Aperfeiçoar as habilidades e a prática de enfermeiros para prestar assistência de qualidade a adolescentes em condições de vulnerabilidade^*

Em outubro de 2014, a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) e seus Estados Membros adotaram a Estratégia de Acesso Universal à Saúde e Cobertura Universal de Saúde, que define o acesso universal como a ausência de barreiras geográficas, econômicas, socioculturais, organizacionais ou de gênero; e cobertura de saúde como a capacidade do sistema de saúde para atender às necessidades da população, incluindo a disponibilidade de infraestrutura, recursos humanos, tecnologias de saúde (incluindo medicamentos) e financiamento. A estratégia de saúde universal defendia um sistema de saúde robusto, apoiado por pessoal de saúde motivado, bem distribuído e com um conjunto apropriado de habilidades, para fornecer serviços de qualidade com base nas necessidades da população¹.

Em setembro de 2017, a OPAS e seus Estados Membros aprovaram a Estratégia de Recursos Humanos para Acesso Universal à Saúde e Cobertura Universal de Saúde. As linhas de ação da Estratégia são: fortalecer e consolidar a governança e liderança; desenvolver condições e capacidades para ampliar o acesso à saúde e a cobertura de saúde, com equidade e qualidade; e fazer parceria com o setor de educação para responder às necessidades dos sistemas de saúde em transformação para a saúde universal². Esses documentos destacaram a escassez de Recursos Humanos em Saúde (RHS) e seu impacto na prestação de serviços com foco no atendimento ao paciente e com a qualidade e segurança exigidas.

Em setembro de 2018, o Plano de Ação para a Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente 2018-2030 foi aprovado pelos Estados Membros da OPAS/OMS. O plano prevê a promoção do acesso universal e equitativo de mulheres, crianças e adolescentes a serviços de saúde completos e de qualidade. As ações propostas neste plano incluem o desenvolvimento e implementação de atenção integral ao adolescente, análise sistemática e abordagem das barreiras enfrentadas por adolescentes em condições de vulnerabilidade no acesso aos serviços de saúde. Desde 2020, a pandemia de COVID-19 tem impactado os serviços de saúde e os resultados de saúde nas Américas, particularmente em populações vulneráveis, e destacou as conexões desordenadas entre saúde, economia, meio ambiente e políticas e mecanismos de proteção social.

Dado o impacto do COVID-19 na região, avançar e implementar uma abordagem de atenção primária à saúde (APS) é urgentemente necessário agora mais do que nunca. Nesse contexto, a OPAS e a Global Affairs Canada iniciaram um projeto em 2021 focado em intervenções para fortalecer o primeiro nível de atenção para garantir a continuidade dos programas prioritários de saúde, planejando a recuperação dos sistemas de saúde a médio e longo prazo. Suas ações contribuirão para aumentar o acesso e a cobertura de serviços de saúde sexual, reprodutiva e materna para mulheres e meninas adolescentes, identificando e superando as barreiras para atender às suas necessidades de saúde por meio da oferta de serviços adequadas ao gênero, culturalmente sensíveis, com foco nas pessoas, abrangentes e de qualidade, e de intervenções focadas na abordagem do curso de vida. Um subprojeto visa a atuação do enfermeiro na melhoria da saúde de adolescentes em situação de vulnerabilidade.

Com a colaboração das escolas de enfermagem da Universidad Nacional de Colombia - Colombia, Universidad de Guayaquil - Ecuador e Universidad Nacional Mayor de San Marcos - Perú, realizou-se uma análise de currículos e identificação de conteúdos relacionados à saúde do adolescente nos cursos de graduação em enfermagem destes países. Entre os resultados se encontrou a necessidade de melhorar a capacitação do corpo docente e a identificação de temas relacionados à saúde do adolescente que precisam ser incorporados à formação do enfermeiro, como comportamento (decisão e atitude), identidade de gênero e orientação sexual, bullying e cyberbullying, uso de tecnologias digitais, violência nos relacionamentos, paternidade na adolescência e atraso puberal.

A adolescência é uma etapa importante do desenvolvimento humano, na qual os adolescentes, nem crianças e nem adultos jovens, lidam com fatores físicos, hormonais, sexuais, emocionais, cognitivos, morais e de relacionamento. Embora geralmente sejam considerados um grupo saudável, a incidência de condições de saúde evitáveis ou tratáveis e as barreiras de acesso são identificadas como questões importantes que afetam sua saúde³.

Desde 2020, este grupo tem sido afetado pelos efeitos diretos da COVID-19, mas também no seu quotidiano, com a interrupção de serviços de saúde críticos, incluindo serviços de saúde mental e saúde sexual e reprodutiva, a interrupção da educação e ambiente social e trocas reduzidos, a perda de renda familiar e o aumento da exposição à violência⁴. É fundamental que as competências e habilidades dos profissionais de saúde e as unidades de saúde sejam aprimoradas para responder melhor às necessidades dessa faixa etária e avançar na cobertura universal de saúde para adolescentes⁵. Juntamente com as lições aprendidas com a resposta à pandemia de COVID-19, os padrões globais para serviços de saúde de qualidade para adolescentes, publicados pela OMS em 2015, fornecem orientações claras sobre o caminho a seguir nesse respeito⁶.

Dada a inserção e o papel do enfermeiro nos serviços e sistemas de saúde, o fortalecimento da força de trabalho de enfermagem passa pela priorização de políticas com foco em ações nas áreas de educação, emprego, liderança e maximização das contribuições do enfermeiro na prestação de serviços, conforme recomendado nas Orientações Estratégicas Globais da OMS para Enfermagem e Obstetrícia 2021-2025⁷.

O investimento nos profissionais de enfermagem, nas suas diversas esferas de ação e tomada de decisão, responderá a problemas como a carência, distribuição desigual e insuficiente qualificação, com impacto específico nas populações em situação de vulnerabilidade.

A Organização Pan-Americana da Saúde, para suprir a necessidade de atualização do conhecimento de docentes e enfermeiros em relação à saúde do adolescente, está planejando diversas atividades nos próximos anos, como a promoção do curso “Salud integral de los y las adolescentes”, disponível no Campus Virtual de Saúde Pública, e a realização de séries de webinars, oficinas e outras atividades de capacitação voltadas para as necessidades de capacitação identificadas. Além disso, serão realizadas análises de políticas relacionadas à saúde do adolescente, participação do enfermeiro em cargos de liderança, defesa da ampliação da atuação do enfermeiro na saúde escolar e na atenção primária à saúde e divulgação das práticas de enfermagem na saúde do adolescente. Este número especial desta revista é uma das conquistas deste projeto.

Espera-se que os artigos aqui publicados auxiliem na divulgação das melhores práticas e papéis dos enfermeiros em diversos países, especialmente naqueles países do projeto como Bolívia, Equador, Colômbia, Guiana, Honduras, Peru, e gerem subsídios para governos, formuladores de políticas, instituições de ensino, associações profissionais e pesquisadores para apoiar ações efetivas relacionadas à saúde do adolescente.

Referências

• ¹
  Pan American Health Organization. Strategy for Universal Access to Health and Universal Health Coverage [Internet]. Washington, D.C: PAHO; 2014 [cited 2022 Mar 22]. Available from: https://iris.paho.org/handle/10665.2/28276
  » https://iris.paho.org/handle/10665.2/28276
• ²
  Pan American Health Organization. Strategy on Human Resources for Universal Access to Health and Universal Health Coverage [Internet]. Washington, D.C.: PAHO; 2017 [cited 2022 Mar 22]. Available from: https://www.paho.org/en/documents/strategy-human-resources-universal-access-health-and-universal-health-coverage-csp2910
  » https://www.paho.org/en/documents/strategy-human-resources-universal-access-health-and-universal-health-coverage-csp2910
• ³
  World Health Organization. Working for a brighter, healthier future: how WHO improves health and promotes well-being for the world's adolescents [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [cited 2022 Mar 22]. 62 p. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/351088
  » https://apps.who.int/iris/handle/10665/351088
• ⁴
  Pan American Health Organization. Mitigating the Direct and Indirect Consequences of COVID-19 on the Health and Well-Being of Young People in the Americas [Internet]. Washington D.C.: PAHO; 2022 [cited 2022 Mar 22]. Available from: https://iris.paho.org/handle/10665.2/54815
  » https://iris.paho.org/handle/10665.2/54815
• ⁵
  Organización Mundial de la Salud. Competencias básicas en materia de salud y desarrollo de los adolescentes para los proveedores de atención primaria incluido un instrumento para evaluar el componente de salud y desarrollo de los adolescentes en la formación previa al servicio de los proveedores de atención sanitaria [Internet]. Ginebra: OMS; 2015 [cited 2022 Mar 22]. 49 p. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/178251
  » https://apps.who.int/iris/handle/10665/178251
• ⁶
  World Health Organization; UNAIDS. Global standards for quality health-care services for adolescents: a guide to implement a standards-driven approach to improve the quality of health care services for adolescents [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2022 Mar 22]. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/183935
  » https://apps.who.int/iris/handle/10665/183935
• ⁷
  World Health Organization. Global strategic directions for nursing and midwifery 2021-2025 [Internet]. Geneva: WHO; 2021 [cited 2022 Mar 22]. 40 p. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/344562
  » https://apps.who.int/iris/handle/10665/344562

Editado por

*

Editado pela Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Centro Colaborador da OPAS/OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Ribeirão Preto, SP, Brasil. A publicação deste suplemento foi apoiada pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS). Os artigos passaram pelo processo padrão de revisão por pares da revista para suplementos. As opiniões expressas neste suplemento são exclusivas dos autores e não representam as opiniões da OPAS/OMS.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  03 Out 2022
• Data do Fascículo
  2022