Estudo retrospectivo dos erros de imunização notificados em um Sistema de Informação on-line^*

Resumos

Objetivo:

analisar os erros de imunização notificados em um Sistema de Informação on-line.

Método:

estudo retrospectivo realizado com dados do Sistema de Informação da Vigilância de Eventos Adversos Pós-Vacinação. Os erros de imunização foram analisados com relação às características demográficas e ao processo de vacinação. Foram calculadas frequências e taxas de incidência dos erros. Os testes binomial e qui-quadrado foram utilizados para verificar diferenças nas proporções das variáveis.

Resultados:

foram analisados 501 erros, a maioria envolvendo doses de rotina (92,6%), sem Evento Adverso Pós-Vacinação (90,6%) e em crianças menores de cinco anos (55,7%). Os tipos de erros mais frequentes foram inadequação na indicação do imunobiológico (26,9%), intervalo inadequado entre doses (18,2%) e erro na técnica de administração (14,2%). A taxa de incidência global de erros foi de 4,05/100.000 doses aplicadas; as maiores incidências das vacinas de rotina foram para vacina antirrábica humana, papiloma vírus humano e tríplice viral; a taxa de incidência de erros com Eventos Adversos Pós-Vacinação foi de 0,45/100.000 doses aplicadas.

Conclusão:

verificou-se que erros de imunização são uma realidade a ser enfrentada pelos sistemas de saúde, porém são passíveis de prevenção por meio de intervenções como adoção de protocolos, checklists e educação permanente em saúde.

Descritores:
Vacinação; Imunização; Segurança do Paciente; Registros Eletrônicos de Saúde; Efeitos Adversos; Efeitos Colaterais e Reações Adversas Relacionados a Medicamentos

Objective:

to analyze the immunization errors reported in an online Information System.

Method:

retrospective study conducted with data from the Adverse Event Following Immunization Surveillance Information System. Immunization errors were analyzed with respect to demographic characteristics and the vaccination process. Frequencies and error incidence rates have been calculated. Binomial and chi-square tests were used to verify differences in the proportions of the variables.

Results:

501 errors were analyzed, the majority involving routine doses (92.6%), without Adverse Event Following Immunization (90.6%) and in children under five years old (55.7%). The most frequent types of errors were inadequacy in the indication of the immunobiological (26.9%), inadequate interval between doses (18.2%) and error in the administration technique (14.2%). The overall error incidence rate was 4.05/100,000 doses applied; the highest incidences of routine vaccines were for human rabies vaccine, human papillomavirus and triple viral; the incidence rate of errors with Adverse Events Following Immunization was 0.45/100,000 doses applied.

Conclusion:

it was found that immunization errors are a reality to be faced by the health systems, but they are amenable to prevention through interventions such as the adoption of protocols, checklists and permanent education in health.

Descriptors:
Vaccination; Immunization; Patient Safety; Electronic Health Records; Adverse Effects; Drug-Related Side Effects and Adverse Reactions

Objetivo:

analizar los errores de inmunización reportados en un Sistema de Información en línea.

Método:

estudio retrospectivo realizado con datos del Sistema de Información de Vigilancia de Eventos Adversos Posteriores a la Vacunación. Los errores de inmunización se analizaron con respecto a las características demográficas y el proceso de vacunación. Se calcularon las frecuencias y las tasas de incidencia de errores. Se utilizaron pruebas binomiales y de chi-cuadrado para verificar las diferencias en las proporciones de las variables.

Resultados:

se analizaron 501 errores, la mayoría con dosis de rutina (92,6%), sin evento adverso posterior a la vacunación (90,6%) y en niños menores de cinco años (55,7%). Los tipos de errores más frecuentes fueron la insuficiencia en la indicación del inmunobiológico (26,9%), el intervalo inadecuado entre las dosis (18,2%) y el error en la técnica de administración (14,2%). La tasa de incidencia de error global fue de 4,05/100.000 dosis aplicadas; las mayores incidencias de las vacunas de rutina fueron para la vacuna contra la rabia humana, el virus del papiloma humano y el triple viral; La tasa de incidencia de errores con los eventos adversos posteriores a la vacunación fue de 0,45/100.000 dosis aplicadas.

Conclusión:

se encontró que los errores de inmunización son una realidad que deben enfrentar los sistemas de salud, pero se pueden prevenir mediante intervenciones como la adopción de protocolos, checklists y educación permanente en salud.

Descriptores:
Vacunación; Inmunización; Seguridad del Paciente; Registros Electrónicos de Salud; Efectos Adversos; Efectos Colaterales y Reacciones Adversas Relacionados con Medicamentos

Introdução

A imunização é um componente-chave dos esforços empreendidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para atingir o terceiro objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas até 2030, que é o de assegurar uma vida saudável, promover o bem-estar para todos, em todas as idades, por meio da redução da taxa de mortalidade infantil e materna, de doenças transmissíveis e não transmissíveis, incluindo a garantia ao acesso a vacinas seguras e de qualidade⁽¹⁾.

Nas últimas décadas, o número de doenças imunopreveníveis quase dobrou e, para esse fim, o número de doses de vacinas aumentou para crianças e adultos⁽²⁾. Com o aumento do número de doses aplicadas, o potencial de erros de imunização (EI) também aumentou de forma global⁽²⁾. Além disso, apesar do avanço nos sistemas de vigilância da imunização, em todo o mundo, EI são, frequentemente, subnotificados⁽²⁾. Os EI podem ser conceituados como quaisquer eventos evitáveis decorrentes do uso inadequado de vacinas, podendo estar relacionados à prática profissional e ao uso imprudente de imunobiológicos, os quais, fora das normas e de técnicas adequadas, podem levar a impactos negativos, tais como proteção imunológica inadequada, aumento dos custos para os serviços de saúde, redução da confiança e potenciais lesões dos usuários dos sistemas de saúde⁽³⁾. Os EI podem causar eventos adversos pós-vacinação (EAPV) e resultar em danos graves aos usuários^(4-6).

Os EI ocorrem em uma frequência alarmante⁽⁷⁾. Estudos conduzidos em países desenvolvidos verificaram alta taxa de EI envolvidos na administração de vacinas^(3,8-9). Aproximadamente um terço dos usuários experimenta pelo menos um EI⁽⁷⁾. Em revisão sistemática realizada em cinco países de língua inglesa foi identificada uma prevalência de erro na vacinação de 1,15 por 10.000 doses de vacinas⁽¹⁰⁾. Na Europa, um estudo que analisou dados do sistema de vigilância de EAPV mostrou que de 233.285 registros de vacinação, em 3,0% foram identificados relatos de pelo menos um EI e, desses, mais da metade (59,9%) resultaram em desfechos graves⁽⁸⁾. No Canadá, um estudo retrospectivo de 3.504 relatórios de EAPV estimou uma taxa de EI de 0,39 a cada 100 mil doses aplicadas (d.a.)⁽¹¹⁾. Nos Estados Unidos da América (EUA), análise do sistema de vigilância de EAPV mostrou que de 21.843 EI no país, dentre as quais, em 25% dos casos, houve algum dano ao usuário⁽³⁾.

A literatura internacional mostra que os EI mais comuns são relacionados ao esquema inadequado (por exemplo: vacinação incompleta), erros de armazenamento e distribuição, vacina incorreta, doses incorretas, intervalo/tempo incorreto e erros de administração^(3,8-9).

Muitos EI ocorrem em detrimento da complexidade dos programas de vacinação. O Brasil oferta imunobiológicos à sua população, por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI), uma das mais expressivas políticas públicas brasileiras, considerado um dos mais completos e complexos programas de vacinação do mundo, reconhecido internacionalmente por sua excelência^(12-13). O PNI ampliou, de forma considerável, a oferta de imunobiológicos nos últimos anos enfrentando, assim, novos desafios^(12-13). Atualmente, disponibiliza mais de 300 milhões de doses anuais de 44 diferentes tipos de imunobiológicos, incluindo vacinas de rotina, soros e imunoglobulinas nas, por volta de, 34 mil salas de vacinação existentes⁽¹⁴⁾.

Desde 2009, o PNI adota o Sistema de Informações do PNI (SI-PNI) com o módulo Sistema de Informação de EAPV (SI-EAPV), o qual, desde 2014, existe no formato on-line, com o objetivo de favorecer melhor obtenção, descrição, vigilância e análise dos dados de EAPV e EI^(12,15-16).

No Brasil, são escassos os estudos sobre a epidemiologia dos EI, dentre eles, poucos analisaram os tipos de erros envolvidos na imunização^(6,15,17-18). Por exemplo, um estudo nacional que analisou 1.622 notificações com encerramento do SI-EAPV, mostrou que 9,3% representavam EI sem EAPV e 0,8% EI com EAPV⁽¹⁵⁾. Outro estudo no Paraná (Região Sul), mostrou a ocorrência de 604 registros de tipos de EAPV decorrentes de EI, sendo frequentes o abscesso subcutâneo quente, abscesso subcutâneo frio e linfadenopatia regional supurada⁽⁶⁾. Em Goiânia (Estado de Goiás, Região Centro-Oeste), um estudo mostrou que entre os 373 EAPV analisados em crianças, em 16,1% ocorreram EI, sendo os mais frequentes vacina administrada fora da idade recomendada, vacina administrada com data de validade vencida, intervalo inadequado entre as doses e vacina aplicada em local incorreto⁽¹⁸⁾.

Há uma lacuna na literatura sobre EI, pois há poucos estudos conduzidos em países em desenvolvimento, como o Brasil, que mostram a magnitude dos EI. Os estudos existentes, em sua maioria, não relatam a taxa de incidência dos EI estratificada por tipo de imunobiológico. Embora o risco para os EAPV relacionados às vacinas tenha recebido considerável atenção nos últimos anos^(4-6), estudos sobre EAPV relacionados aos EI também têm sido pouco desenvolvidos.

A análise dos dados existentes no SI-EAPV pode subsidiar o planejamento de políticas públicas de saúde, o fortalecimento das ações do PNI e dos serviços de saúde, bem como a reflexão sobre a prática da enfermagem que atua em salas de vacinação, visando a prevenção dos EI no país. Acredita-se, ainda, poder contribuir para o preenchimento de uma lacuna existente na literatura científica de países em desenvolvimento, como o Brasil, relacionada aos tipos de EI mais frequentes; às características demográficas da população acometida por erros de imunização; às doses de imunobiológicos; às vias de administração mais comumente envolvidas nas ocorrências; assim como à identificação da taxa de incidência dos EI por tipo de imunobiológico, com e sem EAPV.

Dessa forma, o presente estudo teve o objetivo de analisar os EI notificados em Goiás, entre 2014 e 2017.

Método

Trata-se de um estudo retrospectivo realizado com dados secundários do SI-PNI, módulo SI-EAPV, no período de agosto de 2014 (data do início da utilização da versão on-line do SI-EAPV no estado de Goiás) a dezembro de 2017.

Foram analisadas todas as notificações de EI registradas no SI-EAPV relacionadas à EI, em Goiás, envolvendo imunobiológicos de rotina, imunobiológicos especiais, soros e campanhas de vacinação. Goiás é um estado localizado a leste da Região Centro-Oeste do Brasil, com área de 340.086 km², população estimada de 6.921.161 habitantes, em 2018, e densidade populacional de 17,65 habitantes/km². Encontra-se em 7º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano no Brasil. O rendimento nominal mensal domiciliar per capita é de R$ 1.277,00, ocupando o 8º lugar no país. Apresenta 246 municípios, sendo a capital Goiânia o maior em quantitativo populacional⁽¹⁹⁾. Há oferta de imunobiológicos em todos os municípios do Estado, em salas de vacinação das Unidades Básicas de Saúde, Unidades de Pronto Atendimento, do Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) e em algumas maternidades públicas. O Estado apresentava, em 2018, 943 salas públicas de vacinação (ativas), notificantes, ofertando imunobiológicos nos calendários básicos de vacinação.

No presente estudo, as fontes de dados utilizadas foram o SI-EAPV on-line para coleta e análise dos EI notificados e o SI-PNI para obtenção do número de doses aplicadas (d.a.) de cada imunobiológico de agosto de 2014 a dezembro de 2017.

O período de coleta dos dados e avaliação dos registros ocorreu de janeiro a fevereiro de 2018. Para a extração dos dados, foi elaborado formulário padronizado de coleta de dados, baseado nas informações contidas no SI-EAPV. Inicialmente, foi avaliada a consistência das informações de todos os EI, sendo, na ocorrência de mais de um EI por notificação, desmembrados para contabilização e análise.

Foram analisadas as seguintes variáveis de interesse, presentes no SI-EAPV, para caracterização do perfil epidemiológico dos EI com relação aos usuários e características envolvidas no processo de vacinação: (i) sexo (masculino ou feminino); (ii) faixa etária estratificada em: < 1 ano, 1-4 anos, 5-9 anos, 10-19 anos, 20-59 anos ou > 60 anos; (iii) raça/cor da pele (branca, negra/parda, amarela ou indígena); (iv) tipo de evento (EI sem EAPV ou EI com EAPV); (v) dose (1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 1º reforço, 2º reforço, dose única, revacinação ou campanha); (vi) via de administração (intramuscular, subcutânea, via oral, intradérmica ou endovenosa); (vii) estratégia (rotina, imunobiológicos especiais, soros ou campanha de vacinação), (viii) tipo de imunobiológico e (ix) tipos de EI.

Os tipos de EI foram categorizados em nove categorias, segundo recomendação do Manual de EAPV do Brasil⁽²⁰⁾: (i) erros de prescrição ou indicações (ex.: vacina administrada antes ou após a idade recomendada); (ii) intervalo inadequado entre as doses (ex.: intervalos de doses maiores ou menores que o recomendado); (iii) erro na técnica de administração (ex.: erro na via, topografia, higienização das mãos, tamanho da agulha inadequado); (iv) erro no tipo de imunobiológico (ex.: administração da vacina incorreta); (v) uso incorreto de diluentes ou administração de outros produtos (ex.: diluição e administração de vacinas com diluentes trocados); (vi) erro na avaliação de contraindicações ou precauções (ex.: administração de vacinas vivas em gestantes ou imunodeprimidos); (vii) validade vencida (ex.: aplicação de vacina expirada); (viii) intervalo inadequado entre vacinas (ex.: Febre Amarela e Tríplice Viral administradas no mesmo dia em crianças menores de dois anos) e; (ix) outros EI (ex.: erros que não estejam elencados nas categorias acima, como erro de registro).

Os dados foram analisados no programa STATA, versão 14.0. Inicialmente, foi realizada análise descritiva das variáveis do estudo por meio de frequências absolutas (n) e relativas (%). Para o cálculo da taxa global de incidência dos EI (EI sem EAPV e EI com EAPV) foi utilizado o número de casos de EI notificados no SI-EAPV (numerador) e o número de doses aplicadas (d.a.) e registradas no SI-PNI (denominador), por meio da seguinte fórmula:

$\frac{\mathit{N}\mathit{ú}\mathit{mero}\mathit{de}\mathit{casos}\mathit{de}\mathit{EI}\left(\mathit{EI}\mathit{sem}\mathit{EAPV}\mathit{e}\mathit{EI}\mathit{com}\mathit{EAPV}\right)}{\mathit{Total}\mathit{de}\mathit{doses}\mathit{aplicadas}\mathit{no}\mathit{mesmo}\mathit{per}\mathit{í}\mathit{odo}}\times 100.000$

Além disso, estimou-se a taxa de incidência de EI sem EAPV e com EAPV separadamente. Todas as medidas de análise descritiva e taxa de incidência foram acompanhadas pelos respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%).

A seguir, as diferenças entre as proporções segundo características demográficas (faixa etária, sexo, raça/cor da pele), tipo de evento, dose do imunobiológico, via de administração, estratégia de vacinação e tipo de erro foram verificadas por meio do teste binomial de uma amostra (para variáveis nominais dicotômicas) ou teste de qui-quadrado de uma amostra (para variáveis nominais com mais de duas categorias ou ordinais). Foi adotado um nível de significância de 5% (p-valor < 0,05) para verificar as variáveis estatisticamente significativas.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás, parecer nº 2.519.065/2018.

Resultados

No presente estudo, foram analisadas todas as 404 fichas de notificações e, dentre elas, em 72 (17,8%) havia registro de dois ou mais EI, totalizando 501 EI analisados em Goiás.

A Tabela 1 sintetiza a análise descritiva dos 501 EI analisados, segundo características demográficas, tipo de evento, dose do imunobiológico, via de administração e estratégia de vacinação. Verificou-se maior proporção de EI em indivíduos do sexo feminino (62,5%; p-valor < 0,001), na faixa etária menor de 1 ano (32,7%; p-valor < 0,001) e em usuários da raça/cor da pele negra ou parda (47,7%; p-valor < 0,001). Também, observou-se maior proporção de EI sem EAPV do que com EAPV (90,6% versus 9,4%; p-valor < 0,001). Por fim, quase a metade dos EI ocorreram durante a administração da primeira dose de vacina (49,7%; p-valor < 0,001) e a maioria envolveu vacinas administradas pela via intramuscular (58,1%; p-valor < 0,001). Do total de EI, a maioria ocorreu durante administração de doses de rotina (92,6%; p-valor < 0,001).

Tabela 1
Análise descritiva dos casos de erros de imunização notificados, segundo características demográficas, tipo de erro, dose do imunobiológico, via de administração e estratégia. Estado de Goiás, Brasil, agosto de 2014 a dezembro de 2017

Variáveis	N = 501	%	IC 95%*	p-valor
Sexo
Masculino	188	37,5	33,4-41,8	< 0,001†
Feminino	313	62,5	58,2-66,6
Faixa etária (anos)
< 1	164	32,7	27,8-37,7	< 0,001‡
1-4	115	23,0	19,5-26,8
5-9	23	4,6	3,1-6,8
10-19	65	13,0	10,3-16,2
20-59	125	25,0	21,4-28,9
> 60	9	1,8	0,9-3,4
Raça/cor
Branca	63	32,0	25,9-38,7	< 0,001‡
Negra/parda	94	47,7	40,8-54,7
Amarela	33	16,8	12,2-22,6
Indígena	7	3,6	1,7-7,1
SI§: 304
Tipo de evento
Erro de imunização sem EAPV||	454	90,6	87,7-92,9	< 0,001†
Erro de imunização com EAPV||	47	9,4	7,1-12,2
Dose
1a dose	249	49,7	45,3-54,1	< 0,001‡
2a dose	85	17,0	13,9-20,5
3a dose	28	5,6	3,89-7,96
4a dose	4	0,8	0,31-2,03
1º reforço	29	5,8	3,06-8,20
2º reforço	22	4,4	2,92-6,56
Única	34	6,8	4,89-9,33
Revacinação	34	6,8	4,89-9,33
Campanha	16	3,2	1,97-5,12
Via de administração
Intradérmica	15	4,0	2,4-6,5	< 0,001‡
Intramuscular	219	58,1	53,0-63,0
Subcutânea	80	21,2	17,4-25,6
Via oral	61	16,2	12,8-20,2
Endovenosa	2	0,5	0,1-1,9
SI§: 124
Estratégia
Rotina	464	92,6	90,0-94,6	< 0,001‡
Campanha de vacinação	16	3,2	2,0-5,1
Imunobiológicos especiais	14	2,8	1,7-4,6
Soros	7	1,4	0,7-2,9

Fonte: Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), módulo SI-EAPV
• ^*
  IC 95% = Intervalo de confiança de 95%;
• ^†
  Teste binomial de uma amostra;
• ^‡
  Teste qui-quadrado de uma amostra;
• ^§
  SI = Sem informação;
• ^||
  EAPV = Evento Adverso Pós-Vacinação

A Tabela 2 mostra a análise descritiva dos EI segundo o tipo de imunobiológico. Proporcionalmente, a maioria dos EI envolve as vacinas tríplice viral (15,4%), febre amarela (12,0%), papiloma vírus humano (HPV) (10,0%), pentavalente (7,4%) e vacina oral de rotavírus humano (VORH) (7,0%).

Tabela 2
Análise descritiva dos casos de erros de imunização, segundo o tipo de imunobiológico. Estado de Goiás, Brasil, agosto de 2014 a dezembro de 2017

Variáveis	N = 501	%	IC 95%*
Rotina
Bacillus Calmette-Guérin	12	2,4	1,4-4,1
Dupla Adulto	14	2,8	1,7-4,6
Tríplice Bacteriana	28	5,6	3,9-8,0
Tríplice Bacteriana Acelular Adulto	8	1,6	0,8-3,1
Febre Amarela	60	12,0	9,4-15,1
Hepatite A (pediátrica)	7	1,4	0,7-2,9
Hepatite B	25	5,0	3,4-7,3
Papiloma Vírus Humano	50	10,0	7,6-12,9
Meningocócica C Conjugada	31	6,2	4,4-8,6
Pneumocócica 10 Valente	18	3,6	2,3-5,6
Pentavalente	37	7,4	5,4-10,0
Tríplice Viral	77	15,4	12,5-18,8
Tetra Viral	12	2,4	1,4-4,1
Vacina Inativada Poliomielite	13	2,6	1,5-4,4
Vacina Oral Poliomielite	27	5,4	3,7-7,7
Vacina Antirrábica Humana	10	2,0	1,1-3,6
Vacina Oral de Rotavírus Humano	35	7,0	5,1-9,6
Campanha de vacinação
Influenza trivalente	16	3,2	2,0-5,1
Imunobiológicos especiais
Tríplice Bacteriana Acelular infantil	2	0,4	0,1-1,4
Vacina Haemophilus Influenzae tipo b	1	0,2	0,0-1,1
Imunoglobulina Anti-Hepatite B	1	0,2	0,0-1,1
Pneumocócica 23 valente	8	1,6	0,8-3,1
Hepatite A (CRIE†)	2	0,4	0,1-1,4
Soros
Soro escorpiônico	5	1,0	0,4-2,3
Soro antitetânico	1	0,2	0,0-1,1
Soro botrópico	1	0,2	0,0-1,1

Fonte: Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), módulo SI-EAPV
• ^*
  IC 95% = Intervalo de confiança de 95%;
• ^†
  CRIE = Centro de Referência de Imunobiológicos Especiais

Os tipos de erros mais frequentes apontaram inadequação na indicação do imunobiológico (26,9%; IC 95%: 23,2-31,0), intervalo inadequado entre doses (18,2%; IC 95%: 15,0-21,8) e erro na técnica de administração (14,2%; IC 95%: 11,4-17,5). As prevalências dos demais tipos de EI foram: erro relacionado ao tipo de imunobiológico utilizado (11,8%; IC 95%: 9,2-14,9), erro de administração - uso incorreto de diluentes (8,4%; IC 95%: 6,3-11,1), erro na avaliação de contraindicações ou prescrições (7,8%; IC 95%: 5,7-10,5), validade vencida (5,4%; IC 95%: 3,7-7,7%), intervalo inadequado entre as vacinas (0,6%; IC 95%: 0,2-1,7) e outros erros (6,8%; IC 95%: 4,9-9,3%) (dados não apresentados em tabelas).

A Tabela 3 mostra a taxa de incidência global dos EI (por 100.000 d.a.). A taxa de incidência global foi de 4,05 EI/100.000 d.a. As vacinas administradas na rotina apresentaram taxa de incidência de 3,70/100.000 d.a. e os soros de 547,70 EI/100.000 d.a. As três maiores taxas de incidências para vacinas de rotina foram verificadas para a vacina antirrábica humana (24,93 EI/100.000 d.a.), HPV (10,12/100.000 d.a.) e tríplice viral (8,74/100.000 d.a.).

Tabela 3
Taxa de incidência global dos erros de imunização (por 100.000 doses aplicadas), segundo estratégia de vacinação e tipo de imunobiológico. Estado de Goiás, Brasil, agosto de 2014 a dezembro de 2017

Imunobiológicos	EI*	Doses	TI†	IC 95%‡
Rotina
Tríplice Viral	77	880.192	8,74	7,00-10,93
Febre Amarela	60	961.916	6,34	4,85-8,03
Papiloma Vírus Humano	50	493.767	10,12	7,68-13,35
Pentavalente	37	1.186.555	3,12	2,26-4,30
Vacina Oral de Rotavírus Humano	35	598.092	5,85	4,20-8,14
Meningocócica C conjugada	31	2.120.077	1,46	1,03-2,08
Tríplice bacteriana	28	507.584	5,52	3,82-7,97
Vacina Oral Poliomielite	27	480.871	5,61	3,86-8,20
Hepatite B	25	972.990	2,57	1,74-3,79
Pneumocócica 10 valente	18	995.218	1,81	1,14-2,86
Dupla adulto	14	1.353.737	1,03	0,62-1,74
Vacina Inativada Poliomielite	13	695.891	1,87	1,09-3,20
Bacillus Calmette-Guérin	12	326.151	3,68	2,10-6,43
Tetra Vital	12	223.103	5,38	3,01-9,40
Vacina antirrábica humana	10	40.109	24,93	13,54-45,89
Hepatite A (pediátrica)	7	288.564	2,43	1,17-5,00
Tríplice Bacteriana Acelular Adulto	8	149.893	5,34	2,70-10,53
Subtotal	464	12.274.710	3,78	3,45-4,14
Soros
Soro escorpiônico	5	544	919,12	393,20-2133,00
Soro antitetânico	1	385	259,74	45,87-1456,00
Soro botrópico	1	349	286,50	50,60-1605,0
Subtotal	7	1.278	547,70	265,6-1126,0
Imunobiológicos especiais
Pneumocócica 23	8	3.299	242,50	122,90-477,80
Hepatite A (CRIE§)	2	2.719	73,56	20,18-267,80
Tríplice Bacteriana Acelular infantil	2	2.856	70,03	19,21-255,00
Vacina Haemophilus Influenzae tipo b	1	1.275	78,43	13,85-442,90
Imunoglobulina Anti-Hepatite B	1	1.820	59,94	9,70-310,6
Subtotal	14	11.969	116,97	69,69-196,30
Campanha
Influenza trivalente	16	74.341	21,52	13,25-34,96
Total	501	12.362.298	4,05	3,71-4,42

Fonte: Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), módulo SI-EAPV.
• ^*
  EI = Erro de imunização;
• ^†
  TI = Taxa de incidência: a cada 100.000 doses aplicadas;
• ^‡
  IC 95% = Intervalo de Confiança de 95%;
• ^§
  CRIE = Centro de Referência de Imunobiológicos Especiais

As Tabelas 4 e 5 mostram a taxa de incidência de EI sem EAPV e com EAPV, em Goiás (por 100.000 d.a.), respectivamente.

Tabela 4
Taxa de incidência de erros de imunização sem Evento Adverso Pós-Vacinação (por 100.000 doses aplicadas), segundo estratégia de vacinação e tipo de imunobiológico. Estado de Goiás, Brasil, agosto de 2014 a dezembro de 2017

Imunobiológicos	EI*	Doses	TI†	IC 95%‡
Rotina
Tríplice Viral	74	880.192	8,40	6,65-10,49
Febre Amarela	56	961.916	5,82	4,44-7,50
Papiloma Vírus Humano	46	493.767	9,32	6,90-12,32
Vacina Oral de Rotavírus Humano	34	598.092	5,68	4,00-7,85
Pentavalente	32	1.186.555	2,70	1,88-3,76
Meningocócica C conjugada	30	2.120.077	1,41	0,97-1,99
Vacina Oral Poliomielite	27	480.871	5,61	3,86-8,20
Hepatite B	25	972.990	2,57	1,74-3,79
Tríplice Bacteriana	25	507.584	4,92	3,26-7,16
Pneumocócica 10 valente	17	995.218	1,71	1,03-2,68
Tetra Vital	11	223.103	4,93	2,59-8,57
Vacina Inativada Poliomielite	11	695.891	1,58	0,83-2,75
Dupla Adulto	10	1.353.737	0,74	0,37-1,32
Vacina antirrábica humana	9	40.109	22,44	10,94-41,18
Tríplice Bacteriana Acelular Adulto	8	149.893	5,34	2,70-10,53
Hepatite A (pediátrica)	7	288.564	2,43	1,17-5,00
Bacillus Calmette-Guérin	1	326.151	0,31	0,01-1,51
Subtotal	423	12.274.710	3,45	3,13-3,82
Soros
Soro escorpiônico	3	544	551,50	140,30-1.501,00
Soro antitetânico	1	385	259,74	45,87-1.456,00
Soro botrópico	-	-	-	-
Subtotal	4	1278	313,00	84,21-801,03
Imunobiológicos especiais
Pneumocócica 23	6	3.299	181,90	73,72-378,30
Hepatite A (CRIE§)	2	2.719	73,56	20,18-267,80
Tríplice Bacteriana Acelular infantil	2	2.856	70,03	19,21-255,00
Vacina Haemophilus Influenzae tipo b	1	1.275	78,43	13,85-442,90
Imunoglobulina anti-hepatite B	1	1.820	59,94	9,70-310,6
Subtotal	12	11.969	100,30	51,75-175,10
Campanha
Influenza trivalente	15	74.341	20,18	11,29-33,28
Total	454	12.362.298	3,42	3,11-3,76

Fonte: Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), módulo SI-EAPV.
• ^*
  EI = Erro de imunização;
• ^†
  TI = Taxa de incidência: a cada 100.000 doses aplicadas;
• ^‡
  IC 95% = Intervalo de Confiança de 95%;
• ^§
  CRIE = Centro de Referência de Imunobiológicos Especiais

Tabela 5
Taxa de incidência de erros de imunização com Evento Adverso Pós-Vacinação (por 100.000 doses aplicadas), segundo estratégia de vacinação e tipo de imunobiológico. Estado de Goiás, Brasil, agosto de 2014 a dezembro de 2017

Imunobiológicos	EI*	Doses	TI†	IC 95%‡
Rotina
Tríplice Viral	3	880.192	0,34	0,12-1,00
Febre Amarela	4	961.916	0,41	0,16-1,07
Papiloma Vírus Humano	4	493.767	0,81	0,31-2,08
Vacina Oral de Rotavírus Humano	1	598.092	0,17	0,03-0,95
Pentavalente	5	1.186.555	0,42	0,18-0,99
Meningocócica C conjugada	1	2.120.077	0,05	0,00-0,27
Tríplice bacteriana	3	507.584	0,59	0,20-1,74
Pneumocócica 10 valente	1	995.218	0,10	0,02-0,57
Tetra Vital	1	223.103	0,45	0,08-2,54
Vacina Inativada Poliomielite	2	695.891	0,29	0,08-1,05
Dupla adulto	4	1.353.737	0,29	0,11-0,76
Vacina antirrábica humana	1	40.109	2,49	0,44-14,12
Bacillus Calmette-Guérin	11	326.151	3,37	1,88-6,04
Subtotal	41	10.382.392	0,39	0,29-0,54
Soros
Soro escorpiônico	2	544	367,65	100,90-1.330,00
Soro botrópico	1	349	286,53	50,60-1.605,00
Subtotal	3	893	335,95	114,30-983,00
Imunobiológicos especiais
Pneumocócica 23	2	3.299	60,62	16,63-220,80
Subtotal	2	3.299	60,62	16,63-220,80
Campanha
Influenza trivalente	1	74.341	1,34	0,23-7,62
Total	47	10.460.925	0,45	0,34-0,60

Fonte: Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), módulo SI-EAPV.
• ^*
  EI = Erro de imunização;
• ^†
  TI = Taxa de incidência: a cada 100.000 doses aplicadas;
• ^‡
  IC 95% = Intervalo de Confiança de 95%

A taxa de incidência de EI sem EAPV foi de 3,42 EI/100.000 d.a. As vacinas administradas na rotina apresentaram taxa de incidência de 3,45/100.000 d.a. e os soros de 313,00 EI/100.000 d.a. As três maiores taxas de incidências de EI sem EAPV para vacinas de rotina foram verificadas para a vacina antirrábica humana (22,44 EI/100.000 d.a.), papiloma vírus humano (9,32/100.000 d.a.) e tríplice viral (8,40/100.000 d.a.) (Tabela 4).

A taxa de EI com EAPV foi de 0,45 EI/100.000 d.a. As vacinas de rotina apresentaram taxa de incidência de 0,39 EI/100.000 d.a. e os soros de 335,95 EI/100.000 d.a. (Tabela 5).

Do total de EI com EAPV analisados (n = 47), verificou-se a ocorrência de 139 EAPV diferentes, incluindo manifestações locais (92; 66,2%) e sistêmicas (47; 33,8%). Os cinco EAPV mais relatados foram: dor local (20; 14,4%), edema ou rubor (17; 12,2%), eritema (17; 12,2%), calor (13; 9,4%) e nódulo (7; 5,0%). Com relação ao tipo de EI com EAPV, o erro na técnica de administração foi o mais frequente (22; 46,8%), seguido do intervalo inadequado entre as doses (10; 21,3%), tipo de imunobiológico utilizado (6; 12,8%), avaliação de contraindicações ou precauções (5; 10,6%), erros de prescrição ou indicações (2; 4,3%) e outros (2; 4,3%) (dados não apresentados em tabelas).

Discussão

Na saúde pública, a vacinação é uma estratégia segura, capaz de impactar sensivelmente no controle ou na eliminação de doenças imunopreveníveis^(21-22). Nesse sentido, a vacinação segura é uma preocupação mundial e fator determinante no sucesso ou fracasso dos programas de imunização^(23-24). No presente estudo, foram analisados 501 EI, a maioria envolvendo doses de rotina (92,6%), sem EAPV (90,6%) e em crianças menores de cinco anos (55,7%). Os tipos de erros mais frequentes apontaram a inadequação na indicação do imunobiológico (26,9%), intervalo inadequado entre doses (18,2%) e erro na técnica de administração (14,2%). A taxa de incidência global de EI foi de 4,05/100.000 d.a.; as maiores incidências das vacinas de rotina foram para vacina antirrábica humana, papiloma vírus humano e tríplice viral; a taxa de incidência de erros com EAPV foi de 0,45/100.00 d.a..

As limitações do estudo são provenientes da análise de dados de sistemas de notificação secundários, propensos a determinados vieses, incluindo a ausência de informações, subnotificação dos incidentes e dos EA. Esses vieses podem subestimar a taxa de incidência dos EI. Nessa investigação foram identificadas notificações com falta de informações para determinadas variáveis, como a via de administração e raça/cor da pele. Além disso, diferenças no perfil de notificação podem ter ocorrido entre as instituições notificadoras, uma vez que aquelas com uma cultura de segurança bem consolidada, provavelmente contribuem com notificações e informações mais completas do que aquelas cuja cultura punitiva ainda prevalece^(9,25). Assim, os resultados desse estudo podem não representar a real magnitude dos EI para a localidade analisada.

A qualidade dos programas de imunização depende do modo como as vacinas são produzidas, transportadas, acondicionadas, preparadas e administradas⁽²⁶⁾, bem como da qualidade das notificações e da análise dos EI ocorridos, sendo que um dos grandes desafios dos serviços de imunização é certificar as práticas de vacinação segura. A análise de eventos notificados ao Programa Nacional de Notificação de Erros de Vacinas dos EUA mostra que os EI continuam presentes na prática clínica^(3,25). O presente estudo ratifica essa realidade e aponta que os EI estão presentes na realidade brasileira, sendo mais frequentes em crianças menores de cinco anos, principalmente em menores de um ano de idade.

As crianças menores de um ano têm sido as mais atingidas por EAPV^(15,18)e por EI com EAPV⁽⁶⁾. Esse fato pode ser decorrente da maior exposição vacinal a que esse grupo etário está exposto, considerando que a maioria das vacinas que compõem o calendário é indicada para crianças menores de um ano⁽¹⁴⁾.

No presente estudo, proporcionalmente, a maioria dos EI ocorreu com imunobiológicos administrados pela via intramuscular, seguido dos administrados pela via subcutânea. No Brasil, a maioria das vacinas de rotina é composta por aquelas administradas pela via intramuscular, além dos imunobiológicos especiais e soros⁽¹⁴⁾, fato que pode explicar o resultado do presente estudo.

Nessa investigação, verificou-se que a maioria dos EI ocorreu durante a vacinação de rotina. Também, foi observada maior proporção de EI relacionados às vacinas tríplice viral, febre amarela, HPV, pentavalente e VORH. Esses achados corroboram com um estudo realizado na Região Sudeste do Brasil, no qual também verificou-se maior proporção de EI relacionados às vacinas de rotina (79,0%) e às vacinas rotavírus humano (22,0%), febre amarela (15,6%) e tetravalente (12,9%)⁽¹⁷⁾. Em outro estudo realizado na Região Centro-Oeste do Brasil, foram analisadas fichas de notificação de EAPV de crianças menores de cinco anos, dentre elas, a maioria dos EI envolveu a administração das vacinas febre amarela e VOP⁽¹⁸⁾. Ao comparar com a literatura internacional, uma investigação conduzida nos EUA mostrou que as vacinas HPV (26,0%) e rotavírus (15,0%) foram as mais envolvidas nos EI na prática clínica⁽³⁾.

No presente estudo, verificou-se que os tipos de EI mais prevalentes foram falhas na prescrição e/ou indicação do imunobiológico, seguidos do intervalo inadequado entre as doses e erro na técnica de administração. Uma investigação que analisou EI notificados na Europa, de 2001 a 2016, mostrou que as categorias de EI mais frequentes englobaram vacinação incompleta (36,1%), erros na administração (22,1%), administração da vacina errada ou na idade incorreta (14,6%)⁽⁸⁾. Em estudo conduzido por meio de análise das notificações de um serviço de imunização de base populacional, no Reino Unido, foi verificado que 92% dos erros ocorreram durante a seleção e o preparo da vacina⁽²⁶⁾. Nos EUA, um estudo realizado no período de 2000 a 2013 mostrou que os grupos de EI mais comuns indicaram uso de esquema inadequado (27,0%), erro no armazenamento e dispensação de imunobiológicos (23,0%) e vacina incorreta (15,0%)⁽³⁾. Outros estudos apontaram que os erros ocorridos na etapa de administração são os mais comuns^(3,9,25-26)e incluíram número errado de doses, intervalo inadequado entre as doses e vacina errada⁽⁹⁾.

Do total de EI analisados, 9,4% foram EI com EAPV. A TI de EI com EAPV foi de 0,45 EI/100.000 d.a. Resultados semelhantes foram identificados em outros estudos conduzidos no Brasil^(6,15,18). Os resultados relatados na literatura internacional revelam dados divergentes quanto a magnitude dos EAPV seguidos de EI. Um relatório elaborado a partir de uma base de dados da Austrália revelou 2.924 EAPV relacionados aos EI no ano de 2015, o que representou 12,3 eventos para cada 100.000 pessoas vacinadas⁽²⁷⁾. No Canadá, um estudo de 3.504 relatórios de EAPV estimou uma taxa de EI de 0,39 a cada 100.000 d.a.⁽¹¹⁾. Nos EUA, a análise do sistema de vigilância de EAPV mostrou que no período de 2000 a 2013 foram notificados 21.843 EI no país e que, em 25% dos casos, houve algum dano ao usuário⁽³⁾.

Além disso, a análise dos EI com EAPV mostrou a ocorrência, principalmente, de manifestações locais, como dor, edema ou rubor, eritema, calor e nódulos. Outros estudos conduzidos no Brasil identificaram que mais da metade das manifestações relacionadas aos EAPV reportados foram locais e autolimitadas, de resolução espontânea e sem necessidade de intervenção médica^(15,18). Por outro lado, um estudo conduzido em um estado da Região Sul mostrou que EAPV seguidos de EI mais frequentes apontaram abscesso subcutâneo quente, abscesso subcutâneo frio e linfadenopatia regional supurada⁽⁶⁾. Um estudo canadense identificou que a maioria dos EI com EAPV foi leve ou de gravidade moderada, indicando que as reações comumente relatadas incluíram reações locais extensas, prolongadas ou dolorosas em um membro do local da injeção⁽²⁸⁾.

Vale considerar que EAPV graves relacionados aos EI são raros, logo, as vantagens da imunização são significativamente maiores do que os problemas que eventualmente podem ocorrer⁽²⁹⁾. Todavia, muitos desses eventos podem ser evitados se os serviços de saúde estabelecerem infraestrutura eficaz para supervisionar e promover práticas seguras, incluindo a divulgação de relatórios anuais⁽³⁰⁾.

Com relação às vacinas mais envolvidas nos EI com EAPV, a Bacillus Calmette-Guérin (BCG) e a pentavalente foram as mais comuns. A vacinação intradérmica com BCG está associada a erros específicos⁽³¹⁾ que podem causar eventos adversos que variam desde manifestações locais até manifestações mais graves⁽³²⁾.

Apesar da maioria dos EI não causar dano aos usuários, esforços devem ser direcionados para o planejamento de ações voltadas para a melhoria da qualidade da assistência prestada à população^(2-3). Monitorar os EAPV, particularmente os causados pelos EI, é importante para o sucesso dos programas de imunização, uma vez que tais eventos podem influenciar a aceitação da imunização pela população, bem como impactar negativamente nos custos para o sistema de saúde⁽³⁾. Logo, a avaliação epidemiológica dos EI pode contribuir com as mudanças na prática, com o direcionamento dos esforços para a redução dos erros e dos danos causados aos usuários, bem como com a redução dos custos dispensados ao tratamento dos EAPV.

Ressalta-se que, com a inclusão de novos imunobiológicos⁽¹²⁾, o perfil do calendário vacinal no Brasil apresentou mudanças consideráveis nos últimos anos. A complexidade da imunização torna desafiante o trabalho dos gestores e profissionais da saúde para a garantia da segurança no processo de vacinação. Os gestores e profissionais devem atentar-se, continuamente, para o fato de que não basta a produção de vacinas seguras e eficazes, mas também de garantir estruturas e processos adequados que favoreçam o desenvolvimento seguro de todas as etapas que compõem o sistema de imunização⁽³³⁾.

A vacinação é uma ação que vem sendo realizada pela enfermagem e, no Brasil, com mais frequência por técnicos de enfermagem, considerando que o enfermeiro acumula outras atividades, tanto gerenciais quanto assistenciais⁽³⁴⁾. Garantir as competências e atualizações para essa prática, adotando medidas sistêmicas que os ajudem a não cometer falhas, é imprescindível para aumentar a segurança nesse processo.

Os serviços devem garantir a presença constante do enfermeiro dentro das salas de vacinação e, principalmente, na triagem, desenvolvendo consulta de enfermagem com vistas à indicação e avaliação adequada da imunização. Destaca-se que o PNI preconiza que, para o dimensionamento de pessoal de enfermagem, deve-se ter como base que um vacinador pode administrar, com segurança, cerca de 30 doses de vacinas injetáveis ou 90 doses de vacinas administradas pela via oral por hora de trabalho⁽¹⁴⁾. Essa assertiva desconsidera a complexidade do processo e o tempo gasto pelo profissional de enfermagem para realizar todas as ações necessárias para a imunização segura, tais como a triagem; a avaliação do usuário; a higienização das mãos (antes do preparo, antes e após a administração das doses); o preparo das doses, muitas vezes com necessidade de reconstituição; a conferência, os registros e as orientações aos usuários, implicando em recursos humanos insuficientes e sobrecarga para o profissional de enfermagem. O déficit de profissionais e a consequente sobrecarga de trabalho são causas de erros e de incidentes causados pela enfermagem, os quais possuem estreita relação com a gestão dos serviços de saúde⁽³⁵⁾.

Ainda são incipientes, mas estão sendo sugeridas potenciais estratégias voltadas para a redução dos EI, dentre elas: assegurar a competência profissional das equipes, particularmente dos profissionais de enfermagem, quanto à técnica correta de administração de imunobiológicos; educar profissionais e usuários do sistema sobre o intervalo entre as doses, especialmente daquelas com regimes complexos de administração; garantir processos bem definidos para a administração segura de vacinas e demais imunobiológicos; e investigar as causas de todos os EI para evitar futuras ocorrências^(3,33).

Outras estratégias para a prevenção de EI dizem respeito ao uso de checklists ⁽³¹⁾; investimentos em infraestrutura de tecnologia da informação para apoiar a tomada de decisão clínica; auxílio na identificação de fatores de risco de EI⁽⁹⁾ e a educação permanente em saúde para todos os profissionais envolvidos com a imunização nos serviços de saúde do país. Tais estratégias podem ser consideradas transformadoras de práticas voltadas para a segurança dos usuários^(36-37).

Entretanto, vale ressaltar que as atividades educativas realizadas nas ações de educação permanente em saúde devem ser planejadas com base na problematização do cotidiano e na análise de falhas assistenciais para que gerem reflexões, ações de melhoria e sirvam de aprendizado a todos⁽³⁶⁾. Estratégias de ensino com metodologias ativas, simulação realística e discussão de erros ocorridos também são importantes para aproximar os alunos e profissionais da realidade a ser enfrentada⁽³⁴⁾.

Além da educação permanente em saúde, torna-se essencial o desenvolvimento de competências para a segurança na imunização nos cursos de graduação dos profissionais de saúde, com ênfase ao enfermeiro, responsável pelas salas de vacinação⁽³⁴⁾.

Os usuários do sistema também precisam ser envolvidos no processo de imunização, para que sejam capazes não apenas de servir de barreira para um possível erro, mas também para detectar e reportar sinais de eventos adversos⁽²⁷⁾, tendo como uma das possíveis estratégias a conferência pelo usuário dos seus próprios dados, da criança sob sua responsabilidade e do imunológico antes do seu preparo e administração.

A vigilância cuidadosa e a investigação de EI são necessárias para identificar as causas desses eventos que requerem correção⁽³⁸⁾. O relato espontâneo efetivo dos EI é o primeiro passo para garantir que as vacinas sejam seguras e que estejam sendo administradas corretamente⁽³⁹⁾.

Conclusão

A vacinação trouxe benefícios imensuráveis para a saúde coletiva, reduzindo significativamente, controlando e erradicando agravos imunopreveníveis. Dessa forma, para garantir o seu sucesso é importante que falhas não ocorram durante o processo. Contudo, as evidências desse estudo indicam que os erros de imunização são uma realidade a ser enfrentada pelos sistemas de saúde e pela enfermagem, impactando na qualidade assistencial e na segurança dos usuários que buscam pela prevenção de doenças na população.

A maioria dos EI ocorreu em crianças menores de cinco anos, não causou dano e a taxa de incidência encontrada foi baixa e próxima dos poucos estudos realizados, nacional e internacionalmente. Entretanto, em se tratando de vidas, ações de prevenção e minimização dessas ocorrências devem ser adotadas, focadas na análise da estrutura e dos processos de imunização.

O presente estudo realizou uma análise dos erros de imunização, podendo subsidiar a gestão na tomada de decisão em direção ao fortalecimento da qualidade dos procedimentos de vacinação. Dessa forma, cumpre o papel de divulgar informações sobre questões relacionadas à segurança dos usuários do sistema de saúde no contexto da imunização e amplificar o acesso da gestão, profissionais e da população acerca dessa temática.

O estudo também apresenta implicações para a prática assistencial e para o ensino da área da saúde e enfermagem, pois apresenta situações que alertam para maior aproximação do enfermeiro da sala de vacinação, visando melhorar a supervisão, a educação permanente em saúde, a gestão dos riscos e a assistência direta aos usuários do sistema. O uso de protocolos, ferramentas e dinâmicas com visão sistêmica e não individual também são fundamentais, não apenas para mitigar os erros, mas também para a manutenção da confiança, qualidade e impacto positivo do PNI, em todas as instâncias.

• *
  Artigo extraído da dissertação de mestrado “Erros de imunização em Goiás: análise das notificações”, apresentada à Universidade Federal de Goiás, Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública, Goiânia, GO, Brasil.

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Editado por

Editor Associado: Ricardo Alexandre Arcêncio

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  19 Jun 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  17 Abr 2019
• Aceito
  20 Mar 2020