O protagonismo do profissional da enfermagem na ampliação do tratamento da infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis no Brasil

O Brasil assumiu o compromisso de alto nível de eliminar a tuberculose (TB) como um problema de saúde pública no país até 2030 e para alcançar esse objetivo torna-se necessária a ampliação significativa da investigação e do tratamento da infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis (ILTB), também conhecido como tratamento preventivo da tuberculose (TPT).

Desde a década de 1990, o país recomenda a investigação da ILTB e o TPT para crianças contato e pessoas vivendo com HIV, porém, somente em 2011 essa estratégia foi fortalecida. Posteriormente, a partir da implantação do protocolo da ILTB em 2018, o Ministério da Saúde (MS) considerou a estratégia como prioritária, e apesar de todos os esforços, verificou-se ainda uma baixa oferta do tratamento da ILTB pelos serviços no Brasil ^{( 1 )} .

Considerando a estratégia End TB, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece que o tratamento da ILTB é fundamental para a eliminação da TB no mundo ^{( 2 )} , sendo importante a ampliação das ações da ILTB para a redução da morbimortalidade por tuberculose e consequente incidência futura da doença com a redução do número de casos, particularmente, entre contatos, imunodeprimidos e a população vivendo com HIV/aids. Daí a importância de incrementar a estratégia de ILTB no Brasil e, assim, eliminar a TB como problema de saúde pública até 2035 ^{( 3 )} .

Para atender e alcançar as metas operacionais (nacionais e internacionais) propostas no Plano Nacional Livre de TB ^{( 3 )} , ressalta-se a importância da enfermagem brasileira nas últimas décadas, contribuindo e ampliando a sua prática clínica (seja no manejo de casos de TB e/ou de ILTB), baseada em evidências (no emprego de investigação e pesquisa), na gestão e planejamento do cuidado ^{( 4 )} voltados às necessidades individuais e coletivas da sociedade. Neste sentido, ganhou robustez a dimensão assistencial no processo de trabalho do enfermeiro na Atenção Primária à Saúde em TB e, ao ser ampliada a sua prática, deve-se reforçar o “conhecimento técnico-científico, político e que não se concretiza de forma isolada, mas requer interfaces com o trabalho em equipe e na prática interprofissional” ^{( 4 )} . Adicionalmente, experiências internacionais reforçam o sucesso do tratamento e do manejo clínico da ILTB realizado por enfermeiro ^{( 2 )} .

Nesse ínterim, visando alterar o cenário de baixa acessibilidade de pessoas identificadas e tratadas para a ILTB no país, o Ministério da Saúde, por meio da área técnica da Coordenação-Geral de Vigilância da Tuberculose, Micoses Endêmicas e Micobactérias Não Tuberculosas, da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, realizou oficinas com todas Unidades Federadas e identificou a existência de múltiplos fatores para a reduzida indicação do tratamento da ILTB, e dentre eles, a centralização da prescrição da prevenção em uma única categoria profissional, inviabilizando o cumprimento das metas de ampliação da estratégia de indicação, diagnóstico e tratamento da ILTB pelos serviços de TB. Após essa análise, criou-se nova estratégia com vistas a otimizar a instituição mais efetiva do TPT nos serviços, com novas atribuições do profissional enfermeiro.

Cabe destacar a importância dos profissionais da enfermagem em toda a estruturação do Sistema Único de Saúde (SUS), e também historicamente do protagonismo da categoria nas ações programáticas para controle da TB. Essa expertise dá suporte à ampliação de sua atuação profissional, incluindo a solicitação de ensaios de liberação do interferon-gama ( Interferon-Gamma Release Assays- IGRA) no diagnóstico da ILTB e a realização do TPT.

Posteriormente, formou-se um grupo de trabalho com vários enfermeiros, especialistas em TB, a Rede TB, o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e em conjunto discutiu-se a importância e a possibilidade desse profissional diagnosticar e tratar a ILTB, a partir da anuência do COFEN. Após amplo debate, o COFEN emitiu parecer favorável fortalecendo a implementação dessa estratégia no país ^{( 5 )} .

Adicionalmente, no processo de implantação do protocolo da ILTB realizada por enfermeiros, a Rede TB participa como parceiro, na ampliação da sua contribuição na capacitação técnica dos enfermeiros em ILTB, além de poder auxiliar no incremento dessa estratégia no país, divulgando o conhecimento sobre a prevenção da TB a fim de organizar os serviços, e o COFEN na regulamentação e divulgação da indicação de tratamento da infecção latente pelo enfermeiro, em todos os níveis de atenção. Por fim, o MS formalizará um protocolo de manejo clínico, ainda este ano, com participação e ações voltadas ao enfermeiro.

Há um grande desafio pela frente, a partir da aprovação do Parecer COFEN 040/2023 ^{( 5 )} , com necessidade de estabelecer novas normas, protocolos e capacitação dos profissionais enfermeiros, incluindo o cuidado centrado na pessoa com TB no seu processo de trabalho ^{( 4 )} ; com fortalecimento da prevenção, diagnóstico e seguimento dos casos de ILTB, bem como a otimização de ações que facilitem adesão ao tratamento preventivo, nesse esforço dos enfermeiros para eliminar a TB como problema de saúde pública no Brasil.

Referencias

• ^1.
  Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Protocolo de vigilância da infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis no Brasil [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2018 [cited 2023 Sep 15]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_vigilancia_infeccao_latente_mycobacterium_tuberculosis_brasil.pdf
  » https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_vigilancia_infeccao_latente_mycobacterium_tuberculosis_brasil.pdf
• ^2.
  World Health Organization. The End TB Strategy [Internet]. Geneva: WHO; 2017 [cited 2023 Sep 15]. Available from: https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1271371/retrieve
  » https://apps.who.int/iris/rest/bitstreams/1271371/retrieve
• ^3.
  Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Protocolo de vigilância da infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis no Brasil [Internet]. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2022 [cited 2023 Sep 15]. Available from: http://sitetb.saude.gov.br/download-2023/ILTB_Protocolo_de_vigilancia_da_ILTB_2022.pdf
  » http://sitetb.saude.gov.br/download-2023/ILTB_Protocolo_de_vigilancia_da_ILTB_2022.pdf
• ^4.
  Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Tuberculose na atenção primária: protocolo de enfermagem [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde, 2022 [cited 2023 Sep 15]. Available from: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/tuberculose/tuberculose-na-atencao-primaria-a-saude-protocolo-de-enfermagem.pdf
  » https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/tuberculose/tuberculose-na-atencao-primaria-a-saude-protocolo-de-enfermagem.pdf
• ^5.
  Conselho Federal de Enfermagem (BR). Parecer nº 40/COFEN, de 15 de Maio de 2023 . Dispõe sobre a solicitação do teste diagnóstico (teste de liberação de interferon-gama release assay IGRAN) e indicação de tratamento da infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis (ILTB) pelo Enfermeiro, em todos os níveis de atenção. Brasília: COFEN; 2023.

• Como citar este artigo

  Johansen FDS, Evangelista MSN, Maciel ELN. Nursing professionals’ leading role in expanding the treatment for latent Mycobacterium tuberculosis infection in Brazil. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2023;31:e4083 [cited ano mês dia]. Available from: URL . https://doi.org/10.1590/1518-8345.0000.4083

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Dez 2023
• Data do Fascículo
  2023