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Estratégia eleitoral nos municípios brasileiros: componente programático e alinhamento partidário

Electoral strategy in Brazilian municipalities: programmatic component and partisan alignment

RESUMO

Introdução:

O artigo investiga o componente programático nas eleições municipais no Brasil, destacando se, e em que medida, os programas de governo exigidos por lei desde 2009 se alinham partidariamente. A hipótese é a de que, a despeito da fraqueza dos partidos brasileiros, conforme a literatura dominante, onde práticas particularistas teriam preponderância, a dimensão programática constitui, efetivamente, uma estratégia eleitoral, apresentando algum grau de consistência partidária.

Materiais e Métodos:

Para testar a consistência partidária dos programas de governo, analisamos 3.410 documentos de candidatos a prefeito em 2016 em 1.335 municípios, através do método de análise de texto que estima posições políticas a partir da frequência de palavras (wordfish).

Resultados:

Nossos achados demonstram que: 1) do ponto de vista eleitoral: candidatos a prefeito se diferenciam programaticamente e se alinham partidariamente em disputas em pequenos municípios e em disputas bipartidárias; 2) do ponto de vista partidário: grandes partidos distribuíram suas propostas de políticas públicas de modo difuso. Esse foi o caso do PMDB, PSDB, DEM, PT PSB e PSD e pode se associar isso a uma estratégia eleitoral mais abrangente, tentando se aproximar do eleitor mediano.

Discussão:

Isso significa não apenas que a dimensão programática é uma das estratégias mobilizadas na competição eleitoral no Brasil, mas também que os partidos contribuem para compreendê-las, mesmo que nem sempre de modo determinante.

Palavras-chave:
alinhamento partidário; eleições municipais; partidos políticos; programas de governo; método wordfish

ABSTRACT

Introduction:

This paper aims to investigate theprogrammatic component in Brazilian municipal elections. We want to know if and to what extent government programs demanded by law since 2009 are partisan aligned. Despite the weakness and the preponderance of particularistic practices inside Brazilian parties, often stressed by the literature, our hypothesis is that parties’ programmatic dimension does provide an electoral strategy, presenting some degree of partisan consistency.

Materials and Methods:

In order to test it, we analyzed 3.410 programs from 2016 election’s mayoral candidates in 1.355 municipalities, through the text analysis method that estimates political positions from word frequency (wordfish).

Results:

Our findings reveals that: 1) from the electoral point of view, mayor candidates distinguish themselves programmatically and align each other on partisan lines when competing in bipartisan disputes in small cities; 2) from a partisan point of view, big parties spread their policy proposals in a diffuse way. That was the case of PMDB, PSDB, DEM, PT, PSB and PSD and we may associate this to a wider electoral strategy, trying to get closer to the average voter.

Discussion:

That means not only that the programmatic dimension is one of the strategies mobilized in Brazilian electoral competition, but also that parties contribute to its understanding, even though not always decisively.

Keywords:
Partisan alignment; Municipal elections; Political parties; Government programs; wordfish method

I. Introdução1 1 Agradecemos aos comentários e sugestões de Davi Moreira e dos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e Política.

No ano de 2009, o presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a Lei nº 12.034, que, entre outras modificações na Lei dos Partidos Políticos e nas normas eleitorais, passou a exigir que todos os candidatos a cargos executivos no Brasil registrem suas propostas de governo junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A lei não especifica o formato ou conteúdo mínimo dos programas, formaliza apenas a sua obrigatoriedade no momento do registro da candidatura, ou seja, até o dia 15 de agosto do ano eleitoral.

Apesar dessa nova exigência, não é consensual que uma dimensão da competição eleitoral se estabelece efetivamente em torno dos programas de governo. Do ponto de vista de uma literatura mais ampla, a busca pelo eleitor mediano impõe a convergência programática entre os candidatos e partidos (Downs 1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
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, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.). Considerando especificamente o caso brasileiro, há uma lacuna no que se refere à competição eminentemente programática, já que o Brasil supostamente constituiria um cenário de partidos fracos, onde personalismo e práticas particularistas como o clientelismo teriam predominância.

Por um lado, para autores como Ames (2003)Ames, B., 2003. Os entraves da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV. e Mainwaring (1991Mainwaring, S., 1991. Políticos, partidos e sistemas eleitorais: o Brasil numa perspectiva comparada. Novos Estudos Cebrap, 29, pp. 34-58., 1999Mainwaring, S., 1999. Rethinking Party Systems in the Third Wave of Democratization The case of Brazil. Stanford: Stanford University Press.), essa visão estaria atrelada às regras eleitorais aqui vigentes, que, através do sistema proporcional de lista aberta, privilegiaria o individualismo político. Por outro lado, esse diagnóstico se refere também às continuidades históricas que não foram capazes de superar as elites políticas tradicionais e suas práticas políticas arcaicas (Hagopian 1996Hagopian, F., 1996. Traditional Politics and Regime Change in Brazil. Cambridge: Cambridge University Press.). De uma perspectiva empírica, partidos fracos e políticos clientelistas levariam à ausência de um elemento programático nas eleições, principalmente nas que se passam no nível local.

A disponibilidade de todas as plataformas dos candidatos ao executivo municipal no Brasil proporciona, portanto, uma importante oportunidade para a investigação da hipótese da ausência da competição programática nas eleições municipais. Afinal, se a lei que exige que os candidatos a prefeito elaborem e registrem tais programas não especifica características como tamanho e principais conteúdos que devem abordar, por que candidatos e partidos construiriam plataformas efetivas se a dimensão programática não importasse? O objetivo deste trabalho é justamente investigar a presença do componente programático no contexto eleitoral brasileiro e, em seguida, o alinhamento partidário das políticas oferecidas pelos candidatos a prefeito em 2016.

Para isso, utilizamos o método de análise de texto desenvolvido por Slapin & Proksch (2008)Slapin, J. & Proksch, S., 2008. A Scaling Model for Estimating Time-Series Party Positions from Texts. American Journal of Political Science, 52(3), pp. 705-722. DOI: 10.1111/j.1540-5907.2008.00338.x
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para estimar posições políticas a partir da frequência de palavras (wordfish). O modelo será aplicado aos programas de governo registrados pelos candidatos a prefeito nas eleições 2016 em uma amostra significativamente estatística dos municípios brasileiros elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estratificada de acordo com o tamanho da população. Mais especificamente, analisamos 3.410 programas de 1.385 municípios, testando a hipótese de que os candidatos se diferenciam programaticamente no nível local.

Caso essa hipótese seja comprovada, é possível elencar objetivos secundários, entre os quais o mais relevante talvez seja identificar se e em que medida o componente programático se articula partidariamente. Esse propósito está embasado em uma distinção fundamental entres as dimensões programática e partidária. Dizer que há componente programático é afirmar que os candidatos têm incentivos para atrair o eleitorado também a partir de propostas de políticas públicas e que, por isso, é de se esperar que tais propostas se diferenciem entres eles. Por outro lado, dizer que esse componente possui consistência partidária significa verificar que um mesmo partido apresenta um alinhamento de propostas ao longo do território nacional. Assim, a existência da dimensão programática não implica, necessariamente, em partidarismo. Com relação a esse objetivo, a hipótese é que os programas apresentam algum alinhamento partidário nos diversos municípios considerados.

Este trabalho está organizado da seguinte maneira: na segunda seção, discutimos a dimensão programática na competição eleitoral. Em seguida, transpomos esse debate para o Brasil, demonstrando a lacuna na literatura e apresentando estudos mais recentes que permitem discuti-la. Na quarta seção, explicamos o método utilizado para o desenvolvimento do trabalho para, em seguida, descrevermos e analisarmos os dados. Na quinta, debatemos as contribuições do trabalho no que se refere à atuação dos partidos e as estratégias eleitorais no nível local, objeto de ainda poucas investigações na ciência política, e, na sexta seção, retomamos, como considerações finais, alguns elementos acerca do rendimento analítico de evidências sobre programas dos candidatos.

II. A dimensão programática da competição eleitoral

Para Downs (1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
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, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.), uma disputa eleitoral se define em torno de programas. Partidos, buscando racionalmente a maximização de votos, propõem políticas para vencer as eleições. Eleitores – também racionais – tentam maximizar utilidade, escolhendo o partido cujas posições mais se aproximam das suas. Porque visam atingir o maior eleitorado possível, ou o eleitor mediado, os partidos tendem a convergir suas políticas. Nesse sentido, Downs (1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
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, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.) impõe o paradoxo programático; isto é, a concepção de porque é elemento central de uma disputa, a regra no que se refere aos programas é convergir em vez de competir (Salles 2019Salles, N., 2019. Competição eleitoral no Brasil: uma perspectiva programática. Tese de Doutorado em Ciência Política. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro.).

Todavia, sabe-se que a ruptura com pelo menos uma das premissas downsianas garantiria a não convergência programática entre os competidores e, logo, a disputa efetiva (Grofman 2004Grofman, B., 2004. Downs and Two-party Convergence. Annual Review of Political Science, 7, pp. 25-46. DOI: 10.1146/annurev.polisci.7.012003.104711
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). Entre as principais fragilidades atribuídas ao modelo, está a questão da unidimensionalidade. A crítica elaborada por Stokes (1963)Stokes, D., 1963. Spatial Models of Party Competition. American Political Science Review, 57(2), pp. 368-377. DOI: 10.2307/1952828
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, por exemplo, se baseia no desencontro entre a teoria de Downs (1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
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, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.) e a empiria, já que nas democracias reais o eleitorado não distribui suas preferências com relação a apenas uma dimensão esquerda-direita, mas em torno de diversas questões que variam de relevância ao longo do tempo. Por isso, a formação de preferências se constitui de maneira endógena à competição eleitoral, sendo tarefa dos partidos mobilizar estrategicamente dimensões latentes na disputa.

Political fortunes are made and lost according to the ability of party leaders to sense what dimensions will be salient to the public as it appraises the candidates and party records. [...] the skills of political leaders who must maneuver for public support in a democracy consist partly in knowing what issue dimensions are salient to the electorate or can be made salient by suitable propaganda (Stokes, 1963Stokes, D., 1963. Spatial Models of Party Competition. American Political Science Review, 57(2), pp. 368-377. DOI: 10.2307/1952828
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, p. 372)2 2 “As fortunas políticas são feitas e perdidas de acordo com a capacidade dos líderes partidários de perceber quais dimensões serão salientes para o público ao avaliar os candidatos e os registros partidários. [...] As habilidades dos líderes políticos que devem manobrar para o apoio público em uma democracia consistem, em parte, em saber quais as dimensões de issue são salientes para o eleitorado ou que podem ser destacadas por propaganda adequada” (tradução nossa). .

A ideia de que a competição eleitoral é estruturada por várias dimensões distintas, manipuladas estrategicamente pelos partidos, é o pressuposto básico de umas das principais teorias que se propôs a pensar a disputa a partir do componente programático: a teoria da saliência da competição partidária (Budge & Farlie 1983Budge, I. & Farlie, D., 1983. Explaining and Predicting Elections: Issue Effects and Party Strategies in Twenty-three Democracies. London/Boston: George Allen and Unwin.). Nessa literatura, uma das maneiras de os partidos competirem entre si é através das ênfases que concedem a determinadas áreas e propostas de políticas públicas.

Em estudo pioneiro, Robertson (1976)Robertson, D., 1976. A Theory of Party Competition. New York: Wiley. percebeu que poucas frases assumiam posições favoráveis ou contrárias a 22 temas específicos nos programas dos partidos britânicos entre 1922 a 1974. Nesse trabalho, ele identificou uma característica geral sobre as plataformas: o que orientava os partidos era a ênfase seletiva em diferentes políticas e não um embate direto. Em seguida, o autor calculou quantas vezes uma categoria de política foi mencionada em dado programa em relação às demais, formulando a ideia primária da teoria da saliência: partidos definem as suas políticas enfatizando mais determinados assuntos em detrimento de outros.

Posteriormente, Budge & Farlie (1983)Budge, I. & Farlie, D., 1983. Explaining and Predicting Elections: Issue Effects and Party Strategies in Twenty-three Democracies. London/Boston: George Allen and Unwin. se basearam nesses estudos para formularem de maneira mais sistemática a teoria da saliência. Em diálogo com Campbell et al. (1960)Campbell, A.; Converse, P.; Miller, W.; Stokes, D., 1960. The American voter. University of Chicago Press., os autores demonstraram que os issues não apenas teriam impacto na decisão imediata do voto, como também na própria conformação da identificação partidária. Ademais, eles argumentaram que qualquer explicação da decisão do voto reside, explicita ou implicitamente, no comportamento partidário porque são os partidos que simplificam o complexo universo político através de suas ofertas de políticas públicas e, portanto, de seus programas eleitorais. Assim, “[...] the way electors decide to vote stems directly from the way parties approach them” (Budge & Farlie 1983Budge, I. & Farlie, D., 1983. Explaining and Predicting Elections: Issue Effects and Party Strategies in Twenty-three Democracies. London/Boston: George Allen and Unwin., p.23)3 3 “[...] a forma com que os eleitores decidem votar depende diretamente do modo com que os partidos os abordam” (tradução nossa). .

Se os programas de governo seriam a principal maneira através da qual os partidos comunicam suas políticas e posições ao eleitorado, Budge & Farlie (1983)Budge, I. & Farlie, D., 1983. Explaining and Predicting Elections: Issue Effects and Party Strategies in Twenty-three Democracies. London/Boston: George Allen and Unwin. encontraram evidências que corroboraram apenas parcialmente a ideia de que isso se dava através de um grande debate entre concorrentes sobre por que sua política era a melhor solução para as questões da ordem do dia. Dessa observação, eles reformularam o significado fundamental do comportamento partidário na competição eleitoral através da ideia de ênfase seletiva como a principal estratégia em vez de confronto direto entre oponentes.

Esse apontamento pode ser resumido no conceito de issue ownership, ou seja, a ideia de que partidos “possuem” certos issues (Budge & Farlie 1983Budge, I. & Farlie, D., 1983. Explaining and Predicting Elections: Issue Effects and Party Strategies in Twenty-three Democracies. London/Boston: George Allen and Unwin.; De Sio & Weber 2014De Sio, L. & Weber, T., 2014. Issue Yield: A Model of Party Strategy in Multidimensional Space. The American Political Science Review, 108(4), pp. 870-885. DOI: 10.1017/S0003055414000379
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). Isso implica que a estratégia partidária segue a crença de que os eleitores são capazes de conectar um partido específico a um bom/mau desempenho do governo em determinada área. Desse modo, as principais questões imputadas a uma legenda seriam também um tipo de atalho informacional para os eleitores, simplificando e enfatizando o mundo político em suas propostas e posições.

Apesar de sua importância, é comum o argumento de que poucos eleitores leem efetivamente os programas de governo, especialmente no caso do Brasil. Não apenas devido à alegação de que as necessidades dos eleitores aqui poderiam ser facilmente supridas com práticas clientelistas, mas também porque o analfabetismo é um problema real nos municípios brasileiros. Porém, como o processo de estruturação de saliências é mediado, há formas de as propostas chegarem aos eleitores de outra maneira que não a leitura em sua fonte primárias, como os meios de comunicação de massa, por exemplo (Budge 1976Budge, I., 1976. The internal analysis of election programmes. In: Budge, I.; Robertson, D.; Hearl, D. (eds.). Ideology, strategy and party change: spatial analysis of post-war election programmes in 19 democracies. Cambridge: Cambridge University Press.). Portanto, mesmo nesses contextos os programas possuem importância substancial para a competição política.

III. Competição programática no Brasil: da ausência à disputa efetiva

Embora o componente programático seja um dos elementos determinantes da competição, como demonstrado, ele é recorrentemente destituído de força e importância quando se trata do contexto brasileiro. Para muitos autores, essa lacuna se fundamenta no arranjo institucional que combina presidencialismo, federalismo e sistema proporcional de lista aberta (Ames 2003Ames, B., 2003. Os entraves da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV.; Mainwaring 1991Mainwaring, S., 1991. Políticos, partidos e sistemas eleitorais: o Brasil numa perspectiva comparada. Novos Estudos Cebrap, 29, pp. 34-58., 1999Mainwaring, S., 1999. Rethinking Party Systems in the Third Wave of Democratization The case of Brazil. Stanford: Stanford University Press.). Tai regras reforçariam o comportamento individualista dos políticos, já que o sistema proporcional de lista aberta retira o controle dos partidos sobre os candidatos, oferecendo ao eleitorado opções de escolher individualmente. Nesse sentido, a capacidade de um candidato se eleger ou não dependeria mais das suas habilidades em obter votos e competir com candidatos alternativos dentro do próprio partido.

Apesar do diagnóstico pessimista, Mainwaring (1991)Mainwaring, S., 1991. Políticos, partidos e sistemas eleitorais: o Brasil numa perspectiva comparada. Novos Estudos Cebrap, 29, pp. 34-58. ressalta que arranjos institucionais são sempre passíveis de mudança. Com razão, ele argumenta que políticos não são simples produtos dos sistemas nos quais atuam: eles também o conformam em alguma medida. O infortúnio do Brasil, assim, seria também resultado das escolhas de suas elites políticas que, convenientemente, têm optado pela manutenção de regras individualistas e antipartidárias. Para ele,

[t]he desire to create effective parties is not sufficient for such parties to emerge, but it is indispensable. This desire does not exist in Brazil. [...] With loosely organized parties, politicians are freer to attend to their own clienteles without being bound to programmatic concerns or organizational commitments (Mainwaring, 1991Mainwaring, S., 1991. Políticos, partidos e sistemas eleitorais: o Brasil numa perspectiva comparada. Novos Estudos Cebrap, 29, pp. 34-58., p.39, grifo nosso)4 4 “[o] desejo de criar partidos efetivos não é suficiente para que tais partidos surjam, mas é indispensável. Esse desejo não existe no Brasil. [...] Com partidos pouco organizados, os políticos são mais livres para atender suas próprias clientelas sem estarem vinculados a preocupações programáticas ou compromissos organizacionais” (tradução nossa). .

Na ausência de partidos efetivos, então, a política brasileira seria ocupada pelo estado, elites políticas e seus aliados econômicos e as forças armadas. Consequentemente, personalismo, clientelismo e estilos individualistas de representação seriam fortalecidos, enquanto os mecanismos de accountability seriam verdadeiramente limitados. O Brasil estaria, assim, supostamente fadado a uma vinculação particularmente perversa entre representação e clientelismo.

Para Hagopian (1996)Hagopian, F., 1996. Traditional Politics and Regime Change in Brazil. Cambridge: Cambridge University Press., o fim da ditadura militar no Brasil não garantiu – e nem garantiria – por si só a democracia efetiva. Isso porque, apesar da óbvia mudança no sistema partidário, haveria uma continuidade na elite política e em suas práticas tanto com relação ao regime autoritário como no período pré-1964. Assim, clientelismo e regionalismo continuam sendo fatores de referência para compreender o Brasil: “Party positions on issues are sacrificed systematically to the particularistic calculations of a closed elite, and weak parties suit a restricted democracy” (Hagopian 1996Hagopian, F., 1996. Traditional Politics and Regime Change in Brazil. Cambridge: Cambridge University Press., p. 281)5 5 “Posições do partido em issues são sacrificadas sistematicamente para os cálculos particularistas de uma elite fechada e partidos fracos atendem a uma democracia restrita” (tradução nossa). .

As desigualdades sociais experimentadas pelo eleitorado no Brasil conduziriam a resultado semelhante. Para Mainwaring (1992-93)Mainwaring, S., 1992-93. Brazilian Party Underdevelopment in Comparative Perspective. Political Science Quaterly, 107(4), pp. 677-707. DOI: 10.2307/2152290
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, a pobreza extrema e a informação política rudimentar de grande parte da população a condenariam à dependência clientelista dos políticos e do aparato estatal, forjando um sistema político sem a participação das massas. O autor concluiu: “A vast segment of the population votes according to extremely diffuse images or for personal favors. [...] The population is receptive to individualistic and populistic campaigns; these predilections in turn favor nonideological, populist parties” (Mainwaring 1992-93Mainwaring, S., 1992-93. Brazilian Party Underdevelopment in Comparative Perspective. Political Science Quaterly, 107(4), pp. 677-707. DOI: 10.2307/2152290
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, p. 694)6 6 “Um vasto segmento da população vota de acordo com imagens extremamente difusas ou por favores pessoais. [...] A população é receptiva a campanhas individualistas e populistas; essas predileções, por sua vez, favorecem partidos populistas não ideológicos” (tradução nossa). .

Entre esses autores está Leal (1975Leal, V. N., 1975. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Editora Alfa-Ômega., p. 258), que considerou que situações sociais como “a pobreza do povo, seu atraso cívico e intelectual” pode fortalecer as práticas clientelistas. É importante notar que, nessa visão, as recompensas obtidas através de práticas clientelistas são inferiores e indignas do voto. Nesse sentido, se associa uma ideia de atraso tanto do patronato quanto do eleitor brasileiro. Em um contexto caracterizado de tal maneira, portanto, não faria nenhum sentido a disputa em torno de qualquer dimensão programática. Em resumo: “Thus, for many, clientelism makes it extremely difficult for voters to organize their thoughts in terms of a left-right or any other continuum and places tremendous strain on what is often referred to as ideological or programmatic politics” (Gay 1998Gay, R., 1998. Rethinking Clientelism: Demands, Discourses and Practices in Contemporary Brazil. Revista Europea De Estudios Latinoamericanos Y Del Caribe/European Review Of Latin American And Caribbean Studies, 65, pp. 7-24., p. 11)7 7 “Assim, para muitos, o clientelismo torna extremamente difícil para os eleitores organizar seus pensamentos em termos de um continuum esquerda-direita ou qualquer outro e coloca uma tremenda pressão sobre o que é frequentemente chamado de política ideológica ou programática” (tradução nossa). .

A visão de que a política local, sobretudo nos menores municípios, seria por definição o lócus de práticas políticas consideradas arcaicas – como apadrinhamento, voto de cabresto, tradicionalismo, mandonismo, apadrinhamento e clientelismo – também se fundamenta na obra de Leal (1975)Leal, V. N., 1975. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Editora Alfa-Ômega.. Através do conceito de coronelismo, o autor descreveu um método de trocas entre o Estado central e senhores de terra em declínio. Nesse sistema – que evidencia como as relações de poder se estruturaram a partir dos municípios na Primeira República –, os governadores dependiam, por um lado, do apoio eleitoral dos coronéis para obtenção de votos, enquanto esses necessitavam do poder pública para angariar diversos recursos.

Apesar de importante contribuição, Kerbauy (2000)Kerbauy, M. T., 2000. A morte dos coronéis: política interiorana e poder local. Araraquara/São Paulo: Unesp/Cultura Acadêmica. e Limongi (2012)Limongi, F., 2012. Eleições e Democracia no Brasil: Victor Nunes Leal e a Transição de 1945. Dados, 55(1), pp 37-69. DOI: 10.1590/S0011-52582012000100002
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já demonstraram de maneira convincente que a análise do autor foi superada para análise da competição eleitoral no Brasil contemporâneo8 8 Para a autora, mudanças institucionais impostas pelo regime militar somadas a transformações urbanas vividas pelo país desde 1950 levou à morte dos coronéis. Limongi (2012), por sua vez, argumentou que uma mudança na leitura da descrição de Leal (1975) permite concluir que as eleições não se tratavam de uma farsa. Ao contrário, elas regularam efetivamente o conflito político. Por essas razões, é dispensável entrar nas particularidades do sistema coronelista. . Neste trabalho, é suficiente demonstrar como o município no contexto eleitoral brasileiro foi constituído enquanto base do sistema de tradicionalismo político a partir das ideias desenvolvidas pelo autor. Para Kerbauy (2000)Kerbauy, M. T., 2000. A morte dos coronéis: política interiorana e poder local. Araraquara/São Paulo: Unesp/Cultura Acadêmica., isso ocorre devido à explicação econômica que estudos clássicos sobre poder local no Brasil concedem a fenômenos políticos. Elaborou-se, assim, também uma gradação entre municípios menores e do interior e capitais quanto ao tradicionalismo de suas práticas políticas (Diniz 1982Diniz, E., 1982. Voto e Máquina Política: Patronagem e Clientelismo no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra.). Incorporando o apontamento de Leal (1975Leal, V. N., 1975. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Editora Alfa-Ômega., p. 35) de que “no interior o elemento rural predomina sobre o urbano”, a literatura perpetuou a perspectiva de que o processo de urbanização teria transformado apenas o contexto político das capitais, restando ao interior a fortuna tradicionalista.

Para outros autores, embora superado o coronelismo nos moldes originais, a solidariedade tradicional se traduzindo em novas formas de clientelismo (Andrade & Santos 2007Andrade, L. & Santos, M., 2007. O município na política brasileira: revisitando Coronelismo, enxada e voto. In: L. Avelar & A. Cintra, eds. O Sistema Político Brasileiro: Uma Introdução. Rio de Janeiro/São Paulo: Fundação Konrad Adenauer/Fundação Editora Unesp, pp. 205-221.; Avelar & Walter 2008Avelar, L. & Walter, M. I., 2008. Lentas mudanças: o voto e a política tradicional. Opinião Pública, 14(1), pp. 96-122. DOI: 10.1590/S0104-62762008000100004
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; Kerbauy 2000Kerbauy, M. T., 2000. A morte dos coronéis: política interiorana e poder local. Araraquara/São Paulo: Unesp/Cultura Acadêmica.). A clivagem entre municípios rurais e urbanos, porém, teria persistido. Nesse sentido, Avelar & Walter (2008Avelar, L. & Walter, M. I., 2008. Lentas mudanças: o voto e a política tradicional. Opinião Pública, 14(1), pp. 96-122. DOI: 10.1590/S0104-62762008000100004
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, p. 104) afirmam: “[n]as regiões mais `periféricas’, com forte poder local e regional, as disputas são mais previsíveis, mesmo porque, do ponto de vista ideológico, não há densas diferenças entre os partidos. Oligarquias regionais ainda se mantêm como realidade política”.

III.1 Fundamentos para uma perspectiva programática da competição eleitoral no Brasil

Se, por um lado, essa vertente de autores composta, especialmente, pelos chamados brasilianistas não concede espaço para dimensões programáticas e partidárias, outros estudiosos se dispuseram a elaborar um panorama mais complexo sobre o cenário político e a competição eleitoral no Brasil. Nenhum desses autores nega as práticas particularistas ou o incentivo ao voto pessoal presentes em sistemas eleitorais como o brasileiro. No entanto, eles foram capazes de demonstrar de diferentes maneiras que os partidos e o componente programático são relevantes mesmo neste contexto, seja na elaboração e votação de políticas ou na disputa eleitoral.

Essa perspectiva pode ser associada com a teoria unificada da competição partidária elaborada por Adams et al. (2005)Adams, J.; Merrill III, S.; Grofman, B., 2005. A Unified Theory of Party Competition: A cross-national analysis integrating spatial and behavioral factors. Cambridge: Cambridge University Press. e resumida nas palavras de Figueiredo & Limongi (2002Figueiredo, A. & Limongi, F., 2002. Incentivos Eleitorais, Partidos e Política Orçamentária. Dados, 45(2), pp. 303-331. DOI: 10.1590/S0011-52582002000200005
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p.311): “A diversidade de padrões espaciais de votos [...] sugere que a legislação eleitoral brasileira permite que políticos lancem mão de estratégias variadas para se eleger e reeleger, recorrendo à construção de vínculos diversificados com o eleitorado”.

David Samuels (1997)Samuels, D., 1997. Determinantes do Voto Partidário em Sistemas Eleitorais Centrados no Candidato: Evidências sobre o Brasil. Dados, 40(3), pp.493-535. DOI: 10.1590/S001152581997000300008.
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, ao se dedicar sobre os possíveis incentivos ao voto partidário mesmo em sistemas centrados nos candidatos, também se insere na parcela de autores que buscam, ao menos, problematizar a visão tradicional da política brasileira. Embora o autor construa sua análise sobre a variação das estratégias dos candidatos e não dos partidos, são as características partidárias – acesso à candidatura, fontes de financiamento de campanha e acesso a recursos no governo –, que determinariam estratégias mais individualistas ou mais coletivas dos candidatos. Partidos com maior controle nessas variáveis tenderiam a ter candidatos mais dependentes da máquina partidária e, portanto, com estratégias mais coletivas. Por outro lado, os candidatos tenderiam a adotar estratégias mais individualistas se são mais independentes de seus partidos com relação às mesmas variáveis.

Não era a intenção de Samuels (1997)Samuels, D., 1997. Determinantes do Voto Partidário em Sistemas Eleitorais Centrados no Candidato: Evidências sobre o Brasil. Dados, 40(3), pp.493-535. DOI: 10.1590/S001152581997000300008.
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– e nem é a nossa – defender que estratégias individualistas e coletivas são excludentes ou negar o personalismo e o particularismo no contexto brasileiro, tampouco apontar uma competição orientada exclusivamente de forma partidária. Para ele, mesmo em países de forte tradição clientelista, como o Brasil, a Itália e o Japão, investir no componente partidário poderia ser de baixo custo e alto retorno para os candidatos, já que, assim, poderiam atrair eleitores que não se beneficiam de redes de clientela ou que se orientam programaticamente. Para ele, os políticos

podem buscar votos tanto distribuindo benefícios `fisiológicos’ quanto adotando posições de policy, ou numa visão mais realista, assumindo uma estratégia que misture um pouco das duas orientações, e usando um discurso ao mesmo tempo individual e coletivo (Samuels 1997Samuels, D., 1997. Determinantes do Voto Partidário em Sistemas Eleitorais Centrados no Candidato: Evidências sobre o Brasil. Dados, 40(3), pp.493-535. DOI: 10.1590/S001152581997000300008.
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, p.3).

O estudo de Kitschelt et al. (2010)Kitschelt, H.; Hawkins, K.; Luna, J. & ROSAS, G., 2010. Latin America Party Systems. Cambridge: Cambridge University Press. constitui outro trabalho importante por tratar do que os autores denominam como estruturação programático-partidária na América Latina. O importante aqui talvez seja menos os achados dos autores, mas o seu pressuposto: a concebível presença de tal estruturação programático-partidária nos contextos políticos dos diferentes países da América Latina. Kitschel et al. (2010)Kitschelt, H.; Hawkins, K.; Luna, J. & ROSAS, G., 2010. Latin America Party Systems. Cambridge: Cambridge University Press. também reconhecem que a imagem tradicional da política latino-americana considera os partidos não apenas pouco enraizados na sociedade, mas também como atores incapazes de criar vínculos democráticos responsivos com os cidadãos. Todavia, eles acreditam que a estruturação programático-partidária pode atuar de maneira complementar a práticas clientelistas, de modo que onde há uma estruturação fraca ou ausente, há maior predominância do clientelismo e vice-versa.

Há duas dimensões principais que compõem a estruturação programático-partidária na obra de Kitschelt et al. (2010)Kitschelt, H.; Hawkins, K.; Luna, J. & ROSAS, G., 2010. Latin America Party Systems. Cambridge: Cambridge University Press.. A primeira delas é a coordenação programática, usada pelos partidos como uma marca para desenvolverem alternativas políticas coerentes. A segunda é o vínculo programático, responsável por dirigir essas políticas ao eleitorado:

Programmatic party competition thus entails that parties be internally cohesive in terms of the issue positions supported by their officers and elected representatives, yet sensitive to changing external demands and sufficiently differentiated from other parties in their ideological positions so that voters are able to distinguish which parties are closer to their own stances (Kitschelt et al., 2010Kitschelt, H.; Hawkins, K.; Luna, J. & ROSAS, G., 2010. Latin America Party Systems. Cambridge: Cambridge University Press., p.16)9 9 “Competição partidária programática implica, assim, em os partidos serem internamente coesos em termos das posições sobre issues apoiadas por seus dirigentes e representantes eleitos, mas sensíveis às mudanças nas demandas externas e suficientemente diferenciados de outros partidos em suas posições ideológicas para que os eleitores sejam capazes de distinguir quais partidos estão mais perto de suas próprias posições” (tradução nossa). .

Até mesmo autores que outrora salientaram continuidades históricas e incentivo a práticas clientelistas no Brasil, em trabalhos mais recentes elaboraram um panorama mais complexo. Hagopian, Gervasoni & Moraes (2008)Hagopian, F.; Gervasoni, C.; Moraes, J. A., 2008. From Patronage to Program: The Emergence of Party-Oriented Legislators in Brazil. Comparative Political Studies, 42(3), pp. 360-391. DOI: 10.1177/0010414008325572
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destacaram o surgimento de políticos orientados partidária e programaticamente, superando comportamento determinando por patronagem. De um lado, isso se deu em função de políticas e reformas administrativas implementadas desde 1990, que teriam reduzido o escopo e os recursos para patronagem, diminuindo a eficiência das estratégias eleitorais de caráter pessoal. Eleitores teriam respondido favoravelmente a tais mudanças, reforçando esse novo processo. Por outro lado, esse novo comportamento dos candidatos, partidos e eleitores também se relacionaria com o fenômeno da polarização: quanto mais polarizados os partidos, maior a percepção dos políticos quanto à lealdade do eleitorado aos programas e as marcas partidárias.

A abordagem de Gay (1998)Gay, R., 1998. Rethinking Clientelism: Demands, Discourses and Practices in Contemporary Brazil. Revista Europea De Estudios Latinoamericanos Y Del Caribe/European Review Of Latin American And Caribbean Studies, 65, pp. 7-24. permite ir além, problematizando abordagens que reduzem até mesmo políticas universais, como o Programa Bolsa Família, a meras ferramentas eleitoreiras ou mecanismos institucionalizados de compra de votos (Hunter & Power 2008Hunter, W. & Power, T., 2008. Rewarding Lula: Executive Power, Social Policy, and the Brazilian Elections of 2006. Latin American Politics and Society, 49(1), pp. 1-30. DOI: 10.1111/j.1548-2456.2007.tb00372.x
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). Assim, é importante a afirmação do autor:

[o]f course [...] there are those who would insist that rights have little to do with the selective and occasional distribution of milk tokens, the paving of roads, the building of schools or the installation of neighborhood sewage systems. And, furthermore, that clientelism, as a strategy that is based on the delivery of such goods and services, undermines any attempt to propagate coherent ideologies or establish programs based on principles of universalism and entitlement. This perspective, I believe, is both simplistic and more to the point, elitist (Gay, 1998Gay, R., 1998. Rethinking Clientelism: Demands, Discourses and Practices in Contemporary Brazil. Revista Europea De Estudios Latinoamericanos Y Del Caribe/European Review Of Latin American And Caribbean Studies, 65, pp. 7-24., p. 15)10 10 “[é] claro [...] há aqueles que insistem que os direitos têm pouco a ver com a distribuição seletiva e ocasional de fichas de leite, a pavimentação de estradas, a construção de escolas ou a instalação de sistemas de esgoto da vizinhança. E, além disso, que o clientelismo, como uma estratégia baseada na entrega de tais bens e serviços, enfraquece qualquer tentativa de propagar ideologias coerentes ou estabelecer programas baseados em princípios de universalismo e direito. Essa perspectiva, creio eu, é simplista e mais especificamente, elitista” (tradução nossa). .

Além do simplismo dessa perspectiva, fenômenos políticos não podem ser satisfatoriamente compreendidos através de variáveis sociais e econômicas exclusivamente. É necessário buscar na própria dinâmica da competição mecanismos explicativos para as estratégias dos atores. Ademais, é controverso acreditar que os eleitores teriam menor capacidade de articulação programática em função de suas desigualdades. Afinal, não seriam os mais pobres e os menos escolarizados os mais dependentes e, portanto, os mais interessados em políticas públicas? A própria subsistência cotidiana desses eleitores não seria o necessário para superar níveis de escolaridade e informação política na estruturação de suas preferências?

Os apontamentos até aqui levantados reforçam não somente a necessidade, mas também o espaço para que o componente programático seja investigado na competição eleitoral no Brasil. Alguns estudos recentes já iniciaram esse debate, voltando atenção para os programas de governo. Em trabalho pioneiro, Tarouco (2011)Tarouco, G., 2011. Brazilian Parties According to their Manifestos: Political Identity and Programmatic Emphases. Brazilian Political Science Review, 5(1), pp. 54-76. analisou manifestos de fundação de sete partidos: PP, PDT, PT, PTB, PMDB, PFL e PSDB. O método utilizado pela autora consiste na codificação manual elaborada pelo Manifesto Research on Political Representation (MARPOR)11 11 Conferir categorias, domínios e procedimentos de codificação em <https://manifesto-project.wzb.eu/datasets>. Último acesso em 16/12/2018. , que também é a técnica predominante nos demais estudos sobre programas de governo no Brasil, como será demonstrado. Através da análise de conteúdo desses manifestos, ela identificou que os principais partidos brasileiros se distinguem em conteúdo e, mais do que isso, que a diferença nas suas ênfases não é aleatória.

Em trabalho posterior, no entanto, Tarouco & Madeira (2013)Tarouco, G. & Madeira, R., 2013. Partidos, Programas e o debate sobre esquerda e direita no Brasil. Revista de Sociologia e Política, 21(45), pp.149-165. DOI: 10.1590/S0104-44782013000100011
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chegaram à análise menos conclusiva na tentativa que classificar os partidos brasileiros na dimensão esquerda-direita. Novamente, documentos programáticos12 12 Manifestos de fundação dos partidos e diretrizes disponibilizadas. Não inclui programas eleitorais de governo. disponibilizados por sete partidos – PT, PDT, PMDB, PDS/PPR/PPB/PP, PTB, PFL/DEM e PSDB – foram analisados a partir de uma adaptação feita pelos autores à codificação do MARPOR. De modo geral, eles classificaram, com exceção do documento do PFL de 1995 e de 2005 e do PSDB em 2001, todos os partidos na esquerda do espectro ideológico. Isso incluiu, por exemplo, o próprio manifesto de fundação do PFL e o documento do PSDB de 1988. Assim, nenhum partido foi exclusivamente classificado na direita.

O posicionamento dos partidos brasileiros à esquerda também se repetiu no estudo de Babireski (2014)Babireski, F., 2014. As diferenças entre a direita do Brasil, Chile e Uruguai: análise dos programas e manifestos partidários. Paraná Eleitoral, 3(1), pp. 171-198. sobre os programas partidários da direita em perspectiva comparada com o Chile e o Uruguai. Igualmente pela codificação do MARPOR, a autora classificou os partidos brasileiros DEM e PP, o uruguaio PN e os chilenos UDI e RN. De modo geral, ela apontou os partidos chilenos mais à direita, o uruguaio ao centro e os brasileiros à esquerda. Apesar de ter sido capaz de demonstrar diferenças entre eles, a autora declarou a necessidade de maior refinamento metodológico.

Incluindo 15 países da América Latina, Oliveira (2011)Oliveira, A., 2011. Os discursos programáticos dos partidos políticos na América Latina: identidade de classe e política econômica. Mediações, 16(1), pp. 201-221. DOI: 10.5433/2176-6665.2011v16n1p201
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observou uma relação positiva entre a ênfase de classe e a proposição de uma política inspirada por valores socialdemocratas também a partir da codificação do MARPOR. A partir da classificação, ele distribuiu os partidos de acordo com quatro níveis da luta de classes: elevado, médio elevado, médio baixo e baixo. O PT, único partido brasileiro analisado, se situou na categoria médio baixo. Com relação ao índice de socialdemocracia, o PT enfatizou apenas um tema liberal enquanto destacou quatro da área socialdemocrata.

Recentemente, Jorge et al. (2018)Jorge, V.; Silva, M.; Faria, A.; Ferreira, A. R., 2018. Análise dos programas eleitorais dos candidatos a presidente em 2014: o posicionamento ideológico do PT e do PSDB. Revista de Sociologia e Política, 26(67), pp. 1-20. DOI: 10.1590/1678987318266701
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se debruçaram especificamente sobre as plataformas eleitorais oferecidas pelos candidatos do PT e do PSDB à presidência nas eleições de 2014. Novamente através da codificação do MARPOR, eles testaram a hipótese de que o PT se localizaria na centro-esquerda enquanto o PSDB ocuparia a centro-direita do espectro ideológico. Em consonância com o trabalho de Tarouco & Madeira (2013)Tarouco, G. & Madeira, R., 2013. Partidos, Programas e o debate sobre esquerda e direita no Brasil. Revista de Sociologia e Política, 21(45), pp.149-165. DOI: 10.1590/S0104-44782013000100011
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e Babireski (2014)Babireski, F., 2014. As diferenças entre a direita do Brasil, Chile e Uruguai: análise dos programas e manifestos partidários. Paraná Eleitoral, 3(1), pp. 171-198., os autores não comprovaram a hipótese, já que vislumbraram ambos os partidos no campo da esquerda, com o PSDB à direita do PT, mas ainda no mesmo polo do espectro ideológico.

É preciso reconhecer a importância da investigação da dimensão programática que se inicia no debate sobre a competição eleitoral no Brasil. No entanto, é perceptível que os esforços, além de muito incipientes, se voltaram para poucos documentos, de poucos partidos. Além disso, todos eles utilizam o mesmo método, a codificação do MARPOR que, como os próprios autores sugeriram, carece de uma série de refinamentos, em especial a adaptação ao Brasil. São justamente essas lacunas que este estudo pretende ajudar a preencher.

IV. Metodologia

Para o desenvolvimento deste estudo, utilizamos o método de análise de texto desenvolvido por Slapin & Proksch (2008)Slapin, J. & Proksch, S., 2008. A Scaling Model for Estimating Time-Series Party Positions from Texts. American Journal of Political Science, 52(3), pp. 705-722. DOI: 10.1111/j.1540-5907.2008.00338.x
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que estima posições políticas a partir da frequência de palavras em documentos (wordfish). Como outros métodos aplicáveis à análise de programas de governo, como o expert survey, a codificação manual e o wordscores, a abordagem adotada parte do pressuposto teórico de que, ao se apropriar das palavras, partidos e candidatos fornecem informações sobre suas posições no espaço político.

O modelo funciona da seguinte maneira: conta-se a frequência com que as palavras aparecem nos programas dos candidatos. Assume-se que a distribuição das frequências se origina de um processo de Poisson

y i j m P o i s s o n ( λ i j m ) λ i j m = exp ( α i m + Ψ j + β j × ω i m )

onde yijm é a contagem da palavra j no manifesto do partido i no município m; α é um conjunto de efeitos fixos do partido-município; Ψ é um conjunto de efeitos fixos das palavras; β é uma estimativa do peso específico de uma palavra capturando a importância da palavra j na discriminação entre posições partidárias; ω é a estimativa da posição do partido i na eleição no município m. No modelo, o efeito fixo das palavras controla as palavras mais usadas do que outras, bem como o efeito fixo do município da eleição controla partidos que escrevem programas maiores em determinado local.

É fundamental ressaltar que o wordfish permite analisar documentos apenas de forma comparativa. Isso significa que a posição espacial obtida através da frequência de palavras de um programa de governo é dada como uma função das palavras contidas no(s) programa(s) com o qual se dá a comparação. Uma vez trocado o documento, a posição espacial é alterada. Além disso, ele é um modelo unidimensional, embora permita que temáticas específicas sejam abordadas, desde que de maneiras separadas. Como qualquer modelo estatístico, o wordfish tem suas limitações e seus pressupostos, estimando, por exemplo, que o significado das palavras se mantém estável no espaço e no tempo. Por outro lado, essa metodologia não exige textos de referência, como é o caso do wordscores, e, mais importante, utiliza todas as palavras em todos os documentos.

O wordfish é utilizado neste trabalho para analisar programas de governo registrados pelos candidatos a prefeito no TSE em 2016 de acordo com a seguinte amostra estratificada13 13 Disponível em <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo_continuo/modelo_operacional/amostra.shtm>. Acesso em 10/04/2017. : 50% dos municípios com até 4 mil habitantes; 33% dos municípios com mais de 4 mil e menos de 8 mil habitantes; 20% dos municípios com número habitantes entre 8 mil e 20 mil; 10% dos municípios com mais de 20 mil e menos de 500 mil habitantes; 5% dos municípios com mais de 500 mil habitantes. Dos 1.385 municípios que compõem a amostra, 55 municípios não foram considerados porque só tiveram um candidato a prefeito nas eleições de 2016, assim não havia nem disputa e nem outros programas com os quais pudessem ser comparados. Desconsiderando os municípios em questão, a Tabela 1 apresenta a distribuição dos municípios por estado aleatoriamente selecionados.

Tabela 1
Distribuição de municípios por estado na amostra

Primeiramente, será avaliado se essas plataformas se diferenciam das demais apresentadas na mesma localidade. Nessa etapa da análise, então, os programas serão comparados entre si com relação a todas as candidaturas de um mesmo município, assumindo a presença do componente programático caso se diferenciem. Não é possível concluir, no entanto, a motivação dessa divergência; isto é, se está relacionada com uma agenda específica e de longo prazo dos partidos e candidatos ou apenas representa uma estratégia de maximização de votos. Considerando que a competição eleitoral se estrutura em uma perspectiva unificada (Adams et al., 2005Adams, J.; Merrill III, S.; Grofman, B., 2005. A Unified Theory of Party Competition: A cross-national analysis integrating spatial and behavioral factors. Cambridge: Cambridge University Press.) – ou, em outras palavras, por componentes programáticos e não programáticos – este trabalho também não permite inferir quão efetiva ou determinante é a disputa programática nesse contexto mais amplo.

Em seguida, investigaremos se as diferenças programáticas identificadas se articulam de maneira partidária, assumindo alinhamento quando os programas de um mesmo partido se concentrarem em um mesmo lado do ponto médio do espaço programático (zero). Para isso, todos as plataformas serão analisadas juntas, como se disputassem em um mesmo município.

É importante ressaltar que técnicas de análise de texto requerem alguma preparação prévia dos documentos (Grimmer & Stewart 2013Grimmer, J. & Stewart, B., 2013. Text as data: the promise and pitfalls of automatic content analysis methods for political texts. Political Analysis, 21(3), pp. 267-297. DOI: doi.org/10.1093/pan/mps028
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). Assim, neste trabalho, foi padronizado todo o encoding e o formato dos arquivos; a ordem das palavras foi desconsiderada (bag of words); foram retirados dos textos: acentos, numerais, pontuação, palavras com conteúdo desnecessário, como artigos, numerais, preposições e conjunções, e palavras que não apareceram em, pelo menos, 5% dos documentos, independentemente de sua frequência. Para evitar que palavras semelhantes fossem contadas separadamente, diminuindo a frequência de um tema, utilizamos o stemming14 14 Para exemplificar esse processo, palavras como “trabalho”, “trabalhadora” e “trabalhadores” são todas consideradas como “trabalh”. , processo que retira afixos das palavras, reduzindo-as ao seu tronco (stem). Esses processos resultaram em uma matriz termos-documentos (tdm) em que cada documento i representa um vetor que contabiliza a frequência com que cada stem (S) único ocorre, Si=Si1,Si2,... Sin.

V. Descrição e análise dos dados

Os 1.335 municípios com mais de um candidato a prefeito em 2016 possuem, juntos, 3.410 concorrentes ao executivo municipal, distribuídos entre os 35 partidos políticos existentes no Brasil. Se, para cada candidato é exigido um programa de governo, o corpus de análise deste trabalho totaliza 3.410 plataformas, com média de 2.054,3 palavras. O menor documento é o do PTB em Camocim de São Félix (PE), com apenas 18 palavras, e o maior é o do PP em Capistrano (CE), com 33.166 palavras. De modo geral, é possível observar que há muita variação no número de termos dos programas por e entre partidos (Gráfico 1).

Gráfico 1
Dispersão do número de palavras dos programas por partido

Grande parte dos candidatos possuem programas com até 5 mil palavras, mas partidos como PT, PSDB, PSD e PSB também possuem alguma quantidade de plataformas com até 10 mil palavras. Documentos maiores constituem, como indica o gráfico, casos bastante dispersos. A variação no número de palavras não parece se articular de maneira partidária ou ideológica, já que o PP, por exemplo, possui o candidato com o maior programa, mas também apresenta candidatos com os menores documentos. Também entre o PSOL, por exemplo, considerado ideológico pela literatura, há programas com mais de 10 mil palavras e outros muito menores, inclusive abaixo da média apresentada.

Os candidatos a prefeito se diferenciam programaticamente nos municípios do Brasil? Uma forma de responder a esta questão é observar a frequência das palavras utilizadas por cada candidato em um mesmo município. Assumimos que se utilizam palavras diferentes na mesma localidade, eles oferecem propostas distintas, ou, em outras palavras, mobilizam o componente programático enquanto estratégia eleitoral. Isso porque as palavras, através de sua semântica e etimologia, carregam consigo significados. Por mais que existam sinônimos ou usos informais dos termos que não são controlados neste trabalho, as palavras não têm sentido arbitrário, de forma que mesmo uma abordagem quantitativa pode assumir, em alguma medida, que termos distintos representam significados diferentes. Dito de outro modo, “moradia” pode ter o mesmo sentido de “habitação”, mas jamais de “carro”, “caneta” ou “animal”.

O grau de diferenciação entre as propostas permite distribuir os candidatos em uma escala cuja distância indica o quanto eles diferem programaticamente entre si. Considerando que o tamanho da amostra impossibilita a apresentação e análise de todos os gráficos gerados, ou seja, um gráfico para cada um dos municípios, serão discutidos padrões de distribuição do componente programático. Independentemente do modo com que se apresenta, é possível assumir que há dimensão programática em todos os municípios estudados, já que pelo menos dois candidatos apresentaram propostas de políticas públicas distintas em um mesmo município. Esse apontamento pode ser comprovado através do cálculo da distância absoluta, que subtraiu a menor posição espacial da maior posição em cada um dos municípios. Observando sua distribuição, é possível perceber que em nenhum dos casos ela foi igual a zero (Gráfico 2).

Gráfico 2
Distância absoluta entre as posições dos programas por município

Em resumo, três agrupamentos podem ser identificados: grande parte das distâncias programáticas entre 1.5 e 2.0, outro grupo menor com distâncias entre 2.0 e 2.5 e poucos municípios onde as distâncias entre as plataformas superaram 2.5. É importante salientar que os valores das distâncias não têm, no âmbito deste trabalho, significado substantivo específico. Aqui, interessa notar que elas são maiores do que zero para todos os municípios, o que permite reivindicar a presença do espaço programático como estratégia efetiva nas eleições em questão.

Essa análise, no entanto, pode ser menos precisa para os casos com mais de dois competidores. Dado que a medida considera as posições máxima e mínima, ela não contabiliza posicionamentos intermediários. Em termos analíticos, isso implica na possibilidade de considerar grande distância entre candidatos em um município que, hipoteticamente, apresenta três candidatos com propostas – e, portanto, posições – muito similares e apenas um com programa muito diferente. Nesse caso, ainda que de fato exista competição programática, ele se daria em distâncias menores se incluídos todos os documentos. Por isso, também é importante avaliar a variância entre as posições extraídas das plataformas, elaborando uma análise mais relativa dos casos.

Como apresentado no Gráfico 3, examinar a variância das posições dos candidatos geradas a partir da análise de seus programas de governo também permite assumir competição programática. A diferença é que os valores diminuem, já que não são calculadas a partir dos valores máximos e mínimos. Ainda assim, pode-se identificar dois padrões principais, ambos até o valor 2.0. O maior número de municípios possui variância em torno de 1.4 e, outra grande parte das localidades, próxima de 1.2. Há casos muito específicos de maior variância, como se pode observar. Porém, trata-se de um conjunto de municípios com grande diferença entre o tamanho dos programas comparados. De qualquer maneira, eles não consistem em um padrão.

Gráfico 3
Variância das posições dos programas por município

Porque os valores das divergências apontadas não possuem sentido substantivo, é importante examinar mais qualitativamente os casos representativos de maior e menor distância absoluta. Substituindo termos comuns por “######” entre os programas extremos do município de menor distância absoluta registrada em 2016, Camocim de São Félix (PE), pode-se perceber que um dos documentos praticamente está contido no de seu oponente. Nessa disputa, o candidato do PTB registrou um documento de apenas 18 palavras, todas também utilizadas no programa de 3.548 palavras de seu oponente do PSD (Quadro 1), por isso a menor divergência programática entre eles, 1.5 na escala wordfish.

Quadro 1
Comparação entre programas de Camocim de São Félix (PE)

O caso de maior distância absoluta, por sua vez, se deu entre os programas dos concorrentes do PTC e da REDE no município de Guarujá (SP), com valor de 3.44 na escala wordfish. Como os documentos são demasiadamente maiores do que na situação de menor distância – com 2.155 palavras e 12.312, respectivamente –, o exercício anterior não seria útil. Ainda assim, é necessário propor uma avaliação mais qualitativa das propostas apresentadas. Uma simples observação dos tópicos de cada programa tal como disposto no Quadro 2 já permite identificar diferenças de abordagem entre eles.

Quadro 2
Comparação entre programas de Guarujá (SP)

Se, por um lado, a plataforma do PTC se voltou para grandes áreas mais clássicas, como saúde, educação, segurança e mobilidade urbana, por exemplo, o programa da REDE parece mobilizar mais o tema específico da sustentabilidade. Assim, há um manifesto, valores e ideais, além da inclusão do tema em mais de um eixo de gestão. Enquanto o PTC fala em educação, a REDE traz educação para a sustentabilidade; o mesmo se repete com a cultura. Ademais, a plataforma da REDE aborda temas não inclusos nas proposições de seu oponente, como consumo responsável, do global para o local, economia sustentável e governo participativo.

Embora o tamanho da amostra não permita elaborar análises para cada um dos casos, é possível identificar cinco padrões de competição programática bem definidos15 15 O gráfico para cada um dos municípios pode ser solicitado via e-mail. . Para eleições com apenas dois candidatos, o padrão, fruto do modelo que empregamos, é que cada um deles se situe em um dos polos do espaço político, como exemplificado no Gráfico 4 16 16 O município foi selecionado aleatoriamente, apenas para exemplificação. . Isso se repete para 848 municípios (63,52%), o total de localidades que tiveram apenas duas candidaturas ao executivo municipal em 2016. Como dissemos antes, essa polarização não tem um significado mais substantivo, ela apenas demonstra que os programas diferem significativamente, indicando uma competição em termos programáticos.

Gráfico 4
Padrão de competição programática em eleições bipartidárias

Nos casos com três ou mais competidores, os padrões são mais reveladores e se distribuem de duas maneiras. Primeiramente, pode-se observar uma competição programática polarizada em 149 municípios da amostra (11,17%), o que implica em uma proximidade necessária entre as propostas de políticas de dois ou mais deles. Essa similaridade está representada no Gráfico 5, por exemplo, pela sobreposição dos intervalos de confiança dos programas do PDT e DEM, em um dos polos, e do PSDC e PSC em outro.

Gráfico 5
Padrão de competição programática polarizada em eleições multipartidárias

Nos demais 338 (25,31%) municípios com três ou mais candidatos a prefeito da amostra, pode-se afirmar que a competição programática se definiu em termos fragmentados. É interessante salientar, porém, que, para os casos de três candidaturas apenas, há uma tendência centrípeta, o que está de acordo com modelos espaciais do voto (Downs 1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
https://doi.org/10.1086/257897...
, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.; Hinich & Munger 1996Hinich M. & Munger, M., 1996. Ideology and the Theory of Political Choice. Ann Arbor: University of Michigan Press.). Todavia, nesse padrão também foram enquadrados municípios com várias posições difusas, sem uma tendência central específica. Os dois casos são exemplificados na Figura 1.

Figura 1
Padrões de competição programática fragmentada em eleições multipartidárias

De modo geral, em todas as situações, é possível afirmar que os candidatos a prefeito nos municípios do Brasil distinguem-se programaticamente. Eles adotam palavras distintas em seus programas buscando transmitir ideias diferentes para atrair certo eleitorado. Todavia, esse fato não implica, necessariamente, que essa distinção se dê em bases partidárias; essa é uma questão empírica. Como o wordfish atribui posicionamento a um programa sempre em relação ao conjunto com o qual é comparado, a análise dos documentos por município como no teste da hipótese principal não mensuraria similaridade propositivas entre várias localidades. Além disso, a posição conferida é arbitrariamente situada no polo positivo ou negativo, sendo o sentido substantivo dessa localização responsabilidade do próprio pesquisador compreender. Isso significa que, se um partido A compete com um partido B em um município x e se localiza no ponto 0.5, essa posição não pode ser comparada com o mesmo partido A em disputa com C e D no município y e localização -0.5. Tanto porque mudaram os documentos de referência para a comparação como porque podem ser plataformas absolutamente alinhadas, localizadas em polos opostos apenas pelo caráter arbitrário do método17 17 Essa arbitrariedade se relaciona apenas ao lado positivo ou negativo da posição e não a seu valor, já que é obtido sobretudo através da frequência de palavras, por meio de função já apresentada neste trabalho. .

Comparar apenas as plataformas de um mesmo partido entre si também não seria adequado porque a posição seria dada uma em relação a outras da mesma agremiação e não a seus oponentes, o que levaria a resultados distorcidos. Por isso, a análise mais produtiva a ser realizada através do wordfish é comparar todos os programas de todos os partidos como se concorressem em um único município. Desse modo, é possível verificar se, considerando o universo de documentos, as propostas oferecidas por candidatos de uma mesma agremiação são localizadas em pontos próximos no espectro programático18 18 Essas colocações se fundamentam em testes de sensibilidades realizados ao longo da pesquisa. Porém, o método ainda precisa ser refinado no que se refere à análise da consistência partidária, apresentada com caráter preliminar neste trabalho. . Se os partidos se comportam de maneira coerente programaticamente, esperamos que concentrem suas propostas no mesmo lado com relação ao ponto médio (zero).

De maneira geral, análise do alinhamento partidário na mesma amostra de municípios aponta para a difusão dos programas dos candidatos a prefeito ao longo dos polos positivo e negativo do espectro programático (Gráfico 6). Isso significa que a divergência entre as plataformas apontada anteriormente pouco se organiza de maneira partidária. Alguns partidos, no entanto, apresentaram propostas concentradas: PEN, PRP, REDE, PSOL, PCB, PCO e PSTU. Assim, pode-se afirmar que concorrentes dessas agremiações registraram plataformas semelhantes em diferentes localidades ou, de outro modo, que alinharam partidariamente seus programas de governo. Para esses casos, é possível apontar o partido como determinante da competição programática no Brasil. Além disso, considerando o tamanho da distribuição, pode-se dizer que PCO, PSTU, PCB e PRP são mais alinhados do que PEN, REDE e PSOL, já que suas posições estão mais concentradas no espectro programático.

Gráfico 6
Distribuição de propostas por partido no total de municípios

Esse apontamento não pode ser estendido aos demais partidos. Como mencionado, suas propostas não se agrupam em um mesmo lado do espectro programático ao longo do território nacional. Todavia, mesmo que não haja outras agremiações com ao menos 75% das posições concentradas, alguns partidos apresentaram maioria de propostas em um dos polos programáticos, como PR, PSDC, PHS, PPL, PRB, PRTB e PTN. No contexto deste trabalho, tais legendas podem ser consideradas parcialmente alinhadas.

A análise das medianas também permite identificar uma tendência de o partido alocar mais o conteúdo dos programas em um lado específico do espectro programático. Tendendo ao polo positivo, temos: PTC, PTB, PR, PTdoB, PP, DEM, PMDB, PSL, PSD, PSC, SD, PDT, PSDB e PSDC. Por outro lado, PV, PHS, PMN, PPL, PRB, PROS, PEN, PCdoB, PRTB, PTN, PRP, PMB, REDE, PSOL, PCB, PCO e PSTU propuseram mais políticas localizadas no polo negativo. PPS e PSB centralizaram suas propostas. Esse diagnóstico indica que, ao concentrar mais plataformas em um dos lados, o conjunto de partidos localizados no polo positivos assemelharam mais suas propostas entre si do que quando comparados com os que se posicionaram no polo negativo e vice-versa. A presença de partidos de mesma natureza ideológica em cada um dos grupos parece sugerir alguma relação entre essa dimensão e a programática. No entanto, essa afirmação ultrapassa os limites analíticos deste trabalho, exigindo estudos mais sistemáticos.

Também é interessante notar que os grandes partidos foram os que apresentaram programas de governo mais difusos, dado o conjunto de municípios analisados. Isso se deu de forma um pouco mais acentuada para o PMDB, PSD e PSDB, mas também se aplica aos casos do DEM, PSB e PT. Embora não seja possível estabelecer qualquer associação em termos estatísticos entre esses fatores, essa observação pode indicar alguma associação entre número de candidaturas por partido e propostas mais dispersas ao longo do espectro programático. Se temos como referência Downs (1957aDowns, A., 1957a. An Economic Theory of Political Action in a Democracy. Journal of Political Economy, 65(2), pp. 135-150. DOI: 10.1086/257897
https://doi.org/10.1086/257897...
, 1957bDowns, A., 1957b. An economic theory of democracy. New York: Harper.), seria possível considerar esse comportamento como uma estratégia para atingir maior eleitorado. Partidos menos competitivos, porém, teriam maior liberdade para concentrarem suas propostas em um lado do ponto médio. Essas afirmações, porém, precisam, sem nenhuma dúvida, serem aprofundadas analiticamente.

De modo resumido, a análise sobre o alinhamento partidário dos programas de governo demonstrou que não há um padrão único para todas as agremiações. Em geral, a maioria dos partidos tende a distribuir suas propostas ao longo dos polos positivo e negativo do espectro programático, sobretudo os grandes partidos. Porém, há os que alinham suas propostas, total ou parcialmente. O primeiro caso se aplica a legendas como PEN, PRP, REDE, PSOL, PCB, PCO e PSTU e, o segundo, ao PR, PSDC, PHS, PPL, PRB, PRTB e PTN. Considerando a recorrência de partidos reconhecidamente de esquerda entre os alinhados e a própria coincidência entre legendas de mesma matriz ideológica na análise das medianas, os dados parecem sugerir alguma relação entre divergência programática, alinhamento partidário e ideologia. Casos como os do PTB, PSC, PR e PP reforçam essa suposição, embora ela não se aplique às situações como as do PV, PRB e PDT, por exemplo.

VI. Considerações finais

A análise dos programas dos candidatos a prefeito nos municípios brasileiros demostrou que tais concorrentes se distinguem programaticamente em todos os casos. Esses resultados contestam, em alguma medida, o diagnóstico recorrente da literatura de que o Brasil é um cenário onde o sistema proporcional de lista aberta seria responsável pela exclusividade de estratégias particularistas. É importante ressaltar que os achados deste trabalho não permitem – e nem se propõem a – afirmar, por exemplo, que não há clientelismo no Brasil ou que as disputas municipais são constituídas de maneira exclusivamente programática. No entanto, a análise mostra que, mesmo nos pequenos municípios, onde se esperaria o extremo das práticas clientelistas, os candidatos apresentaram propostas distintas em suas plataformas.

Além disso, foi possível verificar alguns padrões de competição eleitoral. Para disputas bipartidárias, os candidatos tendem majoritariamente a se posicionar programaticamente em lados distintos do ponto médio do espaço programático. No caso em que três candidatos disputam o executivo municipal, esse padrão pode se repetir com dois deles oferecendo propostas similares e outro se diferenciando. Porém, há uma tendência centrípeta mais recorrente para casos com três concorrentes, o que confirma, de algum modo, apontamentos feitos por modelos espaciais de voto. Para quadros com três ou mais candidaturas, também é possível observar uma fragmentação de suas propostas ao longo de pontos difusos do espaço programático.

Embora a competição programática tenha se dado de maneira evidente, o mesmo não se aplica para a consistência partidária das propostas em questão. Grandes partidos – que também apresentaram maior número de candidatos ao executivo municipal das localidades analisadas –, distribuíram suas propostas de políticas públicas de modo mais difuso. Esse foi o caso do PMDB, PSDB, DEM, PT PSB e PSD e pode se associar com uma estratégia eleitoral mais abrangente, tentando aproximar o eleitor mediano. Outros partidos, como PEN, PRP, REDE, PSOL, PCB, PCO e PSTU alinharam partidariamente suas propostas, concentrando-as em um dos lados do espaço programático. Legendas como PR, PSDC, PHS, PPL, PRB, PRTB e PTN, por sua vez, apresentaram apenas alinhamento parcial. Para os demais partidos, a distribuição se deu de forma fragmentada.

Em resumo, os achados mostram que nos municípios Brasil, mesmo nos menores, os candidatos têm incentivos e apresentam, efetivamente, propostas distintas programaticamente e que, em alguns casos, ela se articula de maneira partidária. Além disso, o trabalho permitiu conhecer mais sobre a competição eleitoral no nível local no Brasil, campo amplo ainda a ser explorado pela ciência política, sobretudo com um recorte específico como neste artigo. Lançando mão de novos objetos, como os programas de governo, testamos empiricamente perspectivas importantes sobre os partidos e a competição eleitoral no Brasil, mostrando que uma abordagem mais próxima e mais minuciosa desses municípios permite uma compreensão mais complexa de suas realidades eleitorais.

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Glossário de siglas

  • CE  Ceará
  • DEM  Democratas (partido político)
  • IBGE  Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
  • MARPOR  Manifesto Research on Political Representation
  • PCB  Partido Comunista Brasileiro
  • PCdoB  Partido Comunista do Brasil
  • PCO  Partido da Causa Operária
  • PDS  Partido Democrático Social
  • PDT  Partido Democrático Socialista
  • PE  Pernambuco
  • PEN  Partido Ecológico Nacional
  • PFL  Partido da Frente Liberal
  • PHS  Partido Humanista da Solidariedade
  • PMB  Partido da Mulher Brasileira
  • PMDB  Partido do Movimento Democrático Brasileiro
  • PMN  Partido da Mobilização Nacional
  • PN   Partido Nacional
  • PP  Partido Progressista
  • PPB  Partido Progressista Brasileiro
  • PPL  Partido Pátria Livre
  • PPR  Partido Progressista Reformados
  • PR  Partido da República
  • PRB  Partido Republicano Brasileiro
  • PROS  Partido Republicano da Ordem Social
  • PRP  Partido Republicano Progressista
  • PRTB  Partido Renovador Trabalhista Brasileiro
  • PSB  Partido Socialista Brasileiro
  • PSC  Partido Social Cristão
  • PSD  Partido Social Democrático
  • PSDB  Partido da Social Democracia Brasileira
  • PSDC  Partido Social Democrata Cristão
  • PSL  Partido Social Liberal
  • PSOL  Partido Socialismo e Liberdade
  • PSTU  Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados
  • PT  Partido dos Trabalhadores
  • PTB  Partido Trabalhista Brasileiro
  • PTC  Partido Trabalhista Cristão
  • PTdoB  Partido Trabalhista do Brasil
  • PTN  Partido Trabalhista Nacional
  • PV  Partido Verde
  • REDE  Rede Sustentabilidade (partido político)
  • RN   Renovación Nacional
  • SD  Solidariedade (partido político)
  • SP  São Paulo
  • tdm   term-document matrix
  • TSE  Tribunal Superior Eleitoral
  • UDI   Unión Demócrata Independiente
  • 1
    Agradecemos aos comentários e sugestões de Davi Moreira e dos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e Política.
  • 2
    “As fortunas políticas são feitas e perdidas de acordo com a capacidade dos líderes partidários de perceber quais dimensões serão salientes para o público ao avaliar os candidatos e os registros partidários. [...] As habilidades dos líderes políticos que devem manobrar para o apoio público em uma democracia consistem, em parte, em saber quais as dimensões de issue são salientes para o eleitorado ou que podem ser destacadas por propaganda adequada” (tradução nossa).
  • 3
    “[...] a forma com que os eleitores decidem votar depende diretamente do modo com que os partidos os abordam” (tradução nossa).
  • 4
    “[o] desejo de criar partidos efetivos não é suficiente para que tais partidos surjam, mas é indispensável. Esse desejo não existe no Brasil. [...] Com partidos pouco organizados, os políticos são mais livres para atender suas próprias clientelas sem estarem vinculados a preocupações programáticas ou compromissos organizacionais” (tradução nossa).
  • 5
    “Posições do partido em issues são sacrificadas sistematicamente para os cálculos particularistas de uma elite fechada e partidos fracos atendem a uma democracia restrita” (tradução nossa).
  • 6
    “Um vasto segmento da população vota de acordo com imagens extremamente difusas ou por favores pessoais. [...] A população é receptiva a campanhas individualistas e populistas; essas predileções, por sua vez, favorecem partidos populistas não ideológicos” (tradução nossa).
  • 7
    “Assim, para muitos, o clientelismo torna extremamente difícil para os eleitores organizar seus pensamentos em termos de um continuum esquerda-direita ou qualquer outro e coloca uma tremenda pressão sobre o que é frequentemente chamado de política ideológica ou programática” (tradução nossa).
  • 8
    Para a autora, mudanças institucionais impostas pelo regime militar somadas a transformações urbanas vividas pelo país desde 1950 levou à morte dos coronéis. Limongi (2012)Limongi, F., 2012. Eleições e Democracia no Brasil: Victor Nunes Leal e a Transição de 1945. Dados, 55(1), pp 37-69. DOI: 10.1590/S0011-52582012000100002
    https://doi.org/10.1590/S0011-5258201200...
    , por sua vez, argumentou que uma mudança na leitura da descrição de Leal (1975)Leal, V. N., 1975. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Editora Alfa-Ômega. permite concluir que as eleições não se tratavam de uma farsa. Ao contrário, elas regularam efetivamente o conflito político. Por essas razões, é dispensável entrar nas particularidades do sistema coronelista.
  • 9
    “Competição partidária programática implica, assim, em os partidos serem internamente coesos em termos das posições sobre issues apoiadas por seus dirigentes e representantes eleitos, mas sensíveis às mudanças nas demandas externas e suficientemente diferenciados de outros partidos em suas posições ideológicas para que os eleitores sejam capazes de distinguir quais partidos estão mais perto de suas próprias posições” (tradução nossa).
  • 10
    “[é] claro [...] há aqueles que insistem que os direitos têm pouco a ver com a distribuição seletiva e ocasional de fichas de leite, a pavimentação de estradas, a construção de escolas ou a instalação de sistemas de esgoto da vizinhança. E, além disso, que o clientelismo, como uma estratégia baseada na entrega de tais bens e serviços, enfraquece qualquer tentativa de propagar ideologias coerentes ou estabelecer programas baseados em princípios de universalismo e direito. Essa perspectiva, creio eu, é simplista e mais especificamente, elitista” (tradução nossa).
  • 11
    Conferir categorias, domínios e procedimentos de codificação em <https://manifesto-project.wzb.eu/datasets>. Último acesso em 16/12/2018.
  • 12
    Manifestos de fundação dos partidos e diretrizes disponibilizadas. Não inclui programas eleitorais de governo.
  • 13
  • 14
    Para exemplificar esse processo, palavras como “trabalho”, “trabalhadora” e “trabalhadores” são todas consideradas como “trabalh”.
  • 15
    O gráfico para cada um dos municípios pode ser solicitado via e-mail.
  • 16
    O município foi selecionado aleatoriamente, apenas para exemplificação.
  • 17
    Essa arbitrariedade se relaciona apenas ao lado positivo ou negativo da posição e não a seu valor, já que é obtido sobretudo através da frequência de palavras, por meio de função já apresentada neste trabalho.
  • 18
    Essas colocações se fundamentam em testes de sensibilidades realizados ao longo da pesquisa. Porém, o método ainda precisa ser refinado no que se refere à análise da consistência partidária, apresentada com caráter preliminar neste trabalho.
  • A produção desse manuscrito foi viabilizada através do patrocínio fornecido pelo Centro Universitário Internacional Uninter à Revista de Sociologia e Política.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2017
  • Revisado
    17 Jan 2019
  • Aceito
    17 Abr 2019
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