com profissionais de enfermagem e de outras áreas, utilização de recursos para a realização do cuidado e documentação. Investigações internacionais têm mostrado que atividades de documentação representam 13%(21) e de 18-27%(22) do tempo gasto pelo enfermeiro.

Não foram consideradas, entretanto, atividades administrativas por duas razões: a maior parte dessas atividades são atribuições do enfermeiro supervisor ou coordenador e não do enfermeiro clínico; os instrumentos de classificação são estruturados a partir do conceito do cuidar, ou seja, mensuram os cuidados que acontecem na presença do paciente e/ou de sua família (cuidados diretos) e aqueles realizados fora de sua presença, mas na preparação ou para complementação do cuidado (cuidados indiretos)(23). Cuidados diretos e indiretos têm representado cerca de 80% das atividades realizadas pelos enfermeiros, e, desse percentual, cerca de 50% se refere a atividades de cuidado indireto(24).

Diferentes conceitos de carga de trabalho podem ser encontrados na literatura internacional e, consequentemente, afetam sua forma de mensuração. Alguns autores consideram que ela compreende apenas os cuidados diretos e indiretos realizados(25) e outros que ela deve também incluir, atividades não relacionadas ao paciente, como gerenciamento da unidade e da equipe de enfermagem(11).

No que se refere a instrumentos de classificação, torna-se importante ressaltar seu propósito fundamental de gerar informação sobre o paciente para administração do cuidado, refletindo o serviço oferecido para o paciente/família. A incorporação de outras variáveis não específicas para o paciente, tais como elementos de operação da unidade, na estrutura dos instrumentos, não é recomendada, pois pode comprometer a precisão dos dados desejados(23).

Conclusão

Este artigo abordou as etapas iniciais do desenvolvimento e validação da nova versão de um SCP. O objetivo era criar um instrumento que possibilitasse identificar a quantidade de recursos de enfermagem requerida pelos pacientes e, consequentemente, monitorar a carga de trabalho da equipe de enfermagem. Essa reconstrução se mostrou complexa, pois envolve uma série de fatores que intervêm no processo de trabalho do enfermeiro. necessitando, ainda, mais extensas e aprofundadas investigações.

O instrumento demonstrou validade de conteúdo na opinião de especialistas. Contudo, necessita, ainda, ser submetido a novos testes para avaliação de outras propriedades psicométricas, dentre elas consistência interna, confiabilidade entre avaliadores e validade de constructo. Espera-se que a nova versão possa representar, com mais fidelidade, as atividades e o tempo gasto pela equipe de enfermagem no processo de cuidar.

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  • Corresponding Author:
    Marcia Galan Perroca
    Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP)
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2011

    Histórico

    • Aceito
      10 Dez 2010
    • Recebido
      24 Maio 2010
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