Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação da sensibilidade e da especificidade dos critérios para isolamento de pacientes admitidos em um hospital especializado em oncologia

Resumos

O isolamento precoce de pacientes, possivelmente colonizados por microrganismos multirresistentes, pode minimizar sua disseminação, reduzindo os casos de infecção hospitalar e os custos associados. O objetivo deste estudo foi identificar a sensibilidade e especificidade dos critérios para isolamento de pacientes admitidos num hospital especializado em oncologia. Como método, usou-se o estudo transversal. A população foi composta por 61 pacientes, admitidos no período de 1º março a 31 de agosto de 2009, e procedentes de outros hospitais. Foi preenchido instrumento de coleta de dados no momento da admissão e colhidas amostras da região nasal e anal para cultura microbiológica. Os resultados mostraram que, dos 56 pacientes que preencheram os critérios de isolamento, 30 (49,2%) tiveram culturas positivas para microrganismos multirresistentes e o Staphylococcus aureus resistente à oxacilina foi o mais frequentemente identificado. A maioria dos pacientes colonizados foi isolada no momento da admissão. Conclui-se que a sensibilidade dos critérios para isolamento foi de 90% e a especificidade de 6,5%.

Infecção Hospitalar; Resistência Microbiana a Medicamentos; Isolamento de Pacientes; Enfermagem


Early isolation of patients possibly colonized by multi-resistant microorganisms can minimize their spread, reducing cases of hospital infection and the related costs. This study aimed to identify the sensitivity and specificity of the criteria for isolation of patients admitted to a specialized cancer hospital. Cross-sectional study with a population of 61 patients coming from other hospitals who were admitted to the hospital between March 1st and August 31th, 2009. At the moment of admission, a data collection instrument was filled out and nasal and anal swabs were collected for microbiological culture. Of the 56 patients who met the isolation criteria, 30 (49.2%) presented positive cultures for multi-resistant microorganisms and methicillin-resistant Staphylococcus aureus was the most frequently identified microorganism. Most patients colonized by multi-resistant microorganisms were isolated at the moment of admission. The sensitivity of the isolation criteria was 90% and the specificity was 6.5%.

Hospital Infection; Drug Resistance, Microbial; Patient Isolation; Nursing


El aislamiento precoz de pacientes posiblemente colonizados por microorganismos multirresistentes puede minimizar su diseminación, reduciendo los casos de infección hospitalaria y los costos asociados. El objetivo de este estudio fue identificar la sensibilidad y especificidad de los criterios para aislamiento de pacientes admitidos en un hospital especializado en oncología. Se trata de un estudio transversal cuya población fue compuesta por 61 pacientes admitidos en el período de 01 marzo a 31 de agosto de 2009 y procedentes de otros hospitales. Fue llenado un instrumento de recolección de datos en el momento de la admisión y recogidas muestras de la región nasal y anal para cultura microbiológica. De los 56 pacientes que llenaron los criterios de aislamiento, 30(49,2%) tuvieron culturas positivas para microorganismos multirresistentes y el Staphylococcus aureus resistente a la oxacilina fue el más frecuentemente identificado. La mayoría de los pacientes colonizados fue aislada en el momento de la admisión. La sensibilidad de los criterios para aislamiento fue de 90% y la especificidad de 6,5%.

Infección Hospitalaria; Farmacorresistencia Microbiana; Aislamiento de Pacientes; Enfermería


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da sensibilidade e da especificidade dos critérios para isolamento de pacientes admitidos em um hospital especializado em oncologia

Caroline CataneoI; Silvia Rita Marin da Silva CaniniII; Paulo de Tarso Oliveira e CastroIII; Miyeko HayashidaIV; Elucir GirV

IEnfermeira, Hospital de Câncer de Barretos, SP, Brasil. Mestranda, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: carocataneo@ig.com.br

IIEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Doutor, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: canini@eerp.usp.br

IIIMédico Infectologista, Hospital de Câncer de Barretos, SP, Brasil. E-mail: ccih@hcancerbarretos.com.br

IVEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: miyeko@eerp.usp.br

VEnfermeira, Doutor em Enfermagem, Professor Titular, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, SP, Brasil. E-mail: egir@eerp.usp.br

Endereço para correspondência

RESUMO

O isolamento precoce de pacientes, possivelmente colonizados por microrganismos multirresistentes, pode minimizar sua disseminação, reduzindo os casos de infecção hospitalar e os custos associados. O objetivo deste estudo foi identificar a sensibilidade e especificidade dos critérios para isolamento de pacientes admitidos num hospital especializado em oncologia. Como método, usou-se o estudo transversal. A população foi composta por 61 pacientes, admitidos no período de 1o março a 31 de agosto de 2009, e procedentes de outros hospitais. Foi preenchido instrumento de coleta de dados no momento da admissão e colhidas amostras da região nasal e anal para cultura microbiológica. Os resultados mostraram que, dos 56 pacientes que preencheram os critérios de isolamento, 30 (49,2%) tiveram culturas positivas para microrganismos multirresistentes e o Staphylococcus aureus resistente à oxacilina foi o mais frequentemente identificado. A maioria dos pacientes colonizados foi isolada no momento da admissão. Conclui-se que a sensibilidade dos critérios para isolamento foi de 90% e a especificidade de 6,5%.

Descritores: Infecção Hospitalar; Resistência Microbiana a Medicamentos; Isolamento de Pacientes; Enfermagem.

Introdução

O aumento gradativo da resistência dos microrganismos aos antimicrobianos usados na prática clínica tem contribuído, efetivamente, para que as infecções hospitalares sejam consideradas problema de saúde pública, não só no Brasil, mas na maioria dos países do mundo(1).

As infecções hospitalares têm grande relevância epidemiológica, tanto no contexto da atenção primária à saúde quanto na assistência hospitalar, por contribuírem para a elevação das taxas de morbidade e de mortalidade e do tempo de permanência dos pacientes no hospital e, consequentemente, onerarem os custos do tratamento(2).

Os fatores de risco para a aquisição de infecções hospitalares podem ser endógenos como idade, uso de imunossupressores, antimicrobianos e quimioterápicos, estado nutricional, presença de doença crônica, tempo prolongado de internação em instituições hospitalares, doença de base, entre outros; ou exógenos como infecção cruzada, procedimentos invasivos, uso de materiais e equipamentos contaminados, baixa adesão à higienização das mãos, limpeza e desinfecção inadequadas do ambiente, presença de vetores como insetos e roedores(3).

Nos pacientes com câncer, os fatores de risco podem sobrepor-se, pois, além do imunocomprometimento causado pela própria patologia, são submetidos a tratamento cirúrgico, quimioterápico e/ou radioterápico, sendo a neutropenia, induzida pela quimioterapia, um dos maiores riscos para infecção nessa população(4).

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), cerca de 10% dos pacientes internados em hospitais infectam-se devido a procedimentos invasivos e/ou a terapia imunossupressora. São considerados colonizados por microrganismos multirresistentes os pacientes que apresentam cultura positiva para os microrganismos resistentes, definidos segundo os critérios de cada hospital, e que não manifestam sinais de processo infeccioso e infectados aqueles que apresentam cultura positiva e manifestam sinais infecciosos(5).

As bactérias que comumente causam doenças em pacientes imunocomprometidos são as mesmas que acometem indivíduos imunocompetentes, os gram-positivos são responsáveis por 60 a 70% dos episódios de infecções, documentados microbiologicamente em pacientes neutropênicos, e os microrganismos mais frequentes são estafilococos coagulase negativa e enterococos resistentes à vancomicina(6).

As complicações infecciosas nos pacientes oncológicos geralmente são graves e potencialmente fatais, justificando assim medidas de prevenção e controle. Segundo o Guideline Management of multidrug-resistant organisms in healthcare settings(7) as intervenções recomendadas para o controle de microrganismos multirresistentes, nos serviços de saúde, são agrupadas em sete categorias, sendo elas o apoio administrativo, o uso criterioso de antimicrobianos, a vigilância de rotina, a utilização das precauções padrão e de contato, as medidas ambientais e educativas e a descolonização.

A vigilância ativa vem sendo apontada como importante componente dos programas de controle de microrganismos multirresistentes, uma vez que permite a detecção precoce de microrganismos emergentes, a monitorização das tendências epidemiológicas e a verificação da eficácia das intervenções empregadas. Várias estratégias vêm sendo utilizadas para detecção da colonização assintomática, dentre elas a coleta de material para cultura de vigilância e, mais recentemente, a utilização de preditores, também denominados critérios clínicos como tempo de internação, uso de antibioticoterapia e internação prévia em unidade de terapia intensiva(7-8).

A cultura de vigilância tem sido apontada como a abordagem mais sensível para identificação de pacientes colonizados. Alguns estudos recomendam sua realização em todos os pacientes admitidos no hospital, independentemente da avaliação dos critérios de risco(9-10). Porém, o tempo despendido para a realização dos testes microbiológicos e o alto custo do procedimento têm dificultado a implementação dessa rotina na maioria dos hospitais, sendo a utilização dos critérios clínicos opção promissora e de menor custo, quando comparada à cultura de vigilância(8).

Diante desse panorama, julgou-se oportuna a realização do presente estudo que teve como objetivo identificar a sensibilidade e especificidade dos critérios para isolamento de pacientes, admitidos num hospital especializado em oncologia. Espera-se que estudos dessa natureza possam contribuir para a implementação de precauções de contato, durante a admissão de pacientes em instituições de saúde.

Material e Método

Trata-se de estudo transversal, desenvolvido no Hospital de Câncer de Barretos, SP, instituição especializada em oncologia, considerada de referência nacional para o tratamento de câncer.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do referido hospital (Processo nº180/2008). Os sujeitos que concordaram em participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

A população foi composta por 61 pacientes, com idade igual ou superior a 18 anos, internados no período de 1o de março a 31 de agosto de 2009, provenientes de internação em outros hospitais.

Para a coleta de dados foram elaborados dois instrumentos, o primeiro destinado à obtenção dos dados demográficos idade e sexo, clínicos como tipo de internação e doenças de base e presença de procedimentos invasivos, além dos critérios clínicos: internação prévia em outra instituição de saúde e/ou centro de terapia intensiva e/ou uso prévio de antimicrobiano no hospital de origem e/ou lesão cutânea ou ferida operatória com exsudato purulento. O segundo instrumento foi destinado à coleta dos dados microbiológicos.

O Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH), do hospital em estudo, elaborou, em 2008, protocolo para a admissão de pacientes procedentes de internação em outros hospitais, com o intuito de minimizar a disseminação de microrganismos multirresistentes. O protocolo consiste na instituição das precauções de contato e coleta de swab nasal e anal para os pacientes que preencherem um dos critérios clínicos, descritos anteriormente. Os enfermeiros da instituição estão capacitados para a aplicação do protocolo e são responsáveis pela avaliação de cada paciente, na ocasião da admissão, pela indicação das precauções de contato e coleta de swab.

O laboratório de microbiologia e o SCIH definiram como microrganismos resistentes Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina, Escherichia coli e Klebsiella spp produtoras de betalactamase de espectro estendido (ESBL), Pseudomonas aeruginosa e Acinetobacter spp resistentes ou sensíveis somente ao meropenen ou imipenem, Enterococcus faecalis e Enterococcus faecium resistente à vancomicina.

Os dados demográficos, clínicos e resultados microbiológicos foram coletados pelo pesquisador responsável pela investigação. O banco de dados foi estruturado e analisado por meio do programa para microcomputador Statistical Package Social Science (SPSS), versão 17.0 for Windows. Para verificar a acurácia da conduta de isolamento no momento admissão, foram calculados os valores de sensibilidade, especificidade dos critérios clínicos. A sensibilidade refere-se à habilidade de o teste identificar corretamente indivíduos que apresentam determinada condição, ou doença, e especificidade à habilidade do teste identificar corretamente indivíduos que não apresentam determinada condição ou doença.

Resultados

Na Tabela 1, tem-se a distribuição dos pacientes, segundo as variáveis demográficas e clínicas. Dos 61 pacientes 42 (68,9%) eram do sexo masculino. A média de idade foi de 56,8 anos (dp=15,1), mediana de 56 anos, variando de 18 a 86 anos. A maioria dos pacientes (57,4%) foi internada por motivos clínicos, com tumor sólido (93,5%) e alguns (26,2%) apresentavam procedimento invasivo no momento da admissão.

Em relação aos critérios clínicos, 55,7% estiveram internados por sete dias ou mais em enfermarias comuns, 8,2% internados em unidades de terapia intensiva e 36,1% fizeram uso prévio de antibioticoterapia. Destaca-se que 49,2% dos pacientes não souberam informar se usaram ou não antibiótico e/ou não havia registro desse dado no prontuário de saúde.

Observa-se, na Tabela 2, que 13 pacientes não preencheram nenhum critério para instituição de precauções de contato no momento da admissão, porém 5 (16,7%) apresentaram resultado de cultura positiva para microrganismo multirresistente, sendo que as medidas de precauções de contato foram instituídas posteriormente, ou seja, após o resultado ser conhecido pelos profissionais do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar. Ressalta-se que 19,67% dos pacientes preencheram mais de um critério clínico.

A Tabela 3 mostra os dados relativos aos resultados do swab nasal na admissão do paciente no hospital. O microrganismo de maior prevalência foi Staphylococcus aureus, presente em 19 (31,1%) pacientes e apenas um (1,6%) estava colonizado com Klebsiella spp produtora de ESBL.

Em relação aos resultados do swab anal, os microrganismos mais frequentemente identificados foram Staphylococcus aureus em 20 (32,8%) pacientes, seguido por Escherichia coli produtora de ESBL em quatro (6,6%), Klebsiella spp produtora de ESBL em três (4,9%) e Enterococcus faecalis resistente a vancomicina em um (1,6%).

Observa-se, na Tabela 4, que os critérios clínicos adotados para a instituição das precauções de contato dos pacientes, provenientes de outras instituições de saúde e admitidos no Hospital de Câncer de Barretos, apresentaram sensibilidade de 90,0%, e especificidade de 6,5%.

Em relação aos cinco pacientes que não preencheram os critérios para instituição de precaução de contato na ocasião da admissão, três pacientes apresentaram swab com resultado positivo para microrganismo multirresistente, sendo necessária a instituição das precauções de contato.

Discussão

O controle de microrganismos multirresistentes é tema atual e pertinente dada a crescente evolução da resistência microbiana, tornando-o problema mundial crescente, uma vez que a indústria farmacêutica não consegue acompanhar a evolução dessa resistência. Os critérios clínicos investigados no presente estudo são apontados como fatores de risco para aquisição de microrganismos multirresistentes(11-12).

O critério uso prévio de antimicrobianos é importante fator de risco para a aquisição de microrganismos multirresistentes. No entanto, não foi possível avaliar o efeito dessa variável, visto que 30 (49,2%) pacientes não souberam informar se fizeram ou não uso de antibiótico no hospital de origem ou essa informação não constava nos registros de admissão no prontuário de saúde.

Quanto ao tempo de internação maior ou igual a sete dias, dos 61 pacientes procedentes de outros hospitais, 34 (55,7%) preencheram esse critério. Esse dado confirma que internação hospitalar prévia é importante fator de risco para colonização por microrganismo multirresistente, uma vez que quanto maior a permanência do indivíduo no ambiente hospitalar maior a possibilidade de aquisição e/ou disseminação desses microrganismos(13).

Estudo(12) que investigou fatores de risco para colonização para enterococo resistente à vancomicina (VRE) identificou que a exposição a ambiente hospitalar, internações prolongadas, internação em UTI, presença de patologia onco-hematológica, quimioterapia, pacientes com insuficiência renal em tratamento dialítico, transplantados, imunossuprimidos e em uso de cateteres endovenosos foram os mais frequentes.

Destaca-se que o fator de risco internação em unidade terapia intensiva, no hospital de origem, foi identificado em cinco (8,2%) pacientes, sendo que um apresentou cultura positiva para microrganismo multirressistente.

Ressalta-se que os centros de terapia intensiva concentram as maiores taxas de incidência de infecções hospitalares, e são consideradas epicentros de emergência de resistência microbiana, devido à internação de pacientes graves. Esses pacientes, na maioria das vezes, utilizam antimicrobianos de largo espectro e são submetidos a inúmeros procedimentos invasivos.

Pesquisa(14) que investigou fatores de risco para infecção hospitalar, em um centro de terapia intensiva de um hospital de ensino, identificou que pacientes com internação prévia no CTI apresentaram risco de 1,93 (IC: 1,48-2,49) vezes para o desenvolvimento de infecções quando comparados aos procedentes da comunidade. Os pacientes colonizados por microrganismos resistentes desenvolveram altas taxas de infecção (61,6%) e tiveram risco relativo de 9,5 (IC: 7,7-11,7; p<0,05), quando comparados aos não colonizados por microrganismos resistentes. Os microrganismos resistentes mais frequentemente isolados foram Acinetobacter baumanni (36,3%), Pseudomonas aeruginosa (21,9%), Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (14,7%), Klebsiella pneumonia (11%) e Escherichia coli (7,8%). Assim, os pacientes egressos dessa unidade se matêm como importante reservatório de microrganismos multirresistentes, podendo disseminá-los para outros pacientes, na própria unidade, para os demais setores do hospital ou, ainda, para outras instituições de saúde.

Em relação aos procedimentos invasivos, 11 pacientes (18%) estavam com cateter venoso periférico e quatro (6,6%) com sonda vesical de demora na admissão e, embora esses não fizessem parte dos critérios clínicos para instituição das precauções de contato, o uso de cateteres endovenosos foi apontado como um dos fatores de risco mais frequentes para a colonização por Enterococcus resistentes à vancomicia (VRE)(15).

Quanto aos resultados dos swabs nasais e anais dos pacientes na internação, ressalta-se que Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina (MRSA) foi o mais frequente tanto no swab nasal (31,1%) quanto no swab anal (32,8%), seguido pela Klebsiella spp. produtora de ESBL (1,6% no swab nasal e 4,9% no anal), pelo Enterococcus faecalis resistente vancomicina/teicoplanina (1,6%) no swab anal e E.coli no swab anal (6,6%)

Durante as duas últimas décadas, o MRSA tornou-se o mais prevalente e importante microrganismo resistente causador de infecções hospitalares. Além da tendência persistente, envolve, também, classes adicionais de antimicrobianos tais como os glicopeptídeos(16).

Pacientes colonizados por MRSA estão em maior risco para desenvolverem infecção por esse microrganismo, posteriormente. Estudo(17), que investigou a colonização na admissão e durante o período de internação, evidenciou que 19% dos pacientes colonizados por MRSA na admissão e 25% dos que se tornaram colonizados, durante a internação, desenvolveram infecção por esse microrganismo.

No presente estudo, apenas um paciente (1,6%) apresentou resultado positivo para Enterococcus faecalis resistente vancomicina/teicoplanina (VRE). Estudo que investigou os fatores de risco para colonização retal, por VRE, mostrou que, apesar de o grupo de pacientes colonizados apresentar com maior frequência imunossupressão, neutropenia e câncer, enquanto patologia de base, essas variáveis não apresentaram relação estatisticamente significante com o estado de colonização. No entanto, o uso prévio de antibioticoterapia foi associado à aquisição desse microrganismo, sobretudo o uso de vancomicina e cefalosporinas de terceira geração(12).

Embora a prevalência de Klebsiella produtora de betalactamase de espectro estendido (ESBL) tenha sido baixa, respectivamente em 1,6 e 4,9% dos swabs nasal e anal. Estudo caso controle(18) identificou que 55,6% isolados de Klebisiella pneumoniae e 9,4% isolados de E.coli eram produtoras de ESBL e a mortalidade total em sessenta dias foi significativamente maior entre isolados produtores de ESBL, o que evidencia a necessidade de medidas preventivas para esses microrganismos.

A prevenção e controle de microrganismos multirresistentes constituem-se num dos maiores desafios dos Serviços de Controle de Infecção Hospitalar. Diversas medidas de controle têm sido utilizadas pelas instituições de saúde, e alguns países europeus têm conseguido manter baixa prevalência de MRSA, por meio da adoção de culturas de vigilância ativa e da instituição das precauções de contato(19).

A sensibilidade dos critérios para a instituição de precauções de contato para pacientes procedentes de outros hospitais foi de 90% e a especificidade, 6,5%. Destaca-se que, dos oito pacientes que não preencheram critérios para isolamento na admissão, cinco (16,5%) apresentaram resultado positivo para microrganismo multirresitente. Podendo-se inferir que, provavelmente, esses pacientes tenham feito uso de antibiótico, mas não souberam informar.

A introdução de um conjunto de intervenções, destacando-se a vigilância ativa, a instituição das precauções de contato e o teste rápido para detecção de colonização reduziu em 70% os casos de bacteremia causados por MRSA(20). Porém, a cultura de vigilância para MRSA foi considerada efetiva e seu custo justificado, quando adotada em unidades classificadas como de alto risco, o que contribui para a diminuição da taxa de infecção por MRSA, no hospital(21). Por outro lado, a utilização de critérios clínicos para isolar pacientes colonizados por MRSA e VRE mostrou-se efetiva e de menor custo quando comparada à cultura de vigilância(8).

Ressalta-se que a identificação precoce de pacientes colonizados favorece a adoção de medidas preventivas para evitar a disseminação de microrganismos multirresistentes no hospital. As normas de precauções de contato são muito bem definidas, porém, ainda não são plenamente incorporadas à prática nas diferentes instituições de saúde(22).

O conhecimento deficiente em relação aos mecanismos de transmissão de microrganismos multirresistentes pode contribuir para a baixa adesão às medidas de isolamento(23). Estudo(24), que investigou o conhecimento e comportamento dos profissionais de um centro de terapia intensiva quanto à adoção das precauções de contato, identificou que os profissionais de enfermagem apresentaram cerca de quatro vezes mais chance (OR=3,58; IC 1,48-8,68) de ter comportamento adequado quando comparados aos demais profissionais de saúde e que não houve associação estatisticamente significativa entre conhecimento e comportamento (p=0,196).

A adoção de medidas preventivas para microrganismos multirresistentes deve ser implementada não só pela equipe de enfermagem, uma vez que outras categorias profissionais têm participado ativamente do cuidado aos pacientes hospitalizados.

Apesar das limitações quanto à não avaliação do espectro dos antibióticos utilizados pelos pacientes, internação prévia nos seis meses que antecederam a internação atual, a intensidade e duração da neutropenia, o tipo de tratamento quimioterápico e presença de comorbidades, o estudo permitiu identificar que os critérios adotados no hospital para a instituição das precauções de contato apresentaram 90% de sensibilidade, ou seja, a maioria dos pacientes que apresentaram culturas positivas para microrganismos multirresistentes foi isolada na admissão.

Conclusão

Este estudo reforça a importância da adoção de critérios clínicos para a admissão de pacientes provenientes de outros hospitais, visando a prevenção e controle de microrganismos multirresistentes, uma vez que os critérios adotados no hospital para a instituição das precauções de contato apresentaram 90% de sensibilidade. Entretanto, aponta a necessidade de futuras investigações sobre outros possíveis fatores de risco para colonização dessa clientela específica.

Referências

  • 1
    Organização Mundial de Saúde (OMS). Vencendo a resistência microbiana. World health report on infections disease - 2000.[acesso 20 março 2010].Disponivel em:http://www.ccih.med.br/vencendoresistencia.html
  • 2. Wernitz MH, Keck S, Swidsinski S, Veit SK. Cost analysis of a hospital-wide selective screening programme for methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) carriers in the context of diagnosis related groups (DRG) payment. Clin Microbiol Infect. 2005;11(6):466-71.
  • 3
    Ministério da Saúde (BR). Portaria nº 2.616 de 26 de maio de 1998, que regulamenta as ações de controle de infecção hospitalar no país. Brasília(DF): Ministério da Saúde;1998.
  • 4.Cavalcante NJF. Infecçăo em paciente imunologicamente comprometido. In: Fernandes AT. Infecçăo hospitalar e suas interfaces na área da saúde. Săo Paulo (SP): Atheneu; 2000. p. 670-82.
  • 5
    Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) (BR). Investigação e controle de bactérias multirresistentes. Brasília (DF); 2007. 21 p.
  • 6. Mendes AV, Sapolnik R, Mendonça N. New guidelines for the clinical management of febrile neutropenia and sepsis in pediatric oncology patients. J Pediatr.2007;63(2): 54-63.
  • 7. Siegel JD, Rhinehart E, Jackson M, Chiarello L. Management of multidrug-resistant organisms in heslthcare settings. 2006. [acesso 6 jun 2009]. Disponível em: http://www.cdc.gov/ncidod/dhqp/pdf/ar/mdroGuideline2006.pdff
  • 8. Morgan DJ, Day HR, Furuno JP, Young A, Johnson JK, Bradham DD et al. Improving efficiency in active surveillance for methicillin-resistant Staphylococcus aureus or vancomycin-resistant Enterococcus at hospital admission. Infect Control Hosp Epidemiol. 2010;31(12):1230-5.
  • 9. Lucet JC, Chevret S, Durand-Zaleski I, Chastang C; Regnier B. Prevalence and risk factors for carriage of methicillin-resistant Staphylococcus aureus at admission to the intensive care unit: results of a multicenter study. Arch Intern Med. 2003;163(2):181-8.
  • 10. Furuno JP, McGregor JC, Harris AD, Johnson JA, Langenberg P, Venezia RA, et al. Identifying groups at high risk for carriage of antibiotic-resistant bacteria. Arch Intern Med. 2006;166(5):580-5.
  • 11. Hidron AI, Kourbatova EV, Halvosa JS, Terrel B J, McDougal LK, Blumberg HM et al. Risk factors for colonization with methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) in patients admitted to an urban hospital: emergence of community-associated MRSA nasal carriage. Clin Infect Dis. 2005;41(2):159-66.
  • 12. Askarian M, Afkhamzadeh R, Monabbati A, Daxboeck F, Assadian O. Risk factors for rectal colonization with vancomycin-resistant enterococci in Shiraz, Iran. Int J Infect Dis. 2008;12(2):171-5.
  • 13. Ferrareze MVG, Leopoldo VC, Andrade D, Silva MFI, Haas VJ. Multi-resistant Pseudomonas aeruginosa among patients from an intensive care unit: persistent challenge? Acta Paul. Enferm.2006;20(1):7-11.
  • 14. Oliveira AC, Kovner CT, Silva RS. Infecçăo hospitalar em unidade de tratamento intensivo de um hospital universitário brasileiro. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2010;18(2):233-9.
  • 15. Centinkaya Y, Falk P, Mayhall G. Vancomycin-resistant enterococci. Clin Microbiol Rev. 2000;13(4):686-707.
  • 16. Solberg CO. Spread of Staphylococcus aureus in hospitals: causes and prevention. Scand J Infect Dis.2000;32(6):587-95.
  • 17. Davis KA, Moran KA, McAllister CK, Gray PJ. Multidrug-resistant Acinetobacter extremiliy infections in soldiers. Emerg Infect Dis.2005;1(8):1218-24.
  • 18. Superti S V, Augusti G, Zavascki AP. Fatores de risco e mortalidade de infecçőes da corrente sanguínea por Klebsiella pneumoniae and Escherichia coli produtores de beta-lactamase de espectro estendido. Rev Inst Med Trop Săo Paulo. 2009;51(4):211-6.
  • 19. Muto CA, Jernigan JA, Ostrowsky BE, Richet HM, Jarvis WR, Boyce JM, Farr BM. SHEA guideline for preventing nosocomial transmission of multidrug-resistant strains of Staphylococcus aureus and enterococcus. Infect Control Hosp Epidemiol. 2003; 24(5):362-86.
  • 20. Chowers MY, Paitan Y, Gottesman BS, Gerber B, Ben-Nissan Y, Shirit P. Hospital-wide methicillin-resistant Staphylococcus aureus control program: a 5 year follow-up. Infect Control Hosp Epidemiol. 2009;30(8):778-81.
  • 21. Clancy M, Graepler MT., Wilson M, Douglas I, Johnson J, Price CS. Active screening in high-risk unitis is an efecctive and cost-avoidant method to reduce the rate of methicillin-resistant Staphylococcus aureus infection in the hospital. Infect Control Hosp Epidemiol. 2006;2(10):1009-17.
  • 22. Nichiata LYI, Gir E, Takahashi RF, Ciosak SI. Evoluçăo dos isolamentos em doenças transmissíveis: os saberes na prática contemporânea. Rev Esc Enferm USP. 2004;38(1):61-70.
  • 23. Moura JP, Gir E. Conhecimento dos profissionais de enfermagem referente ŕ resistencia bacteriana a múltiplas drogas. Acta Paul Enferm. 2007;20(3):351-6.
  • 24. Oliveira AC, Cardoso CS, Mascarenhas D. Conhecimento e comportamento dos profissionais de um centro de terapia intensiva em relaçăo ŕ adoçăo das precauçőes de contato. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(5):625-31.
  • Corresponding Author:
    Silvia Rita Marin da Silva Canini
    Universidade de São Paulo. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
    Departamento de Enfermagem Geral e Especializada
    Av. dos Bandeirantes, 3900
    Bairro: Monte Alegre
    CEP: 14040-902, Ribeirão Preto, SP, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Recebido
      07 Jun 2010
    • Aceito
      17 Mar 2011
    Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / Universidade de São Paulo Av. Bandeirantes, 3900, 14040-902 Ribeirão Preto SP Brazil, Tel.: +55 (16) 3315-3451 / 3315-4407 - Ribeirão Preto - SP - Brazil
    E-mail: rlae@eerp.usp.br