Lesão de pele relacionada a adesivo médico em paciente com câncer: coorte prospectiva^*

Resumos

Objective:

to estimate the incidence of medical adhesive-related skin injury in the peripheral venous catheter fixation region in critical cancer patients, to identify risk factors, and to establish a risk prediction model for its development.

Method:

a prospective cohort study with a sample of 100 adult and aged patients hospitalized in an intensive care unit. The data were analyzed using descriptive, bivariate and multivariate statistics with Cox regression.

Results:

the incidence of medical adhesive-related skin injury was 31.0% and the incidence density was 3.4 cases per 100 people-days. The risk factors were as follows: alcoholism, smoking habit, hospitalization due to deep vein thrombosis, acute respiratory failure, immediate postoperative period, heart disease, dyslipidemia, use of antiarrhythmics, blood transfusion, friction injury, pressure injury, turgor, edema, hematoma, petechiae, low values in the Braden scale, clinical severity of the patient, elasticity, moisture, texture and color. The predictive model consisted in the following: decreased skin turgor, presence of hematoma and edema.

Conclusion:

medical adhesive-related skin injury at the peripheral venous catheter insertion site has a high incidence in critical cancer patients and is associated with decreased turgor, presence of hematoma and edema, evidence that can support the clinical practice.

Descriptors:
Nursing; Intensive Care Units; Medical Oncology; Wounds and Injuries; Incidence; Patient Safety

Objetivo:

estimar la incidencia de lesión cutánea relacionada con adhesivos médicos en la región de fijación del catéter venoso periférico en pacientes oncológicos críticos, identificar factores de riesgo y establecer un modelo de predicción de riesgo para su desarrollo.

Método:

cohorte prospectiva con una muestra de 100 pacientes adultos y adultos mayores ingresados en una unidad de terapia intensiva. Los datos se analizaron mediante estadística descriptiva, bivariada y multivariada con regresión de Cox.

Resultados:

la incidencia de lesión cutánea relacionada con adhesivos médicos fue del 31,0% y la densidad de incidencia fue de 3,4 casos por 100 personas-día. Los factores de riesgo fueron: alcoholismo, tabaquismo, hospitalización por trombosis venosa profunda, insuficiencia respiratoria aguda, postoperatorio inmediato, cardiopatía, dislipidemia, uso de antiarrítmicos, transfusión de sangre, lesión por fricción, lesión por presión, turgencia, edema, hematoma, petequias, bajos valores en la escala de Braden, gravedad clínica del paciente, elasticidad, humedad, textura y coloración. El modelo predictivo estuvo compuesto por: disminución de la turgencia cutánea, presencia de hematomas y edema.

Conclusión:

la lesión cutánea relacionada con adhesivos médicos en el sitio de inserción del catéter venoso periférico tiene una alta incidencia en pacientes oncológicos críticos y se asocia a disminución de la turgencia, presencia de hematoma y edema, dicha evidencia puede servir de base para la práctica clínica.

Descriptores:
Enfermería; Unidades de Cuidados Intensivos; Oncología Médica; Heridas y Lesiones; Incidencia; Seguridad del Paciente

Introdução

A decisão incorreta quanto ao tipo de adesivo médico e sua inadequada aplicação ou remoção são fatores que podem ocasionar danos às camadas superficiais da pele. Quando as camadas da pele são removidas juntamente com o dispositivo tem-se uma lesão de pele relacionada a adesivo médico, internacionalmente conhecida como Medical Adhesive-Related Skin Injuries (MARSI)(¹-⁴). Tal lesão caracteriza-se por eritema contínuo após 30 minutos da remoção do adesivo médico e pode estar associado a presença de vesículas, flictenas, erosões ou rupturas na pele(²).

As MARSIs acometem pessoas de diferentes grupos etários, desde aquelas mais saudáveis em atendimento ambulatorial até indivíduos que necessitam de cuidados críticos(⁵-⁸). Sabe-se que muitas vezes são lesões pouco reconhecidas e, portanto, subnotificadas, apesar da alta prevalência e incidência(⁵-⁸), com índices de ocorrência de até 29,83%(⁹).

Suspeita-se que pacientes críticos, especialmente os oncológicos, possam exibir maior risco para o desenvolvimento de MARSIs por apresentarem alterações nos sistemas imunológico, circulatório e respiratório e que causam mudanças na estrutura da pele(¹⁰-¹⁵). Trata-se de pacientes que frequentemente têm sua pele exposta aos adesivos médicos, especialmente aqueles utilizados para a fixação de cateteres venosos de acesso central e periférico.

A terapia de infusão venosa é uma das intervenções de saúde mais comuns na prática clínica e estima-se que 80% dos pacientes hospitalizados são portadores de cateter venoso periférico (CVP). Trata-se de um dispositivo utilizado para hidratação venosa, administração de hemoderivados, medicamentos, incluindo os quimioterápicos, dentre outros(¹⁶).

As evidências científicas ainda são escassas para confirmar a dimensão do problema que é a MARSI e quais os fatores relacionados à sua ocorrência, para amparar a tomada de decisão com vistas às melhores práticas a serem adotadas para sua prevenção. Essa lacuna do conhecimento pode contribuir para que os profissionais de saúde negligenciem esse tipo de lesão que é considerado um evento adverso prevenível(⁸).

Entende-se que o conhecimento sobre a MARSI, especialmente a respeito da sua ocorrência e dos fatores de risco, pode contribuir para fomentar a discussão sobre os tipos mais comuns de lesão verificados em local de fixação de cateter venoso periférico. A proposição de medidas de prevenção pode contribuir para a segurança do paciente, para o planejamento e administração dos serviços de saúde, consequentemente, melhorar a qualidade da assistência nas instituições hospitalares.

A mitigação da MARSI com medidas assertivas para sua prevenção pode reduzir os custos e a dor relacionada às lesões, favorecer o cuidado qualificado de enfermagem e a prática baseada em evidências.

Este estudo teve por objetivo estimar a incidência de lesão de pele relacionada a adesivo médico em região de fixação de cateter venoso periférico em pacientes oncológicos críticos, identificar fatores de risco e estabelecer modelo de predição de risco para o seu desenvolvimento.

Método

Delineamento do estudo

Trata-se de estudo de coorte prospectivo, realizado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital oncológico de grande porte de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, seguindo as diretrizes da iniciativa denominada Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE).

Local do estudo

O estudo foi realizado na UTI de um hospital filantrópico de alta complexidade em cuidados oncológicos com 30 leitos de tratamento intensivo adulto.

População e amostra

A população foi constituída por todos os pacientes adultos e idosos, com diagnóstico médico de câncer, de ambos os sexos, internados na UTI entre outubro de 2019 e janeiro de 2020. Estimou-se o tamanho amostral para população infinita, por critério conservador, com grau de confiança de 95%, margem de erro de 5%, 20% de perdas e proporção de interesse de 15,5% na incidência de lesão por adesivo médico(¹⁷). O cálculo de amostra estabeleceu um número mínimo de 100 pacientes. Considerou-se como tempo zero (0) de coleta de dados o dia em que foi realizada a punção do CVP em cada paciente oncológico internado na UTI. O tempo de seguimento foi de três meses.

Os critérios de inclusão foram: ter o CVP puncionado na UTI, CVP fixado com filme transparente de poliuretano estéril e permanecer internado na UTI após admissão no estudo (punção do CVP) por no mínimo 48 horas após a primeira avaliação.

A população total foi constituída de 338 pacientes, sendo que 107 estavam em uso de cateter venoso central, 100 tiveram alta ou óbito em menos de 48 horas após a punção do CVP, 20 pacientes possuíam MARSI prévia em região de mãos e antebraço e 11 não aceitaram participar do estudo. A amostra não probabilística foi composta por 100 pacientes.

Variáveis do estudo

A variável desfecho foi lesão por adesivo médico relacionada ao CVP em pacientes oncológicos. As variáveis independentes foram: sociodemográficas (idade, sexo e cor da pele); clínicas (uso de álcool e tabaco, motivo da internação no setor, comorbidades, medicações utilizadas, tratamento neoadjuvante, hemoglobina e albumina sérica e glicemia); características da pele (umidade, textura, turgor, edema, coloração, elasticidade, sensibilidade, presença de pelos, lesão por adesivo médico, tipo de lesão por adesivo médico); avaliação da gravidade e demanda de cuidados (Therapeutic Intervention Scoring System-28 - TISS-28) além dos fatores de risco (composto pelos itens avaliados pela Escala de Braden).

Instrumento de coleta de dados

O instrumento que incluiu as informações necessárias foi construído pelos pesquisadores e contemplou itens relativos às variáveis sociodemográficas, clínicas e às características da pele. Foi composto por 42 itens e avaliado quanto ao conteúdo e aparência por dois enfermeiros estomaterapeutas que o julgaram adequado, claro e objetivo.

A escala de Braden tem sido empregada na obtenção dos fatores de risco para a MARSI, possui seis subescalas (percepção sensorial, atividade, umidade, nutrição, fricção e cisalhamento) contemplando fatores de risco intrínsecos e extrínsecos que, quando presentes, indicam risco de desenvolvimento de lesão por pressão(¹⁸). Considerou-se o escore da escala de Braden para avaliação da lesão de pele relacionada a adesivo médico uma vez que ambos os acometimentos compartilham fatores de risco similares. Sugere-se que a prevenção de lesão por pressão relaciona-se à redução de outros tipos de lesões que acometem a pele(¹,¹⁰).

Dessa forma, embora cada lesão tenha sua própria etiologia, o cuidado quanto à prevenção dos fatores de risco em comum pode acarretar na redução de outros tipos de lesões(⁸). Apesar da escala de Braden não ter sido desenvolvida especificamente para a avaliação do risco de MARSI, contempla itens para a identificação de fatores de risco, como estado nutricional e umidade da pele.

O Therapeutic Intervention Scoring System-28 (TISS-28) foi utilizado para a identificação da gravidade do paciente e demanda de cuidados. Esse instrumento foi construído para estabelecer a carga de trabalho de enfermagem em UTI a partir da determinação das intervenções terapêuticas, complexidade de cuidados de enfermagem demandados e tempo dispensado na realização de procedimentos de enfermagem no cuidado ao paciente crítico(¹⁹).

Coleta de dados

Antes do início da coleta de dados, foi realizada a capacitação dos enfermeiros do setor pelo pesquisador principal deste estudo (especialista em estomaterapia). Essa capacitação foi fundamentada no consenso “Adesivos médicos e segurança do paciente: Estado da Ciência”(²). Os principais temas abordados foram aspectos conceituais e operacionais de forma a padronizar a equipe na identificação das características e classificação da MARSI, orientação quanto ao preenchimento do instrumento de coleta de dados, registro fotográfico das lesões e esclarecimentos de dúvidas.

Diariamente, as informações relativas às variáveis sociodemográficas, gravidade do paciente (TISS 28) e fatores de risco para lesões (escala de Braden) eram coletadas nos prontuários eletrônicos. Os escores da escala de Braden e do TISS-28 foram coletados no primeiro dia de acompanhamento de cada paciente. Inspeção diária dos pacientes no sítio de inserção do CVP foi realizada pelo enfermeiro estomaterapeuta responsável e enfermeiros supervisores capacitados que registravam no instrumento as características da pele dos pacientes como umidade, textura, turgor, edema, coloração, elasticidade, sensibilidade, presença de pelos, lesão por adesivo médico e tipo de lesão por adesivo médico.

Utilizou-se um protocolo especialmente elaborado para documentar a avaliação da pele dos membros superiores. Este continha as variáveis: umidade (normal, seca, sudorética, oleosa); textura (normal, fina, áspera, enrugada); turgor (normal/ diminuído); edema (sim/não); coloração (rósea, pálida, eritrose, fenômeno de Raynaud, ictérica, cianose); hematoma (sim/não); petéquias (sim/não) e pelos (sim/não). Todos os enfermeiros supervisores dos três turnos de trabalho foram capacitados de forma a padronizar a avaliação.

Caso fosse constatada a necessidade de troca do dispositivo durante o período noturno ou em fins de semana e feriados, os enfermeiros foram orientados a realizar o registro fotográfico do membro puncionado após a retirada do dispositivo e antes da nova punção para posterior análise do enfermeiro estomaterapeuta e classificação da lesão. Os enfermeiros documentavam também evolução das características da pele na Evolução de Enfermagem, o que possibilitou o acompanhamento do paciente durante as 24 horas diárias.

Tratamento e análise dos dados

Os dados foram lançados no programa Epi Info, versão 3.5.1 por meio de dupla digitação para verificação da consistência dos mesmos. A seguir, foram exportados para o programa R, versão 3.6.2 para análises estatísticas. Na análise descritiva, adotou-se distribuições e frequências, medidas descritivas médias, mediana, desvio padrão, mínimo e máximo na produção de estimativas pontuais.

A incidência e taxa de incidência de lesão por adesivo médico relacionado ao CVP foram determinadas empregando-se a fórmula: número de casos novos em um determinado tempo/número de pessoas sob o risco de desenvolver o agravo no mesmo período de tempo x 100. A densidade de incidência foi calculada a partir do número de casos novos em um determinado tempo/número total de pacientes-tempo de observação.

Análise bivariada foi empregada na comparação entre os grupos de pacientes com e sem MARSI em relação às variáveis clínicas, sociodemográficas e características da pele, levando em consideração a média e o desvio padrão obtidos.

Os dados foram testados quanto à normalidade empregando-se o Teste de Kolmogov - Smirnov. Para a análise das variáveis categóricas utilizou-se o teste de Qui-quadrado de Pearson ou o teste exato de Fisher. Considerou-se como estatisticamente significativo um valor p ≤ 0,05. A força de associação foi estimada entre os fatores de risco e o desfecho por meio da medida Hazard Ratio (HR) incluindo intervalos de confiança de 95%. Procedeu-se ainda o cálculo dos valores de significância para cada fator analisado.

Conduziu-se a análise multivariada usando o modelo de regressão de Cox para identificar as variáveis que exerceram influência no desenvolvimento de lesão por adesivo médico no tempo de acompanhamento. Variáveis com valor de p ≤ 0,20 na análise bivariada foram incluídas no modelo de análise multivariada. O procedimento foi repetido até que todas as variáveis presentes no modelo possuíssem significância estatística (p ≤ 0,05), o que delimitou o modelo final ajustado.

Aspectos éticos

O estudo está em conformidade com a Resolução n ° 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, sendo aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa sob protocolo CAAE - 15181119.0.0000.5149.

Resultados

Encontrou-se que 31 pacientes da amostra apresentaram lesão na pele ao redor do sítio de inserção de CVP. A incidência global de lesão de pele relacionada a adesivo médico foi de 31,0% e a densidade de 3,4% casos por 100 pessoas-dia, variando entre 1,9% e 3,7% casos por 100 pacientes-dia, com intervalo de confiança de 95%. Verificou-se que 57 (57%) dos pacientes eram do sexo masculino. A idade deles esteve entre 26 e 89 anos com média de 63,10 anos (± 14,98). Além disso, 52 (52%) possuíam a cor de pele parda.

Encontrou-se que 64 (64%) pacientes não referiam consumo ou estavam em abstinência de bebida alcóolica e 75 (75%) de tabaco. Todos eles faziam uso de medicamentos durante a internação tanto para o controle da doença que motivou a internação como das doenças associadas ou para a prevenção de complicações. Os medicamentos mais frequentes que podem alterar as características da pele identificados foram os anticoagulantes (92,0%) e antibióticos (78,0%).

Os principais motivos de internação dos pacientes na UTI foram o pós-operatório imediato cirúrgico (35,0%) e sepse (28,0%). A maioria apresentava a comorbidade hipertensão arterial sistêmica (74,0%). A maior parte utilizou tratamento neoadjuvante com quimioterápicos; níveis séricos de albumina (87,0%) e hemoglobina (93,0%) abaixo do valor de referência e valores de glicemia (66,0%) dentro da normalidade.

Os resultados obtidos com a aplicação da escala de Braden foram: 50 (50,0%) pacientes com baixo ou moderado risco e 50 (50,0%) com alto ou altíssimo risco. Os escores pontuados pela aplicação do TISS-28 foram: 60 (60,0%) no escore I ou II e 40 (40,0%) no escore III ou IV.

O tempo médio até a ocorrência da MARSI encontrado foi de 5,60 (±5,49) dias, com mínimo de dois dias e máximo de oito dias. Em 21 pacientes (68,0%), a lesão de pele relacionada a adesivo médico foi classificada em remoção de pele. Quanto à localização das lesões de pele relacionadas a adesivo médico, 100% foram em membros superiores.

As principais características da pele na região de CVP observadas na maioria dos pacientes foram a ausência de edema (55,0%), de hematoma (78,0%), de petéquias (81,0%) e de pelos (86,0%) e coloração rósea (61,0%).

As variáveis que apresentaram associação estatisticamente significativa (p≤0,05) com a presença da lesão por adesivo médico foram etilismo, tabagismo, diagnóstico de trombose venosa profunda e insuficiência respiratória aguda no momento da internação, estar em pós-operatório imediato, presença de cardiopatia, dislipidemia, uso de antiarrítmico, ter recebido concentrado de hemácias, presença de lesão por fricção, lesão por pressão, turgor diminuído, edema, hematoma, petéquias, escores de risco na escala de Braden, gravidade clínica do paciente, elasticidade, umidade, textura e coloração (Tabela 1).

Tabela 1
Variáveis com associação significativa com o desfecho lesão de pele relacionada a adesivo médico relacionada ao cateter venoso periférico. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2020

Variáveis	Lesão por adesivo médico						Valor- p	HR * [IC 95%] †
	Sim		Não		Total
	N	%	N	%	N	%
Etilismo
Não/abstinência	21	68,00%	43	62,30%	64	64,00%	0,011	0,38 (0,14- 1,05)
Sim	10	32,30%	26	37,70%	36	36,00%
Tabagismo
Não/abstinência	22	71,00%	53	76,80%	75	75,00%	0,044	3,75 (1,27 - 11,2)
Sim	9	29,00%	16	23,20%	25	25,00%
Trombose venosa profunda
Não	26	83,90%	67	97,10%	93	93,00%	0,016	6.442 (1.175 - 35.308)
Sim	5	16,10%	2	2,90%	7	7,00%
Insuficiência respiratória aguda
Não	25	80,60%	66	95,70%	91	91,00%	0,015	5.280 (1.226 - 22.743)
Sim	6	19,40%	3	4,30%	9	9,00%
POI ‡ Cirúrgico
Não	26	83,90%	36	52,20%	62	62,00%	0,003	0.209 (0.072 - 0.610)
Sim	5	16,10%	33	47,80%	38	38,00%
Cardiopatia
Não	27	87,10%	47	68,10%	74	74,00%	0,045	0.316 (0.098 - 1.015)
Sim	4	12,90%	22	31,90%	26	26,00%
Dislipidemia
Não	29	93,50%	48	69,60%	77	77,00%	0,008	0.157 (0.034 - 0.722)
Sim	2	6,50%	21	30,40%	23	23,00%
Antiarrítmico
Não	28	90,30%	48	69,60%	76	76,00%	0,025	0.245 (0.067 - 0.895)
Sim	3	9,70%	21	30,40%	24	24,00%
Concentrado de hemácias
Não	14	45,20%	46	66,70%	60	60,00%	0,042	2.428 (1.021 - 5.776)
Sim	17	54,80%	23	33,30%	40	40,00%
Braden
Altíssimo/alto	22	70,90%	28	40,60%	50	50,00%	0,008	1,06 (1,03- 1,08)
Moderado/baixo	9	29,10%	41	59,40%	50	50,00%
TISS28 §
I/II	7	22,60%	53	76,81%	60	60,00%	<0,001	1,70 (1,40- 1,65)
III/IV	24	77,40%	16	23,19%	40	40,00%
Lesão por fricção
Não	25	80,60%	66	95,70%	91	91,00%	0,015	5.280 (1.226 - 22.744)
Sim	6	19,40%	3	4,30%	9	9,00%
Lesão por pressão
Não	11	35,50%	60	87,00%	71	71,00%	<0,001	12.121 (4.388 - 33.479)
Sim	20	64,50%	9	13,00%	29	29,00%
Dermatite associada à incontinência
Não	10	32,30%	69	100%	79	79,00%	<0,001	284.619 (16.008 -5.060,271)
Sim	21	67,70%	0	0,00%	21	21,00%
Turgor
Diminuído	30	96,80%	9	13,00%	39	39,00%	<0,001	0,005 (0,006 - 0,459)
Normal	1	3,20%	60	87,00%	61	61,00%
Edema
Não	4	12,90%	51	73,90%	55	55,00%	<0,001	0,016 (0,003 - 0,080)
Sim	27	87,10%	18	26,10%	45	45,00%
Hematoma
Não	11	35,50%	67	97,10%	78	78,00%	<0,001	0,006 (0,019 - 0,224)
Sim	20	64,50%	2	2,90%	22	22,00%
Petéquias
Não	16	51,60%	65	94,20%	81	81,00%	<0,001	0,065 (0,192 - 0,224)
Sim	15	48,40%	4	5,80%	19	19,00%
Umidade
Normal	0	0,00%	46	66,70%	46	46,00%	<0,001	Ref. 0,006 (0,001 - 0,202)
Alterada	31	100,00%	23	33,30%	54	54,00%
Textura
Normal	0	0,00%	48	69,60%	48	48,00%	<0,001	1,018 (0,232 - 4,465)
Alterada	31	100,00%	21	30,40%	52	52,00%
Coloração
Normal	3	9,70%	58	84,10%	61	61,00%	<0,001	1,188 (0,044 - 31,574)
Alterada	28	90,30%	11	15,90%	39	39,00%

• ^*
  HR = Hazard ratio;
• ^†
  IC = Intervalo de confiança;
• ^‡
  POI = Pós -operatório imediato;
• ^§
  TIS 28 = Therapeutic Intervention Scoring System

No que diz respeito à análise multivariada, as variáveis que impactaram de forma estatisticamente significativa e conjunta no desfecho lesão por adesivo médico e que compuseram o modelo preditivo final para a presença de lesão por adesivo médico nos pacientes internados na UTI oncológica em estudo no período foram turgor diminuído, presença de hematoma e edema (Tabela 2).

Tabela 2
Fatores de risco associados no tempo até a ocorrência de lesão por adesivo médico. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2020

Variáveis independentes	HR *	IC † 95% HR *		P-valor
		Inferior	Superior
Turgor diminuído	0.53	0,25	0,86	0.024
Hematoma	0.61	0,32	1.86	0.004
Edema	0.71	0,63	3.09	0.002

• ^*
  HR = Hazard Ratio;
• ^†
  IC = Intervalo de confiança

Discussão

Este estudo possibilitou novo conhecimento sobre a integridade da pele alterada relacionada a adesivo médico em sítio de inserção de CVP em pacientes oncológicos críticos, uma vez que estudos de incidência de MARSI prevalece em pacientes neonatos(²⁰), idosos(¹⁷), em pós-operatório(⁷) e com estoma(²¹).

A incidência da lesão de pele relacionada a adesivo médico encontrada no presente estudo é similar à identificada em idosos internados em instituição de longa permanência no Japão (incidência cumulativa de 15±5% e densidade de incidência de 38/1000 pessoas-dia)(¹⁷) e superior àquela obtida em unidade clínica de feridas vasculares nos Estados Unidos (incidência de 5,8%)(⁷). Porém, devido ao escasso número de publicações sobre a temática, seja por diferenças no contexto do público avaliado e cenários analisados, tipos de adesivos médicos empregados, seja por diferenças nos métodos usados e na variabilidade dos resultados encontrados, a comparação das incidências de MARSI tem sido dificultada(⁵,⁷,⁹,¹⁷). Além disso, outro problema é a avaliação da MARSI, uma vez que nas unidades de internação de adulto tem sido observado que a maioria das lesões de pele do tipo MARSI foram erroneamente classificadas como desnudamento da pele (48%)(⁸) e em membros superiores(⁸-⁹).

Neste sentido, esta pesquisa representa conhecimento novo sobre a integridade da pele alterada relacionada a adesivo médico em sítio de inserção de CVP pois envolve pacientes oncológicos, em cenário de terapia intensiva.

Verifica-se que a MARSI ocorre em pessoas de diferentes idades, problemas clínicos e atendidas em todos os níveis de assistência à saúde(⁷,¹⁷,²⁰) e pode levar a consequências nefastas sobre as condições físicas dos pacientes, repercutir negativamente sobre a segurança e satisfação com os serviços ofertados, além de acarretar em impactos socioeconômicos para os serviços de saúde e sociedade(⁸).

Observa-se que pacientes críticos apresentam maior risco de alterações na coagulação, perfusão tecidual, inflamação, função imunológica, metabolismo, nutrição e utilização de terapias medicamentosas que levam a modificações nas respostas biológicas destes e influenciam na cicatrização da pele(²¹). Com relação aos pacientes oncológicos críticos, as múltiplas terapias medicamentosas tem efeitos deletérios sobre os mesmos(¹-⁸) e a combinação da quimioterapia com as especificidades da doença oncológica faz com que a pele dos pacientes oncológicos críticos fique ainda mais frágil, tornando-os mais susceptíveis às MARSI(⁹), o que foi comprovado no presente estudo.

Verificou-se o já afirmado na literatura, comprovando-se que, nesta população, as alterações da epiderme, derme e tecido conjuntivo podem se associar ao uso de agentes antineoplásicos e fatores concomitantes como idade, tabagismo, doenças crônicas e tratamento antineoplásico, o que pode levar a alterações no processo de cicatrização(¹¹-¹²). Relevante também a avaliação do tempo até o aparecimento da MARSI. Encontrou-se que os fatores de risco edema, hematoma e turgor diminuído apresentaram associação estatisticamente significativa (p<0,05) com o tempo até a ocorrência de MARSI e que predispuseram a um maior risco para o seu desenvolvimento (HR≥1) nos pacientes críticos oncológicos.

A presença de edema nesses pacientes pode ser associada a várias condições clínicas, como respostas alérgicas, falha cardíaca congestiva, trombose venosa profunda, hipoalbuminemia, uso de agentes quimioterápicos, corticoterapia, sepse e sobrecarga de líquidos. Assim, pacientes com maior gravidade clínica apresentaram o desfecho de lesão na pele relacionada a adesivo médico (MARSI)(⁴,⁷), fato comprovado neste estudo.

O edema foi um fator preditivo para a MARSI. Ressalta-se que, aliado à distensão da pele causada pelo edema, o efeito memória associado de alguns adesivos médicos contribui para a ocorrência da lesão de pele associada a adesivo médico, como as bolhas(⁴,⁷). Verifica-se que o edema enfraquece a junção entre a derme e a epiderme, aumentando o risco de lesão durante a remoção do adesivo médico(⁸).

No presente estudo identificou-se também que o hematoma foi fator preditivo para o desenvolvimento de MARSI. Este é geralmente ocasionado pelo rompimento de vasos sanguíneos que provocam pequenas hemorragias sob a pele e levam a redução no aporte de oxigênio e nutrientes, o que aumenta a fragilidade da pele e pode favorecer o risco de lesões(⁴,²¹-²²). Na literatura, a presença de hematoma não foi identificada como um fator de risco para o desenvolvimento da MARSI, dado refutado no presente estudo.

Outro fator preditivo para a MARSI encontrado no presente estudo foi o turgor diminuído. Este é indicativo de pele desidratada e ressecada devido à redução na produção de glândulas sebáceas e sudoríparas, o que aumenta o risco de integridade da pele prejudicada(²²-²³). O turgor tem especial importância na avaliação da pele, uma vez que intervenções de enfermagem específicas para a prevenção de MARSI, de acordo com tipo de pele, devem ser prescritas e implementadas(³).

Em ambientes clínicos de cuidado de saúde, alguns dispositivos médicos como o CVP são corriqueiramente utilizados e estes requerem repetidas aplicações e remoções de adesivos médicos para sua fixação na pele dos pacientes. Neste sentido, o risco de integridade da pele prejudicada fica aumentado, especialmente no caso de pacientes oncológicos críticos(¹¹-¹²). A associação entre antissepsia da pele, seleção e fixação do adesivo aumenta o risco das lesões por adesivo médico. Sabemos que a preparação antimicrobiana da pele é valiosa no processo de antissepsia, entretanto ela modifica a microbiota e, consequentemente, o pH da pele, além de haver processo mecânico de fricção na utilização dessas preparações sob a pele, o que causa atrito na sua superfície(⁴,⁹). A repercussão desse efeito na potencialização dos danos à pele ainda não está completamente elucidada, carecendo de estudos para sua mensuração.

Verifica-se que os fatores preditivos para lesão de pele relacionada a adesivo médico em região de fixação de CVP encontrados nesse estudo são considerados como potenciais para a alteração da aderência entre a pele e o adesivo médico, tornando-a mais forte que a fixação das células cutâneas à pele. A falha coesiva ocorre quando a força adesiva excede a força das interações entre as várias camadas da pele. Como resultado, as camadas epidérmicas separam-se ou a epiderme separa-se completamente da derme(⁴).

Apesar da relevância de fatores extrínsecos relacionados à MARSI tais como o tipo de adesivo e método de remoção e fixação deste insumo, percebe-se que características intrínsecas individuais precisam ser consideradas, uma vez que interferem na estruturação do tecido e na junção dermoepidérmica.

Identificam-se como limitações do presente estudo o fato de não terem sido avaliadas as técnicas de aplicação e remoção do adesivo médico, além da análise do emprego do “Protocolo de cuidados com o acesso venoso periférico” na prática clínica. Recomenda-se que teste de alergia aos adesivos a serem padronizados nas instituições sejam rotineiramente empregados para os pacientes, uma vez que reações alérgicas são comuns.

Além disso, tendo em vista que o cenário do estudo foi uma UTI de um hospital oncológico de grande porte e esta pode não representar o perfil da clientela em outros ambientes de cuidados, sugere-se que pesquisas subsequentes sejam conduzidas para estabelecer incidências e fatores de risco da MARSI e viabilizar estudos comparativos em diferentes cenários do cuidado e com diferentes populações.

A MARSI é evento adverso que tem grande implicação para a segurança do paciente e para a qualidade da assistência de enfermagem prestada, com implicações éticas e legais tanto para os profissionais como para as instituições. Neste sentido, o estudo colabora com a prática de enfermagem no cuidado de pacientes oncológicos internados em UTI e que podem sofrer com a possibilidade de desenvolver essas lesões. Assim, mostra a importância de se realizar avaliação da pele criteriosa especialmente para pacientes com CVP protegidos por adesivos médicos uma vez que estes podem levar a lesões na pele.

Conclusão

No presente estudo, encontrou-se uma incidência de lesão de pele relacionada a adesivo médico em sítio de inserção de CVP de 31,0% e uma densidade de incidência de 3,4% casos por 100 pessoas-dia. Compuseram o modelo preditivo na análise multivariada as variáveis turgor diminuído, presença de hematomas e edema.

A lesão de pele relacionada a adesivo médico em sítio de inserção de CVP tem alta incidência em pacientes críticos oncológicos e está associada ao turgor diminuído, presença de hematoma e edema nesses indivíduos.

Assim, o estudo é valioso na medida em que as evidências clínicas geradas podem favorecer a prática clínica na assistência a pacientes com risco de integridade da pele prejudicada.

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Editado por

Editora Associada: Maria Lúcia Zanetti

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  08 Nov 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  04 Mar 2021
• Aceito
  06 Ago 2021